O que fizeram com você? E o que você vai fazer com isso?

Desde que nascemos somos moldados por milhares de influências externas. Compreendê-las é a melhor (e talvez única) maneira de tomar as rédeas da vida e atingir o sonhado equilíbrio entre bolso e alma.

Wilson Marchionatti

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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Nos últimos posts vimos comportamentos que revelam um bolso e uma alma em desequilíbrio: consumo excessivo de álcool com objetivo social, ostentação de bens materiais como carros, envolvimento com atividades degradantes como corrupção.

Vocês leitores, sabiamente, enviaram-nos as perguntas que esperávamos:” por que a raça humana faz isso?” “O que explica comportamentos que destroem nosso bolso e nossa alma?” É o que vamos responder agora.

Antes de começarmos, dê parabéns a você mesmo. Esse simples questionamento é uma prova de que a busca pelo equilíbrio já está dentro de você. Agora vamos entender a questão.

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Somos seres complexos, feitos de um corpo cheio de necessidades como fome, reprodução, proteção, conforto. Tudo isso guiado por um cérebro que tem uma parte consciente, com a qual raciocinamos e tentamos fazer boas escolhas, e também uma parte inconsciente, ainda maior do que a consciente, sobre a qual temos pouco controle e que governa nossa vida sem percebermos.

Ao longo da vida, desde que nascemos, acumulamos milhares de experiências positivas e negativas que moldam nosso modo consciente e inconsciente de fazer escolhas.

Veja um exemplo relacionado com o dinheiro: nossa primeira experiência com bens materiais e posses é na fase fetal, quando descobrimos nossa capacidade de criar. Criar o que? Nada mais do que nossas fezes.

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Embora para um adulto isso seja algo desprezível, para uma criança é um acontecimento único, que vai concentrar toda a sua atenção durante horas de vários dias, até compreender o que é essa “arte” que ela recém descobriu.

Nesse momento, caso os pais façam a criança sentir vergonha do que fez, dizendo o famoso “Que feio!”, estarão criando uma propensão para que a criança tenha vergonha de seus atos, e que não os compartilhe com o mundo. Imagine que você recém veio ao mundo, e descobre ser capaz de criar algo, mas todos os habitantes desse mundo dizem que essa criação é algo horrível. É o primeiro incentivo ao surgimento de um pão-duro, uma pessoa que instintivamente guarda tudo que é seu para si.

Caso as fezes da criança sejam tratadas com indiferença, será um incentivo ao surgimento de uma personalidade irresponsável. Pense, de novo, que você recém veio ao mundo e sua primeira experiência com a capacidade de criar não teve efeito algum. É o primeiro incentivo para que uma pessoa tenha dificuldade em relacionar as causas e efeitos de seus atos, como gastar o que não deve, pedir dinheiro emprestado e etc.

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Agora imagine que você acaba de descobrir o cocô e sua mãe, sabiamente, interage com você de uma maneira alegre, batendo palmas e dizendo: “Que nenê inteligente! Agora vamos aprender a fazer no lugar certo”. E com calma, repete o mesmo gesto durante vários meses até a criança aprender que suas “obras” são maravilhosas e bem-vindas, mas que tem um lugar certo para elas. Bingo! A criança começa a desenvolver sentimentos de confiança, responsabilidade e autonomia.

As influências que recebemos do exterior não param por aí. Imagine cada resposta que você recebeu para suas perguntas:

“Por que o Joãozinho ganhou a bicicleta e eu não”? Resposta: Porque ele se comportou e você não.

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“Por que preciso ir à escola”? Resposta: Para um dia ser grande e ganhar dinheiro.

“Eu também quero a bicicleta do Joãozinho, buahh (chorando)”. Resposta: Tudo bem filhinho, vamos no shopping comprar uma (no cartão de crédito).

Imagine agora as cenas que você viu:

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As centenas de filmes românticos, criando em você a busca desesperada pelo amor de outra pessoa, antes de ter o amor de você mesmo.

As centenas de cenas sexuais, mostrando aos homens que esse é o melhor aspecto possível de uma mulher, e mostrando às mulheres que essa é uma arte com a qual podem atrair homens.

As ofensas e bulling entre colegas: “Gordo”, “Quatro-olhos”, “Feio”, ensinando (falsamente) que é possível ter prazer com o sofrimento de outros e tornando a comparação um hábito inconsciente e consciente.

A valorização excessiva de artistas e esportistas por aspectos como beleza, status, dinheiro.

Tente pensar agora nos traumas:

Um pai ou uma mãe incapazes de dar carinho e afeto, ou até mesmo o abandono por um pai ou mãe que não reconhecem ou demoram a reconhecer um filho. Essa carência será compensada de alguma forma, talvez com compras, talvez com sexo, talvez com uma personalidade arrogante.

Um professor insensível que fez você passar vergonha na sala de aula. Com isso surge a timidez, uma defesa do ego para não sofrer desgostos do mundo externo.

Um momento incompreendido de isolamento e solidão, como afastar-se da família ou ser rechaçado por colegas. Isso pode gerar uma busca desesperada por aceitação e criação de vínculos. É o caso de pessoas que gastam o que tem e o que não para conviver em ambientes que não deveriam. Mas pode, por outro lado, até mesmo acentuar a vontade de isolamento.

Por tudo isso, a máxima de Sócrates “Conhece-te a ti mesmo” é uma verdade para quem deseja encontrar um equilíbrio, construindo uma personalidade capaz de fazer boas escolhas tanto no sentido material quanto espiritual. E o mais importante, viver em paz com tais escolhas, pois como dizia Gandhi:  “Felicidade é quando  o que você pensa, fala e faz estão em harmonia”.

Compreender os traumas e comportamentos prejudiciais é a melhor maneira de dissolvê-los e atingir esse desejável equilíbrio.

Não somos culpados pelos traumas e influências de nossa vida. Mas como diria Sartre: “O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos com que os outros fizeram de nós.”