Analistas dizem que BC buscou equilíbrio entre o comunicado duro e a visão do esforço fiscal do governo

Especialistas afirmam que BC foi firme ao apontar os riscos de a desancoragem continuar, mas que manteve ponte de diálogo aberta

Roberto de Lira

Logo do Banco Central na fachada da sede (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Logo do Banco Central na fachada da sede (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

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O Banco Central optou por uma linha de equilíbrio na Ata do Copom divulgada na manhã desta terça-feira (7), quando detalhou as discussões do Comitê de Política Monetária da semana passada – que decidiu pela manutenção da Selic em 13,75% no ano. Segundo analistas, o BC teve de mostrar habilidade para sustentar o comunicado mais “hawkish” da última quarta-feira (1) e sinalizar que reconhece os esforços da nova equipe econômica em buscar um equilíbrio fiscal.

Na avaliação de Caio Megale, economista chefe da XP Investimentos, o Copom manteve o foco já explicitado no comunicado pós-decisão sobre a deterioração das expectativas de inflação de longo prazo. Ele apontou que a Ata lista vários motivos para essa piora, entre eles a percepção de leniência do BC com as metas de inflação, o risco de uma política fiscal expansionista e a possibilidade de mudanças nas metas já fixadas.

Para Megale, independentemente do motivo, a mensagem final mais dura foi clara: o Copom “irá atuar para garantir que a inflação convirja para as metas”. O teor “hawkish” ainda é reforçado na discussão sobre a taxa de juros neutra. “O Copom continua assumindo 4% em seu cenário básico, mas avaliou cenários alternativos e identificou que os impactos de uma elevação da taxa neutra sobre suas projeções crescem no tempo”, afirmou o economista chefe da XP.

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“A nosso ver, isso sinaliza que o Comitê entende que os acontecimentos recentes (principalmente do lado fiscal) podem atuar no sentido de elevar a taxa de juros neutra, o que exigiria uma elevação nominal da Selic ao longo do tempo”, avaliou.

Numa outra ponta da discussão, Megale assinalou um recado mais positivo do o Copom, reconhecendo que as recentes medidas anunciadas pelo Ministério da Fazenda podem ajudar a reduzir os riscos de inflação à frente.

A equipe de análise do Banco Original fez a mesma leitura. Para o banco, é extremamente relevante como o Comitê dá o “benefício da dúvida”’ para o pacote fiscal comunicado por Haddad, abrindo assim a ponte de diálogo. “Como descrito pela própria Ata, a execução do pacote apresentado pelo Ministério da Fazenda deveria atenuar o risco fiscal e que será importante acompanhar os desafios na sua implementação”.

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Para o Original, cenários de alta da Selic tornam-se infactíveis, mas os juros tendem a se manter mais altos por mais tempo. A equipe ressaltou que as políticas que o governo tem discutido – como mudança de meta da inflação, salário mínimo e isenções no Imposto de Renda – ainda apresentem bastante ruído e que isso é traduzido pelo mercado como prêmios adicionais de risco.

O Citi também acredita que o tom “hawkish” foi mantido, mas que o BC tentou na Ata reduzir o ruído sobre a política monetária dos últimos dias, citando que o pacote fiscal terá efeito positivo, se for aprovado e implantado.

O ex-diretor do BC, Tony Volpon, escreveu em sua conta no Twitter, que a Ata do Copom foi correta e didática, uma vez que a autoridade monetária deu as “explicações” pedidas por Lula sobre o atual patamar de juros. Ele deu especial atenção aos parágrafos 12 e 16 do documento, onde o BC discute -e em parte rebate – as razões para a alta das expectativas, reafirmando compromisso com as metas definidas pelo CMN.

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“E, bem importante, diz que em suas simulações o impulso fiscal neste ano está sendo anulado pelo aperto nas condições financeiras. Assim o BC discorda do mercado que tem visto (e expresso isso no Focus) o orçamento aprovado como inflacionário.”, afirmou.

Ele também observou que o BC disse que faz suas projeções baseado em medidas “aprovadas por lei”, e admite que se Haddad passar seu “pacote”, isso vai reduzir o risco de alta de inflação. “Devemos ver isso como o hasteamento de uma bandeira branca pelo BC. Se houver, junto com essa ata, um esforço de comunicação, podemos talvez evitar a perigosa crise que parecia que estávamos contratando”, elogiou Volpon na rede social.

BC ainda conservador

Mirella Hirakawa, economista da AZ Quest, também avaliou que a Ata manteve o tom “hawkish”, depois de um comunicado que já havia surpreendido na semana passada, incluindo a exposição de um cenário alternativo no qual a Selic permaneceria  no atual patamar até o terceiro trimestre de 2024.

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No entanto, o BC reconhece que existe uma possibilidade de um cenário mais benigno no campo fiscal caso o anúncio do pacote feito pelo Ministério da Fazenda se materialize. Mirella lembrou que o próprio BC afirma que seu cenário-base é mais conservador, mas que isso acontece porque a autoridade monetária trabalha com dados que são oficiais, como a Lei Orçamentária Anual (LOA).

“A sinalização é que o BC reconhece que o mercado pode estar mais otimista que ele em relação ao cenário fiscal, juma vez que pode estar contemplando um impacto desse anúncio do Ministério. Mas o BC trabalha com dados que já se materializaram, portanto não consegue usar suposições ou estimativas, como é o caso do mercado. Por isso, opta por um cenário mais conservador. Mas ele repete que existe um risco de um cenário mais benigno pro fiscal se o anúncio feito pelo Ministério se materializar”, ponderou a economista da AZ Quest.

Mirella, no entanto, acredita que Ata aponta que o plano de voo do BC é de uma manutenção da taxa de juros de 13,75% até o terceiro trimestre de 2024 e que existe um risco de novas altas na taxa de juros caso o processo de desancoragem das expectativas permaneça.

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Megale, da XP, também avaliou que a Ata sugere que os riscos de inflação estão assimétricos para cima. “Portanto, o Copom vê pouco espaço (se houver) para flexibilizar a política monetária até o início do ano que vem. A ata é consistente com nosso cenário de taxa Selic estável pelo menos até o final de 2023”, reforçou.

Leonardo Costa, economista da ASA Investments, concorda que a mensagem principal do BC foi mantida na Ata: a deterioração das expectativas de inflação sugere manutenção da taxa de juros em patamar elevado por mais tempo.

“O espaço para eventual corte de juros se mostra bastante reduzido. Nosso cenário contempla manutenção da taxa básica de 13,75% ao longo de todo 2023, fazendo frente à referida deterioração de riscos indicada pelo BC”, afirmou.

Na avaliação do Bradesco, embora o tom da Ata tenha mantido a maior preocupação com a ancoragem das expectativas, a comunicação segue compatível com um cenário de Selic mantida pela maior parte do ano, mas com redução gradual para 12,25% até o final de 2023. Segundo o banco, essa previsão incorpora também um contexto de desaceleração da atividade econômica e da inflação.

“A consolidação desse cenário, no entanto, dependerá dos debates estruturais em curso, principalmente das sinalizações sobre o novo arcabouço fiscal e a sobre a meta de inflação”, disse o Bradesco.

Plano de voo

Para Mauricio Oreng, economista do Santander, a Ata mostra a mudança de plano de voo do BC de esticar ainda mais o período com juros estáveis em patamar “bastante” contracionista. O banco destaca em sua análise que o Copom, conclui que a introdução de um aperto monetário mais prolongado, tal como em seu cenário alternativo (com juros em 13,75% em todo horizonte), gera impacto relevante sobre as projeções em direção à convergência às metas.

“Entendemos que essa indicação confirma a intenção do BB de seguir mantendo a Selic no atual patamar, nas condições atuais de incertezas fiscais e expectativas de inflação pressionadas”, avaliou.

“Dado que o cenário mencionado projetava corte de juros na reunião de setembro, podemos concluir que nas condições atuais o Copom não vislumbra iniciar um ciclo de flexibilização antes do quarto trimestre de 2023. E, a depender da evolução do cenário fiscal e das expectativas de inflação, as projeções para o início de um ciclo de queda podem ser adiadas novamente”, disse Oreng.

Cenário externo

Matheus Pizzani, da CM Capital, também destacou em sua análise o posicionamento do BC acerca das possíveis divergências entre a condução da política fiscal e a monetária nos próximos anos. “Neste sentido, foi possível ver um comportamento firme do Comitê, embora não tão duro quanto tem sido denunciado por membros do Executivo”, comentou.

Além dos desafios domésticos, que incluem os ruídos políticos, Pizzani lembrou que o Copom observa que o ambiente externo se mostra mais positivo do que inicialmente esperado. Entre os motivos para isso, foram citados o processo de reabertura da economia chinesa, o impacto da menor inflação de energia na Europa pelo inverno mais ameno e a desaceleração gradual do crescimento nos Estados Unidos.

Para o economista chefe do Sicredi, André Nunes de Nunes, a Ata veio bastante densa, plenamente justificável diante do comunicado duro da última quarta-feira. “Trouxe aspectos importantes com relação ao cenário, reforçou a questão da desancoragem da inflação para 2024 e 2025 como uma preocupação e mostrou que isso, de certa forma, está atrelado à própria discussão da meta de inflação e o arcabouço fiscal”, listou.

Ele também destacou o lado positivo do documento, que reconhece os avanços da Fazenda, embora o que esteja nas contas do BC até agora seja o que foi aprovado na PEC da Transição. “O pacote anunciado pelo ministro Haddad ainda não entra nas contas, mas o BC mostra que o mercado já coloca isso na conta é que é mais positivo. Logo, qualquer avanço vai ser muito positivo para o balanço de riscos da inflação”, afirmou.

Para Nunes, o comunicado pós-decisão foi mais duro, mas a Ata deu “uma arredondada”, num estilo “bate e assopra” e o mercado deve responder um pouco mais positivamente a isso. O economista do Sicredi acredita que o cenário alternativo de manutenção da taxa de juros elevada por todo o horizonte relevante perdeu força e que agora há espaço para até alguma redução da Selic ainda em 2023.