Perde na ida e perde na volta

A importância de esticar o horizonte de investimento e não deixar dinheiro na mesa

Carolina Oliveira

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

(Shutterstock)
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“Vamos deixar esse vencimento fechar mais 20 pontos. Temos espaço para esse movimento.”

Essa era a fala do Wilson, meu antigo chefe e grande amigo, depois de mais um dia de mercado e depois de mais um dia de resultado muito positivo das nossas operações de juros reais, com todos os planos comprando NTN-Bs, os famosos títulos Tesouro IPCA+.

Depois de muito pensar, o time de investimentos resolveu não vender a posição, afinal de contas tínhamos uma Reforma da Previdência prestes a ser aprovada.

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Voltando para casa, dentro do metrô, recebo uma mensagem da minha mãe: “Você viu o que aconteceu?” Não, não tinha visto…

A data, 17 de maio de 2017, tinha tudo para ser mais um dia padrão: acordar, ir ao trabalho, investir dinheiro, voltar para casa e dormir. E isso tudo teria acontecido se a gente não tivesse tido um evento no meio do caminho: a notícia de que o então presidente do Brasil, Michel Temer, tinha sido flagrado em conversas comprometedoras com o empresário Joesley Batista.

O áudio ainda não tinha sido divulgado, mas as consequências para o mercado financeiro seriam devastadoras: a Reforma da Previdência, muito aguardada, tinha acabado de subir no telhado e os preços dos ativos iriam refletir isso.

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O dia após a notícia não se resumiria mais à minha simples rotina – tínhamos mais uma batalha para vencer. A posição que resolvemos postergar para vender com mais lucro abriu o dia com uma perda milionária.

Então, de manhã bem cedo, em uma reunião extraordinária, nos fizemos as seguintes perguntas: os fundamentos da posição mudaram? O impacto da notícia trazia um risco desproporcional para os ativos? Meu horizonte de investimento seria impactado com a volatilidade que viria no dia 18?

Todas as nossas respostas a essas perguntas naquele dia foram negativas.

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Com isso, não vendemos os títulos – compramos uma posição adicional, inclusive. Os títulos de vencimento em 2035 tiveram queda de -10,47%.

Quem comprou os ativos no famoso Joesley Day e vendeu a posição em dezembro de 2017 teve um retorno de 12,83%. Aumentando o horizonte de investimento, com uma venda em dezembro de 2018, o retorno seria de 29,37%.

Ou seja, se investidores e investidoras tivessem feito a si mesmos as três perguntas que nós fizemos, o título não precisaria ter sido vendido num momento de estresse.

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Ao olhar o gráfico da taxa indicativa do ativo, notamos que o movimento de estresse foi ficando para trás; nele, quanto mais alta a taxa, mais desvalorizado o título está.

Logo depois, com o movimento de recuperação dos mercados, Wilson cunhou a seguinte expressão: “Tem gente que perde na ida e perde na volta.”

Isso quer dizer que aquele investe e vende seu título no momento de extrema desvalorização, perde dinheiro no estresse e deixa de recuperá-lo quando o mercado melhora. Ou seja, perde dobrado.

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Agora, anos mais tarde, pudemos nos deparar com mais uma situação de estresse no mercado: no auge da pandemia do novo coronavírus, muitos gestores chegaram a perder mais de 40% do patrimônio dos seus fundos, o que gerou resgates de muitos investidores, que ficaram bastante assustados com o tamanho da perda.

O impacto foi tão grande que uma das gestoras de ações mais renomadas do mercado brasileiro, a Dynamo, reabriu seu fundo, o Dynamo Cougar, depois de nove anos fechado, para captação.

Ele chegou a cair 47,88% no ano, mas encerrou 2020 com rentabilidade de 26,53%. Do pior momento no ano até o final de 2020, o fundo subiu 121,68%.

O objetivo de selecionar bons gestores consiste em escolher os times que, em períodos de perdas como esses, trabalhem como nunca para que os prejuízos que você vê hoje sejam diluídos ao longo do tempo – e o suor frio do(a) cotista e a dor no bolso serão apenas uma imagem do passado.

Nem sempre a recuperação é tão rápida quanto foi a do ano passado, mas, com uma gestão competente, a chance de ela chegar aumenta bastante.
Portanto, se você porventura se sentir tentado ou tentada a resgatar seus investimentos em meio a uma crise, incorrendo em prejuízo, lembre-se da fala do Wilson para que não perca nunca mais dinheiro, nem na ida, nem na volta.

Abraços,
Carol Oliveira

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Carolina Oliveira

Carolina Oliveira é especialista em fundos de investimento na Spiti, analista CNPI, economista e mestre em Economia Empresarial. Atuou nas áreas de investimentos de fundos de pensão por quase uma década. Acredita que os investimentos foram feitos para beneficiar aquele que investe e que o pequeno investidor deveria ser capaz de conseguir investir sem firulas e com o calibre de um investidor grande. É por essa causa que está disposta a advogar.