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SÃO PAULO – Nesta segunda-feira (24), a China mostrou mais uma vez porque o sell-off global ou, em bom português, o cenário de pânico dos mercados, é desta vez bastante sério e afeta de forte bastante expressiva os mercados mundiais. No mercado americano, o S&P500, o Dow Jones e o Nasdaq caíam mais de 3%, seguindo o cenário de pânico no chinês Xangai, que teve queda de 8,46%, na maior baixa desde 2007, enquanto as bolsas europeias têm baixa superior a 3%, abrindo o novo capítulo sobre o cenário de temor chinês.
Aliás, esta sessão está sendo chamada de “Black Monday” dos mercados, fazendo um pararelo com que aconteceu em 19 de outubro de 1987, quando as bolsas caíram em um efeito dominó a começar por Hong Kong e culminando numa queda de 22,61% do Dow Jones. No total, 2.153 companhias chinesas atingiram o limite diário de desvalorização. Fundamentos econômicos fracos e a falta de apoio do governo ao mercado contribuíram para o forte movimento de vendas. Os paralelos com a crise asiática de 1997 também ganham forças no mercado.
Guardadas as devidas proporções, desta vez, mais preocupações chinesas chegam ao mercado, reforçadas por dados econômicos fracos. De acordo com a agência de planejamento econômico estatal, a pressão sobre a economia chinesa está mais óbvia, uma vez que o país ainda enfrenta muitas dificuldades e desafios.
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Em meio à forte queda das bolsas mundiais, a China inaugura mais um capítulo de “pânico” para os mercados. Preocupa o rumo da economia global e, com isso, aumenta a demanda por ativos seguros. Vale destacar que, desde a inesperada depreciação da moeda chinesa, no dia 11 de agosto, mais de US$ 5 trilhões foram eliminados de mercado das bolsas internacionais.
“Os mercados estão em pânico. As coisas estão começando a parecer com a crise financeira asiática no fim da década de 1990. Especuladores estão vendendo ativos que parecem ser os mais vulneráveis”, disse o chefe de pesquisa do Shinsei Bank, Takako Masai.
Se, em 11 de agosto, o Banco do Povo da China “chocou” os mercados ao anunciar a desvalorização da sua moeda em relação ao dólar em quase 1,9%, gerando temores de uma desaceleração econômica mais forte e o possível impacto disso para as exportações de vários países para a China com essas medidas, além de gerar uma possível desvalorização competitiva, outros temores já avaliam assolado os mercados com relação ao gigante asiático.
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No início de julho, o mercado já viu seus temores aumentarem fortemente com relação ao mercado asiático. No dia 8, especificamente, Xangai caiu 8% no intraday, mas fechou em queda de 5,9% naquele dia, após um longo rali em que ela subiu 150% no ano passado. O governo até tentou buscar um alívio, com medidas para estancar a saída. Dentre elas, a China proibiu grandes acionistas de venderem ações nos próximos seis meses. Até gerou-se um alívio no mercado – mas que não durou muito.
Voltando para agosto, o Conselho de Estado da China até buscou novas medidas, abrindo as portas para que o principal fundo de pensão do país invista no mercado acionário local, informou a agência estatal de notícias Xinhua. O fundo, que no fim de 2014 contava com patrimônio de 3,5 trilhões de yuans (US$ 547 bilhões), poderá aplicar até 30% de seus recursos em ações. Contudo, isso não fui suficiente, uma vez que os mercados estavam esperando mais notícias: os investidores esperavam “grandes medidas” para sustentar os mercados vindas de Pequim, o que não ocorreu.
Assim, ativos vistos como um porto-seguro, como títulos de governo e o iene, apresentaram ganhos em meio à instabilidade nos mercados financeiros.
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Conforme destaca matéria do Financial Times, há quatro razões que mostram por que a China afeta diretamente o resto do mundo. No caso dos EUA, por exemplo, os economistas do Goldman Sachs avaliam que as exportações do país para a China respondem a cerca de pelo menos 1% do PIB do país. A China corresponde a uma preocupação bem forte para os mercados, em um cenário em que o crescimento americano não é brilhante, o Brasil está em recessão e a zona do euro também não está numa zona confortável.
Em quatro gráficos, o jornal britânico destaca que a China é responsável pelo consumo de 11% do petróleo mundial, a China utiliza 57% do cobre mundial e importou dois terços do minério de ferro em 2013. Ou seja, o abalo do mercado chinês tem potencial para reverberar em boa parte dos mercados mundiais.
Com isso, o minério de ferro negociado no porto de Qingdao teve forte baixa de 5,03%, a US$ 53,28, enquanto o petróleo teve baixa superior a 4%, atingindo a mínima em seis anos.
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Atuação, mas…
Vale destacar que as autoridades chinesas já gastaram US$ 200 bilhões para sustentar os preços nas últimas semanas em agosto de forma a não aumentar a desvalorização do yuan, segundo fontes do Banco Popular da China ouvidas pelo Financial Times.
Mas, agora, os temores aumentam, com a percepção de que o país está passando por uma crise de transição sem paralelos em muito tempo. Shuang Ding, economista do Standard Chartered em Hong Kong, alegou que é “absolutamente necessário para o banco central uma injeção de liquidez” no sistema bancário, reduzindo a taxa de reservas obrigatórias (ou compulsório) porque a depreciação do renminbi aumentaria as saídas de capital.
O governo chinês está num dilema: ou dar suportes em meio à desaceleração da economia ou prosseguir com as suas reformas mais amplas. “Por um lado, eles não querem deixar de financiar mas, por outro lado, a economia está fraca e gostaria de ter o crescimento do crédito a um nível razoável”, disse ele.
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Assim, o cenário é de bastante adversidade e temores de que há sim uma bolha chinesa estourando, o que ecoa no mercado brasileiro, que despenca nesta segunda-feira uma vez que o País é bastante dependente do mercado chinês para exportar e também é bastante afetado pelo cenário de aversão ao risco do mercado. Uma das indicações para tanto, como destaca o site Investing.com é, além da bolha no mercado de ações, a bolha no mercado de crédito.
A “bolha” da dívida privada da China ainda não é tão grande como a bolha que estourou no Japão no início dos anos 1990, mas mostra que a taxa de crescimento da dívida privada na China ao longo dos últimos anos é muito além de qualquer coisa que aconteceu no Japão ou nos EUA nos anos que antecederam seus respectivos picos de bolha. A reportagem destaca que a bolha chinesa pode sim explodir ainda mais até explodir de fato mas, ao mesmo tempo, em meio à transição chinesa, há indícios de que a bolha sim estourou. Uma das pistas principais é o grande fluxo de dinheiro para fora da China, que tem aumentado e muito no acumulado dos últimos doze meses.
“Não criemos pânico”
Contudo, há quem não veja um cenário tão desolador. A desvalorização do yuan e o recente cenário de queda nos mercados de câmbio e de ações da Ásia não devem levar a outra crise financeira asiática, como acreditam alguns, afirmam analistas do Bank of America Merrill Lynch. O analista Josh Klaczek, do J.P. Morgan, também argumenta que o cenário é diferente, de acordo com reportagem da Agência Estado.
“Nós acreditamos que a apreensão do mercado é exagerada, já que o câmbio na Ásia está subvalorizado e as opções de política são amplas”, afirma o Bank of America Merrill Lynch. Diferentemente de 1997, a maioria dos países asiáticos tem déficit em conta corrente, mas balanços fortes, dependendo menos de empréstimos de moedas estrangeiras, segundo o banco. Mais importante ainda, os países asiáticos também têm mais espaço político para combater uma crise. Muitos países, como China, Coreia do Sul e Índia, podem cortar mais os juros neste ano, enquanto durante a crise de 1997 muitas nações asiáticas tiveram de elevar os juros, para defender suas moedas.
Klaczek diz que a região asiática atingiu um “ponto de inflexão negativa, relativo à qualidade e ao crescimento dos ativos”. Segundo ele, porém, apesar de semelhanças com o período anterior a 1997, há diferenças de magnitude e composição. O analista do J.P. Morgan cita, por exemplo, o fato de que a dívida corporativa externa é bem mais baixa hoje, mas com uma alavancagem geral doméstica maior, ainda que a maior parte dessa alavancagem esteja concentrada em China, Hong Kong e Cingapura. “Essa dinâmica representa uma saída do financiamento estrangeiro na região e o uso do excesso de liquidez para apoiar o consumo e o investimento após a crise financeira global”, afirma o economista.
Do lado negativo, Klaczek aponta que a relação entre crédito privado e Produto Interno Bruto (PIB) na Ásia é 29% maior hoje que em 1996. Além disso, diferentemente do que ocorreu em 1998, o Federal Reserve, o banco central norte-americano, pode estar menos em uma posição de agir como um agente capaz de ajudar a conter o fluxo de saída de capital. O analista lembra que o Fed em 1998 cortou os juros três vezes, ajudando a conter a crise nos emergentes. “Mas neste caso, a alta de juros do Fed pode apenas ser retardada, o que deve enfraquecer mais os mercados emergentes”, diz Klaczek.
O analista diz que, se por um lado a relação entre crédito e PIB continua elevada na região, a diferença principal com 1996 é que uma parte maior do crescimento tem sido financiada com liquidez doméstica. Nos anos 1990, países como Indonésia, Malásia e Tailândia tinham déficits em conta corrente muito altos, o que resultou em crise quando os fluxos de capital começaram a reverter seu curso e as contas correntes não puderam apoiar as reservas. Agora, esses déficits são menores, na comparação, o que por sua vez permitiu que a Ásia construa maiores colchões de reserva em moeda estrangeira em geral, de acordo com o analista.
(Com Reuters e Agência Estado)