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A computação em nuvem está crescendo e, para suportar toda a demanda — puxada principalmente pela evolução da inteligência artificial —, empresas têm expandido a infraestrutura de data centers e serviços de armazenamento no Brasil.
Na última terça-feira (28), a controladora e presidente do conselho do Magalu, Luiza Trajano, anunciou que sua empresa passaria a oferecer um serviço de nuvem para que os dados de clientes permaneçam no Brasil. O argumento da executiva também é de que soluções em nuvens brasileiras podem evitar o risco cambial para empresas – já que os serviços prestados por estrangeiros sofrem com a oscilação do dólar — ideia compartilhada por outros players desse mercado.
Segundo Trajano, a princípio, o serviço é apenas parte da área digital da empresa, mas deve se tornar uma unidade independente para atender micro e pequenos empresários. E a concorrência não será nada modesta. Hoje, o mercado de serviços de nuvem é dominado por algumas das principais empresas de tecnologia do mundo, como Google, Microsoft e Amazon.
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Essas empresas são chamadas de hyperscalers, ou hiperescaladores, provedores de nuvem em larga escala. Companhias como essas são as principais responsáveis por acomodar a procura cada vez maior por capacidade computacional iniciada com a explosão do ChatGPT.
Além das próprias big techs, no entanto, empresas que projetam e constroem os data centers utilizados pelas big techs para alocar o hardware necessário para a computação em nuvem foram impactadas pela mudança. Agostinho Villela, vice-presidente de engenharia da Scala Data Centers, considera o ChatGPT um “cisne negro” para o mercado, que fez os indicadores de demanda por nuvem duplicarem ou triplicarem.
Ele explica que a pandemia havia aquecido o mercado devido ao aumento da digitalização nas empresas e, por consequência, à necessidade de armazenamento. Havia uma tendência de estabilização desse movimento este ano, mas aí veio o Chat GPT. “A indústria ainda não conseguiu nem entender todas as implicações da IA generativa […] Se pensarmos que a tendência dela é multimodal: processar também imagem, som e, futuramente, vídeo, esse número só deve crescer”, diz Villela.
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A Scala, fundada em 2020, a partir da compra de dois data centers do UOL, evoluiu de 25 MW de TI para 70MW de TI (unidade de medida que mensura a evolução de operações nesse mercado) em três anos, expandindo sua operação para oito data centers espalhados por cinco campi. Segundo a consultoria Arizton, o mercado de data centers deve crescer 8,26% no País entre 2022 e 2028 e hoje já representa 50% dos investimentos no setor na América Latina.
Uma outra justificativa para o aumento na demanda por data centers no Brasil tem a ver com um movimento de soberania de dados — isto é, preservação de informações em servidores, sejam eles proprietários das empresas ou em nuvem, no território brasileiro. Esse é, em parte, o argumento de Luíza Trajano, ao dizer que “nossos dados estarem no Brasil é uma garantia. Porque todos os nossos dados estão nos Estados Unidos ou na China”.
A manutenção de dados dentro do Brasil também tem sido estimulada, segundo alguns especialistas, pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Apesar de não obrigar que empresas mantenham as informações de seus clientes armazenadas no Brasil, o artigo 33 da lei menciona que dados só podem ser transferidos para países ou organismos que proporcionem um grau de proteção similar ao da lei brasileira. “Ainda que o tema não seja 100% pacificado pela lei brasileira, a simples hipótese da transferência de dados vir a ser uma questão levou as empresas, principalmente em segmentos muito regulamentados, a terem essa preocupação”, diz Villela.
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O executivo explica que todo esse processo ainda é catalisado pela expansão da rede de 5G no País, que aumenta a necessidade de computação devido ao tempo de resposta mais veloz da frequência.
Potencial para o Brasil
A dinâmica de distribuição de data centers no mundo tem passado por alterações e a sustentabilidade da concentração de complexos gigantes de servidores em algumas localidades já começa a ser questionada. A região de Northern Virginia, nos Estados Unidos, maior área de data centers no mundo, ao menos três vezes que o segundo colocado, Singapura, viu sua demanda energética para abastecer servidores quadruplicar nos últimos 15 anos.
Em função desse movimento, muitos dos dados alocados no país têm passado por um movimento chamado de reshoring digital: com a priorização da demanda doméstica, dados são repatriados para servidores em seu país de origem.
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O Brasil tem uma posição interessante frente ao mundo devido à disponibilidade energética para manter os data centers, que hoje consomem entre 1,5% e 2% de toda a energia no planeta. Para se ter ideia, quando completo, o campus de Tamboré da Scala, principal estrutura da empresa, consumirá 600 MW de energia, valor equivalente ao consumo de Brasília.
Segundo a Arizton, o mercado de data centers sustentáveis deve saltar dos atuais US$ 891 milhões para US$ 1,65 bilhões em 2028. “Existe uma grande possibilidade de o Brasil avançar devido aos recursos energéticos abundantes, porém, em contrapartida, temos que ver outros aspectos importantes para as empresas. Por exemplo, a segurança dos dados”, diz Gabriel Gomes de Oliveira, membro do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE) e pesquisador pelo Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer.
Para Gomes, mesmo que a LGPD tenha representado um avanço regulatório para garantir maior segurança de dados, o país ainda esbarra em lacunas de mão de obra e infraestrutura, como a própria evolução do 5G, ainda muito restrita aos grandes centros. “A meu ver, [o avanço da busca por data centers brasileiros] vai depender muito do tipo do dado que está se trabalhando. Se não forem dados tão voláteis, e a maioria dos dados não são, é possível que o país seja um mercado forte”, diz.