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Há três explicações centrais para o Brasil ter sediado tantas catástrofes não naturais nos últimos anos. Somos o país do depois, do esquecimento e das grandes proporções.
I. O país do depois
Tragédia natural: diz-se do evento que causa grandes danos (humanos, patrimoniais, naturais) e cuja origem está ligada a fenômenos naturais. Assim, encontramos facilmente em nosso repertório mental alguns exemplos de terremotos, tsunamis, furacões ou tempestades que se encaixam facilmente nesta descrição. Pouco mais de um mês atrás, entretanto, mais uma vez o país ficou atônito diante de uma grande tragédia não natural. Não natural pois não decorreu de nenhum desfeito da natureza com a população de Brumadinho e trabalhadores da mineradora. A barragem não era natural; os dejetos — embora minerais — também obviamente não o eram, pois lá não foram depositados naturalmente. E o rompimento sabidamente não se deu por terremoto — um terremoto de grande intensidade poderia ser o único motivo pelo qual um acidente com estas características pudesse, talvez, ser considerado natural.
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Fato é que o país está acostumado a sediar — e posteriormente acompanhar suas coberturas midiáticas — catástrofes não naturais de grandes proporções. E por “grandes proporções” eu me refiro a acidentes que causam ou (1) um número grande de mortes ou (2) a perda de patrimônio (histórico, cultural, natural, físico) de valor inestimável. Simples assim. Brumadinho, Museu Nacional, prédio ocupado no centro de São Paulo, Mariana, penitenciária de Alcaçuz, Kiss, Bateau Mouche. Estas são algumas das tragédias não naturais de grandes proporções que impactaram o país, as quais posso citar como ilustração.
Mas o que tragédias não naturais têm em comum? Ora, se elas não decorrem de eventos naturais (os quais, por definição, não podemos controlar nem, na maioria das vezes, prever e nos preparar para), uma lógica simples me faz concluir que elas decorrem de ações ou inações do próprio ser humano. Em outras palavras, são tragédias que poderiam ser evitadas.
Vivêssemos nós 300 anos atrás, esta conclusão não estaria necessariamente correta. O conhecimento acumulado até então pela humanidade, particularmente no que se refere às ciências exatas, era drasticamente inferior ao atual. A consequência disto é que as tecnologias existentes eram extremamente rudimentares, se compararmos ao nosso tempo. Além disso, a difusão deste conhecimento entre as diferentes sociedades era extremamente baixa. Dito isto, era muito mais difícil de se prever à época as consequências das decisões/ações que o homem tomava, de forma que uma tragédia não natural decorrida de uma escolha humana poderia, a rigor, ser considerada inevitável, um infortúnio. Um exemplo hipotético: o colapso de uma ponte causando muitas mortes. Um exemplo real: o Grande Incêndio de Londres, em 1666.
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No século XXI, não mais: é difícil engolir a argumentação de que uma tragédia não natural possa ser inevitável. Via de regra, decorrerá de negligência, imperícia, incompetência, desonestidade, ganância e outras nuances vergonhosas de nossa condição humana. Sendo assim, temos a primeira conclusão do texto: catástrofes não naturais são catástrofes evitáveis. O que não quer dizer facilmente evitáveis.
É verdade, estas catástrofes evitáveis de grandes proporções não ocorrem só no Brasil. A TV já nos contou muitas vezes sobre vazamentos de petróleo, desabamentos de prédios e pontes, mega-incêndios e outras tragédias evitáveis, tanto em países ricos como pobres. Mas somos um forte candidato a campeão — e neste momento estou pouco me importando com relativizações do tipo “É, mas…”: “É, mas em área somos um dos maiores países do mundo…”; “É, mas e se levarmos em conta a nossa população, ainda assim ficamos mal na foto?”. Parece-me que, independentemente do nosso tamanho e população, os números absolutos das tragédias, bem como suas frequências, as fazem um tema muito sério.
Então, por que será que elas, as tragédias, ocorrem em tão grande número aqui? Neste texto buscarei justamente compartilhar as respostas que minhas reflexões sobre o tema encontraram.
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O meu palpite mais forte: somos o país do depois. As pessoas, a mídia, as empresas e o governo (3 esferas) só resolvem tomar atitudes depois que o problema aconteceu. Depois de Mariana, foram semanas e meses de “medidas urgentes” (as aspas são para, de fato, dar-lhes tom pejorativo, dado que sempre tomadas a posteriori dos fatos) mirando outras barragens. Após do Museu Nacional terem sobrado apenas as paredes externas, choveram críticas, advindas de toda a sociedade, sobre o descaso dos governos com o patrimônio histórico e cultural brasileiro. Precisou um prédio abandonado do centro de São Paulo, invadido e habitado por pessoas em condições de vulnerabilidade social, pegar fogo, desabar por inteiro e matar 7 para que sociedade e o governo municipal de São Paulo acordassem para os possíveis riscos causados por tais invasões e habitações irregulares.
Mas vamos colocar mais o dedo na ferida de nossa memória coletiva de país do depois. Depois da Kiss, assistimos prefeituras e corpos de bombeiros cassando quase indiscriminadamente alvarás de bares e casas noturnas. Presos se digladiaram em uma fortaleza (construída sobre areia de praia) terra-de-ninguém apelidada de presídio no Rio Grande do Norte, daí o governo à época ensaiou a transferência de detentos para outras fortalezas e a retomada do poder e da ordem naquele feudo criminal caótico.
Por fim, não posso deixar de citar o Bateau Mouche, que talvez seja o suprassumo da negligência, ganância, desonestidade e demais faces obscuras de nossa vergonhosa condição de humanos brasileiros que, via de regra, geram tais catástrofes evitáveis. Na virada de 2018 para 2019 foram 30 anos daquela trágica noite em que 55 morreram após o naufrágio de um barco cuja sina não poderia ser outra senão descansar no fundo da Baía de Guanabara. O excelente documentário Arquivo N – Os 30 anos do naufrágio do Bateau Mouche explica muito bem a sucessão de ações e omissões humanas responsáveis pelo ocorrido. À época criança, não me lembro quais foram as medidas práticas, decorridas do caso, implementadas a posteriori com o intuito de que casos similares não se repetissem. Mas eu apostaria que nos dias e semanas que se seguiram foram sim implementadas medidas. Assim como Brumadinho, depois.
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Ser o país do depois não é, entretanto, uma conclusão. Trata-se tão somente de uma constatação. É só viver aqui no Brasil e acompanhar com certa regularidade o que se passa no país para que se chegue a tal constatação. Mas qual é a verdadeira conclusão/lição que dela decorre?
Bom, é algo bastante óbvio, muito embora pareça-me que uma quantidade incrível de agentes da sociedade (as mesmas pessoas, empresas, mídias e governos citados anteriormente) simplesmente ou a desconheça ou a esqueça frequentemente. Se somos o país do depois é porque somos o país da negligência e da falta de atitudes preventivas. Parece ridiculamente óbvio, né? E é. Mas vamos explorar um pouco mais o assunto para ver se o é tanto assim?
Qual foi a última vez que tivemos um incêndio de grandes proporções em um grande asilo ou hospital no Brasil? Quantas pessoas morreram nas últimas vezes que tivemos a queda de coberturas ou marquises de estádios de futebol? A última ruptura de ponte que comoveu o país, quando se deu? E daquela vez que as plataformas de visitação das Cataratas de Foz do Iguaçu ruíram, foram dezenas ou centenas de vítimas?
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Temos uma usina nuclear, com 2 reatores, responsáveis por aproximadamente 50% do consumo de energia elétrica do estado do Rio de Janeiro. O dano potencial que um acidente nuclear pode gerar é provavelmente muito maior do que 99% dos brasileiros imaginam, incluindo muitos dos ilustres ministros e alguns presidentes que nos governaram desde que a usina passou a operar, em 1985.
Certamente já ocorreram incêndios em hospitais brasileiros, mas desconheço casos contemporâneos em que 50, 100, 300 pacientes e trabalhadores tenham desaparecido. Idem para colapsos de coberturas de estádios lotados, bem como de pontes. Desconheço caso recente (últimas décadas) de acidente gravíssimo em Foz do Iguaçu; sabidamente em Angra nunca tivemos acidentes nucleares que causaram muitas mortes ou vazamento de combustível nuclear. Mas independentemente de grandes tragédias relacionadas a estas estruturas terem ou não ocorrido, a atenção que se dá ao gerenciamento de riscos advindos delas é adequada?
O aprendizado de bebês e crianças se dá principalmente através da tentativa e erro. Se por acaso um pai nunca ensinar para uma criança que fogo machuca, ela vai acabar aprendendo isto, mais cedo ou mais tarde. Na pele, literalmente. O approach brasileiro no gerenciamento de riscos via de regra é assim, infantil: só tomamos providências após já termos errado. Tínhamos, entretanto, plena capacidade para facilmente concluir, a priori do erro, que tomar providências era imperativo. Afinal, lembremos, estamos no século XXI: o conhecimento e tecnologias são vastos e disponíveis para todas sociedades ao redor do planeta. Ou seja, nosso processo de aprendizado não precisa se dar na tentativa e erro.
Assim, depois do caso Kiss, buscou-se melhorar a segurança de casas noturnas. Afinal, são de fato estabelecimentos de alto risco, dados a alta densidade de pessoas, o som alto, a luminosidade baixa, a peculiaridade dos espaços físicos, entre outros. Mas e hospitais, também não têm especificidades que o tornam uma estrutura de alto risco? Ali temos produtos químicos inflamáveis, pessoas com extrema dificuldade de locomoção, edificações grandes, labirínticas e desconhecidas para boa parte dos indivíduos que lá dentro estão. Não é difícil de se imaginar o risco potencial de perdas humanas que um incêndio de grandes proporções poderia gerar em uma edificação com estas características.
E nossos estádios e pontes, têm recebido a devida atenção preventiva? Ou precisaremos uma tragédia para entendermos que, independentemente de até hoje talvez não termos tido uma grande catástrofe, são claramente estruturas com alto risco associado? A força da gravidade existe e pode ser bastante impiedosa com quem a desafia — Brumadinho não teria ocorrido não fosse ela. A cidade de São Paulo por exemplo, recentemente precisou ver um vão de um viaduto na Marginal Pinheiros ceder para cair na real de que algumas de suas pontes e viadutos estão, como se diria na minha terra, na capa da gaita. E que representam sério risco à vida de seus usuários.
E as outras prefeituras das grandes cidades do país inteiro, será que se mexeram? Ou pensaram que “é um problema das pontes da cidade de São Paulo”? Já os órgãos estaduais e federais responsáveis pelas pontes e viadutos de nossas estradas (logo, em sua maioria fora dos centros urbanos), será que pensaram “isso é um problema dos viadutos das cidades”?
A limitação de visão do brasileiro é realmente impressionante! O que o acidente no CT do Flamengo gerou nos dias subsequentes? Questionamentos sobre como estão as condições nos outros alojamentos na cidade do Rio (quiçá no Brasil), bem como sobre a utilização de espuma de poliuretano em divisórias internas de contêineres de aluguel. Estes questionamentos precisam ser feitos? Claro. Mas ar condicionado escolhe apenas alojamento-de-categorias-de-base-de-times-de-futebol-do-Rio-de-Janeiro para resolver gerar curtos-circuitos e explodir? Arquitetos, engenheiros ou designers de interiores escolhem apenas contêineres de aluguel para prescrever divisórias com espuma de poliuretano?
Será que é tão, mas tão difícil fazer os diversos agentes da sociedade entenderem que risco se estima pela multiplicação da (1) probabilidade estimada de um evento ocorrer pelo (2) dano potencial — humano, material ou natural — que este evento poderá gerar? É uma definição/equação simplíssima, com duas variáveis, porém extremamente poderosa.
Em outras palavras: há muitos contextos em que incêndios podem gerar danos potenciais enormes. Assim, se se pretende de fato agir preventivamente daqui para adiante, assistir autoridades focando-se apenas em alojamentos de times de futebol de uma cidade — porque recém tivemos um evento em contexto similar — é gozar da capacidade crítica que um cérebro humano nos possibilita.
Moral da história: ser o país do depois significa, obrigatoriamente, não ser o país do antes. E não ser o país do antes significa que a nossa sociedade não dá bola para riscos relevantes os quais ela nunca vivenciou. Esta é a verdadeira lição que decorre do fato de sermos o país do depois. Somos incapazes de utilizar nossos cérebros para identificarmos a priori riscos potenciais controláveis e agirmos proativamente sobre eles.
II. O país do esquecimento
Mas o Brasil não é apenas o país do depois. É também o país do esquecimento — e aqui serei tão curto quanto é a memória da nossa sociedade. Passados os dias ou semanas de comoção nacional, a poeira baixa. As providências são tomadas enxergando apenas o que está em um passado próximo. Quando o fio do tempo vai passando por nós e aquela catástrofe maior já está lá longe, esquecemos. E por conclusão lógica, se os agentes assim esquecem o que se passou, esquecidas também são as famosas “medidas” tomadas no pós-evento.
Interessante que esta falta de memória inclusive invalida a característica infantil (tentativa e erro) de nosso approach para gerenciamento de riscos. Afinal, a criança que se queima com fogo porque nunca a alertaram que aquilo a machucaria, provavelmente nunca esquecerá, por toda sua vida, que fogo queima. Na Kiss, a fumaça e o fogo mataram 242, 6 anos atrás. Será que as providências tomadas à época para que casos similares não voltassem a ocorrer ainda estão sendo praticadas, fiscalizadas, melhoradas? Ou os agentes que de alguma forma têm responsabilidade sobre a segurança de casas noturnas (empresários, arquitetos, trabalhadores, frequentadores, órgãos fiscalizadores) esqueceram que fogo em danceteria queima (e muito)? Tenho sérias dúvidas sobre quais as respostas.
Por fim, sobre sermos o país do esquecimento, aqui parece-me valer um reconhecimento: a mídia, no meu entender, ajuda a sociedade a ter memória menos curta, tocando na ferida de tempos em tempos, geralmente para mostrar os males ainda sofridos pelas pessoas envolvidas na tragédia ou para invocar a incompetência da justiça em punir eventuais culpados. Embora o foco não seja o (não) gerenciamento de riscos para casos futuros, ao revisitar a tragédia, provavelmente acaba contribuindo de alguma forma para a minimização de ocorrências futuros.
III. O país das grandes proporções
Por fim, o Brasil é o país das grandes proporções. Proporções de quê? Das catástrofes, justamente. Mas com isto não quero dizer que nossas catástrofes têm proporções maiores do que as dos outros; refiro-me ao fato de que a sociedade se comove muito, porém apenas com tragédias de grandes proporções. Assim, se em nossa maneira de (não) gerenciar riscos, em um primeiro momento somos infantis e, em um segundo, deixamos de sê-lo — dado que esquecemos o que aprendemos com nossos erros — a todos os momentos somos míopes: enxergamos apenas as coisas grandes que ocorrem na frente de todos, aquelas impossíveis de não enxergar. As “pequenas” tragédias não naturais, diárias, não passam de mais uma manchete dentre as inúmeras geradas a cada hora em um país gigante como o nosso. Passa o dia, tá esquecido. A não ser que o ocorrido tenha vitimado pessoas ricas, famosas, crianças, adolescentes, ou então que ocorra em um dos centros do poder midiático do país (básica e exclusivamente as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro), tragédias não naturais de pequenas proporções passam sem que as famosas “medidas” — existentes quando temos as catástrofes de grandes proporções — sequer sejam cogitadas.
Explorarei um exemplo apenas, bastante trivial e realista, para que o argumento do parágrafo acima não fique tão genérico e aberto a interpretações. Acidentes de trânsito em estradas ocorrem por alguns motivos — imprudência e/ou falha humana, falha técnica de veículos, deficiência na qualidade das vias, entre outros. Me focarei no último, afinal, se a falta de qualidade em uma estrada tem potencial de causar muitas mortes, estamos claramente diante de um caso de catástrofe não natural. Estradas foram construídas por humanos, bem como humanos (os gestores da rodovia), no nosso século, têm plena capacidade de identificar possíveis pontos que gerem riscos potenciais às vidas que por lá passam — mesmo que ali nunca tenham ocorrido mortes, nem mesmo acidentes. OK, estamos de acordo que é não natural. Mas estamos diante de uma catástrofe?
É aí que quero chegar. Parece-me que a maioria das pessoas não considera catástrofe um carro que não venceu uma dada curva, acabou capotando e gerando a morte de 2 de seus ocupantes. Interpretam como uma fatalidade. Mas e se, em média, 23 pessoas por ano, nos últimos 20 anos, tiverem perdido a vida em circunstâncias parecidas naquela curva? Estamos ou não diante de uma catástrofe?
Curvas de rodovias, se bem-feitas, têm todas algo chamado de superelevação — uma inclinação no pavimento, perpendicular ao eixo da estrada, que contrapõe a inércia do veículo e nos ajuda a realizar a curva de forma mais segura confortável. É algo que nem notamos, mas está lá, qualquer estrada minimamente bem projetada e construída tem.
E quando a tal superelevação é inexistente ou tem inclinação insuficiente para a velocidade da rodovia e o raio da curva? É aí que geralmente notamos algo estranho… Vamos ter a tendência de achar aquela curva fechada demais, afinal foi difícil vencê-la. Ou, alternativamente, concluiremos que o motorista (ou nós mesmos, se formos o próprio) entrou rápido demais na curva.
Este é um tipo de falha técnica, geralmente gestado da incompetência e negligência na construção da rodovia, perpetuado na incompetência e negligência da vistoria feita pelo contratante — geralmente o governo — logo após a finalização da construção. E esta simples falha técnica, em apenas uma curva, pode, de verdade, causar mais mortes ao longo dos anos do que Brumadinho. Mas não apenas este tipo de falha: rodovias, edifícios, aeroportos, barragens, pontes, hospitais, barcos, navios, trens, ferrovias, remédios, vacinas, eletrodomésticos, indústrias e mais uma miríade de coisas que o homem constrói, utiliza, habita, produz e frequenta escondem riscos potenciais muito grandes, que se negligenciados ou mal geridos, podem gerar tragédias de grandes proporções.
Muitas vezes, como no caso do carro dos 2 passageiros, a tragédia é composta de “mini” eventos, que não saem na mídia de abrangência nacional e não chegam à mesa das autoridades. Mas questiono: a autoridade responsável por aquela rodovia (não interessa se privada ou pública), após 2, 3 ou 4 acidentes naquele ponto (com ou sem mortes), não teria indícios suficientes para investigar proativamente e agir preventivamente? A secretaria de obras de um município precisa esperar a ocorrência de alguns ou vários acidentes em uma esquina qualquer da cidade para identificar que um galho de uma árvore está encobrindo o semáforo e gerando um risco potencial enorme de acidentes naquela esquina? Isto está ocorrendo exatamente neste momento em Porto Alegre, onde moro. São muitos semáforos encobertos por vegetação adjacente às ruas e avenidas; a poda preventiva de galhos por motivo de segurança viária tem sido largamente insuficiente.
Ser o país míope, das grandes proporções, é isto: só dar atenção àquelas catástrofes que geram danos gigantescos e que ocorrem de uma hora para outra; é não conseguir enxergar que tragédias não naturais, logo evitáveis, estão ocorrendo continuamente debaixo dos nossos olhos e não as identificamos. Ou seja, pior que míope, no gerenciamento de risco o Brasil é também cego.
Pela memória de Ricardo Boechat — a quem, ao ouvi-lo na rádio na manhã de 11/02/2019, dia de sua morte, pensei em enviar este artigo, que fora finalizado no dia anterior.