Magazine Luiza, B2W ou Via Varejo: qual se saiu melhor em meio à revolução do e-commerce com o coronavírus?

Em uma temporada considerada positiva para o segmento, analistas apontam Magalu como mais preparada, mas se dividem sobre preferências para ações do setor

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A sessão do dia 6 de maio foi emblemática para as grandes varejistas de e-commerce brasileiras, com as ações saltando na bolsa como um sinal do que poderia ser a temporada de resultados do primeiro trimestre de 2020 – e também a tendência para os meses seguintes.

Naquele pregão, os investidores repercutiam o resultado do Mercado Livre, com ações listadas na Nasdaq que saltaram 19,64%. Com grande participação no Brasil, o Mercado Livre divulgou números que sinalizavam que, mais do que as companhias de varejo de alimentos ou de farmácia, as empresas nacionais com grande exposição ao e-commerce estariam no seleto grupo das que se destacariam positivamente em meio à pandemia do coronavírus. Isso devido às medidas de isolamento social, que levariam mais pessoas a buscar outros meios para adquirir os produtos necessários além das lojas físicas.

As projeções se confirmaram e os resultados das empresas brasileiras de e-commerce, independentemente da reação das ações logo após os balanços, foram bem recebidos pelo mercado.

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Por sinal, os ativos das empresas do segmento tiveram uma recuperação surpreendente desde o ápice do temor dos mercados com o coronavírus e se firmaram como as poucas altas do ano no Ibovespa. As ações da B2W (BTOW3) saltam 49,54% no acumulado de 2020, com ganhos de cerca de 96% na comparação com a cotação de fechamento no final de março.

Em seguida, estão os papéis do Magazine Luiza (MGLU3), com valorização de 41,59% em 2020 e alta de 72% entre abril e maio. Os ganhos foram ainda mais expressivos para a Via Varejo (VVAR3) desde o começo do mês passado, com disparada de 130,68%; já no ano, a alta é mais modesta, de 9%.

Mas, mesmo com uma visão tão positiva para os balanços de forma geral, alguns resultados saltaram ainda mais aos olhos dos analistas e investidores.

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De acordo com Pedro Fagundes, analista da XP Investimentos, a empresa que mais despontou e se mostrou mais preparada para enfrentar a pandemia do coronavírus foi também a última a informar o resultado: o Magazine Luiza, que divulgou seus números na última segunda-feira (25). Apesar de apresentar um lucro abaixo do esperado, com queda de 76,7%, para R$ 30,8 milhões, na base anual e, em termos ajustados, ter sofrido um prejuízo de R$ 8 milhões, as demais linhas surpreenderam positivamente.

O e-commerce da companhia teve um crescimento do GMV (volume bruto de mercadorias) de 73% no primeiro trimestre de 2020 na comparação anual. Formado pelo site, app, marketplace e as operações de Netshoes, Zattini, Época Cosméticos e Estante Virtual, as vendas digitais superaram o valor de R$ 4 bilhões e corresponderam a 53% das vendas totais da companhia. As vendas totais do Magalu atingiram R$ 7,7 bilhões, alta de 34% em relação ao mesmo período do ano passado. Nos meses seguintes, houve uma aceleração ainda maior, de 138% em abril e de expressivos 203% em maio.

Conforme aponta Fagundes, o Magalu já contava com a estratégia de multicanalidade funcionando, possui muito caixa e tem uma estratégia inteligente na alocação de capital, podendo investir mais em marketing e fazer promoções.

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Na avaliação dos analistas do Bradesco BBI, os resultados deixam o Magazine Luiza na posição de um dos vencedores da atual crise. O crescimento do comércio eletrônico, o quesito prazos de entrega e a comercialização de novos segmentos também foram reforçados. “Vemos a queda nos lucros [por conta do efeito das lojas fechadas] como uma questão menos importante, devido ao progresso estratégico significativo que está sendo feito”, avaliaram.

A qualidade do crescimento do e-commerce também é destacada, pois ele está sendo impulsionado por maior frequência (usuários ativos mensais nos aplicativos da companhia de até 21 milhões ante 6 milhões no primeiro trimestre de 2019), entrega mais rápida (20% do GMV no marketplace enviado por Malha Luiza e Logbee) e expansão em novas categorias. Neste último quesito, o site de cosméticos Época cresceu 150% em abril, enquanto a Netshoes também teve um bom desempenho e a categoria higiene e cuidados pessoais é agora a maior categoria em número de pedidos.

“Isso nos deixa confiante em nossa visão de que o Magazine Luiza será o principal vencedor em participação de mercado nos próximos anos”, apontam os analistas do BBI.

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O caixa reforçado em uma época de crise, por sinal, é visto como um grande diferencial positivo para a companhia. Durante teleconferência, Frederico Trajano, presidente do Magalu, ressaltou que o caixa da empresa tem fôlego para suportar dois anos de lojas físicas fechadas. “Reforçamos caixa, emitimos debênture e fizemos descontos de recebíveis. Podemos fazer ainda outras ações do tipo, mas a perspectiva com abertura de lojas é mais positiva”, apontou.

A varejista terminou o primeiro trimestre do ano com posição de caixa total de R$ 4,6 bilhões. Além da adoção das medidas previstas na Medida Provisória 936, que permite reduzir a jornada de trabalho e de salários, e a renegociação de aluguéis, a empresa emitiu uma debênture em abril que irá remunerar com taxa do CDI mais 1,5% de juros.

Victor Saragiotto e Pedro Pinto, analistas do Credit Suisse, avaliaram que o resultado da Magalu era um dos mais esperados da temporada e não desapontou. Contudo, fizeram algumas ponderações: “As lojas físicas têm uma rentabilidade maior do que a operação online e acreditamos que a margem no segundo trimestre deva ser um pouco pior. De toda forma, o grande apelo da história está no crescimento e nos parece razoável acreditar que o mercado irá dar um peso maior a este ponto do que à rentabilidade”.

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B2W e Via Varejo: surpresas positivas em tempos difíceis

Se o Magalu despontou, outras companhias também mostraram qualidade e resiliência em meio ao coronavírus, como a B2W e Via Varejo.

No caso da B2W, que possui as marcas Americanas.com, Submarino, Shoptime e Sou Barato, as vendas brutas foram de R$ 4,58 bilhões, alta de 27,3% frente mesmo período do primeiro trimestre de 2019. Com isso, a receita líquida cresceu 32,3%  e fechou com um total de R$ 1,7 bilhão. O crescimento do lucro bruto foi de 29% e do EBITDA, de 53%, impulsionados pelo controle e diluição de custos, com as despesas com vendas gerais e administrativas como percentual das vendas caindo de 25,3% para 23,5%.

O número de pedidos  aumentou 35% na comparação anual. Já em abril, a companhia adiantou que o número de pedidos foi 83% maior. “Tais números refletem não apenas o crescimento registrado nas suas linhas de cima (GMV e Receita) do primeiro trimestre de 2020 como a força que o comércio eletrônico terá no mundo pós pandemia”, aponta a equipe da análise da Levante Ideias de Investimento.

A companhia também conta com uma grande vantagem: a B2W está utilizando as Lojas Americanas para fazer vendas e entregas, bem como realizando a venda digital através dos aplicativos “clique e retire na lojas”. A maioria (70%) das lojas da Americanas é de rua e pode fazer as entregas para pedidos online, tendo registrado um crescimento de 6,5% nas vendas mesmas lojas. As lojas de shopping centers, que permanecem fechadas, tiveram queda 4,2% no trimestre.

Assim, um ponto bastante destacado por analistas é de que grande parte do trabalho que a B2W e a
Lojas Americanas estava fazendo para acelerar as iniciativas de multicanalidade se acelerou. O “ship from store” (compre online e receba da loja mais próxima) foi expandido de 300 para todas as 1.700 lojas físicas da Americanas – antes da Covid-19, a meta era que esse processo acontecesse até o final do ano. A empresa ainda aponta que as iniciativas como expedição da loja e click and collect (retirada em lojas de compras feitas pela internet), tiveram um crescimento de 85% e atingiram quase 12% do GMV.

“Isso é positivo a longo prazo, à medida que os consumidores se familiarizam com a compra online de itens com maior frequência/menor preço, o que é essencial para a ‘segunda onda’ do comércio eletrônico [mais baseado em venda de itens de vestuário, cosméticos e artigos esportivos]”, avalia o Bradesco BBI.

A companhia teve um consumo de caixa de R$ 646 milhões no trimestre, ante R$ 385 milhões em igual período do ano passado. Para os analistas do BBI, contudo, o aumento foi por um bom motivo, motivado pela decisão de aumentar os estoques à frente como resultado do Covid-19. “Esperamos que essa posição mais alta de estoque seja monetizada ao longo do ano, portanto não estamos preocupados com a maior queima de caixa”, avaliam.

Por outro lado, apesar de saudar a velocidade de integração das plataformas, a logística da companhia e também de ter conseguido se aproveitar da recém-adquirida aquisição do supermercado Now (em janeiro) para otimizar o desempenho na categoria, Fagundes aponta como pontos relativamente fracos para a B2W o fato de que ela ainda está diminuindo a sua distância com o Magazine Luiza e seguir apresentando prejuízos seguidos, além de maiores problemas com caixa. 2019 foi o primeiro ano em que a companhia conseguiu gerar caixa.

“O nível de execução da empresa realmente mudou de patamar. A B2W está na direção correta, mas ainda não ‘chegou lá'”, aponta o analista da XP.

Com relação à Via Varejo, que vem passando por um grande processo de reestruturação, os números também são positivos, mostrando que a estratégia da dona das Casas Bahia e do Ponto Frio de implantar uma verdadeira “revolução digital” está rendendo frutos em um momento crucial por conta da pandemia.

A empresa viu o crescimento das vendas brutas online acelerar para 45,7% na comparação mensal; apesar do maior portfólio de e-commerce e queda das vendas nas mesmas lojas, a margem bruta registrou uma expansão, de 3,1 pontos percentuais. Além disso, a Via Varejo conseguiu registrar lucro apesar do cenário adverso, de R$ 13 milhões, ante prejuízo de R$ 50 milhões em igual período do ano passado, além de tomar iniciativas de gerenciamento que permitiram a redução da queima de caixa em R$ 850 milhões.

“Como resultado dos investimentos em tecnologia, as indicações para o crescimento online em abril foram surpreendentes – o segmento de venda direta (1P) cresceu 260% na base anual, enquanto o mercado registrou um crescimento de 130% no mesmo período”, apontam os analistas do Credit.

Com o número de lojas abertas sendo reduzido drasticamente por conta das medidas de isolamento social, a procura por entregas rápidas (até 24 horas) passou a representar 28% das vendas online, enquanto houve um crescimento de usuários ativos nos aplicativos praticamente exponencial. O número passou de 1,5 milhão em junho de 2019 para 8 milhões em março e saltou para 11,2 milhões em abril.

Uma das recentes medidas da companhia, a venda realizada pelo Whatsapp também teve boa aceitação do público e já é responsável por 20% das vendas online. Enquanto isso, o BanQi, lançado em 2019 com o objetivo de acelerar a presença digital, também ganha destaque com presença em 100% das lojas físicas e mais de 1 milhão de downloads do aplicativo.

Dentro deste cenário, o Bradesco BBI aponta que, embora o comércio eletrônico esteja crescendo a partir de uma base baixa, os números de crescimento de GMV para o primeiro trimestre e para abril são impressionantes e mostram que muito progresso foi feito em um período relativamente curto. “Embora parte do crescimento seja temporário devido à restrição das vendas nas lojas físicas, a situação está dando à Via Varejo a oportunidade de destacar as melhorias que foram feitas na plataforma”, avaliam os analistas.

Ainda há mais a ser feito para diminuir a diferença entre os concorrentes, avaliam os analistas, sendo que a própria gestão estabeleceu um roteiro de iniciativas a serem entregues nos próximos 60 dias. A companhia manteve as suas indicações para o capex (investimento em capital) para a transformação digital, o que aumenta o otimismo com novas medidas.

Soma-se a isso o fato de que, no caso da companhia, as lojas físicas também apontavam para um sinal de recuperação no período pré-coronavírus, indicando uma recuperação bem-sucedida após tempos difíceis para a Via Varejo.

Questão de preço

O saldo do primeiro trimestre de 2020 para essas empresas foi positivo e mostrou que elas estão bem preparadas para enfrentar o período de isolamento social por conta do coronavírus. Mais do que isso, o momento tem sido importante para acelerar o processo de transformação que já vinha ocorrendo. O desafio foi grande – e elas conseguiram corresponder.

Conforme destacado acima, isso acabou se refletindo no forte desempenho das ações nos últimos meses – e uma questão é até onde elas podem ir.

Fagundes, da XP Investimentos, reforça sua recomendação de compra para as ações do Magazine Luiza, apontando que a companhia está bem posicionada não só para atravessar os desafios impostos pela crise atual, mas também para continuar acelerando os seus esforços de ganho de participação de mercado e de aumento da monetização da plataforma.

Já para a B2W, a recomendação é neutra. O analista ressalta que, mesmo com o múltiplo EV/GMV ((EV = enterprise value, ou valor de mercado + dívida líquida”/GMV) apontando a B2W como mais barata, o Magalu tem um histórico maior de geração de caixa e lucro, o que reforça a indicação positiva apesar do preço do ativo. Após a divulgação do resultado, o analista elevou o preço-alvo para os ativos MGLU3 de R$ 58 para R$ 71, o que representa um potencial de valorização de 5,4% frente o fechamento de quarta-feira.

Por outro lado, o Credit Suisse mantém recomendação neutra para os ativos. Os analistas consideram brilhante o trabalho feito pela gestão do Magalu, mas avaliam que o papel da varejista negocia a um patamar que implica expectativas bastante altas – ou seja, um nível de crescimento excessivamente forte ou então um destravamento de valor de iniciativas ainda incipientes (Magalupay, MaaS, IDPV).

A recomendação do Credit para os ativos BTOW3 também é neutra enquanto que, para os papéis VVAR3, é outperform (desempenho acima da média do mercado). Sobre Via Varejo, eles apontam: “Reconhecemos que ainda há um longo caminho a percorrer, mas a disposição da empresa em manter intacto seu capex para a transformação digital e os resultados entregues até o momento nos deixam otimistas sobre o case de investimento”.

Corroborando uma visão geral positiva para as três companhias, estão os dados da Bloomberg que compilam as recomendações das casas de análise que cobrem os papéis: de 15 casas que cobrem o ativo MGLU3, 11 recomendam compra e 4 possuem recomendação de manutenção. No caso de BTOW3, há 11 recomendações de compra e 7 de manutenção; para VVAR3, o número de recomendações de compra e manutenção é, respectivamente, de 10 e 6. Não há recomendações de venda.

Desta forma, para grande parte dos agentes de mercado, mesmo com alguns reveses e pressão de margens em meio à pandemia, essas companhias estão conseguindo se reinventar e acelerar ainda mais o processo de transformação, credenciando-se como as poucas “vencedoras” em tempos tão difíceis para a economia com o coronavírus.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.