PDT lança oficialmente Ciro Gomes como candidato à presidência; vice segue indefinido

Na quarta vez em que concorre ao Palácio do Planalto, Ciro Gomes tenta se vender como alternativa à polarização entre Lula e Bolsonaro

Marcos Mortari

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O PDT aprovou, nesta quarta-feira (20), a candidatura de Ciro Gomes à Presidência da República. A decisão foi tomada, por aclamação, em convenção nacional realizada na sede da sigla, em Brasília. No evento, também foram delegados poderes para a Executiva Nacional do partido definir a escolha do vice na chapa e as coligações.

Esta é a quarta vez em que Ciro Gomes disputa o cargo no Palácio do Planalto. Agora, ele tenta se vender ao eleitorado como uma alternativa à polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Conheça mais sobre a trajetória de Ciro Gomes clicando aqui.

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O evento, realizado de forma híbrida na sede do PDT, em Brasília, marca a estreia da temporada de convenções partidárias entre os presidenciáveis.

Pelo calendário da Justiça Eleitoral, os partidos têm entre 20 de julho e 5 de agosto para realizar as reuniões que definirão coligações e a escolha candidaturas à presidência, aos governos e aos cargos de deputado federal, estadual e distrital. Depois, as siglas têm até 15 de agosto para solicitar os registros de candidatura junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O PT é o próximo partido com presidenciável a realizar sua convenção, em São Paulo, com a formalização da candidatura de Lula na quinta-feira (21). A convenção do PL, de Bolsonaro, está marcada para domingo (24), no Rio de Janeiro. Já o MDB pretende lançar o nome da senadora Simone Tebet (MS) em 27 de julho. Confira a lista completa clicando aqui.

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No discurso após a homologação de sua candidatura ao Palácio do Planalto, Ciro chamou atenção para dois déficits vividos pelo Brasil no atual momento: um financeiro e outro social. “No ciclo vicioso da incompetência, do oportunismo e da bandidagem, tenta-se sempre corrigir um agravando o outro. Sem falar do agravamento do déficit moral, que contamina historicamente as nossas relações políticas. Somos vítimas, mais do que nunca, da falta de vergonha, do roubo e da exploração da pobreza, dosados pela insensibilidade e mediocridade de uma classe dirigente inescrupulosa e incapaz”, disse.

O primeiro presidenciável a ter sua candidatura formalizada criticou a polarização mantida entre Lula e Bolsonaro e não economizou ataques aos dois adversários. Sobre Bolsonaro, disse que “nunca o Brasil teve um presidente tão insensível e incompetente” e o classificou como “grande preguiçoso”.

“Nunca o Brasil empobreceu tanto e tão rápido material e espiritualmente como nos últimos anos. Por isso, o compromisso que assumo perante o meu partido (…) e principalmente com o povo brasileiro (…) é lutar contra essa realidade cruel para vencermos juntos essa batalha de vida ou morte para a maioria do povo trabalhador do país”, afirmou.

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“Todos estamos a ver diariamente um festival de mentiras, agressões, desmandos e manipulações de toda a espécie. Assistimos, nesta semana, ao mais horrendo espetáculo de apologia à ditadura e de vexame internacional já feito por um presidente em toda a nossa história – e talvez, acredito, na história do mundo moderno e civilizado. Vocês viram: o presidente chama os embaixadores das potências e nações estrangeiras para esculhambar o nosso país e degradar nossas instituições, que a ele cabe o juramento constitucional velar, proteger e fazer respeitar”, pontuou.

Ciro acusa Bolsonaro de ter cometido um genocídio durante a gestão da pandemia de Covid-19 no Brasil e afirma que o mandatário agora comete “estelionato eleitoral” com a aprovação de medidas como a PEC dos Auxílios – apelidada de “PEC Kamikaze”, que cria programas sociais e amplia benefícios existentes a menos de três meses do pleito – na tentativa de conquistar mais um mandato.

No discurso, Ciro se comprometeu a extinguir o instrumento da reeleição, assim como o chamado “orçamento secreto”, que permite a distribuição de recursos com destinação indicada por parlamentares, sem respeito aos princípios de proporcionalidade, impessoalidade e transparência.

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“Para isso (ser reeleito), [Bolsonaro] usa , de um lado, a mão pesada da repressão e da ameaça. De outro, a mão ágil do estelionato eleitoral. A mão pesada de autocrata é a que cria mentiras sobre a segurança das urnas e insinua intervenção armada contra o nosso povo. A mão ágil de larápio é a que moldou a famigerada PEC Kamikaze, o maior estelionato eleitoral de toda a nossa história. Essa mesma mão já havia costurado acordos com parte do Congresso e construído juntos um bunker de obscuras transações – o famigerado orçamento secreto, que vai acabar no primeiro dia do meu governo”, disse.

“E as duas mãos já haviam cooptado setores das Forças Armadas, atraídos vergonhosamente por benesses e mordomias que não dignificam o uniforme de Duque de Caxias. Mas todo esse esforço será em vão, pois as benesses fugazes serão engolidas pelo abismo da imensa miséria que toma conta do país e humilha nosso povo”, continuou.

Já em relação a Lula, Ciro fez associação a malfeitos de corrupção e à manutenção do que chamou de “modelo mal acabado de neoliberalismo tropical”. E ainda fez referência à reaproximação do petista com o MDB em busca de uma aliança nos estados 6 anos após o impeachment de Dilma Rousseff (PT).

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“Vendo a fotografia dos acordos, dos conchavos, da falta de escrúpulo com que chamam o povo brasileiro para lutar contra o golpe, para no dia seguinte estarem abraçados e beijando na boca com toda a intimidade aqueles que promoveram o golpe”, criticou.

Para Ciro, “Bolsonaro tem imensa culpa sobre tudo que está acontecendo”, mas ele teria sido produzido pelo próprio “lulopetismo”. Na avaliação do pedetista, o atual presidente seria cria de “um modelo econômico e de uma escola corrupta de governar que encaminharam o país com pouquíssimos altos e muitíssimos baixos para uma tragédia anunciada”.

“Esse modelo foi tão enganador e improvisado que aos poucos foi descontentando a todos e alimentando frustrações e ressentimentos em amplos bolsões das várias camadas sociais que repartem a nação brasileira”, declarou.

Ciro associa o modelo econômico citado a o que ele chama de uma elite “neocolonizada e neoescravista”, que teria, ao mesmo tempo, menosprezado os pobres com políticas sociais compensatórias e produzido privilégio a banqueiros em detrimento da classe trabalhadora.

“Seu modelo social é o ‘pobrismo’, que significa, entre outras coisas, procurar pacificar e contentar os pobres com migalhas e transferir o centro da verdadeira riqueza para os ricos brasileiros. Em um banquete dos ricos e restos para os pobres, Collor preparou a cozinha, Fernando Henrique serviu a mesa e Lula temperou a comida. Dilma, Temer e Bolsonaro apenas requentaram o prato. Todos, absolutamente todos, serviçais dos mesmos patrões e seguidores da mesma receita”, disse.

“Todos os presidentes mantiveram o infame tripé macroeconômico e sua tóxica política de juros, seja por inércia, por incompetência ou por mera submissão ao grande capital nacional e internacional. A pretexto de conter a inflação, estão fazendo de novo. Mantiveram uma das taxas de juros mais altas do mundo ao longo desses últimos 26 anos. A pretexto de melhorar a arrecadação e a eficiência do Estado, montaram um dos sistemas tributários mais burros e injustos do planeta Terra, onde o pobre paga muito mais que o rico e quem produz paga muito mais do que quem especula”, continuou.

“Será que acham que os 14 anos foram pouco tempo? Para comparar, eu gosto de lembrar que em menos tempo Napoleão Bonaparte redesenhou toda a Europa e Alexandre, o Grande agigantou o mundo grego. Mas para não ir tão longe, vejam a obra de Getúlio ou vejam a obra de Juscelino. E o que o lulismo conseguiu foi parir Bolsonaro. Que obra monumental!”, ironizou.

Ao criticar a polarização mantida por Lula e Bolsonaro, Ciro diz que os dois candidatos esvaziam o debate de ideias e soluções para o Brasil, e transformam a disputa eleitoral em um confronto “personalista” e “odiento”.

“Essa postura de Bolsonaro e de Lula não é apenas uma zombaria com o destino do povo brasileiro, como também uma seríssima ameaça de que o caos possa tomar conta do país”, afirmou.

“Os dois estão causando um mal terrível à política brasileira, e estimulando seus seguidores a criar e estimular duas versões maniqueístas e doentias – na política, isso é trágico! – do bem absoluto e do mal absoluto. Por isso que estão se matando pessoas inocentes pelo Brasil afora. É o nós contra eles em versão mista de farsa e de tragédia. Pelos seus erros, Lula parece ter saído da prisão para aprisionar o Brasil em uma camisa de força. Por sua péssima índole, Bolsonaro, que chegou ao poder pelo voto, quer usar o voto para destruir as eleições e a própria democracia”, criticou.

Ideias para governar

Ciro propõe uma mudança no atual modelo econômico, que alega se manter nas últimas três décadas, passando por uma nova política de juros que concilie combate à inflação e geração de emprego, uma reforma tributária progressiva, com a introdução de imposto sobre grandes fortunas e taxação de lucros e dividendos, mudanças na relação com o meio ambiente na busca da preservação e uso de energias alternativas, além do que ele chamou de “revolução na educação”.

“Nosso projeto, o Projeto Nacional de Desenvolvimento, baseia-se na livre iniciativa, no livre mercado e na democracia, mas tem uma convicção de que o Brasil não conseguirá jamais sair da crise profunda em que se encontra se não tiver um Estado vigoroso, indutor de crescimento econômico e promotor da justiça social. Um Estado capaz de estimular a formação de uma forte poupança nacional, de desenvolver novas tecnologias e, muito especialmente, capacitar nosso povo com uma educação moderna emancipadora”, sustentou.

O candidato pedetista prometeu acabar com a política de preços para combustíveis praticado pela Petrobras, com base na paridade em relação aos valores no mercado internacional e a cotação do dólar, e quer transformar a companhia “na maior empresa de energia limpa do mundo” e longe da possibilidade de uma privatização.

Ele também prometeu revogar o teto de gastos, que chamou de “uma das medidas mais arbitrárias e elitistas já tomadas” por “cortar apenas os investimentos na vida do povo e deixar completamente livres os juros pagos aos banqueiros”. E disse que fará uma renegociação de dívidas de estados e municípios. Mas garantiu que seu Projeto de Desenvolvimento Nacional manteria um equilíbrio nas contas públicas.

Do lado dos programas sociais, Ciro pretende incorporar ideias do programa de renda mínima defendido pelo vereador Eduardo Suplicy (PT-SP). O plano do presidenciável seria englobar pagamentos feitos pelo Auxílio Brasil, seguro-desemprego, aposentadoria rural do Benefício de Prestação Continuada. Ele também retomou sua promessa antiga de ajudar brasileiros endividados na renegociação de suas dívidas.

“Vou ajudar a resolver o endividamento de 66 milhões de brasileiros e brasileiras que estão com o nome sujo no SPF e no Serasa, renegociando suas dívidas com abatimento grande e parcelamento a juros baixos. O consumo das famílias responde por 60% do PIB brasileiro. Se elas estão sem crédito, sem renda ou sem emprego, é absolutamente impossível retomar o desenvolvimento, reativar a economia brasileira”, justificou.

Dificuldades da campanha

O anúncio da candidatura de Ciro Gomes afasta a possibilidade de desistência do pedetista da corrida presidencial, em meio às investidas da campanha de Lula por apoio do PDT já no primeiro turno. Mas isso não impede que lideranças do partido em alguns estados optem por fazer campanha para o petista na prática.

O evento também não esconde as dificuldades enfrentadas pela campanha de Ciro, que ainda não conseguiu costurar alianças de impacto, enfrenta problemas para construir palanques nos estados e ainda tem pendente a escolha do vice, que deve ser anunciada mais próximo do final do período das convenções partidárias, em 5 de agosto.

Normalmente, as candidaturas buscam nomes fora de seus partidos para a posição, como forma de atrair siglas para a chapa e agregar estrutura de campanha e tempo de rádio e televisão. Mas, diante da dificuldade de expandir a campanha, é possível que o PDT saia com o que se costuma chamar de chapa “puro sangue”, com a vice ocupada por outro pedetista.

Até o momento, nos estados, Ciro tem palanques competitivos apenas no Maranhão, com o senador Weverton Rocha (PDT), que disputa o governo estadual; e no Ceará, com o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio, que tenta o comando do Poder Executivo estadual.

Nos dois casos, no entanto, há riscos de divisão de espaço com outro presidenciável ao longo da campanha – o senador Weverton, por exemplo, já anunciou apoio a Lula. Muitas vezes, o desempenho nas pesquisas eleitorais é fator importante na garantia ou não de fidelidade nas alianças seladas.

Leia também: Lula e Bolsonaro concentram melhores palanques nos Estados, mas enfrentam dificuldades para acomodar aliados e unificar estruturas

Considerando os principais levantamentos das últimas quatro semanas para a disputa ao Palácio do Planalto, Ciro Gomes tem algo entre 6% (PoderData, 20/07) e 8% (BTG/FSB, 27/07). Uma distância que varia de 20 a 25 pontos percentuais em relação ao segundo colocado, o presidente Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição.

Perfil

Advogado de formação, Ciro Gomes vem de uma família com longa tradição na política cearense. Ele foi deputado estadual por dois mandatos, prefeito de Fortaleza (CE), governador do Ceará e deputado federal.

Também atuou como ministro da Fazenda no governo de Itamar Franco e da Integração Nacional no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – um de seus adversários na disputa pelo Palácio do Planalto neste ano – e deputado federal.

Conhecido pelo temperamento forte, ele integrou diversos partidos, da direita à esquerda em sua trajetória política. Começou no PDS (hoje PP), legenda nascida da Arena do regime militar, mas logo migrou para o PMDB.

Depois, foi para o PSDB, onde se tornou uma liderança importante, colhendo os frutos da aliança com o hoje senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). Posteriormente, passou pelo PPS (hoje Cidadania), PSB e PROS antes de embarcar no PDT, sigla pela qual disputou as últimas eleições presidenciais.

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Esta será a quarta eleição presidencial que Ciro Gomes disputa. A primeira foi em 1998, pelo PPS (atual Cidadania), em coligação com o PL e o PAN, quando obteve 7.426.187 votos, o que correspondeu a 10,97% dos votos válidos na ocasião.

Quatro anos depois, também pelo PPS, desta vez coligado ao PDT e ao PTB, obteve 10.170.882 de votos (ou 11,97% dos votos válidos), quando terminou na quarta colocação da corrida ao Palácio do Planalto.

A terceira tentativa ocorreu na eleição de 2018, agora pelo PDT, com coligação com o Avante. Naquela ocasião, Ciro terminou na terceira colocação, com 13.344.371 votos (ou 12,47% dos votos válidos).

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.