O ano ainda não terminou, mas 2021 já ocupa lugar de destaque na galeria de proventos distribuídos pelas companhias abertas. Com um volume de quase R$ 200 bilhões anunciados até setembro, já é possível afirmar que o valor foi recorde, considerando dividendos e juros sobre capital próprio em termos nominais (sem descontar a inflação). O cálculo é da plataforma de informações financeiras Economatica.
Para se ter uma ideia, o montante acumulado em nove meses supera em 68% o resultado consolidado de 2020, de pouco mais de R$ 119 bilhões. Um ano antes, quando o mundo ainda não enfrentava a pandemia de coronavírus, os pagamentos totalizaram R$ 136,7 bilhões.
“Foi um ano completamente atípico, com resultados muito bons em determinados setores e algumas distribuições extraordinárias [de proventos], o que fez até mesmo companhias sem grande tradição no pagamento de dividendos se destacarem nesse quesito”, afirma Einar Rivero, gerente de relacionamento institucional e comercial da Economatica.
A pedido do InfoMoney, Rivero preparou uma lista das companhias que mais se destacaram neste ano em termos de proventos. Para tanto, o dividend yield, (taxa de retorno com a distribuição de dividendos), indicador mais utilizado pelo mercado para avaliar os melhores pagadores, foi usado como parâmetro.
O cálculo considerou dividendos e juros sobre capital informados pelas empresas à B3 ao longo de 2021, até novembro, versus os preços de fechamento das ações em 31 de dezembro do ano passado.
O levantamento levou em conta as ações que apresentaram uma condição mínima de negociação na Bolsa, com volume médio diário de pelo menos R$ 5 milhões. Também optou-se por eleger uma só ação para representar cada companhia, no caso das que possuem tanto papéis ordinários (ON) quanto preferenciais (PN) listados, usando novamente o critério de maior liquidez. Confira:
As melhores pagadoras de dividendos de 2021
Empresa (ação) | Dividend yield (%) |
Metalúrgica Gerdau PN (GOAU4) | 20,60% |
Unipar PNB (UNIP6) | 20,55% |
Vale (VALE3) | 16,74% |
Portobello (PTBL3) | 16,45% |
Copel PNB (CPLE6) | 16,04% |
JBS (JBSS3) | 12,75% |
Gerdau PN (GGBR4) | 12,56% |
Isa Cteep PN (TRPL4) | 12,28% |
Minerva (BEEF3) | 11,06% |
Marfrig (MRFG3) | 11,06% |
Fonte: Economatica
Obs: Levantamento feito com base nos dividendos e juros sobre capital próprio informados à B3 em 2021, entre janeiro e novembro, versus os preços de fechamento das ações em 31 de dezembro de 2020
Antes de entrar nos detalhes que ajudaram eleger as dez ações com maior retorno em proventos no ano, é preciso revisitar o conceito de dividend yield, que consiste em dividir o valor dos dividendos pagos por ação pelo preço do papel na Bolsa, e depois multiplicar por 100 (para visualizar o dado em percentual).
Dessa forma, momentos de mercado nos quais as cotações estão mais pressionadas – como se viu em grande parte de 2021 – fazem com que o percentual de retorno fique maior. Ao contrário, quando a ação se valoriza muito, a conta do rendimento apenas com dividendos fica menor.
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Tal ressalva é importante para entender que, ao longo deste ano, os dois itens da conta estiveram acentuados. De um lado, o principal índice da B3 (Ibovespa) tem apresentado forte volatilidade, com queda acumulada de 14,4% no ano até novembro. De outro, os balanços de algumas companhias trouxeram números atípicos, surpreendendo positivamente.
“Por conta de resultados mais fortes, temos empresas que historicamente não se destacavam pelo pagamento de dividendos, mas que entraram em cena neste ano”, diz José Francisco Cataldo Ferreira, superintendente da Ágora Investimentos.
Agora sim, confira os destaques:
Gerdau: exportações e construção civil
Apesar de pertencerem ao mesmo grupo, a metalúrgica Gerdau e a siderúrgica de mesmo nome são empresas distintas, com suas respectivas ações listadas na Bolsa. Juntas, respondem pelo principal destaque em termos de dividendos neste ano, considerando os números até novembro.
“Esperávamos resultados positivos da Gerdau no terceiro trimestre, mas a companhia conseguiu superar de longe nossas estimativas, com receitas 13% acima do esperado”, diz Gabriela Cortez Joubert, analista do Banco Inter. Segundo ela, a geração operacional de caixa medida pelo Ebitda chamou ainda mais a atenção: veio 34% maior do que o projetado.
Pedro Galdi, analista da Mirae Asset Corretora, afirma que a Gerdau se beneficiou do cenário nos Estados Unidos e aumentou as exportações. Além disso, destaca o reaquecimento do mercado de construção civil no Brasil, para a qual a companhia fornece aços longos.
Ambos os especialistas acreditam que 2022 também será positivo para o grupo em termos de remuneração ao acionista. “Seguimos vendo Gerdau como a melhor opção dentro do setor siderúrgico e deve continuar pagando dividendos interessantes”, diz Galdi.
Vale: só os dividendos comprariam a B3
A Vale distribuiu cerca de R$ 73 bilhões em proventos neste ano, até setembro – o maior volume já pago por uma empresa aberta em um único ano, conforme dados da Economatica. Para se ter uma ideia da magnitude, o montante daria para arrematar uma companhia como a B3, uma das 15 maiores do País, ao preço de mercado no fim de novembro.
Uma cifra que salta aos olhos, mas que tem origem em uma conjunção de fatores positivos, alguns deles atípicos. Em termos comparativos, em 2020, por exemplo, a mineradora pagou “apenas” R$ 18,7 bilhões em proventos.
“Neste ano, a Vale se beneficiou do preço do minério de ferro batendo recordes de alta, o que impulsionou sua geração de caixa”, diz Matheus Amaral, coordenador de equity research do Banco Inter. Em maio, a commodity chegou a ser cotada a US$ 230 a tonelada, patamar nunca visto na história.
Por ser uma grande exportadora, a empresa teve ainda a seu favor a forte alta do dólar frente ao real. A variação acumulada neste ano, até novembro, estava em 8%.
Mesmo beneficiada por fatores incomuns de mercado, os especialistas destacaram a eficiência operacional da mineradora. “A empresa tem uma gestão muito boa de custos, o que favorece o pagamento de proventos”, afirma Amaral.
Para Galdi, da Mirae, a Vale deve seguir apresentando bons resultados, não tão robustos quanto os de 2021, mas suficientes para distribuir novos dividendos de dois dígitos por ação.
Entre as elétricas, Copel e ISA CTEEP
O setor de energia elétrica, um dos mais lembrados quando o assunto é dividendos, tem como representantes no levantamento a Copel, estatal do Paraná, e a ISA CTEEP, transmissora que atua no mercado paulista.
O analista Ilan Arbetman, da Ativa Investimentos, ressalta que a Copel tem um histórico de bons pagamentos de proventos e, atualmente, está capitalizada para fazer novas distribuições – após o recebimento de R$ 1,4 bilhão de um pré-pagamento de dívida do Estado do Paraná e a conclusão da venda da Copel Telecom, por R$ 2,5 bilhões.
O especialista chama atenção também para dois eventos importantes ocorridos neste ano: a aprovação de uma nova política de dividendos, com o objetivo de dar “mais transparência e previsibilidade” no fluxo de pagamentos, segundo comunicado da empresa; e a migração para o Nível 2 de governança corporativa da B3.
“Temos boas expectativas de que a Copel irá pagar, em relação ao exercício de 2021 e durante boa parte de 2022, cerca de 67% do lucro líquido em proventos”, projeta Arbetman.
Em relação à ISA CTEEP, ele lembra que a companhia atua em São Paulo, mercado energético mais importante do país, e também tem grande tradição na distribuição de lucro aos acionistas. “Uma palavra que define a empresa é estabilidade”, diz o analista da Ativa. “Vemos uma disciplina financeira muito grande por parte da administração e as receitas são corrigidas anualmente pelo IPCA [índice oficial de inflação do país], o que é um diferencial importante”.
As novidades do ano: JBS, Minerva e Marfrig
Considerado a principal “novidade” na relação de bons pagadores de proventos neste ano, o setor frigorífico emplacou três companhias na lista das dez mais: JBS, Minerva e Marfrig.
“Em linhas gerais, as empresas do segmento tiveram resultados muito fortes, sobretudo no primeiro semestre”, diz Galdi, da Mirae. Segundo ele, as exportações para a China foram determinantes na virada do último ano e devem seguir sustentando os próximos demonstrativos financeiros.
“As vendas para a China tendem a minimizar o efeito de demanda menor por proteína no mercado doméstico”, afirma o analista. “Isso tem ocorrido pela conjuntura de forte queda na renda per capita do brasileiro, o que tem feito as pessoas substituírem proteína bovina por frango e salsicha, por exemplo”.
Tendo como foco apenas os proventos futuros, sem projetar o desempenho das ações, Galdi afirma que o horizonte para as três companhias segue positivo.
Unipar e Portobello, as ações de menor liquidez
Duas companhias que figuram entre as cinco com maiores dividend yields neste ano, Unipar Carbocloro e Portobello têm como característica comum uma liquidez menor que as demais integrantes da lista. Ambas não fazem parte, por exemplo, do índice IBrX 100, que reúne as 100 ações mais negociadas na B3.
Com atuação no segmento químico e petroquímico, a Unipar divulgou quatro comunicados sobre proventos neste ano, até novembro. A relação inclui dividendos complementares, intercalares (relativos ao primeiro semestre), extraordinários e até mesmo a antecipação de pagamentos relativos ao fechamento do ano.
No caso da Portobello, um dos maiores grupos do setor cerâmico do país, houve um aviso de pagamento aos acionistas em abril e outros três comunicados ao longo de 2021, estes relativos à antecipação de dividendos.
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Por se tratarem de empresas com papéis menos líquidos na Bolsa, o acompanhamento por parte das corretoras é reduzido, o que traz pouca visibilidade em termos de análise para 2022. O histórico dos últimos quatro anos, no entanto, revela que as ações preferencias classe B (PNBs) da Unipar têm uma mediana de dividend yield na casa de 10% ao ano, conforme cálculos da Economatica. No caso da Portobello, que só possui ações ordinárias (ONs), a mediana ficou pouco acima de 3% ao ano.
O que esperar para 2022?
Em termos de conjuntura econômica, o próximo ano deve ser mais complicado do que 2021, na opinião de diversos especialistas. “E também por ser um ano de eleições, o cenário deve ficar ainda mais turbulento no segundo semestre, com muita volatilidade na Bolsa”, afirma Cataldo, da Ágora.
O especialista lembra que o mercado já está precificando um cenário de economia crescendo pouco, inflação ainda alta e juros elevados em 2022.
Nesse ambiente, diz ele, a tendência na composição dos portfólios de ações é reduzir as apostas em empresas de crescimento e preferir os grandes grupos, já consolidados – o que favorece a estratégia de dividendos. “É um ano [2022] muito interessante para isso, pois são empresas mais resilientes”.
Apesar do ambiente hostil, o investidor que souber selecionar bem as companhias de dividendos pode ter uma oportunidade ímpar pela frente, afirma Amaral, do Banco Inter. Ele explica que, do lado dos resultados das empresas, espera uma retomada da lucratividade para níveis pré-pandemia em diversos setores. “E como o mercado descontou bem as ações, existe uma oportunidade de yield interessante, que não havia, por exemplo, no primeiro semestre de 2021”.
Segundo Amaral, em um mercado que demanda alta seletividade, torna-se ainda mais importante analisar o histórico de pagamento aos acionistas, nível de maturidade e capacidade de geração de caixa das empresas. “Isso vale para qualquer cenário, mas na estratégia de dividendos pesa ainda mais”.
Ela pondera ainda que o investimento com foco em dividendos enfrentará forte concorrência da renda fixa em 2022, sobretudo com o mercado sinalizando uma taxa básica de juros (Selic) de dois dígitos no primeiro trimestre.
Tal realidade reforça a importância de evitar empresas com dívida líquida muito elevada frente à geração de caixa – muito alavancadas, na linguagem financeira –, lembra Pedro Serra, gerente de research da Ativa. “Isso porque a alta dos juros pode afetar a capacidade dessas empresas distribuírem proventos.”
E a reforma do Imposto de Renda?
Outro assunto a ser monitorado, ainda que de longe, é a reforma tributária. O projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados prevê que os dividendos (hoje isentos de Imposto de Renda) sejam taxados em 15% e que as distribuições de proventos via juros sobre capital próprio sejam extintas.
O assunto ainda precisa passar pelo Senado e pela Presidência da República, mas a discussão agitou o universo dos dividendos neste ano, fazendo com que algumas empresas antecipassem pagamentos. Por ora, no entanto, a questão não figura do radar dos especialistas.
“O mercado não tem falado mais disso. Existem muitas coisas para serem aprovadas e creio que não aconteceria [andamento da reforma] no curto prazo”, diz Cataldo, da Ágora. “No início de 2022, a pautas devem ainda ser muito políticas”.
Serra, da Ativa, tem opinião semelhante. “Trabalhamos com um cenário base de que não haverá nenhum avanço nesse sentido. Acho difícil, diante do ambiente de eleição, capitalização da Eletrobras e outras questões que devem ocupar o governo.”