Analistas veem bons sinais no IPCA-15 de maio, mas advertem para desinflação ainda lenta dos núcleos

Média móvel de 3 meses anualizada dos núcleos perdeu velocidade, para 6,28% em maio, ainda acima do teto da meta de inflação

Roberto de Lira

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O dado do IPCA-15 de maio divulgado nesta quinta-feira pelo IBGE, que veio bem abaixo das estimativas do mercado – uma alta de 0,51% ante consenso de 0,64% – está carregado de bons sinais de acordo com análises qualitativas feitas por economistas. Mas eles mostram cautela quando avaliam a possibilidade de mudanças de curto prazo na política monetária restritiva do Banco Central por conta do alívio na inflação corrente. O motivo principal é que os núcleos do indicador estão desacelerando muito lentamente.

João Savignon, head de pesquisa macroeconomica da Kínitro Capital, destaca que a desaceleração do IPCA-15 no mês (de 0,57% para 0,51%) foi resultado da moderação da alta dos preços administrados, que saíram de 1,41% em abril para 1,10% em maio, devido ao arrefecimento dos preços da energia elétrica e gasolina, que mais do que compensaram a alta dos medicamentos e dos jogos de azar (loterias).

Já o conjunto de preços livres ficou relativamente estável em relação ao mês anterior (0,31% ante 0,29%), mas com a composição mudou bastante, lembra Savignon, num contraste entre a alta forte de alimentação no domicílio (1,02%) e a queda de serviços (-0,06%) – reflexo da queda de 17,3% nas passagens aéreas. Os bens industriais, por sua vez, aceleraram de 0,22% para 0,39%.

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Quando analisa a média dos núcleos em maio, o analista da Kinitro destaca que o dado surpreendeu na margem (0,42%, ante os 0,58% projetados). Em termos interanuais, a média desacelerou 7,49% para 6,77%. E a média móvel de 3 meses anualizada também perdeu velocidade, mas num ritmo mais lento, de 6,51% para 6,28%.

“Vale destacar que o quadro geral para a inflação melhorou no último mês e podemos ter novas surpresas positivas com a inflação nos próximos meses. No entanto, estamos naquela fase difícil do processo de desinflação, quando os principais choques se dissipam e a convergência das principais medidas de núcleo é um processo gradual”, alerta.

Leonardo Costa, economista da ASA Investments, também considera que o indicador cheio foi uma surpresa favorável para baixo, com um qualitativo bom, especialmente pela taxa mensal de núcleos rodando mais perto do +0,4% do que a projeção de +0,5%, com efeito disseminado pelo IPCA. Mas ele também observa que a média trimestral anualizada segue rodando acima do teto do regime de metas.

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Ainda assim, ele achou positivo que a desaceleração tenha se espalhado chegado na margem aos núcleos. “Teve surpresa mais disseminada nos serviços, com destaque para aluguel, serviços pessoais e consertos em geral. Nos bens, fraqueza além sazonalidade no vestuário e artigos de residência”, comenta.

“Janela aberta para o BC”

Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, também citou a melhora nos dados de serviços, serviços subjacentes e na média dos núcleos, que arrefeceram tanto na passagem de abril para maio, quanto no acumulado dos últimos 12 meses. “E o índice de difusão, que mostra o porcentual de itens que aumentaram de preços no mês, teve uma alta marginal de 63% em abril para 64% em maio”, lembra.

Para ele, apesar de a inflação de boa parte desses grupos ainda estarem acima do desejado pelo Banco Central, os números de maio mostram um arrefecimento importante. “Esses dados podem ajudar positivamente o cenário do Banco Central, mas ainda é cedo para afirmar que essa será uma nova tendência. Apesar de ter vindo melhor do que o esperado, acreditamos que a autoridade monetária deve manter a taxa de juros inalterada na próxima reunião do Copom, em junho”, prevê.

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Sung diz que foi aberta uma janela para o BC começar a discutir possíveis cortes em breve. “Nossa expectativa é de cortes apenas no terceiro trimestre”, afirma.

Na análise do Goldman Sachs, a desaceleração da inflação em maio em relação a abril foi impulsionada pela grande queda nas passagens aéreas, pela menor inflação do preço dos combustíveis e também por leituras abaixo do esperado em Vestuário, Habitação e Bens Domésticos.

“Isso mais do que compensou impressões mais altas em alimentos consumidos dentro e fora de casa, cuidados pessoais, preços de loterias e medicamentos regulamentados”, a ao banco de investimentos em relatório assinado por Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica para a América Latina.

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Ele também cita que o núcleo da inflação registrou 0,42, abaixo do esperado, com a medida anual caindo para 6,76% no comparativo anual, abaixo dos 9,12% no final de 2022 e primeira impressão abaixo de 7% desde 21 de outubro. “Esperamos que a taxa de inflação anual teste a alta de 3% em junho, um reflexo dos efeitos de alta base”, afirma.

Tatiana Pinheiro, economista-chefe da Galapagos Capital, afirma que a fotografia do IPCA-15 de maio é muito parecida com a dos meses anteriores, com a inflação seguindo em trajetória de queda, por conta da deflação do 3° trimestre de 2022, após a redução dos impostos sobre combustíveis, energia elétrica e telefonia, além dos efeitos do aperto monetário.

“No mês, além dos efeitos já esperados de reajuste de remédios, a sazonalidade está presente com inflação de alimentos e de vestuário. A má notícia é que ambas registraram inflação um pouco além da sazonalidade. A boa notícia é que o desalinhamento de preços entre serviços e ‘tradables’ está reduzindo”, afirma.

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“Mantemos nossa expectativa que a deflação de ‘tradables’ no atacado, somada à finalização do realinhamento de preços no varejo, irá resultar em inflação bastante baixa em julho e agosto. Para a política monetária, este número indica a manutenção da estratégia de juro alto por mais algum tempo”, diz Tatiana

A Levante Investimentos pondera em relatório que a desaceleração da inflação em deveu-se basicamente à queda nos preços das passagens aéreas, após uma alta de 11,96% em abril. “Segundo o IBGE, a queda dos preços das passagens respondeu, sozinha, por 0,12 ponto percentual de queda no índice. Sem esse efeito, a inflação teria sido de 0,63 por cento, em linha com as expectativas”, destaca.

Análise é que, apesar do recuo, o resultado de maio segue indicando que os alimentos estão caros. Os preços do grupo Alimentação e Bebidas subiram 0,94%, após terem subido 0,04% em abril. Isoladamente, esse grupo foi responsável por uma alta de 0,20 ponto percentual no acumulado do índice, lembra a Levante.

Segundo relatório, no entanto, esses números são pouco relevantes para o BC, que está atento mesmo ao comportamento dos núcleos da inflação no longo prazo. “E esses percentuais seguem bastante acima do teto da meta, que é de 4,75 por cento (já considerada a tolerância de 1,5 ponto percentual para além do centro da meta, de 3,25%. Ou seja, por mais que os preços pareçam estar desacelerando devido à baixa dos combustíveis, e a um arrefecimento do mercado internacional de commodities, a inflação segue acima do permitido”, adverte a Levante.

Convergência lenta

Para Claudia Moreno, economista do C6 Bank, a inflação em 12 meses irá atingir um patamar mínimo em junho e voltar a subir a partir do segundo semestre. “O principal motivo desse comportamento é a saída do cálculo das deflações registradas no IPCA no ano passado em função dos efeitos da desoneração de impostos”, explica

No dados de maio, segundo a economistas, os núcleos de inflação do BC, que expurgam elementos voláteis e não recorrentes, voltaram a mostrar melhora, mas seguem em patamar elevado. “Em 12 meses, os núcleos do BC acumulam uma alta de 6,8%, o que indica que a inflação mais estrutural está caindo em ritmo lento”, afirma a economista.

Claudia Moreno diz que esse movimento também é visto na inflação de serviços, que veio abaixo do esperado, mas acumula uma alta de 6,4% em 12 meses. “Além de sofrer os efeitos da inércia inflacionária, o setor também é pressionado pelo mercado de trabalho aquecido”, comenta.

Na sua previsão, essa resiliência da inflação de serviços somada à pressão nos núcleos e à expectativa de inflação acima da meta não são compatíveis com a convergência da inflação para a meta de 3% no horizonte relevante de política monetária.

Para os economistas Marco Caruso e Igor Cadilhac, do Banco Original, ainda que a inflação e sua composição tenham surpreendido positivamente, o comportamento dos serviços e núcleos continua a demandar cautela.

“Para os próximos meses, a redução nos preços dos combustíveis pela Petrobras vai arrefecer ainda mais a queda prevista no 1º semestre e suavizar a alta a partir do 2º semestre. Sendo assim, projetamos uma inflação de 5,7% em 2023”, preveem os economistas.

Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter, por sua vez, vê como boas notícias do IPCA-15 de maio a queda mais disseminada dos preços e a redução da inflação de serviços e da média dos núcleos – que ficou em 0,42% no mês e acumula 6,8% em 12 meses.

“A prévia de maio indica que teremos uma inflação menor no mês, abaixo de 0,4%, com o impacto maior da redução dos combustíveis na segunda quinzena e expectativa de desaceleração dos preços dos alimentos. Com isso, é bem provável que as expectativas de inflação tenham nova queda nas próximas semanas o que deve reforçar o debate sobre o corte de juros no segundo semestre, que na nossa opinião, pode se iniciar em agosto”, afirma Rafaela.

André Nunes de Nunes, economista-chefe do Sicredi, também vê, no lado de serviços, uma pressão ainda persistente, mesmo com a leve queda de serviços subjacentes, passando de 0,51% para 0,45%. A média móvel de três meses dessazonalizada e anualizada continuou subindo, de 5,5% para 5,9%.

“No geral, o qualitativo da leitura do IPCA-15 de maio foi positivo, mas o desafio da desinflação em serviços ainda persiste. Por ora, revisamos nosso IPCA em 2023 de 5,5% para 5,4%, mas entendemos que o viés é de baixa para esse número”, alerta.

Luis Menon, economista da Garde, destaca que alguns itens industriais vieram mais baixos no mês, contribuindo para a surpresa positiva, como carros usados (deflação de 0,79%) e o grupo de aparelhos eletrônicos (-0,85%).

“No qualitativo foi possível notar um número melhor, com núcleos desacelerando de 0,45% em abril para 0,42% e os serviços subjacentes, de 0,51% para 0,41%. Mas é importante lembrar que, dessazonalizando e anualizando, esta medidas ainda estão acima da meta, em 6,2% e 5,8%”, afirma.

Com os números divulgados hoje, a projeção da Garde para o IPCA do mês ficou em 0,39%. Para o ano, está em 5,4%.