Analistas esperam que Fed desacelere juros novamente, mas veem fim do ciclo ainda distante

Dados divulgados desde reunião de novembro foram mistos, com inflação menor e geração de empregos ainda resiliente

Roberto de Lira

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Desde a última decisão sobre política monetária nos Estados Unidos, o Federal Reserve recebeu dados suficientes para embasar uma nova desaceleração no ciclo de alta de juros – em dezembro o comitê do Fed optou por elevar os juros em 50 pontos-base, após quatro altas seguidas de 75 bps. Ou seja, a análise de que os diretores vão optar por uma alta de 0,25% é quase unânime. Mas no horizonte dos analistas, ainda está distante a expectativa de um início de cortes. O motivo são os sinais pouco claros do efeito da política mais restritiva na atividade.

Para os que acreditam que o fim do ciclo de alta está próximo, a queda de 0,1% no índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) em dezembro já é um indício claro de que o pior já passou em termos de escalada de preços. No mesmo mês, o núcleo do índice de gastos com consumo (PCE) subiu 0,3%, com forte queda em bens, mas ainda com pressão em serviços.

A queda de 0,2% nos gastos do consumidor americano também aponta para um esperado desaquecimento, assim como uma provável virada na tendência de alta dos salários, de 4,8% para 4,6% entre novembro de dezembro – a variação trimestral anualizada recuou para 4,13%, segundo cálculo da ASA Investments.

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Mas também há indícios de que desaceleração da economia está num ritmo ainda abaixo do esperado pelo Fomc. No mercado de trabalho, por exemplo, o payroll de dezembro ainda mostrou a criação de 223 mil vagas. E, na semana passada, foi divulgado que o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA cresceu a uma taxa anual de 2,9% no quarto trimestre de 2022, abaixo dos 3,2%% do 3° trimestre, mas acima das estimativas.

Sinais mistos

Para o Goldman Sachs os dados sobre o crescimento salarial e a inflação são encorajadores, enquanto os sinais sobre o crescimento da atividade têm sido mistos e, às vezes, preocupantes. Isso até facilita a redução do ritmo de aumento dos juros, mas é insuficiente, segundo o banco de investimentos, para antecipar os movimentos do Fomc ao longo de 2023.

O mais provável, segundo o banco, é que a autoridade monetária continue a buscar uma trajetória de crescimento abaixo do potencial, a fim de reequilibrar o mercado de trabalho para que a inflação volte a 2% de forma sustentável. “Concordamos com as autoridades do Fed que ainda há um longo caminho a percorrer. Afinal, a diferença entre empregos e trabalhadores ainda está cerca de 3 milhões acima do nível pré-pandêmico”, alertou o Goldman Sachs.

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A projeção inicial do banco é que o Fed ainda deve promover mais dois aumentos adicionais de 25 pontos-base nas reuniões de março e maio. Mas pode acontecer uma dose menor de juros se a fraca confiança nos negócios continuar a diminuir as contratações e o investimento. Por outro lado, o remédio pode ser mais amargo se reacelerar à medida que o impacto do aperto nas políticas passadas desapareça.

Para a gestora Galapagos Capital, a redução no ritmo de alta de juros para 25 bps já é consenso, mas a discussão da taxa terminal continuará a evoluir nas próximas reuniões. Quando “chegar a hora”, o Fed anunciará uma pausa, deixando a porta aberta para aumentos adicionais nas taxas. “Nossa opinião é de que seria um erro o Fomc encerrar o ciclo prematuramente ou considerar a possibilidade de cortes de juros em 2023 para evitar um ‘aperto passivo’”, afirmaram o economistas em relatório.

Para a Galapagos, a ideia de um “pouso suave” na economia americana contraria a hipótese de uma queda rápida da inflação e do fim precoce do ciclo de aperto do Fed. “Se os dados apoiarem a hipótese de “pouso suave”, então a precificação de mercado parece ainda mais inadequada”, argumentam.

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A gestora avalia que composição da inflação continua preocupante, umas vez que o progresso da inflação plena foi modesto e só aconteceu no final de 2022, quando fechou em 6,5%, ante 7% em 2021. E essa queda tardia deveu-se predominantemente à retração de 40% nos preços da gasolina entre julho e dezembro.

Outro indicador da resistência dos preços, segundo a Galapagos, foi o núcleo da inflação, que encerrou 2022 em 5,7%, não muito abaixo dos 6% de 2021. Houve uma queda substancial no núcleo da inflação de bens, mas o núcleo de serviços básicos contou uma história diferente. Com 7% ao ano, essa inflação dos serviços básicos em 2022 foi maior do que em 2021, quando terminou em 6,8%.

Para a Galapgos, a fonte da alta da inflação de serviços básicos emana exatamente das condições apertadas no mercado de trabalho e do rápido crescimento dos salários. “Em nossa opinião, ainda é uma questão em aberto se os serviços essenciais desacelerarão acentuadamente até o final deste ano. Os salários precisam desacelerar para 3,5% a 4%, de forma consistente, e o desemprego subir acima de 5% para atender a duas condições necessárias para controlar a inflação dos serviços básicos”, afirma o relatório.

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A gestora diz que continua a acreditar que a política do Fed visa uma taxa real de juros de cerca de 1,5%, o que implica por volta de 100 bps. restantes no ciclo de alta. “Discordamos veementemente da precificação de mercado, que inclui uma taxa terminal mais baixa do que a do Fed e 50 bps. de cortes em 2023.”

Rodrigo Cohen, analista de investimentos e co-fundador da Escola de Investimentos, diz que é preciso ficar atento ao comunicado  do Fomc, que deverá ser mais “dovish” porque os  EUA vem mostrando sinais de queda na atividade econômica.

Ele também destacou os últimos dados de queda de consumo, na produção industrial e da inflação e também lembrou que o PIB do 4° trimestre mais abaixo que no período anterior aumentou o temos e uma recessão no país, mesmo que branda. “Todos esses fatores contribuem para que os juros não subam mais tanto. E o comitê deve abordar todos esses fatores no comunicado.”

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Além da decisão, do comunicado e da entrevista do presidente Jerome Powell nesta quarta-feira, Cohen lembrou que ainda serão divulgados o Relatório Nacional de Emprego ADP e o payroll na sexta-feira e que isso será importante para ajudar a entender os próximos passos do Fed.

“Quanto menor o ganho médio por hora, temos menor chance de inflação porque o americano ganhando menos, compra menos. Se tivermos indicadores que apontem para inflação controlada, podemos ter uma próxima alta depois dessa, de 25 pontos, e depois podemos esperar pela manutenção da taxa de juros nas próximas reuniões até iniciar o ciclo baixista.”

E o fim do ciclo?

Andressa Durão, economista da ASA Investments, acredita que o comunicado do Fomc deve reconhecer a desaceleração da inflação, mas apesar da inclinação “dovish”, não  é esperada uma indicação que o fim do ciclo está próximo. “O ‘forward guidance’ deve ser mantido e, na coletiva de imprensa, Powell deve reforçar a mensagem de que a política monetária poderá permanecer em nível restritivo por um tempo.”

Ariane Benedito, economista da Esh Capital, também acredita que nem o otimismo do mercado com resultado do PCE divulgado na última semana deve mudar a atual postura do Fed. Isso por conta dos núcleos do indicador e dos dados do mercado de trabalho, que continuam resilientes.

“Caso o Banco Central americano adote o 0,25% na reunião dessa semana, que hoje é o consenso do mercado, o prolongamento dos juros é iminente e ainda terá espaço para mais um reajuste de mesma magnitude na próxima reunião (março), com a permanência da taxa em 5% para 2023. Até o presente momento, não vejo espaço para afrouxamento da política monetária americana.”

Raphael Camargo, analista da Neo Investimentos, é outro que acredita que o movimento de hoje do comitê de política monetária já foi “telegrafado” nas últimas comunicações de seus membros. Para ele, a trajetória de queda do índice de preços ainda que não totalmente consolidada. “O Fomc terá que lidar também com um mercado de trabalho ainda bastante apertado e salários rodando em níveis altos. Os dados mais recentes indicam moderação ainda incipiente”, afirmou.

Para ele, o comunicado da decisão não deve ter grandes alterações em relação ao divulgado em dezembro passado e deve trazer um destaque para a manutenção do “guidance” de que novas altas serão apropriadas para atingir níveis suficientemente restritivos.

David Meier, economista da Julius Baer, escreveu em relatório nesta semana que, dentro dos dados do PIB na semana passada, o investimento residencial diminuiu, refletindo os primeiros ventos contrários de uma política monetária mais restritiva. “A queda de atividades sensíveis à taxa de juros confirma que a política monetária do Fed pode ser considerada restritiva. Daqui para frente, ficará mais difícil justificar novos aumentos e tendemos a esperar uma contenção em março.”

Felipe Reymond Simões, economista e diretor da WIT Asset, acredita que uma decisão de  alta de 0,25% hoje seria um ótimo indicativo de que realmente o Fed está desacelerando o ritmo da taxa de juros e que provavelmente deva parar nos 5,5% ao ano.

“O que de modo geral é bom para o mundo, porque é um indicativo de que eles estão confortáveis com o nível de inflação atual e que essa taxa já é suficiente para conter a alta da inflação. É bom porque a taxa de juros americana é a referência. Vai ser uma sinalização que outros bancos centrais podem começar a reduzir também o aumento. No caso do Brasil, que já está mais para o final do ciclo, talvez até começar a abaixar a taxa de juros.”

Para o BofA, embora o Fed pareça favorecer outra redução no ritmo dos aumentos das taxas, a comunicação durante o período intermediário sugere que os formuladores de políticas não mudaram sua visão sobre onde a taxa provavelmente terminará, ou a visão de que as pressões inflacionárias diminuirão lentamente.

Segundo relatório, mesmo com a esperada a redução do ritmo, o Fed vai querer evitar a interpretação de que isso implica em uma taxa terminal mais baixa ou um início mais cedo de cortes do que o comitê considerou apropriado quando se reuniu pela última vez, em dezembro.

“Isso significa que não há mudança na orientação da taxa de juros na declaração do FOMC. Acreditamos que a declaração continuará a dizer que ‘aumentos contínuos na faixa-alvo serão apropriados’. Uma suavização nessa linguagem pode levar a uma flexibilização indesejada nas condições financeiras.”

Para Jon Maier, Chief Investment Officer da Global X, as ações e os títulos do Tesouro já subiram este mês devido à expectativa generalizada de que o Federal Reserve está próximo do fim de seus aumentos nas taxas de juros, à medida que a inflação diminui e as condições financeiras mais rígidas esfriam a economia.