Publicidade
Num segmento em que a demanda global encolheu nas últimas duas décadas, um ano de forte alta de preços normalmente deixa de ser comum. Mas como a oferta desabou de dois anos para cá, 2023 é um desses pontos fora da curva no mercado de suco de laranja.
O cenário beneficia as brasileiras Citrosuco e Cutrale e a francesa Louis Dreyfus Company, que lideram as exportações mundiais da bebida a partir da produção concentrada em São Paulo e deverão colher bons resultados com a valorização de seu carro-chefe.
Mas, acima de tudo, confere fôlego para a ampliação de investimentos em frentes capazes de garantir rentabilidade quando os preços voltarem a se equilibrar em um patamar mais baixos: sanidade e produtividade agrícola, eficiência industrial, inovação e diversificação,
Continua depois da publicidade
É o que está fazendo a Citrosuco, a maior companhia do segmento, com faturamento que deverá superar R$ 5 bilhões este ano, segundo estimativas de mercado. Com sede em Matão, no interior paulista, a empresa controlada pelos grupos Fischer e Votorantim quer liderar a corrida.
“Em primeiro lugar, suco de laranja não é commodity, é um produto de consumo diário nos lares. Mas laranja não é só suco, é uma fruta ainda limitada em termos de portfólio. Tem muito para dar”, afirmou Marcelo Abud, CEO da Citrosuco, ao IM Business.

O executivo, que tem 48 anos, assumiu o cargo em julho de 2022. Antes disso, ocupou cargos de liderança na Anheuser-Busch InBev, Ambev, Delly’s Food Service e, entre abril de 2021 e meados de 2022, na Lavoro, que ajudou a transformar em uma das maiores redes de revendas de insumos agrícolas do país.
Continua depois da publicidade
Logo depois da chegada de Abud, em novembro do ano passado, a Citrosuco deu uma tacada importante para a diversificação dos negócios e anunciou a criação da Evera, subsidiária que produz ingredientes naturais para diversos setores, mas principalmente para alimentos e bebidas.
Com a Evera, a companhia busca aproveitar melhor as oportunidades de abertura de mercados para polpa e fibra da laranja, e para partes da fruta ainda subutilizadas, como bagaço, folhas, flores e sementes.
Para criar a subsidiária, a Citrosuco investiu durante alguns anos quase R$ 10 milhões em pesquisas, desenvolvimento e na estrutura inicial de produção. A previsão é que o novo braço fature pelo menos US$ 100 milhões em 2024.
Continua depois da publicidade
“Acreditamos que o consumidor do futuro vai consumir mais laranja, mas em outras opções”, disse Abud. Mas a fruta continuará a ser a matéria-prima de um dos sucos mais consumidos do mundo, embora a demanda global esteja relativamente estagnada.
O Brasil responde por cerca de 75% das exportações mundiais da bebida, e na safra 2022/23, encerrada em junho, os embarques do país alcançaram 1 milhão de toneladas equivalentes de suco de laranja concentrado e congelado (FCOJ), volume estável ante os dois ciclos anteriores.
Na década passada, contudo, o país exportava entre 1,2 milhão e 1,3 milhão de toneladas por temporada. Em boa medida, essa estagnação, interrompida pelo aumento do consumo durante a pandemia, reflete a proliferação de concorrentes no mercado, como sucos de outras frutas, néctares e refrescos, muitos deles mais baratos.
Continua depois da publicidade
Ocorre que, também nas últimas décadas, a produção de laranja da Flórida, que no passado dava as cartas nesse segmento e foi a grande inspiração da indústria brasileira, sofreu uma derrocada por causa de adversidades climáticas e da doença conhecida como greening.
A atual produção de laranja da Flórida é dez vezes menor que há dez anos, o que vem tornando a oferta de suco cada vez mais ajustada à demanda. E os reflexos negativos do La Niña em 2021 e 2022 sobre o cinturão citrícola brasileiro, concentrado em São Paulo e Minas Gerais, dizimou estoques de suco e abriu espaço para o atual ciclo de alta de preços.
Na safra 2022/23, a receita das exportações brasileiras de suco de laranja voltou a superar a marca de US$ 2 bilhões depois de quatro temporadas, segundo dados da CitrusBR, entidade que representa as grandes empresas exportadoras. “De dois anos para cá, o preço do FCOJ quase dobrou”, lembrou Abud.
Com a valorização do produto, o lucro da Citrosuco antes de juros, impostos, amortização e depreciação (Ebitda) alcançou cerca de R$ 200 milhões na safra passada. E a tendência é que o cenário de preços elevados perdure pelo menos até a definição do tamanho da próxima safra de laranja no Brasil.
O preço alavanca os resultados da indústria, disse o executivo, mas a queda dos estoques aos menores níveis da história preocupa. “Estamos conseguindo cumprir nossos contratos com os importadores, mas se a próxima safra de laranja [2024/25] for menor que a atual, teremos uma ruptura no mercado”, afirmou.
A Citrosuco, criada pelo grupo Fischer, não vende suco no mercado doméstico e é a líder das exportações. Superou a Cutrale, cuja sede é em Araraquara, também no interior paulista, quando fundiu operações com a Citrovita, da Votorantim. A operação foi aprovada pelo Cade no fim de 2011.
O clima não é a única variável que influencia a produção de laranja. O greening, doença causada por uma bactéria que surgiu há 20 anos no mundo, também prejudica o cinturão citrícola de São Paulo e Minas, embora muito menos que o da Flórida.
Em parte, realçou Abud, porque a cadeia produtiva brasileira logo centrou esforços no combate ao vetor que transmite a doença – que é um psilídeo, um inseto de 2 milímetros. Nos EUA, o foco foi descobrir uma cura, o que até hoje não aconteceu, embora investimentos nesse sentido já tenham superado US$ 2 bilhões.
Outra diferença é que, desde o início, no Brasil as árvores infectadas tiveram que ser erradicadas, segundo orientação de órgãos como o Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), mantido com contribuições de produtores de laranja e indústrias de suco. Na Flórida até hoje há muita resistência a esse tipo de medida.
Para se tornar mais resiliente ao clima e ao greening, a cadeia produtiva tem unido esforços para contar com novas variedades de laranja. Investimentos em novas tecnologias como drones e na conectividade das fazendas de laranja são expressivos na Citrosuco, e novas fronteiras para o cultivo em escala industrial também estão no radar.
“Na região central de Minas Gerais, a incidência de greening é inferior a 1%. E em áreas da Bahia que podem receber pomares, até agora não foi registrada infecção. É outra vantagem do Brasil em relação à Flórida, onde a produção não tem para onde crescer”, observou o CEO da Citrosuco.
A companhia conta atualmente com 26 fazendas, com 73 mil hectares no total e produção de laranja auditada por consultorias externas. A fruta é processada em três plantas, todas em São Paulo (Matão, Catanduva e Araras).
No exterior, tem escritórios nos EUA, na Bélgica, na Áustria, no Japão e na China. Para garantir melhores margens no comércio conta com cinco navios dedicados e terminais portuários em Santos, nos EUA, na Bélgica, no Japão e na Austrália. A companhia tem 5,3 mil funcionários, número que cresce para 12 mil durante a colheita de laranja.
You must be logged in to post a comment.