Após nove cortes, Copom mantém Selic a 2,00%: como investir com juros menores que a inflação?

Bolsa, crédito privado e investimentos alternativos estão entre as principais recomendações de gestores de patrimônio

Mariana Zonta d'Ávila

(Getty Images)
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SÃO PAULO – Em linha com o esperado pelo mercado financeiro, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manteve a taxa básica de juros em 2,00% ao ano nesta quarta-feira (16), depois de um ciclo de nove cortes consecutivos da Selic.

Com juros estacionados nas mínimas históricas, a busca por investimentos mais rentáveis e, portanto, com maior risco implícito, ainda recai, principalmente, sobre os ativos de renda variável.

A escolha, contudo, não tem sido fácil. Se por um lado o investidor vê a possibilidade de perder para a inflação ao alocar recursos em aplicações conservadoras, na renda variável, há cada vez mais preocupações com o fim do fôlego das bolsas globais e com os riscos no horizonte, com destaque para as eleições presidenciais americanas.

A preocupação com a aceleração da inflação uma vez que os estímulos injetados nas economias mundiais forem retirados também vem ganhando relevância, com potencial ajuste dos portfólios.

O fato é que hoje, com a Selic a 2% ao ano, uma aplicação no Brasil com rendimento equivalente a 100% do CDI rende 1,65% em 12 meses, já descontado o Imposto de Renda, de 17,5%, no período. Mesmo isenta de tributação, a caderneta de poupança tem um retorno ainda menor, de apenas 1,4% ao ano, neste cenário.

Os valores são mais baixos que a expectativa de inflação para este ano, de 1,94%, e para o próximo, de 3,01%, segundo o relatório Focus, do Banco Central, mais recente. Nos últimos 12 meses até agosto, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumula alta de 2,44%.

Em entrevista ao InfoMoney, João Julião, gestor da estratégia de ações globais da Verde Asset, destacou que, para além das eleições nos EUA, o grande riso no horizonte seria uma alta acentuada da inflação e das expectativas de inflação.

“Se tivermos uma desancoragem por conta de todo esse dinheiro que foi colocado na economia, ela poderia causar uma forte queda dos mercados, porque as taxas de juros futuros teriam que subir e seria necessário descontar o valor das empresas com uma taxa de juros maior. Os bancos centrais ainda teriam que subir os juros de alguma forma para corrigir as expectativas”, afirmou.

Na avaliação de Felipe Dexheimer, coordenador de alocação da XP, os investidores devem ficar de olho na inflação medida pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), que corrige os contratos de aluguéis, que deve encerrar o ano em 15%, de acordo com o relatório Focus.

“Isso mostra que tem várias pressões inflacionárias que estão abaixo da superfície do IPCA. Em muitos casos, elas podem não se manifestar, mas empresas podem ser obrigadas a repassar [o aumento], colocando um risco de surpresas inflacionárias, como a dos alimentos”, diz.

Renda fixa

Em um cenário de juros baixos nunca antes visto no Brasil, o investidor que quiser ter retornos na renda fixa acima da inflação precisa abrir mão da liquidez e alongar o prazo das carteiras, olhando para um horizonte acima de dois anos e meio, afirma Dexheimer.

Além de fundos de crédito privado com prazos de resgate a partir de 30 dias, o alocador da XP diz gostar de debêntures de infraestrutura (isentas de Imposto de Renda para a pessoa física), com uma duration (prazo médio mínimo do investimento) em torno de cinco anos.

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A avaliação é compartilhada por Renan Rego, sócio e gestor da gestora de patrimônio G5 Partners, que chama atenção para debêntures de infraestrutura com vencimentos intermediários, de seis a oito anos, em especial de projetos de linha de transmissão. São papéis que oferecem taxas de 1,5% a 1,8% acima do Tesouro IPCA+ de mesmo vencimento, diz.

Entre os títulos públicos, Dennis Kac, CIO e sócio da Brainvest no Brasil, tem posição em papéis prefixados de vencimentos mais curtos, como 2023. “O papel precifica uma forte alta para a Selic, o que não achamos que vá acontecer, então o prêmio de risco é robusto”, avalia. Nesta quarta-feira (16), o papel pagava um prêmio anual de 4,35%.

De olho em um cenário de alta da inflação, que seria negativo para os prefixados, o executivo diz que também tem exposição a títulos do tipo Tesouro IPCA+, de forma a proteger o portfólio. Segundo ele, os papéis com vencimentos intermediários, como 2028, oferecem uma boa relação entre risco e retorno, com juros reais na casa de 3% ao ano.

Bolsa

Depois de uma forte retomada das bolsas mundiais após as mínimas de março, as “big techs” americanas, que puxavam o desempenho das ações nos Estados Unidos, começaram o mês de setembro em forte queda.

Até terça-feira (15), a Nasdaq caía 5% no mês, depois de registrar alta de 10% em agosto. No S&P, o movimento era similar: baixa da ordem de 3%, após valorização de 7% no mês anterior.

Na avaliação de Julião, da Verde, o movimento se trata de um ajuste técnico e os fundamentos permanecem sólidos. “Vemos que essa correção é saudável e, passando isso, achamos que a volatilidade das ações começa a baixar”, afirmou.

Dito isso, a Verde continua gostando das teses de tecnologia, bem como aquelas ligadas a novas tendências geradas pela pandemia, vinculadas a imóveis e internet, por exemplo.

Já a SPX preferiu encerrar as posições compradas (com aposta na alta) no setor de tecnologia americano.

No Brasil, ainda que o Ibovespa já tenha recuperado grande parte das perdas decorrentes da pandemia, com ganhos de quase 60% desde a mínima do ano, em 23 de março, a avaliação dos gestores de patrimônio consultados é de que ainda há espaço para ganhos.

Em agosto, o principal benchmark de renda variável no Brasil caiu 3,4%, encerrando quatro meses consecutivos de alta. Em setembro, o Ibovespa sobe cerca de 1%, mas, no ano, o desempenho está negativo em 13,3%.

Neste cenário, a preferência é por delegar a escolha dos ativos a bons gestores que consigam ter desempenho acima do Ibovespa e buscar as melhores oportunidades.

Kac, da Brainvest, conta que gosta de combinar fundos de estratégias long only e long biased, que se mostram, juntas, a melhor alocação para os investidores no médio e longo prazo, defende. Enquanto uma costuma estar 100% alocada, a outra permite maior flexibilidade, com o gestor podendo reduzir ou ampliar posições de acordo com o cenário.

A gestora de Rogério Xavier, por sua vez, possui posições compradas em empresas dos setores de utilities, telecomunicações, consumo e mineração, contra o Ibovespa.

Dexheimer, da XP, destaca que as bolsas globais subiram bastante desde as mínimas do ano, mas que os analistas do mercado ainda não tiveram tempo de rever suas projeções para as companhias.

Segundo ele, similar ao que aconteceu em 2008, o preço das empresas subiu enquanto o lucro não teve tempo de ser revisado.

“Estamos no ‘olho da incerteza’; o mercado já subiu, mas ainda não deu tempo de os analistas incorporarem uma melhora nas projeções. Parece que está caro, mas tudo indica que estamos seguindo uma trajetória positiva, com dados de recuperação da economia”, diz.

Antes de investir, contudo, é preciso monitorar o cenário externo. Entre os principais riscos que o investidor deve ficar de olho, Rego, da G5 Partners, cita uma segunda onda de contaminações pela Covid-19 no mundo, bem como a aproximação das eleições presidenciais americanas, que acontecem em novembro.

Investimentos alternativos

A grande oportunidade hoje, segundo os gestores consultados, recai sobre os investimentos estruturados, como fundos de private equity, venture capital, crédito estruturado e fundos de ativos estressados.

Mas além de terem baixa liquidez, os investimentos alternativos ainda não estão disponíveis para o investidor de varejo. Isso porque são destinados, em sua maioria, para qualificados e profissionais, com patrimônio investido a partir de R$ 1 milhão e R$ 10 milhões, respectivamente.

Kac, da Brainvest, explica que esses são investimentos que visam retornos mais elevados e são descorrelacionados das classes tradicionais de ativos. “Eles têm prazos maiores, de cinco a dez anos, então o investidor precisa de paciência”, diz. E completa: “Não é trade, é longo prazo.”

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A classe também vem ganhando espaço nos portfólios dos clientes da G5. “São veículos que precisam se tornar mais presentes. Eles nos dão proteção contra a inflação e oferecem riscos assimétricos a favor do investidor”, afirma Rego.

É fundamental, entretanto, que o investidor entenda a estrutura dos produtos, o histórico dos gestores e invista com parcimônia, assinala o gestor.

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