Associações criticam manutenção de juros pelo Copom e pedem coordenação entre políticas fiscal e monetária

Entidades de classe defendem redução de incertezas nas contas públicas e reformas para que expectativas de inflação possam cair

Roberto de Lira

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A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) nesta quarta-feira (22) de manter inalterada em 13,75% a taxa básica de juros, sem sinalização de quedas futuras e mesmo com o reconhecimento de que já existe um cenário de forte restrição ao crédito, desencadeou uma série de críticas e alertas por entidades de classe.

As associações e federações pedem uma coordenação entre as políticas fiscal e monetária para que as expectativas de inflação caiam e permitam juros menores.

Em nota divulgada ainda ontem, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou que a manutenção da taxa de juros é, neste momento, desnecessária para o combate à inflação e apenas traz custos adicionais para a atividade econômica.

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Para a entidade, a taxa básica de juros no patamar atual foi um dos fatores determinantes para a desaceleração da atividade econômica no final de 2022, com destaque para a retração de 0,2% no PIB do último trimestre.

“E seguirá sendo um limitador significativo para o crescimento da atividade em 2023, quando as previsões para o PIB indicam alta de apenas 0,88%, segundo o Boletim Focus do BC”, destacou a CNI.

Foi lembrado ainda que é preciso levar em consideração que os eventos adversos relacionados a grandes empresas varejistas no País terão influência negativa sobre o mercado de crédito. Esses acontecimentos, disse a associação, têm levado ao aumento de provisões por parte dos bancos, o que reduz a oferta e tende a encarecer o crédito.

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“Assim, deve haver retração das concessões de crédito nos próximos meses, com reflexos negativos sobre a atividade econômica”, destacou a nota, lembrando ainda as dificuldades enfrentadas pelos bancos nos Estados Unidos e na Europa.

Mas a entidade não jogou toda a pressão apenas sobre o BC e fez o alerta que “é preciso que o governo tenha cautela na condução dos gastos públicos, para evitar que a taxa Selic permaneça em patamar alto, com prejuízo para a atividade econômica”.

Na mesma linha, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) comentou que o elevado patamar da taxa de juros tem imposto severos sacrifícios à atividade econômica e representado entrave para as condições de crédito, prejudicando os investimentos das empresas e o consumo das famílias.

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“No entanto, a federação reforça que, para que a redução da taxa Selic ocorra de forma responsável, é preciso que as incertezas no âmbito das contas públicas sejam superadas e que a ancoragem das expectativas de inflação em torno da meta esteja garantida”, ponderou.

Nesse contexto, a federação afirmou que anúncio de uma nova regra fiscal – que seja compatível com a sustentabilidade da dívida – é fundamental para um ambiente de crescimento econômico perene.

A Firjan ressaltou ainda que, com a intensificação das incertezas globais, torna-se urgente a adoção de uma forte coordenação das políticas fiscal e monetária.

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“Não há mais espaço para atalhos. A concretização de um novo arcabouço fiscal e a aprovação reformas estruturais contribuirão para ganhos de competitividade e para a adoção de medidas necessárias para o desenvolvimento econômico e social”, comentou.

A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) também disse enxergar com preocupação a manutenção dos juros em 13,75%, considerando que a atividade econômica brasileira vem mostrando claros sinais de desaceleração.

“Entende-se como necessário o debate sobre as elevadas taxas de juros no Brasil, uma vez que esta medida pode dificultar o acesso das empresas a crédito e investimentos, prejudicando o desenvolvimento do país e o bem-estar da população”, explicou em nota.

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A Federação também colocou a questão dentro de um quadro geral macroeconômico, considerando relevante a promoção de reformas estruturantes e a apresentação de uma nova âncora fiscal

Para a Fiemg, isso deve fomentar o aumento da eficiência dos gastos do governo, a sustentabilidade das contas públicas e o incremento da produtividade. “Somente assim a redução das taxas de juros e o crescimento econômico sustentável e duradouro do país serão alcançados”, afirmou a nota oficial da entidade.

Setores imobiliário e de construção

A economista, Ieda Vasconcelos, da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), lembrou que a Selic está no mesmo patamar desde agosto do ano passado e que essa taxa elevada não estimula as atividades produtivas e contribui para acrescentar mais incertezas nos investimentos produtivos, necessários para a continuidade de geração de emprego e renda na economia.

“Nesse sentido, a expectativa de crescimento do setor, de 2,5% para esse ano, poderá ser revisada”, apontou.

A Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) também divulgou uma nota afirmando que entende que a autoridade monetária precisa reduzir a taxa. “Os juros altos são entraves ao desenvolvimento econômico do Brasil e podem prejudicar a geração futura de emprego”, argumentou a representante das incorporadoras.

A Abrainc ressaltou que os financiamentos habitacionais de médio e alto padrão são os mais impactados com a Selic. Neles, a taxa de financiamento habitacional do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) ainda segue em valores inferiores ao Certificado de Depósito Interbancário (CDI).

Todavia, o setor considera que seria relevante que o Banco Central já adotasse medidas que aumentem a oferta de funding ao setor. Uma possível medida, para manter o crédito habitacional em patamar similar ao de 2022, seria o aumento no porcentual de recursos da poupança, que é direcionado obrigatoriamente ao financiamento de imóveis – dos atuais 65% para 70%.

Outras medidas defendidas pela associação para preservar o crescimento do setor nesse ambiente de alta na Selic seria a dedução dos juros de crédito imobiliário no imposto de renda e a elevação do teto para que quem usar o FGTS na compra de um imóvel – atualmente esse valor está em RS 1,5 milhão.

A Abrainc ponderou ainda que a principal fonte de financiamento para compradores de imóveis de baixa renda é o FGTS, que não é influenciado pela Selic. Dessa forma, com a implantação do novo Minha Casa, Minha Vida há boas perspectivas de aumento de produção para esse segmento.

(Com Estadão Conteúdo)