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Eles são muitos, se espalham como um polvo malévolo por todas as partes e dominam a maioria das posições de influência ou decisão nas principais instituições nacionais, incluindo algumas grandes entidades de classe de natureza empresarial. No entanto, apesar de muitos, todos eles juntos não passam de uma pequena minoria diante do tamanho da sociedade brasileira que os sustenta. Assim, a ação nefasta dos burocratas e dos aloprados nada mais é do que a ditadura de uma minoria que submete e asfixia a imensa maioria dos brasileiros com decisões absurdas, obrigações estapafúrdias, regramentos irracionais, preferências tecnológicas duvidosas e escolhas filosóficas antiquadas. Isso ocorre, apesar da desproporção numérica apontada, por conta dos mecanismos de delegação de competência que foram sendo progressivamente adotados, seja no âmbito legal, seja na regulamentação administrativa, e que acabaram fazendo com que essas categorias de semideuses amealhassem um incrível poder de interferência na economia, na administração e na vida diária das pessoas comuns. Menciono e nomeio duas categorias porque o sistema resulta da simbiose dos burocratas, formados no âmbito interno das estruturas administrativas – que incluem aqueles que usualmente são designados como “corpo técnico”, e dos aloprados, dispersos no meio político, encastelados em cargos chave ou agrupados em ONGs que dependem do Estado – que incluem tanto o conjunto que costuma ser identificado como “formadores de opinião errada”, como os “populistas”, nostálgicos de ideologias superadas.
Já apontei, explicitamente, alguns efeitos desastrosos da ação desse sistema no setor imobiliário, que conheço mais de perto. Lembro-me de ter abordado diversas vezes os custos elevadíssimos e a perda de produtividade gerados pela burocracia infernal na aprovação de projetos e no licenciamento de empreendimentos, sem qualquer vantagem para a sociedade. Mencionei, também, em texto específico, a questão das novas tomadas de energia (plugues) que se tornaram obrigatórias no Brasil com a ação combinada do CONMETRO – Conselho Nacional de Metrologia, Normatização e Qualidade Industrial (Resolução N° 08), com a ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas (Norma NBR 14136) e atos subseqüentes. O fato é que ficaram proibidas no Brasil, a partir de 01/01/2010, a fabricação e a importação de aparelhos elétricos ou eletrônicos que não tivessem rigorosamente de acordo com o novo padrão (particularíssimo e que não encontra similar em todo o mundo). Os mesmos atos proibiram, também e expressamente, a comercialização do padrão antigo em todo o território nacional a partir 01/07/2011. Mais uma vez, os tecnoburocratas agiram com o seu viés habitual, já que para eles, todas as coisas devem ser classificadas, unicamente, como “proibidas” ou como “obrigatórias”. Não existe meio termo. Na ocasião, para ilustrar o absurdo da situação, observei que os proprietários de todas as unidades habitacionais construídas pela MRV Engenharia no padrão antigo teriam uma despesa total para a conversão obrigatória, da ordem do custo integral de construção de 250 unidades habitacionais novas! O mais importante é que tratava-se da reedição de um mau passo, se consideradas todas as conseqüências perniciosas de decisões anteriores, que abrangeram desde o especialíssimo padrão PAL-M adotado no nosso sistema de TV em cores até o famigerado formato Telebrás criado para as conexões telefônicas que adotou uma base enorme, de 4 x 4 cm, com quatro pinos chatos de grande tamanho.
Nesses exemplos, eu não precisaria ater-me às coisas diretamente ligadas ao mercado imobiliário. Outras situações absurdas do mesmo tipo afetam diretamente a economia das pessoas comuns. Quem já se conformou com a trapalhada produzida recentemente pelo CONTRAN – Conselho Nacional de Trânsito, que, em incompreensível sucessão, decidiu pela obrigatoriedade de um tipo novo de extintor de incêndio para veículos (ABC) e, logo em seguida, aboliu o uso desse equipamento e de qualquer outro, por dispensável e contraproducente? Esses não são exemplos esparsos e raros. Se examinarmos as decisões que reservam terras e terrenos para a ocupação por parte de uma fração desproporcionalmente pequena da nossa sociedade (terras indígenas ou invasões urbanas, por exemplo) ou aos impedimentos e obstáculos impostos indevidamente a um grande conjunto de atividades produtivas, fica muito mais fácil entender a nossa perda progressiva de produtividade interna e a nossa dificuldade crescente de competição no mercado globalizado. Precisamos modificar isso, enquanto ainda é possível.