Turismo pós-vacinação: Passaporte de imunização já é realidade em alguns países; veja como funciona

Passaporte digital e aplicativos voltados a companhias aéreas para monitorar turistas que estão devidamente vacinados já estão sendo testados

Allan Gavioli

Passaporte do Brasil
Passaporte do Brasil

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SÃO PAULO – Com a pandemia, o setor aéreo e o de turismo sofreram um baque nunca antes visto. Segundo números da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata, na sigla em inglês), a demanda global por transporte aéreo fechou 2020 em queda de 70% na comparação com 2019.

Porém, com o início das campanhas de imunização ao redor do mundo, o setor volta a ensaiar uma retomada, ainda que o ritmo de recuperação mude muito de um país para outro.

E junto com a tentativa do setor de voltar a uma certa normalidade, surgem dúvidas sobre como o turismo irá se rearranjar após a vacinação. Os países vão exigir certificados internacionais de vacinação? O chamado “passaporte vacinal” para que turistas possam entrar em outros países se transformará em realidade?

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O InfoMoney conversou com especialistas e players do setor para reunir o que já se sabe sobre sobre o novo cenário do turismo pós-vacinação.

Recuperação ainda vai demorar

Roberto Haro Nedelciu, presidente da Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa), diz que o debate veio à tona ainda no começo da pandemia, mas esfriou logo depois e, agora, a discussão volta com força à medida que a vacina foi se tornando uma realidade.

“Achávamos que a pandemia duraria alguns meses, mas já passou mais de um ano. Então, é difícil falar sobre qualquer perspectiva de tempo”, diz Haro. “Vejo a vacina como um complemento de segurança. Hoje sabemos que o essencial para não pegar a Covid é respeitar as medidas de proteção e distanciamento. Então a vacina será um desses cuidados para ajudar as pessoas a se sentirem mais seguras para viajar”, explica, ressaltando que a realidade de um passaporte de vacinas pode ainda demorar para se concretizar.

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Na avaliação de Victor Hanna, advogado das áreas Aeronáutico e Contencioso Cível e Arbitragem do escritório Demarest, o setor tem visto com bons olhos o andamento da campanha de vacinação, mas o advogado também acredita que a implementação de um certificado universal de vacina, que seja exigido para viajar, ainda está longe da realidade, por enquanto.

“É algo que já representa uma gotinha de esperança para os passageiros, para o setor e para todo o mundo. A perspectiva é boa, mas acho que todo mundo está muito ciente que isso não é imediato e pode demorar ainda um ano ou mais”, diz Hanna.

“A vacinação acabou de começar, ainda é cedo para concluir quando o turismo voltará com tudo”, concorda Thomas Allier, CEO do Viajala, buscador e comparador de preços do setor de turismo. Até o momento, foram aplicadas cerca de 160 milhões de doses da vacinas globalmente – um número muito pequeno em comparação à população mundial

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Além do começo tímido da vacinação, Allier também lembra que as campanhas devem demorar ainda mais em países em desenvolvimento.

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“Já se espera que os programas de vacinação no Brasil e na América Latina levem meses, talvez até mais de ano, para atingir a maior parte da população. Por isso, numa perspectiva realista, é provável que 2021 ainda seja um ano difícil para o setor aéreo, de recuperação lenta e gradual”, complementa o CEO. “Com certeza a Europa e os Estados Unidos vão acabar saindo na frente”, concorda Hanna.

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Certificado de vacina contra febre amarela pode servir como modelo

O mais próximo que já existe de um passaporte de vacinas que condiciona a entrada de um turista à imunização, é o certificado internacional da febre amarela. Na avaliação dos especialistas, uma adaptação desse modelo poderia funcionar para as vacinas da Covid-19. Porém, com algumas ressalvas.

Dentre elas, duas são primordiais: a febre amarela e a Covid-19 são doenças totalmente diferentes e as vacinas desenvolvidas para febre amarela têm uma eficácia próxima a 100%, já os imunizantes aprovados globalmente contra a Covid-19 têm taxas que variam entre 50% e 95%. E enquanto a febre amarela é um vírus transmitido por um vetor externo (picada de mosquito), a Covid-19 é uma doença causada por um vírus respiratório, fazendo com que a propagação da doença seja bem maior e seu rastreamento mais complexo.

“O que temos que ter em mente é que as companhias aéreas costumam seguir as regras sanitárias dos países nos quais elas operam”, complementa Hanna. “A Austrália, por exemplo, está completamente fechada, porém já está estudando implementar a entrada só de pessoas vacinadas”, diz o advogado.

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“A Qantas Airways [aérea australiana] já está se adaptando para embarcar apenas pessoas que já tomaram a vacina contra a Covid, para eles isso vai ser obrigatório. Eles já acostumados com a vacina da febre amarela. Em diversos países é assim, para entrar no avião, somos obrigados a mostrar a carteirinha internacional de vacinação, então não seria uma grande novidade, mas será uma coisa a mais para ser difundida no setor”, complementa.

A decisão de restringir a entrada de viajantes que ainda não tenham sido imunizados contra a Covid-19 no Brasil, por exemplo, seria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Até o momento, porém, não há nenhuma orientação da agência que indique essa possibilidade.

“Essa prática não é incomum. Pode ser viabilizado um certificado internacional de vacinação, similar ao da febre amarela, que é exigido em países como a Colômbia, que só admite brasileiros que embarquem apresentando esse certificado”, explica o CEO do Viajala, dizendo que esse certificado pode ser emitido em qualquer aeroporto internacional mediante à comprovação da vacinação contra febre amarela.

Allier ainda acredita que, no caso da Covid-19, um passaporte de vacinação com base no já utilizado certificado de vacinação contra febre amarela pode ser uma solução de fácil implementação por parte das companhias aéreas se houver um extenso planejamento.

Os especialistas ainda lembram que a exigência de um teste PCR negativo de Covid-19 para entrada em diversos países deve continuar por muito tempo, já que a plena imunização global deve demorar a acontecer.

Aéreas e governos podem restringir entrada e embarque de não vacinados

Da mesma forma que os governos podem proibir a entrada de viajantes que vieram de determinado país para diminuir o risco de contaminação, isso também pode ser condicionado à vacinação. E essa mesma restrição pode ser feita por parte das aéreas, que podem se recusar a embarcar algum viajante que não esteja vacinado. Vale dizer, porém, que essa medida ainda não foi adotada por nenhuma companhia.

“No Brasil a ideia ainda é incipiente. Na realidade, eu acredito que seja um pouco arriscado as aéreas já exigirem algo relacionado à vacinação, até porque sabemos que pouquíssimas pessoas foram vacinadas por aqui”, acredita Hanna.

Nacionalmente, quem pode determinar alguma diretriz para as aéreas nesse sentido é a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Procurada pelo InfoMoney, a agência não respondeu os pedidos de comentário até o fechamento desta reportagem.

“Esse é o tipo de incerteza que faz com que 2021 deva ser planejado pelas empresas do setor turístico com muito cuidado, e com as metas sendo quase tão conservadoras quanto foram em 2020”, complementa Allier.

Países já começaram a exigir o certificado de vacinação

Seychelles, no Oceano Índico, e Chipre, no Mar Mediterrâneo, são dois países que já anunciaram que só vão permitir a entrada de viajantes devidamente vacinados contra a doença. E, mais recentemente, países da Europa começaram um movimento parecido.

No início de fevereiro, a Suécia informou que oferecerá a seus cidadãos um passaporte digital de vacinação contra a Covid-19 e que o documento deve ser lançado antes do verão europeu. O movimento sueco é similar ao que aconteceu na Dinamarca, onde o governo informou que pretende lançar até o fim de fevereiro um passaporte digital para pessoas que se vacinaram contra a Covid-19.

Já na Islândia, turistas que apresentarem um certificado de vacinação poderão entrar no país sem precisar apresentar um teste PCR negativo ou realizar a quarentena.

Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, defende que um certificado de vacinação reconhecido internamente na União Europeia é “importante” para a livre circulação de pessoas dentro dos países do bloco sem risco de propagação a doença. “É um requisito médico ter um certificado que comprova a vacinação. Por isso, eu saúdo a iniciativa do primeiro-ministro grego [Kyriakos Mitsotakis] sobre um certificado de vacinação mutuamente reconhecido pelo bloco”, disse Ursula durante uma entrevista à veículos de imprensa de Portugal.

Passaporte de saúde digital

As inciativas dos países europeus vão em linha com o que a Iata, a associação internacional das aéreas, pensa para o futuro do turismo com as vacinas. O chamado Iata Travel Pass, que está sendo desenvolvido pela entidade, é um aplicativo que trará todas as informações sobre o viajante e poderá ser utilizado para monitorar e certificar que o turista está devidamente vacinado antes de permitir o embarque na aeronave.

Pelo aplicativo, o usuário poderá inserir dados dos testes PCR já realizados, a sorologia que indica a presença de anticorpos e o certificado de vacinação, unindo em um só aplicativo todas as informações que mostram que o turista está apto a viajar e não está infectado. Além disso, o documento digital trará todas as outras informações que o passaporte comum já possui.

“O teste é a solução imediata para reabrir as fronteiras e restabelecer com segurança a conexão entre as pessoas. E, por fim, isso provavelmente fará a transição para os requisitos de vacinação. Nos dois casos, é essencial ter um sistema seguro para gerenciar as informações sobre o teste ou a vacina da Covid-19. O Iata Travel Pass está sendo construído considerando a segurança de dados, conveniência e verificação de informações como prioridades”, disse Alexandre de Juniac, diretor geral e CEO da Iata, em nota enviada à imprensa. A partir de abril, o sistema será adotado em forma de teste nos voos da companhia aérea Emirates Airlines.

Outra iniciativa digital para facilitar o controle de entrada e embarque de passageiros durante a pandemia é o Common Pass, que tem como principal patrocinador o Fórum Econômico Mundial.

Com um funcionamento muito parecido com o Iata Travel Pass, e já sendo testado por companhias aéreas como Lufthansa, Swiss e United Airlines, o Common Pass pode acelerar a digitalização dos passaportes e a exigência da vacina para viajar.

Como explicou Hanna, porém, a implementação da nova tecnologia fica sob a responsabilidade das companhias aéreas, mas é bem possível que, quando a Iata determinar que o uso do aplicativo é uma das diretrizes adotadas pela associação, as aéreas devem passar a adotar o sistema como regra.

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Allan Gavioli

Estagiário de finanças do InfoMoney, totalmente apaixonado por tecnologia, inovação e comunicação.