Memória inflacionária dificulta trabalho do BC, diz diretor de Política Monetária

Bruno Serra alertou que ainda não dá para dizer que a inflação está se revertendo nem globalmente e nem no Brasil

Estadão Conteúdo

O diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra (Raphael Ribeiro/BCB)
O diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra (Raphael Ribeiro/BCB)

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O diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra, repetiu nesta terça-feira, 6, que a “memória inflacionária” brasileira dificulta o trabalho da autoridade monetária, ainda que a inflação corrente esteja relacionada a fatores globais. “Precisamos reagir rápido e de forma contundente. O BC surpreendeu o mercado com um ciclo de alta mais longo e até mais duro ao longo de todo 2021. Mas o ser humano é ansioso, naturalmente, e os economistas mais ansiosos que a média. Mas a defasagem de política monetária é bastante longa, de forma incômoda, em torno de seis trimestres. Para quem está no dia a dia, é um tempo bastante incômodo”, afirmou, em evento virtual organizado pela Bradesco Asset Management.

Serra alertou que ainda não dá para dizer que a inflação está se revertendo nem globalmente e nem no Brasil. “Vimos uma inflação mais baixa este mês, com medidas do governo que ajudaram a cair os preços de bens essenciais. E há sinais de descompressão lá fora que não se mostraram em todos os lugares. Então eu diria que o processo ainda está bem incipiente”, completou.

Ele avaliou que há um risco elevado de fortalecimento do dólar, com um risco grande de que a China poderá crescer menos ainda do que o esperado. “Um risco bem sério, que pode gerar problema por meia década, é o Fed [Federal Reserve, o banco central norte-americano] e os BCs desenvolvidos tirarem o pé mais cedo do que seria o caso, repetindo a década de 70. Não acho que isso vai acontecer, está todo mundo atento a isso, para não cometer mesmo erro do passado. Mas tenho um pouco de receio, embora seja um risco menos provável que os outros mencionados, porque a resultante é muito grave”, afirmou.

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Ciclo e precificação

O diretor de Política Monetária do Banco Central avaliou que o ciclo de aperto monetário global ainda está mais perto do início do processo, diferentemente do Brasil, que começou mais cedo a aumentar os juros. “O mercado começa a precificar queda de juros em países mais avançados no ciclo”, comentou.

Serra lembrou que é esperado o aperto das condições monetárias leve à desaceleração da atividade econômica em diversos países. “Isso começa a acontecer. O processo está no início, mas começa a dar algumas sinalizações mais clara de desaceleração global. Mas há um problema em vários países, que é o mercado de trabalho muito apertado”, alertou.

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Segundo o diretor, mesmo com esse mercado de trabalho “apertado” nos Estados Unidos, os salários não subiram em termos reais. “Pelo contrário, os salários reais caíram razoavelmente. Um caminho é desacelerar a economia rápido para descomprimir o mercado de trabalho, ou os salários vão subir e compensar essa queda. Esse fenômeno é bastante perigoso para o gestor da política monetária”, completou.

Commodities

Bruno Serra disse também que já há um arrefecimento da demanda por bens e commodities, embora ainda haja um longo caminho para a normalização. “Começamos a ver alguns sinais de arrefecimento da demanda por bens, os preços de commodities começam a reverter o cenário de alta e começa a haver uma normalização das cadeias de produção. Esse choque de demanda, esse excesso, começa a ser normalizar um pouco. Vai ser um processo longo, tem sido bem mais longo que o esperado, mas ele começa a acontecer”, afirmou.

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Ele repetiu que o Brasil e a América Latina têm um histórico mais desafiador para combater à inflação, o que levou a uma reação mais rápida das autoridade monetárias na região. “Os BCs que estão em regiões com inércia mais elevada tiveram que reagir mais cedo. O Brasil foi o primeiro a reagir, mas todos tiveram que reagir, inclusive os desenvolvidos”, completou.

Atividade

O diretor de Política Monetária do Banco Central repetiu que o Brasil é uma exceção com revisões de crescimento para cima enquanto as projeções para a economia mundial têm sido revistas para baixo. “Somos uma exceção não porque estamos descorrelacionados totalmente do ciclo global. Havia talvez um excesso de pessimismo, ou uma ansiedade de que a defasagem da política monetária fosse mais curta do que de fato é. As projeções do começo do ano estavam pessimistas demais, cautelosas demais. Os investimentos estão indo bem, mas estamos no ciclo global, se o ciclo virar, ele vai nos impactar e nos atrapalhar”, avaliou.

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Serra reiterou que o cenário não é “muito auspicioso” para PIB global, com uma desaceleração necessária nos Estados Unidos. “Essa desaceleração tem que ser rápida, para abrir o gap do mercado de trabalho nos EUA. Se não for, o mercado de trabalho vai acabar acelerando os salários e pegar em serviços, enraizando mais a inflação e aumento o custo de desinflacionar. Como o FED sabe disso, a tendência é fazer o trabalho duro o mais rápido possível”, disse.

Ao mesmo tempo, o diretor do BC citou o problema grave de energia na Europa.

E completou: “É difícil não imaginar a Europa entrando em recessão nos próximos trimestres. E o cenário da China é o pior dos últimos 20 anos com certeza. O mercado imobiliário na China tem claro excesso em relação ao PIB e essa reversão vai puxar a economia chinesa para baixo. A projeções de PIB na China estão por volta de 4% e acho que agora é daí para baixo.”