C&A espera efeito da redução dos juros só para 2024

Varejista continua com a mão firme na tesoura, cortando investimentos e despesas operacionais para fazer frente a aumento das despesas financeiras

Lucas Sampaio

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O início do ciclo de queda dos juros, segundo o CEO da C&A, Paulo Correa, ainda não permite à companhia baixar a guarda. O endividamento das famílias, diz ele, deve frear a retomada do consumo, e o efeito do alívio monetário deve ser percebido apenas em 2024. O segundo semestre ainda será de rédeas curtas nos custos e investimentos.

Em meio à “tempestade perfeita” dos juros altos e da concorrência das varejistas asiáticas, a C&A tem tentado se equilibrar entre dois pilares: melhorar sua eficiência operacional, cortando custos e melhorando a gestão da dívida, e investir em tecnologias que lhe permita ser mais ágil para responder ao comportamento dos consumidores nos dias atuais.

A explosão do fenômeno Barbie é um retrato deste novo comportamento e do “dinamismo do mundo, que hoje está nas redes sociais”, afirma Correa. A empresa, disse ele, preparou-se para a estreia do filme nos cinemas, com produtos diversos licenciados, mas a demanda surpreendeu. “O mundo rosa invadiu o país.”

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“Como prever isso? Não tem como, mas você precisa ser ágil e ter cadeias produtivas mais ágeis”, afirma Correa, que conversou com a reportagem antes de a empresa entrar no período de silêncio que antecede a divulgação do balanço do segundo trimestre. “Tivemos a capacidade de muito rapidamente reorganizar as lojas para mostrar tudo o que tínhamos  de rosa. E vendeu muito mais do que a gente esperava vender. Voou, sumiu tudo, poderíamos ter vendido mais”.

A mesma estratégia foi utilizada no e-commerce: uma pesquisa por “Barbie” no site da C&A traz apenas seis roupas licenciadas da boneca mais famosa do mundo nas primeiras posições, na organização por relevância, mas a busca traz mais de 800 resultados, com todo tipo de produto rosa que o cliente possa imaginar (inclusive roupas não licenciadas).

Uma das maiores redes de varejo do mundo, a holandesa C&A tem no Brasil 332 lojas (quase 20% do total), mais de 15 mil funcionários e está em 125 cidades. Suas ações já subiram mais de 200% desde 1º de março (de menos de R$ 2 para quase R$ 6), mas ainda estão muito longe do valor do IPO (R$ 16,50), feito em outubro de 2019, e do pico histórico (R$ 18,50), batido em 13 de dezembro do mesmo ano.

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Correa diz que o papel está sendo “penalizado” pelo “achatamento” de valor das empresas de varejo em geral, além da taxa de juros (o custo de captação da empresa é CDI+2,16%). Caracterizado pelo consumo cíclico e demanda elástica, o varejo de moda vem sentindo mais os reflexos dos juros altos, que, além de aumentar as despesas financeiras das empresas, pesam sobre o endividamento e a inadimplência dos consumidores.

Corte de custos, mas ainda no prejuízo

O executivo disse que colocou “uma lupa enorme em cada linha de despesa”, reduziu investimentos e despesas operacionais e não abriu nenhuma nova loja no primeiro trimestre (no quarto trimestre de 2022 havia sido apenas uma).

Paulo Correa, CEO da C&A Brasil (Foto: Divulgação)

Foram revistos desde contratos com fornecedores até licenças de softwares, além do corte de pessoal. Não houve desligamentos em larga escala, mas a reposição de quem deixou a empresa passou a ser muito mais seletiva. Nas despesas com marketing, a C&A não renovou o patrocínio com o BBB e deu prioridade aos posts que geram mais retorno. Nas entregas em vendas digitais, o custo do frete ganhou relevância, não apenas os estoques em cada centro de distribuição.

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“Nenhuma linha de despesa passou ‘lisa’. Não foi uma fórmula mágica, uma ‘bala de prata’. Foi olhar pedaço por pedaço da companhia para encontrar um caminho”, diz o executivo. Mas, mesmo aumentando receitas em 3,6% e reduzindo investimentos em 10,3% e  despesas operacionais em 12,5%, no primeiro trimestre a empresa ainda teve um prejuízo de R$ 126 milhões. Foi um resultado “menos pior” que o do primeiro trimestre de 2022, mas ainda assim um prejuízo. Com o impacto dos juros, o resultado financeiro piorou 47,2%, de R$ 68,6 milhões no primeiro trimestre de 2022 para R$ 101 milhões.

“A gente está em uma jornada em que o principal vilão é o endividamento. Embora tenhamos uma dívida saudável e uma alavancagem controlada, o custo do endividamento é alto” (a empresa gastou R$ 499 milhões só com a rolagem da dívida no primeiro trimestre).

Apesar de o papel ainda cair 64% em relação à abertura de capital, o executivo afirma que “a companhia, operacionalmente, está em uma fase melhor do que antes do IPO”. Então vamos recuperar esse valor [de mercado], porque é uma empresa melhor e com resultados melhores do que no IPO. E vamos recuperar esse valor de mercado através de resultados consistentes”.

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O research da XP tem recomendação neutra para C&A e um preço-alvo de R$ 3,50 para a ação, uma queda de quase 40% em relação ao patamar atual. A aposta atual é na resiliência do varejo de moda de alta renda, em nomes como Arezzo, Grupo Soma e Grupo SBF (Centauro), ou na Renner, concorrente direta da C&A.

Danniela Eiger, head de varejo do research da XP, está com uma visão cautelosa para o varejo em geral e destaca que o setor de moda sofre mais no cenário atual. “Apesar da queda de juros, a Selic ainda deve ficar em duplo dígito até 2024. Ainda é um ofensor importante, em termos de consumo. E, por mais que a inflação esteja desacelerando, ela ainda está alta e as famílias ainda estão endividadas”.

Lucas Sampaio

Jornalista com 12 anos de experiência nos principais grupos de comunicação do Brasil (TV Globo, Folha, Estadão e Grupo Abril), em diversas funções (editor, repórter, produtor e redator) e editorias (economia, internacional, tecnologia, política e cidades). Graduado pela UFSC com intercâmbio na Universidade Nova de Lisboa.