Trump, Temer ou Ilan? Os fatores que explicam a maior alta do dólar na década

Apostas de que o Fed elevará os juros além do esperado, notícias negativas envolvendo o presidente Temer e uma possível fuga de dólares influenciando o BC são os motivos por trás da disparada da moeda norte-americana

Mário Braga

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SÃO PAULO – A perspectiva de que o Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA) elevará os juros além do esperado devido às medidas que Donald Trump poderá adotar como presidente, notícias que podem comprometer o mandato de Michel Temer e a possível fuga em massa de dólares do Brasil que teria levado o Banco Central (BC) a suspender o leilão de swap reverso são os três principais motivos que explicam a disparada da moeda norte-americana ante o real nesta quinta-feira (10). 

 A divisa encerrou o dia cotada a R$ 3,3614, com alta de 4,73%, a mais forte desde 22 de outubro de 2008, quando avançou 6,27%. 

Especialistas indicam que o dólar pode ganhar um novo “piso psicológico” na casa dos R$ 3,35 e consideram que o movimento registrado hoje representa uma reversão definitiva da tendência de queda esperada para a moeda antes de Trump conquistar a Casa Branca. Veja abaixo como cada um desses fatores está influenciando o movimento da moeda norte-americana:

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Trump
A política expansionista sinalizada por Trump para impulsionar o crescimento dos EUA deve levar o Fed a subir os juros além do que já estava precificado pelo mercado. O diretor de câmbio da Wagner Investimentos, José Faria Júnior, destaca que, além da elevação dos juros prevista para dezembro, agora o mercado está precificando mais três altas em 2017, uma a mais que anteriormente.

O consequente aumento dos yields dos Treasuries levou a uma disparada nas taxas de juros futuros ao redor do globo, o que é apontado por Faria Júnior como o principal motivo por trás da escalada do câmbio. “No Brasil, como o dólar estava muito baixo, o movimento está sendo um pouco mais forte que em relação a outras moedas atreladas a commodities”, comentou, citando o exemplo do dólar australiano, que perdeu 3,8% em relação ao dólar, ao passo que o real se desvalorizou 6,4% desde a abertura de quarta-feira até as 14h desta quinta-feira.

Ilan
Nem o anúncio do Banco Central, presidido por Ilan Goldfajn, de que irá suspender por tempo indeterminado o leilão diário de swap reverso foi suficiente para segurar a cotação da moeda norte-americana. Na prática, a medida significa que a autoridade monetária deixaria de tirar moeda de circulação, e a oferta maior que o esperado poderia arrefecer a escalada do dólar.

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No entanto, o BC pode ter tomado esta decisão devido a uma expressiva fuga de recursos do país. Pablo Stipanicic Spyer, diretor da mesa de trade da Mirae Asset Wealth Management, considera que algum grande investidor, como “um fundo de pensão gigantesco”, deve estar se desfazendo de ativos em países emergentes e, ciente desta decisão, a autoridade monetária brasileira suspendeu suas intervenções no mercado cambial.

“Neste tipo de operação, o BC funciona igual a uma agência de banco. É preciso avisar com um dia ou até dois de antecedência para se fazer uma retirada muito grande. Imagino que, depois de o Trump eleito e da volatilidade de ontem, um cliente gigante tomou a decisão de ir embora e avisou o banco da retirada de R$ 4 bilhões, R$ 5 bilhões”, comentou. Com um montante tão superior ao do leilão de swap reverso, não faria sentido realizar a operação.

As declarações do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de que a eleição do republicano pode levar a uma redução do fluxo global de capitais, estão em linha com a tese de Spyer. Após um evento em Santiago (Chile), Goldfajn, afirmou que a autoridade monetária está monitorando as condições do mercado de câmbio para evitar mais pressão e que o BC somente reduzirá o estoque de swaps cambiais tradicionais — equivalentes à venda futura de dólares — quando houver condições no mercado.

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Temer
Faria considera ainda que “desconfortos políticos internos” também contribuem para o viés de alta do dólar. “A informação de que cresceu a chance de o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) cassar a chapa Dilma-Temer, a nova fase da Operação Lava Jato, um certo medo das delações e até a situação das contas públicas no Rio de Janeiro formam um coquetel de notícias que não aliviam o câmbio no curto prazo”, detalhou.

Nesta quinta-feira, o jornal O Estado de S. Paulo informa que houve um cheque de doação nominal da construtora Andrade Gutierrez no valor de R$ 1 milhão ao então candidato a vice-presidente Michel Temer (PMDB) em 10 de julho de 2014, durante a campanha eleitoral. Já a coluna Painel, da Folha de S. Paulo, relata que tucanos e integrantes do governo Michel Temer ligaram o sinal de alerta, em meio ao aumento do temor de que o relator do processo que analisa irregularidades na campanha de 2014 recomende a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), sem que haja separação entre presidente e vice.