“Não invisto no Brasil por causa dos erros do governo”, diz Jim Rogers

Em evento da BM&FBovespa, investidor diz que atualmente está comprando dólares, embora esteja bastante pessimista com o futuro dos EUA e deixa um conselho: "ensinem seus filhos e netos a falar mandarim"

Thiago Salomão

Jim Rogers (crédito: Wikimedia Commons)
Jim Rogers (crédito: Wikimedia Commons)

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CAMPOS DE JORDÃO* – A participação de Jim Rogers no 6º Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais da BM&FBovespa foi marcada por um misto de bom humor visto em seus conselhos e pessimismo com o futuro da economia – em especial de seu país, os Estados Unidos. Durante mais de 60 minutos, o famoso investidor, que fez fortuna ao lado de George Soros com um fundo de investimento criado 40 anos atrás e já viajou pelo mundo por duas vezes, explicou por que mesmo sem confiar no futuro dos EUA está comprando dólares, criticou enfaticamente as medidas adotadas pelo governo brasileiro, falou sobre a hegemonia que a China terá no século XXI – aconselhando os palestrantes a ensinarem seus filhos e netos a falarem mandarim – e terminou a apresentação de sábado (31) passando uma mensagem encorajadora de como devemos enfrentar a vida.

Brasil está fazendo errado
Para Rogers – que também é mestre em filosofia, política e economia pela Oxford University –, o Brasil não está aproveitando o “Bull Market” (mercado em alta) das commodities do jeito que poderia por conta de algumas medidas tomadas pelo governo do Brasil, como a taxa em produtos estrangeiros e os impostos colocados nas operações cambiais, que inibem os investimentos estrangeiros na agricultura. “O Brasil precisa de capital estrangeiro, expertise para crescer na agricultura, mas o seu governo está dizendo ‘não queremos os estrangeiros aqui nos ajudando a se desenvolver’. Por isso eu não faço mais investimentos aqui no Brasil”, explica o investidor, que disse gostar apenas de algumas commodities locais, como café e açúcar.

Questionado sobre as eleições presidenciais por aqui em 2014, o investidor afirmou que se Dilma Rousseff for reeleita ele certamente não investirá no Brasil novamente, a menos que ela mude sua forma de conduzir a política econômica. “O Brasil precisaria remover todos os controles sobre a moeda, abrir a economia e tirar os subsídios dados. Eu acredito que o Brasil poderia ser uma das maiores economias do mundo, mas certamente isso não irá acontecer”, afirma Rogers. ”Eu tenho que repetir, eu amo o Brasil, mas eu não acho que o governo está tomando as decisões corretas”, complementa.

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Aceite: China será a hegemonia do século XXI
Sobre o gigante asiático, Rogers critica o fato de muita gente mostrar-se cada vez mais pessimista com a China, o que não faz sentido para ele. “Temos que saber que a China será a maior economia do mundo. O século XIX foi do Reino Unido, o século XX dos EUA e o século XXI será da China. Ainda chamam a China de comunistas, mas hoje eles são os melhores capitalistas do mundo”. Ele alerta que claramente haverá um momento de desaceleração, mas isso é normal em qualquer economia. Por isso ele afirma que os problemas atuais da China não podem ser encarados como o fim de uma oportunidade. “Sabemos que a China é uma parceira comercial do Brasil, então aproveitem disso”, diz o ex-parceiro de Soros.

Por conta disso ele reforçou durante sua apresentação a importância de nos prepararmos as próximas gerações para essa hegemonia chinesa. “O melhor conselho que posso lhe passar é que ensinem seus filhos e netos a falar mandarim, porque este será o idioma mais importante do mundo. É um conselho que eu pratico, minhas duas filhas estudam mandarim”, diz Rogers.

Questionado sobre o impacto cultural que a China pode trazer ao mundo, ele espera que com certeza isso reflita nas outras economias no futuro, mas não se mostra tão temeroso com isso. “Temos que lembrar que Portugal e Espanha já disseminaram suas influências no passado. O Reino Unido o fez também no século XIX e os Estados Unidos no último século. A questão é que a China vem aprendendo muito nos últimos anos, eu não posso defender os erros que a China cometeu no passado, mas eu não posso negar as melhoras que eu vejo na china nos últimos 40 e 50 anos; eu só não moro lá por causa da poluição, mas até nisso eles estão se adequando. Por isso estou ensinando minhas filhas a falarem mandarim fluentemente”, afirma.

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Compro dólar, mas só no curto prazo
Sobre seus investimentos recentes, Rogers disse que tem comprado dólares, justificando isso ao momento atual de forte volatilidade no mercado cambial e também à maior probabilidade dos Estados Unidos entrarem em guerra com a Síria. “O Obama (Barack Obama, presidente dos EUA) tem se mostrado bastante inclinado em entrar na guerra. Se isso acontecer, será uma grande loucura por parte do governo e vamos ter sérios problemas por conta disso”, afirma. Rogers espera ver esse cenário ainda volátil pelos próximos 2 ou 3 anos.

Embora esteja comprando divisas norte-americanas, o investidor é enfático ao dizer o quão pessimista está com a economia norte-americana. “Temos diminuído nosso crescimento e o endividamento tem ficado muito alto. Eu não acredito que os EUA manterão a hegemonia atual até 2020 e daí as pessoas vão começar a se afastar do dólar. Não sei se eles vão buscar o ouro, prata ou a moeda chinesa, mas os EUA não devem sobreviver à próxima recessão”, projeta. “Todos sabemos que o dólar ainda é a principal moeda do mundo, mas temos visto o país ser o centro dos maiores problemas do mundo atualmente. Eu não gosto de dizer isso por ser americano, mas hoje o mundo está saindo dos EUA e indo para a Ásia por causa da crise financeira e pelos erros cometidos por nossos políticos”, complementa.

Mas se Rogers está tão pessimista com os EUA e sua moeda, por que está comprado em dólar? “Muitas pessoas vão atrás do dólar por acharem que ele é um porto seguro. Mas ele não é um porto seguro, as pessoas apenas acham isso. Por esse motivo eu tenho dólar hoje, pois ainda haverá demanda pela moeda”, explica o investidor.

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Não quer falar mandarim? Vire fazendeiro
Já tendo citado sua preferência em investir em commodities, Rogers faz uma análise interessante sobre o segmento da agricultura, que tem visto seus produtores “sumirem”. De acordo com o investidor, a idade média dos agricultores nas principais economias do mundo não fica abaixo de 55 anos, ou seja, não temos vistos novos fazendeiros no mercado agrícola. “Eu não vejo agricultura com muitos bons olhos, as pessoas estão se aposentando ou morrendo e eu não vejo novos fazendeiros. Por essa falta de oferta os preços devem subir forte”, afirma o investidor.

Dentre os materiais básicos que investe, Rogers destaca o açúcar, produto o qual o Brasil é um dos maiores produtores do mundo. A cotação da matéria atualmente está bem abaixo da sua máxima histórica alcançada em 74, o que colabora para sua expectativa de que o movimento de alta seja visto na commodity. “Com exceção do minério de ferro, vejo um ‘bull market’ para as outras commodities pois não há ofertas suficiente para os próximos anos. É o caso do petróleo, cujas reservas estão em declínio”, conclui. O investidor inclusive fez uma piada sobre os sachês de açúcar que são dados juntos ao café durante o evento: “queria agradecer ao Edemir (Edemir Pinto, presidente da BM&FBovespa) por nos dar açúcar de graça, isso sim vale dinheiro”.

Diante desse cenário desenhado, Rogers recomenda aos palestrantes que, se eles quiserem fazer algo diferente de ensinar o filho a falar a língua chinesa, então que ensinem eles a virar fazendeiros.: “Ou melhor: tenha um filho, ensine-o a dirigir um trator e a falar mandarim. Você terá um fazendeiro chinês”, brinca o investidor.

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Comprar ações? Só se Bernanke manter o QE3
Sobre o mercado de ações, Rogers diz que não está muito otimista principalmente pela expectativa de cenário inflacionário no país e pelo risco de uma guerra eclodir em breve. Contudo, ele faz uma ponderação importante: “eu sou o pior trader de ações do mundo”, brinca ele, falando sobre sua falta de sorte no mercado acionário. Os principais índices acionários norte dos EUA estão próximos de suas máximas históricas, e Rogers só acredita que essa tendência ascendente irá se manter caso o Federal Reserve mantenha ativo o QE3 (Quantitative Easing 3), programa do banco central norte-americano que consiste na compra mensal de até US$ 85 bilhões em títulos públicos.

“Só vamos ver as bolsas subindo caso Bernanke (Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve) decida seguir imprimindo dinheiro, já que é só isso que ele sabe fazer”, critica o investidor. “Se ele fizer isso, tudo vai subir, mas em compensação o dinheiro vai perder ainda mais o seu valor, ou seja, esses ganhos não valerão nada”, complementa.

De maio pra cá, os mercados têm respondido com forte volatilidade às sinalizações de presidentes regionais do Federal Reserve sobre quando será dado o início da retirada dos estímulos mensais dados pelo governo dos EUA. Uma boa parte do mercado espera que o Fed comece a retirada do QE3 ainda neste ano, com uma parcela de analistas já prevendo esse início ainda em setembro.

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Oportunidades: todo desastre tem seu fim
Embora tenha dito que não tem investido em muitos países, Rogers fez questão de destacar algumas economias que, após um histórico nada favorável de crises e guerras, estão apresetando melhorias significativas. É o caso da Colômbia, Venezuela e até mesmo a Coreia do Norte. “Durante estes mais de 40 anos que eu viajo pelo mundo conhecendo os países eu descobri uma coisa muito importante: todo desastre tem o seu final”, diz o investidor, que cita a própria China como exemplo.

Quando questionado sobre como ele enxerga “mudanças fantásticas” na Coreia do Norte, Rogers deixou a modéstia de lado para responder: “muitas pessoas vão discordar de mim, mas eu provavelmente estarei certo”, disse o investidor, provocando risos dos palestrantes, que foi seguida por uma salva de palmas.

Faça o que te faz feliz
Para fechar a apresentação, Rogers respondeu à pergunta sobre qual o principal conselho ele poderia dar depois de tantos anos viajando pelo mundo – atualmente com 70 anos, Rogers se “aposentou” aos 37 anos. “Entenda aquilo que você gosta, que te faz feliz. E se isso não te der dinheiro, isso não importa, porque você vai estar feliz. Daí você vai ter sucesso. Você não tem que fazer aquilo que sua mãe ou seu pai mandou você fazer. Você tem que fazer aquilo que você gosta. Nunca é tarde demais para mudar a sua vida. Com 47 anos eu dei a volta ao mundo dirigindo uma moto, que era um sonho que eu sempre quis realizar. Se você não tentar, um dia você vai ter 75 anos, vai acordar e dizer ‘eu nunca tentei’”, finaliza o investidor viajante.

*O jornalista Thiago Salomão viajou ao evento à convite da BM&FBovespa.

Thiago Salomão

Idealizador e apresentador do canal Stock Pickers