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Se a notícia que há problemas contábeis nas demonstrações de resultados da Americanas (AMER3) está tirando o sono de alguns investidores desde quarta-feira (11), outros teriam lucrado com o forte desempenho negativo dos papéis na sessão da véspera, quando caíram cerca de 80%.
Ao menos é o que sugerem especialistas que, desde a divulgação da inconsistência de R$ 20 bilhões nos números da companhia, vêm indicando que o número de shorts, ou operações que apostam na queda das ações, envolvendo os papéis da varejista estava em patamares elevados.
O problema, porém, é que essa movimentação aumenta a possibilidade de ter existido um insider trading (operação com informação privilegiada), ou mais de um, que se beneficiou das declarações da varejista e da saída do agora ex-CEO Sergio Rial – o que configuraria algo ilegal.
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Antes do fechamento do pregão de quarta-feira, e pouco antes da divulgação do fato relevante da Americanas, duas operações envolvendo opções de venda das ações da Americanas e uma de envolvendo opções de compra chamaram a atenção do mercado.
“Há indícios de irregularidade. As opções saíram no final do pregão, às 17h35 (horário de Brasília). Alguém operou muitas puts [opções de venda]”, explica Pedro Menin, sócio-fundador da Quantzed.
De acordo com ele, a movimentação é anormal primeiro, pelo fato de as opções da Americanas usualmente não serem tão negociadas – com o volume de negociações realizado na quarta fugindo consideravelmente da média.
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Como agravantes, surgem ainda o horário da movimentação e a sua proximidade com a publicação do fato relevante na qual há a revelação das “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões.
“Não dá para cravar que é insider, quem será responsável por isso será a CVM perante denúncia, mas há grandes indícios”, debate Menin.
No total, de acordo com os especialistas, as três movimentações realizadas um pouco antes da divulgação do fato relevante foram feitas em uma mesma corretora: foram compradas três milhões de opções de venda com strike [preço de exercício] em R$ 11, vendidas três milhões de opções de venda com strike em R$ 9 e vendidas três milhões de opções de compra a R$ 13.
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“Parece que foi uma operação fence, então, nesse caso, o lucro pode ter ficado em R$ 5 milhões”, diz Menin, levando em conta o fechamento de ontem. “É difícil afirmar se foi isso, de fato. Se foi um put spread, o lucro vai além e pode chegar a R$ 40 milhões”, dizem os especialistas da Quantzed. Na véspera, algumas puts chegaram a disparar mais de 1.000% em uma sessão de derrocada para os papéis AMER3.
Fence é uma estrutura utilizada como proteção para o investidor que já possui um ativo ou que deseja comprá-lo com proteção. É colocada uma opção de venda próxima ao preço do ativo e uma com strike inferior, o que protege o intervalo. Por fim, há uma opção de compra além do preço da ação, que limita, porém, também os ganhos. No put spread, há apenas uma trava de baixa, com a compra de duas puts com diferentes targets – o que também fornece proteção.
Um levantamento da TC Economatica vai na mesma linha, destacando o grande número de ações alugadas da Americanas e acima do setor, indicando um posicionamento de investidores apostando na queda das ações às vésperas da divulgação do fato relevante. O número de ações alugadas bateu 75 milhões, subindo consideravelmente desde setembro.
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Confira no gráfico abaixo:
“O que explica o short [posição vendida, em que se aposta na queda da ação] ter subido tanto dias antes da divulgação do fato relevante? Em torno de 20 vezes mais que o setor de consumo cíclico? Enquanto isso, Magazine Luiza (MGLU3) e Via (VIIA3) tiveram uma queda no short no mesmo período. Alguém sabia de algo que o resto do mercado não sabia?”, avalia Felipe Pontes, diretor operacional da Economatica.
Por fim, há o fato de que os diretores da própria empresa vinham vendendo, de forma constante, ações da companhia há alguns meses. Ainda de acordo com a Quantzed, foram mais de R$ 200 milhões em operações deste tipo desde o segundo semestre do ano passado.
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Procurada, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) afirmou que investigações sobre possíveis insider trading não são divulgadas ao público. Já a assessoria da Americanas preferiu não se manifestar sobre o caso.
Cabe destacar que, na quinta, a CVM abriu novo processo administrativo – o terceiro – para apurar as condutas relacionadas à falha contábil. O processo tem número 19957.000425/2023-42, mas não pode ser visualizado no site da reguladora do mercado de capitais brasileiro, o que significa que corre em sigilo.
A autarquia já havia iniciado na quinta, mais cedo, um processo de número 19957.000413/2023-18, que se refere à análise de informações contábeis. O outro, de número 19957.000415/2023-15, se refere a notícias, fatos relevantes e comunicados.
Em caso de suspeita de insider trading, caberá à autarquia apurar se a negociação dos derivativos foi feita por pessoas que souberam das inconsistências contábeis no balanço antes; a CVM pode solicitar às corretoras e bancos que forneçam os dados do cliente que fez a operação e sua possível relação com executivos e funcionários da varejista.
Saiba mais:
1) O que é uma opção?
A opção é um derivativo negociado na Bolsa de Valores. E como qualquer derivativo, seu preço “deriva” da oscilação do ativo ao qual ela se lastreia. No caso de uma opção de ação, o contrato varia de acordo com as oscilações desta ação na Bovespa – confira a ferramenta de cotações de opções de ações do InfoMoney.
Quem compra uma opção está adquirindo o “direito” de comprar ou vender alguma ação; já quem vende a opção tem a obrigação de atender a exigência daquele que comprou o contrato. Ou seja: se você vendeu uma opção de compra e essa opção for exercida, você terá que vender essa ação ao detentor da opção pelo preço estabelecido; se você vendeu uma opção de venda e ela for exercida, você terá que comprar esta ação ao preço estabelecido.
2) O que é uma opção de compra? E uma opção de venda?
Existem dois tipos de opções: de compra (call) e de venda (put). Quando um investidor compra uma “call”, ele está adquirindo o direito de comprar uma determinada ação a um preço já estabelecido (que é preço de exercício, ou “strike”) até um dia de vencimento já firmado. Para o investidor que compra uma “put”, ele está adquirindo o direito de vender uma ação até um dia determinado a um valor já estabelecido.
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