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SÃO PAULO – A economia brasileira caminha para um momento de aceleração inflacionária, sendo necessária uma política muito mais ativa e drástica do Banco Central para contê-la. É o que avalia o economista Alexandre Schwartsman em entrevista para o podcast da Rio Bravo, destacando também outros temas, como o uso do câmbio para conter inflação, além da mudança no mercado de trabalho no Brasil.
De acordo com o economista, o Brasil enfrenta um problema inflacionário, oriundo principalmente do mercado de trabalho, em meio à baixa taxa de desemprego no País de dois anos para cá. Com isso, está o ritmo de crescimento dos salários, que vem sido muito acima da produtividade e acaba se refletindo em maiores custos.
Neste cenário, observa Schwartsman, a inflação do setor de serviços, que não apresenta competitividade direta com os preços do setor externo, apresenta uma aceleração muito mais forte do que a observada no setor industrial, por exemplo, em que a concorrência é maior.
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Desta forma, com o baixo nível de desemprego e à falta de mão-de-obra qualificada, os trabalhadores que já estão no mercado veem seus salários corroídos pelos preços mais altos, reinvindicam por maiores rendimentos e são atendidos. Por isso que, na avaliação de Schwartsman, a inflação não apresenta tendência à estabilidade e ainda por cima corre um sério risco que ela comece a apresentar uma aceleração gradual nos próximos anos.
Por quê isso ocorre?
De acordo com o economista, esse movimento ocorre devido à atuação do Banco Central, que resolveu ficar de lado, numa dinâmica parecida à observada nos anos 60 e 70, sem que a autoridade monetária tenha tomado medidas proativas do ponto de vista de política monetária.
Com a continuidade de uma inflação alta, aponta Schwartsman, há um momento em que algo drástico deve ser feito, como ocorreu no mandato de Paul Volcker no Federal Reserve, levando a uma das piores recessões nos EUA. Na época, a inflação no país estava entre 14% e 15%.
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“Não estamos lá ainda, mas se o Banco Central não fizer nada a respeito agora, lá na frente ele vai ter que tomar medidas mais drásticas”, aponta o economista.
Construção civil muda dinâmica do mercado de trabalho
Por outro lado, o economista destaca ainda a mudança estrutural no mercado de trabalho ligada à construção civil, que é intensiva em mão-de-obra de baixa qualificação. O boom da construção civil contribuiu para a redução na taxa de desemprego. Atualmente, há um novo fenômeno ocorrendo no País, que é a falta de mão-de-obra não qualificada, afirma o economista, o que é a grande novidade do mercado de trabalho.
Outro fenômeno que está ocorrendo no País é o chamado “entesouramento do trabalho”, em que os empregadores têm dificuldade em demitir em épocas de maior crise por acreditar que, quando houver recuperação, haverá uma grande dificuldade de achar mão-de-obra qualificada no mercado de trabalho.
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Isso explica o crescimento não muito forte da produtividade do Brasil, com o PIB (Produto Interno Bruto) crescendo cerca de metade em 2012 da alta de 2% do emprego no mesmo período.
Câmbio de cobertor curto
O Brasil sofre com uma estrutura consistente de política econômica que tenha o mesmo número de objetivos e instrumentos, avalia o economista. “No caso do câmbio, há um conflito óbvio”, ressaltando que a cotação do real frente ao dólar “flutua” em patamares julgados adequados pelo governo à produção industrial.
“Quer dizer, ele flutua, mas não flutua. Isso é uma coisa que só podia sair da cabeça do Ministro da Fazenda” afirma, citando Guido Mantega. “Agora, é uma síndrome de cobertor curto. Se você for tentar segurar a inflação via câmbio você obviamente, vai descobrir a cabeça, que é a produção industrial. Se você for aquecer a cabeça da produção industrial vai deixar fora os pés da inflação”, destaca Schwartsman.
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Scharwstman ainda destaca que, se o Banco Central está usando o câmbio para conter a inflação, é porque ele se sente constrangido a usar o instrumento clássico de política monetária, que é a taxa básica de juro. Entretanto, ele aponta que uma eventual alta na Selic, de um ponto percentual por exemplo, o efeito será bem pequeno, sendo necessário uma intervenção muito maior para afetar as expectativas do mercado quanto à inflação.
Caso o BC queira reverter as expectativas com o aumento dos juros, Schwartsman foi taxativo. “Francamente, eu duvido que o Banco Central tenha bala na agulha hoje para fazer o que é necessário de política monetária”, afirmou.
BNDES e o “bolsa-empresário”
Sobre a atuação do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) , o economista ressalta a falha de mercado existente no Brasil, após um período de ausência de crédito de longo prazo ligado a um período de hiperinflação muito longa. Com isso, o BNDES entrou para cumprir a lacuna do mercado, mas que mata os mecanismos de longo prazo em períodos de maior estabilidade econômica.
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“Ele (BNDES) passa a operar um subsídio gigantesco, porque, afinal de contas, é a diferença entre a taxa TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), que é a taxa base do empréstimo do BNDES, e o custo da dívida pública. Essa diferença é um subsídio, então ele passa a determinar quais são os campeões nacionais”, afirma o economista.
Apesar de ter sido usado como monumento contracíclico em 2008 e 2009, o BNDES vem aumentando o seu balanço nos anos posteriores, quando a economia já vinha em trajetória de recuperação. Assim, ele virou um instrumento de política industrial e minou os mercados de capitais de longo prazo.
“Cá entre nós, se eu sou acionista de uma empresa e vejo o diretor financeiro da minha empresa indo a mercado buscar recurso, eu obviamente, como acionista, não quero. Eu quero que ele vá buscar dinheiro subsidiado no BNDES. Então matou o mercado de capitais de longo prazo”, afirma Schwartsman.
Neste sentido, ele atua como uma “Bolsa-Empresário”, ressaltando que o repasse de dinheiro para empresas eleitas como as campeãs nacionais é muito maior do que o dinheiro usado em programas de transferência de renda, como o Bolsa-Família. Assim, Schwartsman destaca que é preferível fazer transferências aos mais pobres, ao invés de subsidiar capital aos ricos empresários.