Não, não é uma boa ideia tornar as leis mais duras para os mais ricos

E é assim que funciona o nosso sistema tributário. As pessoas que já pagam os impostos mais altos obterão naturalmente o maior benefício de uma redução de impostos

Marcelo López

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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Há muito tempo venho falando sobre os problemas criados pela impressão desenfreada de dinheiro por parte dos bancos centrais, somada à redução forçada da taxa de juros, movimentos que, como previ, não alcançaram seus objetivos, mas conseguiram gerar diversos efeitos colaterais.

Talvez o pior deles tenha sido tornar ainda mais pronunciada a diferença entre as classes sociais, fato mencionado recentemente por Ray Dalio em seu livro Debt Crises e, mais recentemente, por Howard Marks em um de seus famosos memorandos.

Com uma taxa de juros mantida artificialmente baixa, aqueles com ativos reais ou dinheiro para adquiri-los, têm uma vantagem monstruosa sobre os que não possuem.

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Com o volume de dinheiro aumentando no mundo devido à atuação dos bancos centrais, o dinheiro perde seu valor ou, como a maioria das pessoas prefere enxergar, os ativos sobem de preço.

Uma pequena explicação é pertinente aqui: inflação, por definição, é simplesmente um aumento na base monetária, que é “inflada”. Aumento de preços é consequência da inflação. Com mais dinheiro em circulação, há mais procura por ativos reais, que acabam “se valorizando”.

O mais intrigante, e algo sobre o qual poucos param para refletir, é que o caminho natural é o da redução de preços dos ativos, ou seja, eles deveriam custar cada vez menos.

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Com novas e aprimoradas técnicas de produção, seja de alimentos ou de bens, conseguimos produzir mais, em menos tempo e com menos recursos. Então, não fosse a intervenção dos bancos centrais na economia, veríamos os preços caindo, ao invés de subindo, e o nível de vida das pessoas melhorando. Mas eu divago.

Voltando ao assunto dos ativos reais, as pessoas que conseguem adquiri-los se beneficiam enormemente, já que a apreciação dos mesmos garante proteção patrimonial contra os efeitos nefastos da inflação. A valorização das propriedades e bens é mais que suficiente para neutralizar o aumento do custo de vida associado a alimentação e transporte, por exemplo.

Com isso, a desigualdade entre aqueles que possuem bens e os que não possuem é exacerbada, chegando a mais um efeito maligno dessa intromissão dos bancos centrais na economia: o conflito entre classes.

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No seu mais recente memorando, o qual eu recomendo que todos leiam, Howard Marks fala sobre o crescimento do populismo no mundo, especialmente nos EUA, onde uma nova classe de políticos está emergindo contra o próprio capitalismo.

Incapazes de estabelecer o correto nexo causal, essa nova classe política culpa o capitalismo por tudo e sugere que há como os ricos pagarem mais para ajudar aqueles que nada têm. É muito fácil fazer essa sugestão e ela tem um apelo popular muito grande, embora crie um problema maior que aquele que ela se propõe a resolver.

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Abaixo, compartilho uma história trazida no memorando de Marks, pois a achei muito válida e de fácil compreensão.

Suponha que, todos os dias, dez homens saiam para tomar cerveja e que a conta para todos os dez chegue a $100. Se pagassem a conta da maneira como pagamos nossos impostos, seria algo assim:

Os primeiros quatro homens (os mais pobres) não pagariam nada.
O quinto pagaria $1.
O sexto pagaria $3.
O sétimo pagaria $7.
O oitavo pagaria $12.
O nono pagaria $18.
O décimo homem (o mais rico) pagaria $59.

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Eis o que eles decidiram fazer:

Os dez homens bebiam no bar todos os dias e pareciam muito felizes com o arranjo, até que um dia o dono fez algo inesperado. “Como vocês são todos bons clientes”, ele disse, “vou reduzir o custo de sua cerveja diária em $20”. As bebidas para os dez homens agora custariam apenas $80.

O grupo ainda queria pagar sua conta da maneira como pagamos nossos impostos. Então os primeiros quatro homens não foram afetados. Eles ainda beberiam de graça. Mas e os outros seis? Como eles poderiam dividir o lucro de $20 para que todos recebessem sua parte justa?

O dono do bar sugeriu que seria justo reduzir a conta de cada homem em uma porcentagem mais alta do que ele era, para seguir o princípio do sistema tributário que eles estavam usando, e ele começou a sugerir os novos valores mais baixos que cada um deveria pagar agora.

E assim o quinto homem, como os quatro primeiros, agora não pagou nada (uma economia de 100%).
O sexto agora pagou $2 em vez de $3 (uma economia de 33%).
O sétimo agora pagou $5 em vez de $7 (uma economia de 29%).
O oitavo agora pagou $9 em vez de $12 (uma economia de 25%).
O nono agora pagou $14 em vez de $18 (uma economia de 22%).
O décimo agora pagou $50 em vez de $59 (uma economia de 15%).

Os quatro primeiros continuaram a beber de graça, e os últimos seis gastaram menos do que antes. Mas, uma vez fora do bar, os homens começaram a comparar suas economias.

“Só ganhei $1 da economia de $20”, declarou o quinto homem. Ele apontou para o décimo homem: “Mas ele ganhou $9!”

“Sim, isso mesmo”, exclamou o sexto homem. “Eu só economizei $1 também. É injusto que ele tenha economizado nove vezes mais que eu!

“Isso é verdade!”, Gritou o sétimo homem. “Por que ele deveria receber $9 de volta, quando eu ganhei apenas $2? Os ricos sempre se dão bem!

“Espere um minuto”, gritaram os primeiros quatro homens em uníssono, “nós não conseguimos nada. Este novo sistema tributário explora os pobres!”

Os nove homens cercaram o décimo e o espancaram.

No dia seguinte, o décimo homem não apareceu, então os outros nove sentaram e tomaram suas cervejas sem ele. Mas quando chegou a hora de pagar a conta, eles descobriram algo importante: juntos, eles não tinham dinheiro suficiente para a metade da conta!

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E é assim que funciona o nosso sistema tributário. As pessoas que já pagam os impostos mais altos obterão naturalmente o maior benefício de uma redução de impostos. Taxe-os demais, ataque-os por serem ricos e eles podem simplesmente não aparecer mais. Na verdade, eles podem começar a beber no exterior, onde a atmosfera é mais amistosa.

Como é muito mais fácil para um rico mudar de país do que para um pobre, tornar a legislação e a jurisdição hostis aos mais abastados pode não ser uma boa ideia para o país. Culpar o capitalismo pelos problemas criados pelo “capitalismo dos amigos”, aqui representado pelo Estado e pelo banco central, tampouco é intelectualmente sensato.

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Marcelo López

Marcelo López tem certificação CFA, é gestor de recursos na L2 Capital Partners, com MBA pelo Instituto de Empresa (Madrid, Espanha) e especialização em finanças pela principal escola de negócios da Finlândia (Helsinki School of Economics and Business Administration). Atuou como Gestor de Carteiras e de Fundos em grandes gestoras internacionais, tais como London & Capital e Gartmore Investment Management.