Publicidade
Foi inaugurado na semana passada em São Paulo o Templo de Salomão, o maior espaço religioso do país, com área quatro vezes maior que o Santuário de Aparecida e custo de 680 milhões de reais. Nele, há um prédio de 11 andares com sete estúdios de rádio e TV, além de cerca de 50 apartamentos para bispos e pastores. Tudo cercado por muitas irregularidades e suspeita de corrupção.
Dentre os problemas apontados, o que salta aos olhos é o fato da construção de cerca de 100.000 metros quadrados, que empregou até 1.800 operários e demorou quatro anos para ser concluída, não tinha alvará de construção. A licença obtida pela Igreja Universal era para reforma e não para construção de obra nova, mas incrivelmente a municipalidade paulista não “percebeu” a irregularidade.
Outro fato que chama a atenção é que um dos imóveis que deveria ser reformado, segundo o alvará concedido, já havia sido demolido dois anos antes. Uma fábrica, que ocupava 18 mil m2 já não existia, mas constou como imóvel a ser reformado. Antes ou depois do alvará, a verdade é que nenhum dos prédios que existiam na área foram preservados.
Continua depois da publicidade
Com isso, cerca de 35 milhões de reais deixaram de ser arrecadados aos cofres municipais para realização de obras viárias no entorno do templo. Isso porque, em construções novas com mais de 5.000m e 499 vagas de garagem –o templo tem 100.000 e 1.800 vagas, o município exige uma contrapartida de 5% do valor da obra para investimentos na região.
Além disso, o terreno está em uma ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), e construções novas em terrenos com mais de 500 m2, onde por exemplo foi realizada a demolição, precisa destinar 40% da área para construção de moradias populares.
Para esse probleminha, os nobres vereadores deram um jeito. No projeto do novo plano diretor da cidade, que foi sancionado pelo prefeito na última semana, fizeram um remendo no texto e excluíram apenas o terreno onde foi construído o Templo de Salomão da classificação de ZEIS. Desta forma, com uma simples canetada desapareceu a obrigatoriedade de destinação de parte do terreno para construção de moradias.
Continua depois da publicidade
E as denúncias não param por aí. Há indícios que estão sendo investigados pelo MP e apontam que parte da terra retirada do local onde foi construído o templo foi irregularmente levado para o Campus da USP Leste e estaria contaminada. Como a universidade está em uma área de preservação, a terra deveria ser analisada o que não ocorreu.
A USP teve as aulas suspensas em janeiro e julho deste ano, causando um enorme prejuízo para alunos e pesquisadores do Campus Leste. Comprovada a origem da contaminação, os responsáveis pelo problema podem ser acionados judicialmente para reparar os danos causados, mas certamente há perdas que superam a simples reposição econômica, como o ano letivo dos prejudicados.
Como se não bastasse, a construção não passou por vistoria do corpo de bombeiros nem tem habite-se, mas isso não “importa muito”. O município “resolveu” essa questão e emitiu uma “autorização especial” que permite o funcionamento do templo, mesmo sem cumprir as exigências legais para o funcionamento. Mas também vamos pensar que não é necessária “tanta formalidade”, afinal, o espaço é abençoado.
Continua depois da publicidade
Foi com base nesse documento que o templo foi inaugurado, com a presença da presidente da república, do governador do estado e do prefeito da cidade. Autoridades de todos os níveis do poder executivo, exercitando sua fé, coincidentemente em ano eleitoral.
O Ministério Público de São Paulo está fazendo seu trabalho. O promotor Maurício Lopes investiga desde a denúncia do depósito irregular de terra, passando pela fraude na emissão dos alvarás até a suspeitíssima autorização especial para funcionamento, mas parece que é um pouco tarde para correr atrás dos prejuízos. Dificilmente algo de concreto será feito e, pelo andar da carruagem, será mais um exemplo de que as falcatruas e corrupção compensam, afinal, nada na lei é tão inflexível na terra chamada Brasil.