Pandemia derruba pelo segundo ano projeções para a economia e bancos revisam cenário do Brasil em 2021

Com pandemia, inflação e risco fiscal, PIB do Brasil vai crescer menos, segundo bancos como Barclays, Morgan, Credit; entenda o novo cenário

Priscila Yazbek

(RHJ/Getty Images)
(RHJ/Getty Images)

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SÃO PAULO – O ano começou com expectativas positivas para a economia brasileira, retomada era a palavra de ordem, analistas previam o Ibovespa chegando a 130 mil pontos e o PIB crescendo cerca de 4%. Mas, pelo segundo ano, a pandemia fez cair por terra as previsões. Para acomodar nas projeções de 2021 o pior momento da crise sanitária, juros maiores e deterioração fiscal, bancos revisaram suas projeções para o PIB do Brasil para algo mais próximo a 3%, com os mais pessimistas prevendo crescimento na casa dos 2%.

As revisões de importantes bancos de investimento, como Credit Suisse, Barclays, Morgan Stanley e outros vieram principalmente após a elevação da taxa Selic em 0,75 ponto percentual e a sinalização do Banco Central de que o ciclo de alta de juros será mais intenso e rápido do que o esperado. Além dos juros mais altos, que contribuem para reduzir a atividade, os bancos citam as restrições provocadas pela pandemia como motivo para as reavaliações de cenário.

Os dois fatores – pandemia e juros altos – se conectam e retroalimentam. Juros sobem com aumento da inflação. O avanço dos preços é explicado, em boa parte, pelo dólar alto, fruto do enfraquecimento da economia e aumento do risco do país, e pelas restrições nas ofertas, ambas questões ligadas à pandemia.

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Além das instituições privadas, no último dia 25, o Banco Central também reduziu a expectativa para a economia deste ano, de 3,8% para 3,6%, conforme o Relatório Trimestral de Inflação (RTI). Segundo o BC, a decisão foi motivada pela “incerteza acima do usual” sobre a economia e das possíveis respostas de governantes, empresas e população à crise sanitária.

O Boletim Focus do Banco Central, que reúne as projeções dos principais bancos e instituições financeiras do país para a economia, mostra que o mercado começou o ano esperando alta de 3,41% do PIB do Brasil em 2021 (previsão da edição de 08 de janeiro). Diversas quedas depois, o mais recente Focus já mostra que os economistas esperam agora avanço de 3,18%.

Veja a seguir os bancos que revisaram projeções para o PIB e o cenário econômico brasileiro e as justificativas.

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Credit Suisse

O banco Credit Suisse reduziu nesta semana as projeções de crescimento do PIB de 3,7% para 3,2% para 2021 e de 2,9% para 2,4% para 2022. As justificativas foram: o ciclo de alta de juros mais forte que o esperado; a aceleração da inflação; e o agravamento da pandemia. Três fatores que devem ter um impacto maior na atividade econômica do que o esperado, segundo o banco suíço.

“A retomada da atividade econômica observada desde o terceiro trimestre de 2020 deve ser temporariamente interrompida em março de 2021 devido à adoção de medidas de distanciamento social e ao aperto das condições financeiras. A recuperação do lado da oferta da economia foi adiada para meados do segundo trimestre”, diz o relatório do Credit.

Com a inflação pressionada, os analistas esperam que a Selic continue sendo elevada em 0,75 ponto percentual nas próximas cinco reuniões seguidas do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), o que deve levar a taxa para 6,5% ao ano no final de 2021, patamar que deve ser mantido ao longo de 2022.

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“Em nossa opinião, o Banco Central não conseguirá implementar uma normalização parcial, como consta dos documentos oficiais, e precisará aumentar as taxas para perto do nível neutro [nível de taxa que mantém a inflação estável]. Isso porque a inflação deve seguir pressionada nos próximos trimestres, atingindo 5,1% no final de 2021, acima do centro da meta do Banco Central de 3,75%”, afirma o banco.

Os analistas destacam que o avanço nos preços das commodities levaram a inflação ao produtor (Índice de Preços ao Produtor Amplo – IPA) a 42,6% nos 12 meses encerrados em fevereiro, ante uma inflação ao consumidor (IPCA) de 5,2%. Com as baixas margens e o real depreciado, produtores devem repassar custos mais elevados aos consumidores nos próximos meses, levando a inflação a subir, que também fica pressionada por causa do cenário fiscal incerto.

Morgan Stanley

No relatório intitulado “Um crescimento mais baixo e taxas mais altas”, o Morgan Stanley afirma que as restrições relacionadas à Covid e o auxílio emergencial insuficiente significam crescimento mais baixo. Mas as restrições de oferta persistentes impedem que a renda menor e o isolamento se traduzam em inflação mais baixa. “A incerteza fiscal persistente e a alta inflação são outros ventos contrários”, diz o banco.

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Assim, o Morgan reduziu a expectativa para o PIB de 2021 de 4,3% para 3,5%, principalmente devido à fraca demanda interna. Para 2022, a expectativa subiu de 2,7% para 3,0%.

O relatório destaca que a inflação maior, diante da combinação de preços de commodities mais altos e real mais fraco, levou o BC a fazer um “agressivo aperto” dos juros para evitar aumentos na expectativa de inflação para 2022. Agora o banco espera a Selic em 5% em 2021 (ante 4,25%) e manteve a previsão de 6% para 2022. Apesar do início agressivo do ciclo de alta dos juros, a projeção de inflação para 2021 subiu para 5%, ante 4,5%.

Eles mencionam também atrasos no plano de vacinação. “Apesar do bom histórico do Brasil em campanhas de vacinação, até o final de maio não deve haver nenhum impacto substancial da imunização sobre novos casos de Covid. Até lá, o crescimento esperado para o primeiro semestre do ano estará comprometido”.

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Com o aumento do desemprego e a redução significativa no auxílio emergencial, dos R$ 293 bilhões gastos em 2020 para os R$ 44 bilhões previstos para este ano, os analistas também preveem um declínio da massa salarial no primeiro semestre. O setor de serviços deve ser o mais afetado. Além do impacto direto do fechamento de atividades, diz o banco, as restrições de mobilidade sozinhas explicaram quase 60% da variação do PIB geral de serviços no segundo e terceiro trimestres de 2020.

Eles mencionam ainda a questão fiscal, dizendo que incertezas permanecem, a despeito da aprovação da PEC Emergencial. “Os mercados estão preocupados se os desenvolvimentos recentes no cenário político poderiam funcionar como um incentivo para o governo escalar medidas heterodoxas.” Conforme mostrou reportagem recente do InfoMoney, analistas avaliam que a entrada do ex-presidente Lula na disputa eleitoral para 2022 poderia levar Bolsonaro a adotar medidas mais populistas, de aumento de gastos, para elevar sua popularidade.

Barclays

Em revisão de cenário realizada no meio de março, o Barclays afirmou que a América Latina continua sendo duramente afetada pela pandemia, ressaltando que o Brasil vive a situação mais dramática entre os países da região. O banco britânico diz que o crescimento brasileiro será mais fraco do que o previsto anteriormente e que a recuperação será bastante gradual e dependente do progresso de vacinação.

Ainda que os dados de atividade econômica brasileira tenham ficado acima das expectativas no quarto trimestre de 2020 e em janeiro de 2021, segundo o Barclays, a tendência positiva não deve se manter diante da piora das condições financeiras e da nova rodada de “lockdowns”.

Por essas razões, o banco revisou a projeção para o PIB deste ano de 3,5% para 3,2%. Se as previsões se concretizarem, o Brasil ficará na lanterna do crescimento econômico em relação aos seus pares. O banco britânico prevê alta de 5% para o PIB do México, 6% para a Colômbia, 6,5% para a Argentina, 7,5% para o Chile e de 8,8% para o Peru.

Bradesco

O Bradesco cortou a projeção do PIB do Brasil de 3,6% para 3,3% nesta quinta-feira (1). O banco também revisou a expectativa para o IPCA deste ano, de 3,9% para 5% e a previsão para a Selic de 4% para 5,25% . O dólar para 2021 também foi elevado, de R$ 5,30 para R$ 5,60.

Segundo o banco, as incertezas fiscais têm elevado os prêmios de risco, piorado as condições financeiras e impedido uma estabilidade da taxa de câmbio, adicionando incerteza ao cenário. Segundo relatório assinado pelo economista-chefe do Bradesco, Fernando Honorato, a retomada esperada no cenário base pode não se materializar.

Por outro lado, o Bradesco afirma que um desfecho positivo para as questões fiscais e para o manejo da pandemia têm potencial para acelerar o crescimento e surpreender as expectativas positivamente, inclusive com efeitos sobre a taxa de câmbio, a inflação e os juros

Itaú

O Itaú Unibanco reduziu a expectativa para o crescimento do PIB de 4% para 3,8% em 2021 e de 2,5% para 1,8% em 2022. As razões são parecidas com as dos outros bancos: o aumento do risco fiscal e a deterioração das condições financeiras impedem a manutenção dos juros em patamares mais baixos e reduzem a perspectiva de crescimento.

O Itaú também revisou a expectativa para a taxa de desemprego, que subiu de 14,2% para 14,3% no fim de 2021 e de 13,3% para 14,2% no fim de 2022. “O crescimento do PIB esperado para 2022 (1,8%) é próximo ao potencial e, portanto, insuficiente para gerar recuo na taxa de desemprego.”

O banco afirma que a segunda onda de Covid-19 e o aumento de medidas de restrição devem levar a uma queda mais intensa do setor de serviços, mas os impactos sobre a atividade como um todo devem ser mais limitados do que na primeira onda, segundo o relatório divulgado em meados de março. Já o varejo e a indústria devem ser favorecidos pelo auxílio emergencial e pelos estoques baixos.

No documento, o Itaú também destacou que a PEC emergencial aprovada no Congresso viabilizou a nova rodada de auxílio emergencial e que, com o auxílio e compra de vacinas, os gastos não sujeitos ao teto devem somar R$ 65 bilhões em 2021.

A principal contrapartida ao auxílio, segundo o Itaú, foi a regulamentação dos gatilhos do teto de gastos, que garantem “uma melhora permanente do marco institucional fiscal”, e que serão importantes para a manutenção do ajuste fiscal, após o fim da pandemia.

Mauá Capital

Saindo do espectro dos bancos, a gestora Mauá Capital também prevê um período mais turbulento que o esperado para a economia nos próximos meses. Em entrevista concedida há duas semanas ao Radar InfoMoney, programa diário de notícias de economia, transmitido ao vivo no Youtube do InfoMoney, Luiz Fernando Figueiredo, CEO da Mauá e ex-diretor do Banco Central, traçou uma expectativa para a economia brasileira ainda pior do que a dos bancos, com crescimento na casa dos 2%.

O economista afirmou que com os meses de março e abril sendo “dramáticos em relação à pandemia”, o país verá uma queda muito forte de atividade. “O desemprego vai subir, empresas que já estavam tentando se segurar vão ficar mais um bom tempo paradas, vamos ver fechamento de restaurantes, bares. Vai ser um período meio infernal”, projeta. “Estamos caminhando para uma economia que vai crescer neste ano algo em torno de 2,5% ou talvez menos”, diz Figueiredo.

Ele ressalta, porém, que apesar de o governo ter “flertado com a irresponsabilidade fiscal, “a PEC Emergencial saiu bastante razoável”. “Isso garantiu uma certa ancoragem fiscal – numa situação de muita fragilidade, é verdade-, mas isso abre espaço para um ambiente menos tortuoso para o resto do ano.”

Por essa razão, o câmbio e outros ativos tendem a ficar menos pressionados passados os piores meses da pandemia, segundo Figueiredo. “Nós teremos uma trajetória muito difícil, mas os ativos têm implícitos no preço deles quase que uma grande descontinuidade e isso não vai acontecer, já esticaram demais, agora têm que voltar um pouco. Não vai ser uma volta exuberante, mas os ativos estão bem mais descontados do que deveriam”, afirma o CEO da Mauá, que acredita que o Ibovespa pode voltar aos 125 mil pontos este ano.

Assim como o Morgan, Figueiredo também mencionou a preocupação do mercado sobre uma eventual virada populista de Bolsonaro com a entrada de Lula no páreo. Mas ele avalia que os discursos de Lula têm sinalizado que ele não deve se caminhar para o centro. “Em função disso, minha visão, que é bem contrária à de muitos analistas, é que para fazer frente ao populismo de Lula, Bolsonaro vai caminhar para um caminho mais em ordem, de responsabilidade fiscal”, diz.

Mas ele pondera que o risco de uma guinada populista no governo não está descartado. “Existe esse risco, sim, e aí o país teria uma chance enorme de entrar em recessão, porque nós já estamos com uma fragilidade tão grande que o sistema não aguenta mais muito desaforo. É um país que tem muita dificuldade para crescer e o populismo seria a pá de cal no crescimento, na recuperação de emprego, etc.”

Goldman Sachs

Apesar de não ter revisado as estimativas sobre o crescimento da economia brasileira, em meados de março o banco Goldman Sachs reduziu a exposição em ações brasileiras de overweight (acima da média do mercado) para neutra em seu portfólio da América Latina, enquanto elevou exposição no México para overweight.

“Embora reconheçamos que os ativos estão negociando relativamente a múltiplos baixos e que podem negociar a patamares melhores se o ritmo da vacinação aumentar, não temos uma opinião forte sobre uma recomendação direcional, considerando a alta volatilidade esperada daqui para frente, devido ao início muito prematuro do debate presidencial de 2022 e à piora da inflação e da dinâmica do emprego, com a escalada da pandemia”, afirmam os estrategistas do banco.

Apesar de rebaixar o Brasil para neutro, o banco elevou a exposição ao México por acreditar que os estímulos fiscais dos Estados Unidos devem resultar em maiores remessas ao país (que aumentaram 11% em 2020, chegando a 3,8% do PIB), além de forte um desempenho das exportações e da produção industrial.

“O risco político, que sempre é uma questão que assombra nossa visão do México, está inegavelmente presente em praticamente todos os países da região. Embora o Chile seja considerado para uma possível atualização, achamos que o mercado está em um bom patamar no país”, destacam. Assim, as recomendações para a América Latina são de overweight para o México, neutro em Brasil e Chile e underweight (exposição abaixo da média) para Peru, Colômbia e Argentina.

UBS

O UBS também não revisou especificamente as expectativas para o PIB, mas divulgou um relatório na semana passada destacando a piora no cenário econômico brasileiro. “Um sentimento geral de desânimo e pessimismo está pairando sobre o Brasil. Um ano após a pandemia começar a se espalhar no país, brasileiros estão vivendo a pior fase da crise de saúde”, dizem os analistas.

Na frente econômica, o banco afirma que o aumento da inflação e das expectativas levaram o Banco Central a iniciar um novo ciclo de aperto dos juros.

Na política, eles dizem que a incerteza de curto prazo foi reduzida após a aprovação no Congresso da PEC Emergencial e acreditam que novas reformas, como a Administrativa, estão em pauta e podem passar nos próximos meses. No longo prazo, porém, eles afirmam que o cenário é “turvo” após a decisão do Supremo Tribunal Federal que permitiu ao ex-presidente Lula disputar as eleições de 2022.

“Assim, os mercados podem não ver muitos bons motivos para estar otimistas com o Brasil, mas vale a pena notar que a maioria das más notícias já está embutida nos preços”, diz o relatório do UBS.

O banco afirma ainda que, apesar dos atrasos na vacinação, eles acreditam que o Brasil pode imunizar a maior parte, senão todos, os 160 milhões de adultos da população até o final de 2021 (veja mais).

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Priscila Yazbek

Editora de Finanças do InfoMoney.