O ano da convergência ao Bitcoin

Nas últimas semanas, tenho percebido uma tendência interessante. A cobertura midiática sensacionalista acerca do preço do bitcoin está sendo substituída por notícias de empresas, comerciantes, etc., que passaram a aceitar bitcoins como meio de pagamento. E, em paralelo, alternam-se os bancos centrais e reguladores mundo afora nos seus comunicados de alerta e perigo. Enquanto uns enxergam oportunidades, outros, apenas riscos e ameaças. A verdade é que a convergência ao Bitcoin está se materializando.

Fernando Ulrich

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Nas últimas semanas, tenho percebido uma tendência interessante. A cobertura midiática sensacionalista acerca do preço do bitcoin está sendo substituída por notícias de empresas, comerciantes, etc., que passaram a aceitar bitcoins como meio de pagamento. E, em paralelo, alternam-se os bancos centrais e reguladores mundo afora nos seus comunicados de alerta e perigo. Enquanto uns enxergam oportunidades, outros, apenas riscos e ameaças.

De certa forma, a postura dos entes públicos é plenamente compreensível. Aliás, é esperada. Não aguardem aplausos de algum órgão regulador, nem apoio ou qualquer atitude efusiva, oriunda do setor público, em relação às moedas digitais. Afinal de contas, como guardiões da moeda e da estabilidade financeira, bancos centrais e reguladores têm por ofício a incumbência de gritar fogo ao menor sinal de perigo. É verdade que falharam grosseiramente na crise de 2008 – quando, ao invés de gritar fogo, jogaram gasolina na fogueira –, mas isso é discussão para outro momento.

A reflexão que interessa aqui é, por um lado, não menosprezar a relevância de cada decisão de adesão ao Bitcoin e suas consequências no mercado, e, por outro, buscar compreender a importância da adoção do Bitcoin pelo comércio em geral ao futuro da moeda digital.

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Antes de tudo, é preciso visualizar o abismo que separa as decisões políticas das decisões empresariais – e não o façamos como forma de crítica, mas, sim, como constatação de um simples fato da nossa realidade. Enquanto os custos de uma decisão política equivocada recaem sobre toda a sociedade, quem arca com as perdas de um erro de juízo empresarial é o próprio empreendedor, aquele que arrisca seu próprio capital e patrimônio (o que os economistas denominam de “internalização dos custos”).

Esse paradigma vale igualmente para o extremo oposto. Uma política pública acertada beneficia a todos os cidadãos; seus ganhos são dispersos. Ao passo que um empreendedor visionário colhe exclusivamente os lucros de suas decisões exitosas. Via de regra, esses incentivos perversos fazem com que todo burocrata seja tão cego aos riscos quanto às oportunidades, enquanto um empreendedor é instigado pelas oportunidades buscando mitigar todo e qualquer risco.

Mas, em se tratando de uma inovação financeira, desta vez, os burocratas acabam por magnificar os riscos sem nem sequer atentar às oportunidades. Escaldados com tantos deslizes no âmbito monetário e bancário das últimas décadas em geral, e da crise de 2008 em específico, não era de se esperar nada diferente.

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Não pense que estou irresponsavelmente desprezando os riscos do Bitcoin. Longe disso. Inclusive, eles serão tratados em outros posts proximamente. Contudo, o que aqui procuro ressaltar é o seguinte: não é nada extraordinário quando um órgão regulador emite um comunicado alertando sobre os riscos das moedas digitais; mas é digno de apreço e reflexão quando um empreendedor embarca nessa inovadora empreitada.

Em retrospecto, podemos concluir que o anúncio da WordPress.com, em novembro de 2012, de aceitar bitcoins como pagamento foi uma decisão acertada – à época, um bitcoin era negociado por pouco mais de US$ 10 dólares. E não afirmo isso por causa da valorização da moeda – até porque não sei se a empresa mantinha ou mantém encaixe em bitcoins –, mas sim pela enorme ampliação na base de usuários e a maior demanda que o Bitcoin vem tendo desde então.

A WordPress foi pioneira por razões ideológicas e mercadológicas também (leiam o comunicado no link acima). Em qualquer mercado precisamos de pioneiros. São eles que enxergam as oportunidades que sacudirão o status quo. São eles que transformam ou revolucionam uma indústria. No varejo, a Overstock deu seu passo na semana passada. Já o time norte-americano de basquete Sacramento Kings saiu na frente no mercado bilionário dos esportes profissionais, passando a aceitar bitcoins, a partir de março, na venda de ingressos a cachorros-quentes nos jogos.

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Com certeza, os concorrentes nesses e outros mercados hão de se aprumar. Ou defendem suas fatias de mercado aderindo às formas mais inovadoras e tecnológicas de pagamento, ou serão vistos como retrógrados avessos à mudança. Como um blogueiro em um fórum de discussão muito bem disse, “Quando a Amazon estava apenas começando lá em 1994, seus concorrentes eram constantemente questionados: ‘Qual a sua estratégia para a internet?’. Agora, em 2012, a pergunta é ‘qual a sua estratégia para o Bitcoin?’.”

Diante do que foi dito até o presente, registro aqui a mais temerária e arriscada das tarefas à reputação de um economista, a de prever o futuro. Ciente disso, aguardemos o fim do ano para o julgamento final. Pois bem, prevejo que este ano de 2014 será repleto de notícias de novas empresas, novos comerciantes e afinsadotando o Bitcoin como uma nova forma de pagamento. Arrisco dizer que o preço ficará em segundo plano. O tema central será a convergência do mercado à mais nova tecnologia financeira dos últimos anos.

E por que tudo isso é importante ao futuro do Bitcoin? Porque sem uma ampla base de possibilidades de uso da moeda digital, temo que o Bitcoin possa ficar restrito a um ativo financeiro de reserva de valor, tendo pouca utilidade como meio de troca. Quanto mais empresas utilizarem bitcoins como forma de pagamento, quanto mais consumidores usarem bitcoins como meio de troca, maior será sua liquidez e menor tende a ser sua volatilidade, em um processo que se retroalimenta.

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A verdade é que estamos nesse caminho. E a imprensa começa a se posicionar dessa maneira (veja esta notícia do Wall Street Journal). A convergência ao Bitcoin está se materializando, e cada vez menos como uma mera tática de marketing. Ao contrário, pressinto que ela será um imperativo de mercado.

A inata criatividade do ser humano contornará os obstáculos com invenções surpreendentes e inovadoras, como a da BitPay, que já permite que os empregados recebam parte de seus salários em bitcoins, ou como a da eToro, cuja plataforma para “hedgear” a exposição em bitcoins em um mercado de derivativos cambiais está sendo desenvolvida. Por sinal, o Brasil está bem atrasado em relação ao mundo desenvolvido. Precisamos com urgência de empresas que forneçam serviços como o da BitPay ou da Coinbase, para que o Bitcoin possa florescer no nosso país.

Mas e por que diabos alguém usaria bitcoins? Para quem já conhece a moeda digital, as vantagens são claras. Quem pouco sabe ou desconfia, possivelmente não entende. Procurarei dedicar os próximos posts a elencar e explicar justamente as vantagens e os benefícios do Bitcoin. Tampouco deixarei os riscos de lado, muitos dos quais já foram devidamente estampados por jornais e revistas – alguns bastante questionáveis, é verdade –, e outros que merecem genuína atenção.

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Que este seja o ano da convergência ao Bitcoin.

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Fernando Ulrich

Fernando Ulrich é Analista-chefe da XDEX, mestre em Economia pela URJC de Madri, com passagem por multinacionais, como o grupo ThyssenKrupp, e instituições financeiras, como o Banco Indusval & Partners. É autor do livro “Bitcoin – a Moeda na Era Digital” e Conselheiro do Instituto Mises Brasil