O que está acontecendo com o preço da gasolina?

Como tudo em economia e mercados, a explicação para a alta dos preços dos combustíveis, em especial a gasolina, é encontrada em um emaranhado de fatores, tanto globais quanto domésticos.

Rachel de Sá

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(Foto: Getty Images)
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Ultimamente, tenho lembrado daquele filme incrível da Pixar, “Toy Story”, por conta do personagem Buzz Lightyear. Para quem não se lembra, o mote do melhor amigo do Woody, e que em breve terá seu próprio filme, é: “Ao infinito e além!”

Mas por que raios estou falando de longas metragens de animação em uma coluna sobre economia? Pois bem. Tenho lembrado muito do Buzz, pois sua frase preferida parece ser a definição perfeita do que tem acontecido com os preços da gasolina por aqui.

Se você também notou isso quando foi abastecer o carro ou pegar transporte por aplicativo — ou mesmo lendo sobre a movimentação dos caminhoneiros acerca do preço do diesel e o provável aumento na passagem de ônibus —, saiba que não está doido.

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De fato, no Brasil, o preço dos combustíveis já acumula alta de 42% nos últimos doze meses até setembro. Separando esse percentual entre os principais combustíveis, temos: gasolina: 39,6%; etanol: 64,8%; e diesel: 33%.

O que está causando essa alta?

Como tudo em economia e mercados, a explicação para a alta dos preços dos combustíveis no mundo, em especial a gasolina, é encontrada em um emaranhado de fatores, tanto globais quanto domésticos.

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A começar pelo cenário internacional, podemos listar alguns dos principais elementos por trás desse comportamento recente:

1. Aumento da demanda – Após um período sem precedentes de paralização na produção global causado pela pandemia da Covid-19, os estímulos fiscais e monetários e a volta à normalidade permitida pela vacinação em diversos países do mundo levaram a um forte aumento na demanda por commodities no geral, especialmente as energéticas. Entre elas, o petróleo e derivados (como o gás de cozinha).

2. Oferta limitada – Enquanto a demanda voltou de maneira rápida e forte, a oferta respondeu muito mais devagar. Também por uma série de motivos:

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a. Transporte e logística paralisados total ou parcialmente por muito tempo;
b. Menores investimentos em combustíveis fósseis nos últimos anos, diante de incentivos para a transição para uma economia de baixo carbono;
c. Política de preços praticada pela Organização de Países Exportadores de Petróleo, que não somente reduziram a produção por conta do choque da pandemia, mas também foram afetados por menores investimentos nos últimos anos.

3. Aumento preço gás natural – Apesar da relação com a própria produção de petróleo (tendo, em certos tipos, sua extração relacionada à extração de petróleo) o preço final do gás natural também afeta o preço da gasolina. Isso porque os dois combustíveis acabam sendo substitutos um do outro.

Assim, diante da oferta reduzida de gás por parte da Rússia para consumidores, especialmente na Europa, e da expansão da demanda pela commodity também por países que enfrentavam crises hidrológicas (como o Brasil), o preço do gás subiu. Com a troca pela gasolina como alternativa mais barata, a demanda pressionou ainda mais os preços.

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4. Mais moeda no mundo? Commodities sobem – Em resposta à pandemia, os Bancos Centrais tornaram o dinheiro barato por meio de taxas de juros baixas e compras de ativos no mercado. O excesso de liquidez causado pressionou preços de bens reais, como petróleo e outras commodities energéticas.

E no Brasil, onde está “escondida” a alta?

Por aqui, o preço que vemos na bomba da gasolina é composto por (aproximadamente):

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1. Impostos federais e estaduais: 40%
2. Preços do produtor ou importador nas refinarias (definido pela Petrobras): 33%
3. Custo do etanol (tem um pouco na gasolina): 17%
4. Margem de distribuição e revenda: 10%

Porém, tendo em vista os movimentos globais, não precisamos procurar onde está “escondido” o motivo da alta dos preços recente. Ela é, na realidade, explicada em boa parte logo ali no primeiro item: preço do petróleo.

Isso porque os preços do petróleo (assim como outros insumos básicos, as famosas commodities) são negociados no mercado global, em dólar. Assim, quando o preço dessa commodity sobe no mercado internacional, ele sobe aqui também!

Mas não se esqueça do dólar!

Por outro lado, também sabemos que a alta dos preços da gasolina não foi uniforme ao redor do mundo – apesar da alta expressiva na grande maioria dos países que não controlam os preços artificialmente (como a Argentina e a Venezuela). Sabemos que, no Brasil, a alta vista nos últimos meses foi também influenciada por outro componente: o câmbio.

Isso acontece pois, como não usamos dólar por aqui, quando passamos o preço do barril de petróleo, que hoje está por volta de 80 dólares para o real… voilá: R$ 457!

E aí está o pulo do gato: quanto mais caro o dólar, mais alto o barril de petróleo em reais, mais alta a gasolina.

Assim, quando vemos incertezas políticas e fiscais rondando nossa economia e sendo precificadas na nossa moeda, já sabemos que ela não impacta só a “viagem pra gringa”. E sim, o preço do pãozinho francês, e da viagem para o trabalho – de carro, ônibus ou caminhão.

E se limitássemos o preço?

Diante disso, muitas vezes surge a pergunta sobre por que não limitar a alta dos preços. Ou seja, controlar os preços dos combustíveis para o consumidor final. A ideia pode parecer uma ótima solução, à primeira vista, mas guarda muitas “armadilhas”, grande parte delas já vivenciada por aqui mesmo no passado.

Uma das principais armadilhas vem do fato de o Brasil ainda importar boa parte do combustível final utilizado (o petróleo refinado), apesar de ser exportador de petróleo bruto. De fato, “óleos e combustíveis de petróleo ou minerais” são o principal item importado pelo Brasil atualmente (respondendo por 7,3% do total das nossas importações).

Deste modo, a diferença entre o preço pago pela Petrobras e vendido na bomba ao consumidor, teria de ser coberto de alguma maneira. Dado a operação da maior estatal do país, isso normalmente se torna prejuízo.

Como já vimos no passado, esse foi um dos principais motivos por trás da piora substancial da saúde financeira da Petrobras na década passada (mais ainda do que o esquema de corrupção envolvendo a estatal), e esse é o motivo por trás dos “ajustes” recorrentes que vemos: o petróleo está subindo no mundo, não tem como fugir!

E se produzíssemos tudo aqui?

Diante desse impasse, uma outra pergunta recorrente é “por que não produzimos tudo aqui”? De fato, isso poderia ser feito, caso tivéssemos a devida tecnologia para extração e refino do petróleo.

Porém, o “problema” da alta de preços não seria resolvido. Isso porque o preço no mercado global seguiria andando livremente de acordo com a oferta e a demanda, e nós em algum momento teríamos que ajustar por aqui, a não ser que quiséssemos controlar não o preço, e sim o quanto exportamos, o que pode entrar, a qual preço, etc.

Com tantos controles, acabaríamos por afastar justamente os investimentos privados necessários para a constante evolução de tecnologia e capital produtivo para a extração e a produção do combustível final.

Poderíamos, então, recorrer ao investimento público para tal fim. Porém, estaríamos priorizando o gasto para políticas de combustível fóssil no país, em detrimento de outros gastos, como em áreas como saúde, educação e pesquisa. Se nos endividássemos mais para isso, a consequência seria, bem provavelmente, maior inflação…voltando ao problema original, controlando os preços, os produtos e o câmbio até que o ciclo vicioso se tornasse insustentável.

Essa é a situação que vemos na Venezuela, por exemplo. E que muito provavelmente será a da Argentina em breve, caso a política de controle de preços não seja revertida.

Resumo da ópera, nada é tão simples quanto parece, e não há solução fácil.

Uma maior estabilidade e menor volatilidade da nossa moeda ajudariam bastante, assim como alternativas de menor volatilidade de preços que não alterassem aqueles praticados pela Petrobras ou aumentassem o gasto público nesse momento (como fundos emergenciais usados exclusivamente em momentos de estresse global, transparentes e limitados no orçamento).

Mas uma coisa é certa: tentativas de tapar o Sol com a peneira nunca se provaram muito eficazes.

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Rachel de Sá

Formada em Relações Internacionais em 2011 pela PUC-SP com passagem pela Universidade Sciences-Po, em Paris.Entrou na XP Investimentos em 2019 como analista de macroeconomia e, em junho de 2021, assumiu o desafio de ser a nova Chefe de Economia da Rico Investimentos (XP Inc.). Rachel é responsável pela análise econômica e política da casa, destacando o que de mais importante está acontecendo no cenário econômico do país e do mundo. Nas redes sociais, é ela quem conta tudo sobre o que está rolando na economia, na política e no mercado. Sempre com uma linguagem “gente como a gente”. Nas horas vagas, anda de bike, surfa e canta em uma banda amadora de rock. Compartilha conteúdos pelo canal @raborgesdesa no Instagram