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Após algumas semanas de “recesso branco”, o Congresso Nacional retorna ao trabalho com a expectativa de análise de uma série de pautas de interesse do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em especial da equipe econômica.
A breve pausa informal em Brasília ofereceu uma oportunidade para os articuladores políticos do Palácio do Planalto intensificarem negociações com lideranças partidárias em busca da formação de uma base de apoio mais sólida nas duas casas legislativas ‒ sobretudo na Câmara dos Deputados, que costuma dar início à tramitação da maior parte da agenda legislativa.
Siglas que integraram a base de apoio do governo de Jair Bolsonaro (PL), o Progressistas e o Republicanos passaram a flertar com a gestão Lula em busca de posições estratégicas no governo. A expectativa é que representantes das duas siglas sejam nomeados para pastas na primeira reforma ministerial do terceiro mandato do petista.
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Lula saiu vencedor das eleições de 2022 com uma coalizão formada por 10 partidos: PT, PSOL, Rede, PSB, PCdoB, PV, Agir, Avante, Pros e Solidariedade. Juntos, eles compunham uma bancada modesta para a legislatura seguinte, com : 121 deputados dos 513 e apenas 12 senadores dos 81.
O governo eleito buscou desde o início aproximação com MDB, PDT, PSD e União Brasil ‒ siglas contempladas por posições na Esplanada dos Ministérios ‒, com potencial de ampliar a base aliada para até 284 deputados e 49 senadores. O que não se confirmou em boa parte das pautas que não eram entendidas pelos congressistas como “agendas de Estado”.
Foi nesse contexto que Lula passou a ser cada vez mais cobrado para reorganizar a estrutura de ministros de seu governo. O movimento foi inaugurado com a troca de Daniela Carneiro (RJ) por Celso Sabino (União Brasil-PA) no comando do Ministério do Turismo, em meio aos recados da cúpula do União Brasil de que não se sentia atendida pelos nomes da legenda que ocupavam pastas do Executivo.
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Com as negociações avançando sobre Progressistas e Republicanos, a base potencial de Lula sobe para 374 deputados e 59 senadores ‒ embora na prática a expectativa seja muito menor. Ainda assim, a avaliação de especialistas é que há uma tendência de redução no atrito entre Executivo e Legislativo.
Para os analistas da consultoria Arko Advice, os ministérios com mais chances de mudanças são: Desenvolvimento, chefiado por Wellington Dias (PT); Esporte, por Ana Moser; Ciência e Tecnologia, por Luciana Santos (PCdoB); e Gestão e Inovação, por Esther Dweck. Eles também veem possibilidade de trocas no Ministério de Portos e Aeroportos, de Márcio França (PSB); e no Ministério da Indústria, Comércio e Serviços, do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). E destacam, ainda, postos relevantes no segundo escalão, como na Fundação Nacional de Saúde (Funasa), na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e nos Correios.
Se, por um lado, o recesso parlamentar deu oportunidade para o avanço de negociações políticas, por outro, encurtou o prazo para análise de medidas provisórias, que agora passam a demandar maior celeridade para não “caducarem” (isto é, perderem validade antes que sejam discutidos pelo parlamento).
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Isso porque o fato de o Congresso Nacional não ter votado o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2024 impedia que os parlamentares entrassem em recesso formal. Ou seja, a pausa foi feita de forma extraoficial, por acordo entres os integrantes de cada casa legislativa, com contagem dos prazos regimentais das MPVs.
Do ponto de vista fiscal, as matérias que mais chamam atenção são as MPVs 1171/2023 e 1172/2023. A primeira atualizou a faixa de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPJ) para R$ 2.112,00 e apontou como fonte de compensação novas regras de tributação da renda auferida por pessoas físicas residentes no País em aplicações financeiras, entidades controladas e trusts no exterior.
O texto, no entanto, já está no 93º dia de tramitação e não teve sua comissão instalada no parlamento. Em meio ao risco de caducidade, o governo tem trabalhado para incluir pontos dele no relatório que da MPV 1172/2023, que já tramita no Congresso Nacional e dispõe sobre o valor do salário mínimo a R$ 1.320,00 desde 1º de maio.
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Reanálise de temas
A agenda legislativa também inclui na lista prioritária do governo a conclusão da votação do projeto de lei complementar que trata do novo arcabouço fiscal (PLP 93/2023) na Câmara dos Deputados. O texto sofreu modificações no Senado Federal e caberá aos deputados federais decidirem se acatarão ou não as sugestões. Entre elas há uma defendida especialmente pelo Ministério do Planejamento e Orçamento, que pode ampliar o espaço para previsão de despesas na peça orçamentária de 2024.
O dispositivo, de autoria do líder do governo no Congresso Nacional, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), autoriza que o governo utilize estimativa para a diferença da inflação cheia no ano e a apurada no período considerado para correção do “teto” de gastos para incluir programações de despesas primárias. Tal execução, contudo, ficaria condicionada à aprovação pelo parlamento de projeto de lei de crédito adicional com a ampliação do limite individualizado em questão.
Há ainda a retirada do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) da regra de limite de despesas. Além da inclusão das transferências constitucionais da União ao Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) no rol de exceções ao novo teto.
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Outra pauta que retorna à Câmara dos Deputados é o projeto de lei que trata do Marco Legal das Garantias (PL 4.188/2021). O texto muda as normas relacionadas às garantias de empréstimos, com objetivo de diminuir o risco de inadimplência do devedor e assim reduzir o custo do crédito.
Durante tramitação no Senado Federal, foi retirado da proposta capítulo que se referia à execução extrajudicial de títulos executivos, que, na avaliação dos integrantes da Casa, precisaria ser tratado em outro projeto.
Os senadores também restauraram a impenhorabilidade do bem de família, que havia sido derrubada pelos deputados. Pela legislação atual, uma família não pode perder o único imóvel por dívidas, exceto em casos como a hipoteca. O texto da Câmara permitia a penhora em qualquer situação na qual o imóvel tenha sido dado como garantia real, independentemente da obrigação garantida ou da destinação dos recursos obtidos, mesmo quando a dívida for de terceiro (por exemplo, um pai garantindo uma dívida do filho com o único imóvel que possui).
Outra alteração aprovada pelos senadores foi a restauração do monopólio da Caixa Econômica Federal para a penhora de bens móveis (como joias, relógios, canetas e pratarias), outra norma que a Câmara havia derrubado. O objetivo de quebrar esse monopólio seria aumentar a concorrência nos penhores para baratear o crédito.
Também fica restaurado o monopólio da Caixa e do Banco do Brasil para o pagamento de professores. Esses bancos são os únicos que podem administrar os recursos do Fundeb. O relator da matéria, senador Weverton Rocha (PDT-MA) alegou que essa iniciativa foge do tema do projeto.
Ainda na agenda da Câmara dos Deputados, vale destacar que o governo solicitou urgência constitucional para dois projetos de lei de sua própria iniciativa. Um deles (PL 2.925/2023) altera a legislação do mercado de capitais para incluir mecanismos de proteção a acionistas minoritários contra prejuízos causados por acionistas controladores ou administradores de companhias abertas.
O outro (PL 2.926/2023), regulamenta a atuação das instituições operadoras de infraestruturas do mercado financeiro que realizam serviços de compensação de créditos.
Reforma tributária e Carf
Já no Senado Federal, as atenções devem se voltar à tramitação da Proposta de Emenda à Constituição que trata da reforma tributária dos impostos sobre o consumo (PEC 45/2019), aprovada no início do mês pela Câmara. O texto reúne 5 tributos em um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) dual em nível federal (CBS) e subnacional (IBS), com base ampla, tratamento igualitário entre bens e serviços e cobrança por fora, não cumulativa e no destino.
Durante a aprovação na Câmara dos Deputados, o texto recebeu uma série de exceções com benefícios setoriais. A expectativa da equipe econômica do governo é que os senadores analisem cada ponto da matéria e corrijam eventuais distorções e excessos. Há também uma avaliação de que o Senado, por ser a chamada “Casa da Federação”, dê maior atenção ao embate federativo e avance sobre pontos não acordados pelos deputados, como as regras de distribuição dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR).
O relator da matéria é o senador Eduardo Braga (MDB-AM), visto como aliado do Palácio do Planalto. O presidente da casa legislativa, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tem sinalizado a intenção de votar a matéria em plenário até outubro ‒ o que daria a oportunidade para a Câmara analisar possíveis mudanças até o fim do ano, para que a promulgação não se arraste para 2024. Por se tratar de PEC, é necessário apoio de 3/5 nas votações em cada casa e as duas precisam votar o mesmo texto no mérito.
Logo no início das atividades no segundo semestre, o Senado Federal também deve se debruçar sobre o projeto de lei que retoma o chamado “voto de qualidade” a favor da União no caso de empate em julgamentos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) ‒ última instância de julgamento de questões tributárias na administração federal.
A expectativa do governo é que a casa legislativa aprove a matéria e que ela seja sancionada no início de setembro, garantindo resultados importantes para a agenda de recomposição da base fiscal perseguida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT). Nos cálculos da pasta, a medida tem potencial de gerar arrecadação adicional de até R$ 50 bilhões em 2023.
Na versão original encaminhada pelo governo federal, o projeto abria a possibilidade para a Receita Federal disponibilizar métodos preventivos para a autorregularização de obrigações principais ou acessórias relativas a tributos por ela administrados e estabelecer programas de conformidade para prevenir conflitos e assegurar o diálogo e a compreensão de divergências acerca da aplicação da legislação tributária.
Pelo texto, o órgão estabelecerá classificação de contribuintes, de acordo com o grau de conformidade tributária e aduaneira, com base em critérios de regularidade cadastral, regularidade no recolhimento dos tributos devidos, aderência entre escriturações ou declarações e os atos praticados pelo contribuinte e exatidão das informações prestadas.
O projeto também ampliava o montante para enquadramento de processos administrativos no rol de contenciosos de pequeno valor, que, pela lei podem ter julgamento realizado em última instância por órgão colegiado da Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento da Secretaria Especial da Receita Federal, observados o contraditório, a ampla defesa e a vinculação aos entendimentos do Carf.
Atualmente a regra vale apenas para contenciosos cujos valores não superem 60 salários mínimos. O governo queria elevar para 1 mil salários mínimos, mas teve que recuar em meio a resistências entre parlamentares e representantes de empresários.
Pelos cálculos da equipe econômica, a ampliação do limite de alçada poderia reduzir em cerca de 70% a quantidade de processos encaminhados ao Carf, o que poderia reduzir o tempo médio para o órgão entrar no fluxo para 2,27 anos.
Na agenda microeconômica, o Senado Federal também deve analisar projeto de lei que cria as debêntures de infraestrutura (PL 2.646/2020) e outra matéria que permite a utilização de planos de previdência e seguro pessoal como garantia de crédito (PL 2.550/2023). Há ainda expectativa que a casa legislativa discuta a nova lei de seguros (PLC 29/2017).
Orçamento e pacote fiscal
A volta do recesso também deve ser marcada pela necessidade de os parlamentares apreciarem a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2024. E o governo também deverá encaminhar ao parlamento, ainda em agosto, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), já seguindo as regras do novo marco fiscal e com meta de déficit zero, e o Plano Plurianual (PPA) em formatação inédita.
Além das pautas já em tramitação nas duas casas legislativas, o ministro Fernando Haddad quer aproveitar o momento favorável para as relações com o Congresso Nacional e o noticiário econômico positivo para avançar com mais medidas em busca do cumprimento dos objetivos fiscais estabelecidos. Estima-se que ainda seja necessário algo em torno de R$ 50 bilhões de arrecadação adicional para que todas as despesas previstas sejam cobertas para o período.
“O governo ainda tenta fechar a conta dessas medidas que vai precisar entregar até, no máximo, 31 de agosto, quando o PLOA é enviado ao Congresso. Para que o governo entregue aquele prometido déficit zero no ano que vem, ele precisa apontar nessa PLOA quais vão ser as medidas de arrecadação extra que vão permitir esse resultado de primário equilibrado em 2024. Não necessariamente as medidas precisam estar aprovadas, mas ele precisa pelo menos indicar quais são e enviar ao Congresso as que precisam de aprovação”, observou Júnia Gama, analista política da XP, no podcast Frequência Política.
Na agenda estão ações como novas regras de tributação de “offshores” mantidas por brasileiros no exterior e dos chamados fundos fechados ‒ duas modalidades de aplicações financeiras que, na avaliação da equipe econômica do governo, geram distorções e favorecem o diferimento tributário. Ambos os movimentos já foram tentados durante administrações anteriores, mas sem sucesso.
Também fazem parte da lista a regulamentação das apostas esportivas, que pode gerar arrecadação adicional de R$ 15 bilhões para os cofres públicos.
Além de medidas como o possível fim dos Juros sobre o Capital Próprio (JCP) e a regulamentação da cobrança do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entender que o governo pode fazer a cobrança sobre incentivos fiscais que estados dão a empresas para despesas de custeio.
Para o fim do semestre, quando o Senado Federal concluir a análise sobre a reforma tributária dos impostos sobre o consumo, há a expectativa de que o governo envie ao parlamento a segunda etapa das discussões, com um projeto de lei focado na cobrança de impostos sobre a renda.
Nesta fase, a ideia é uma rediscussão sobre a tributação sobre a distribuição de lucros e dividendos, dentre outras medidas ainda não antecipadas pelo Ministério da Fazenda.
(com Agência Senado)