Analistas dizem que ganhos salariais nos EUA preocupam mais que geração forte de vagas

Ganhos médios por hora trabalhada das folhas de pagamento privadas subiram 0,5% em abril e 4,4% nos últimos 12 meses

Roberto de Lira

(Shutterstock)
(Shutterstock)

Publicidade

Em meio aos dados que mostram a continuidade do aquecimento do mercado de trabalho nos Estados Unidos, o que mais deve continuar trazendo preocupações para o Federal Reserve (Fed) por conta de pressões inflacionárias é o desempenho dos salários, dizem analistas. Segundo o Payroll divulgado nesta sexta-feira (5), os ganhos médios por hora das folhas de pagamento privadas subiram 0,5% no mês e 4,4% nos últimos 12 meses.

A criação de empregos não-agrícolas nos EUA também veio acima do esperado pelo mercado – 235 mil novas vagas, ante estimativas de 180 mil – e a taxa de desemprego recuou para 3,4% no mês, a mais baixa em 50 anos.

Embora esses dados de geração líquida de vagas sejam fatores de atenção, Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital, lembrou que a surpresa com a geração de empregos foi praticamente compensada pelas revisões para baixo dos meses anteriores. De fato, a revisão combinada em fevereiro e março representou um número de 149.000 vagas a menos que o relatado anteriormente.

Continua depois da publicidade

Assim ela disse que deve ser dada mais atenção à taxa de desemprego de 3,4%, que mostra que quase todas as pessoas inseridas no mercado de trabalho estão ocupadas. “Essa taxa baixa tem um efeito secundário sobre o nível de salários”, comentou.

“O que esse conjunto de indicadores nos mostra? Que o mercado de trabalho continua muito apertado, que a criação de vagas está continuamente num terreno bastante elevado, com dados muito fortes”, afirmou Carla.

Ela explicou disse que a abertura de vagas está forte, mesmo após a recuperação do represamento motivado pela pandemia, com impactos sobre a taxa de desemprego e, principalmente, sobre o ganho médio por hora. “Esse ganho tem potencial para continuar impactando os indicadores inflacionários”, afirmou.

Continua depois da publicidade

Ela lembrou que, no último Fomc (nesta quarta-feira), Jerome Powell disse no seu discurso que os dados que seriam divulgados no intervalo até a próxima reunião, em junho, serão extremamente relevantes para a condução da política monetária.

“E o primeiro indicador relevante nessa janela de tempo, um dos mais relevantes, mostra uma pressão consistente, com potencial impacto sobre indicadores inflacionários. Esse dado traz algum nível de pressão adicional e pode deixar a autoridade monetária não tão confortável em termos de encerramento do ciclo de aperto monetário”, disse.

Rodrigo Cohen, analista de investimentos e co-fundador da Escola de Investimentos, também afirmou que os dados mostram o persistente aquecimento da economia norte-americana, mas não a ponto de forçar o Fed a subir mais os juros nas próximas reuniões. O principal motivo é a atual em virtude também da crise bancária.

Continua depois da publicidade

“Em relação às próximas reuniões do Fed, eu acredito que não muda nada. Dados só favorecem a possível manutenção dos juros e início da queda dos juros num prazo menor”, disse.

Cohen destacou que há uma extensa lista de indicadores para o Fed observar até a próxima reunião, de inflação (CPI e PCE), pedidos de auxílio-desemprego, PIB, e balanços de bancos. “É isso que vai ditar o ritmo das decisões em relação aos juros nos Estados Unidos”, comentou.

Andressa Durão, economista da ASA Investments, também analisou que a surpresa positiva com o dado de emprego foi mais do que compensada pelas revisões baixistas nos meses anteriores. Por outro lado, ele afirmou outros indicadores da pesquisa trouxeram sinais ‘hawk’, como a taxa de desemprego atingiu na mínima e revisões altista nos dados de salário, pesar de Jerome Powell ter dito nesta semana que não estão enxergando repasse para inflação.

Continua depois da publicidade

“Continuamos esperando taxa de juros parada até o fim do ano, salvo novas surpresas relevantes nos dados de mercado de trabalho e, principalmente, de inflação”, previu Andressa.

Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, destacou que o Payroll mais forte que o esperado e a contínua valorização dos salários em abril se soma a outras pesquisas sobre o mercado de trabalho na semana, que levam a uma competição por trabalhadores e a uma alta dos salários acima da produtividade, pressionando a inflação.

“O mercado de trabalho deve desacelerar lentamente. A inflação segue pressionada por elevações de salários acima dos ganhos de produtividade. Não esperamos que os juros americanos caiam antes de meados de 2024”, previu.

Continua depois da publicidade

Ela ponderou, no entanto que o  início do corte de juros pode ser antecipado caso haja um aperto de crédito mais intenso decorrente do colapso de alguns bancos regionais nos EUA.

Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, comentou em sua conta no Twitter que o Payroll de abril mais forte que o esperado não aponta sinais da esperada recessão nos EUA.

Para o Bank of America (BofA), ainda que os dados divulgados hoje, aliados às revisões dos meses anteriores, possam trazer a sugestão que houve alguma moderação gradual na atividade de contratação – nos últimos três meses, o crescimento médio do emprego na folha de pagamento foi de 222 mil – o dado ainda é forte por quaisquer padrões históricos.

“É difícil argumentar que o mercado de trabalho esfriou em abril. Na verdade, os desequilíbrios do mercado de trabalho aumentaram ainda mais”, comentou o banco em relatório.

O BofA destacou que os ganhos médios por hora aumentaram 0,5% no mês, acelerando acentuadamente após uma média de 0,3% nos três meses anteriores. E o  índice agregado de folhas de pagamento semanais aumentou 0,7 % no mês após duas impressões suaves consecutivas, de 0,1%.

“Alisando os dados, o crescimento do índice de folha de pagamento, uma medida do crescimento da renda salarial agregada, desacelerou, mas continua elevado. De fato, semestralmente, a folha de pagamento agregada cresceu 5,2%, mantendo o ritmo da inflação. Isso deve continuar a apoiar o consumo”, analisou o banco.

O relatório projeta que a orientação das comunicações do Fed antes da reunião de junho manterá o viés de alta visto no comunicado desta semana. “O Fed reagiu com mais força aos dados disponíveis em sua reunião de maio em relação às incertezas sobre o estresse bancário e seu efeito no aperto do crédito. O relatório de emprego de abril deve manter esse equilíbrio, por enquanto”, comentou.