Tesouro Direto: se juros subiram, por que rendimento dos títulos públicos chegou a cair 9% no 1º semestre?

Papel atrelado à inflação com vencimento em 2045 foi o que mais desvalorizou entre janeiro e junho

Mariana Segala

(Shutterstock)
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Os investidores de renda fixa viveram um primeiro semestre de fortes emoções. O período entre janeiro e junho foi marcado por sucessivas elevações dos juros. A Selic – taxa básica da economia – virou o ano aos 9,25% e desde então, escalou mais quatro pontos percentuais. No mês passado, quando foi realizada última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, alcançou 13,25% ao ano.

De um lado, quem tem dinheiro sobrando para fazer novas aplicações comemora as taxas elevadas – que já asseguram um rendimento mensal líquido de Imposto de Renda de 1% ao mês, dependendo do investimento. Mas quem olha só de vez em quando os extratos do Tesouro Direto pode ter tomado um susto.

No primeiro semestre, boa parte dos títulos públicos disponíveis no Tesouro Direto desvalorizaram. O caso mais extremo foi do Tesouro IPCA + com vencimento em 2045. O papel oferece uma taxa de juros, que era de 5,89% ao ano nesta quinta-feira (30), mais a variação da inflação. Entre janeiro e junho, seu valor recuou 9,67%.

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Não foi o único título que perdeu valor. O chamado preço unitário do Tesouro IPCA + com vencimento em 2055, que faz pagamentos de juros semestrais, também recuou 2,27%, assim como o Tesouro IPCA + 2035, que caiu 2,21%.

Confira na tabela o desempenho dos títulos públicos negociados no Tesouro Direto no mês, no semestre e nos últimos 12 meses:

Título Vencimento Rentabilidade em 30 dias (%) Rentabilidade no 1º semestre 2022 (%) Rentabilidade em 12 meses (%)
Tesouro Prefixado 01/01/2025 -0,86 -0,2 -3,09
Tesouro Prefixado 01/01/2029 -3,87
Tesouro Selic 01/03/2025 1,09 5,58 9,34
Tesouro Selic 01/03/2027 1,11 5,97 9,7
Tesouro IPCA+ 15/08/2026 -0,39 4,85 6,59
Tesouro IPCA+ 15/05/2035 -2,81 -2,21 -7,82
Tesouro IPCA+ 15/05/2045 -5,69 -9,67 -23,1
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais 15/08/2032 -1,13
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais 15/08/2040 -2,73 0,16 -3,31
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais 15/05/2055 -3,5 -2,27 -8,47

Fonte: Tesouro Direto. Considera a posição em 30/06/2022. Alguns papéis começaram a ser negociados ao longo do semestre e, portanto, não possuem histórico de 6 ou 12 meses.

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A explicação para o movimento está na marcação a mercado. Quem compra um título neste dia e o mantêm na carteira até o vencimento receberá exatamente a remuneração prometida inicialmente. Porém, isso não significa que o valor do papel permaneça inalterado o tempo todo. O preço se movimenta, sim, e não é pouco.

Durante a existência de um título público, seu preço é marcado a mercado diariamente. Significa que seu valor é atualizado, dependendo das condições atuais de negociação, incluindo a oferta e a demanda dos investidores.

Um dos elementos que mexem com os preços dos títulos públicos são as taxas de juros. Na prática, os papéis prefixados e os atrelados à inflação – especialmente os de longo prazo, que são mais sensíveis às variações – costumam desvalorizar quando as taxas de juros estão em tendência de alta. O contrário também é verdadeiro: os preços dos papéis normalmente sobem quando as taxas de juros caem. Por isso, até o vencimento, eles podem apresentar rentabilidade negativa em alguns momentos.

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O Tesouro IPCA + 2045, por exemplo, custava R$ 1.147,62 no dia 3 de janeiro, primeiro dia útil de 2022, quando oferecia uma remuneração de 5,25% ao ano aos investidores. Nesta quinta-feira, seu preço era bem menor: R$ 1.081,51. Em contrapartida, a taxa de juros que pagava para novos investidores era mais alta, de 5,89% ao ano.

Se, por alguma razão, o investidor precisasse de dinheiro hoje e decidisse vender seu Tesouro IPCA+ 2045, acabaria tendo um prejuízo. Mas nada sofreria se mantivesse os papéis consigo até o vencimento, quando receberia a remuneração contratada no momento do investimento.

A volatilidade dos preços dos títulos públicos tende a se manter nos próximos tempos. Em relatório, Ricardo Peretti, estrategista de pessoa física do Santander, indica que o primeiro semestre terminou com uma perspectiva mais negativa do que aparentava seis meses antes e diferentes fatores devem pesar de maneira distinta sobre os papéis no Tesouro Direto.

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No front global, a economia dos Estados Unidos sofrendo com alta inflação e dando sinais de desaquecimento deixa no mercado um ar “de que o resto do mundo também irá sucumbir”. No cenário doméstico, no entanto, dado que o BC foi um dos primeiros a iniciar o ciclo de aperto monetário, alguns indicadores econômicos já sugerem melhora. O índice de preços IPCA-15, por exemplo, divulgado em junho, veio em linha com as expectativas do mercado, avançando 0,69% na comparação mensal. “Embora acima do patamar de maio (0,59%), houve redução no acumulado dos últimos 12 meses, o que pode indicar que o pico da inflação já tenha ocorrido”, afirma.

“Se, por um lado, a indicação de que a trajetória da inflação local é declinante poderia trazer algum alívio, por outro lado, dúvidas quanto ao ritmo de subida de juros nos EUA e o consequente risco de recessão por lá devem manter ativos de países emergentes, como o Brasil, ainda sob pressão”, afirma.

Na visão de Peretti, é importante que o investidor mantenha um posicionamento que o proteja da inflação ainda elevada. “A sugestão continua sendo de alocação no Tesouro IPCA+ que apresenta a duration [prazo até o vencimento] relativamente mais curta, optando pelo vencimento de 2026, onde vemos a assimetria mais positiva entre risco e retorno, diante das incertezas fiscais”, afirma.

Mariana Segala

Editora de Investimentos do InfoMoney