Com vacinação lenta, Brasil deve ter redução de internações e mortes só a partir do 2º semestre

Natália Pasternak, do Instituto Questão de Ciência, Dimas Covas, do Butantan, e Edécio Cunha, do Incor, participaram de série de lives do InfoMoney e da XP

Giovanna Sutto

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SÃO PAULO – A situação do Brasil diante da piora da pandemia é grave: nesta semana, o país ultrapassou a marca de 4 mil mortes em um período de 24 horas, pela primeira vez desde que a crise sanitária começou. O total de vítimas fatais da doença chegou a 340.776, segundo dados do Ministério da Saúde.

O Brasil possui o segundo maior número absoluto de casos e óbitos por Covid-19 no mundo, atrás somente dos Estados Unidos.

Diante desse cenário, embora as saídas sejam poucas, são conhecidas: vacinar a população e respeitar as medidas de segurança e higiene, como as restrições de circulação e o uso de máscaras. Mas algumas dúvidas surgem: essas novas variantes são realmente graves? Será preciso tomar vacina contra a Covid-19 todo ano? Faltam insumos para a produção? É ético empresas privadas comprarem vacinas?

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São essas e outras perguntas que Natália Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência, Dimas Covas, presidente do Butantan, e Edécio Cunha, chefe do laboratório de bioquímica/Incor, responderam durante a Super Lives – 1 ano de pandemia, série organizada em parceria pelo InfoMoney e pela XP nesta quarta-feira (7). Confira a entrevista completa acima.

Veja os principais destaques:

Cronograma da Coronavac e impacto da vacinação

Segundo Covas, a população que pode ser vacinada nos critérios atuais deve receber o imunizante até o fim deste ano.

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“O problema, no entanto, é que ainda existe muita incerteza sobre o quantitativo de vacinas até o meio deste ano. O Butantan vai entregar 46 milhões de doses até o fim de abril, como está previsto no contrato com o governo federal. A Fiocruz promete entregar mais 18 milhões de doses para esse mês. Esperamos que isso realmente aconteça, mas eles tiveram alguns imprevistos na produção. Precisaremos esperar”, diz o executivo.

Segundo ele, para completar a vacinação, com duas doses, da primeira faixa de prioridade do Programa Nacional de Imunização (PNI), que inclui idosos, profissionais da saúde, e profissionais da educação e da segurança pública em alguns estados, seria necessário algo em torno entre 70 e 80 milhões de doses.

“Temos um quarto disso garantido até agora. Isso sem contar, os portadores de comorbidades e pessoas de 40 a 60 anos que testão sendo internadas em ritmo acelerado devido à variante P1. Então, o grande desafio será fechar esse semestre com uma cobertura para a população prioritária. Por enquanto, só temos a Coronavac”, diz.

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Natália acrescenta que acelerar o ritmo de vacinação é essencial para conseguir reduzir a taxa de transmissão e consequentemente as internações e mortes. “Nas não temos bola de cristal para saber quando os números vão baixar. Estamos acompanhando”, disse.

“Fato é que o impacto real da vacinação na vida do brasileiro deve começar a ser sentido a partir do segundo semestre quando um maior volume de vacinas vai chegar, incluindo Pfizer e Janssen. Até lá, a melhora será apenas entre os grupos prioritários”, pontua.

Variantes preocupam?

Natália explica que as variantes são uma preocupação, mas que é um risco esperando diante de um quadro de pandemia ao redor do mundo.

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“As variantes são previsíveis porque fazem parte da evolução do vírus. Não é nada inesperado surgir uma variante do vírus, que está rodando o mundo e se replicando em milhões de pessoas há um ano”, diz.

Segundo ela, quanto mais ele se replica, mais sofre mutações e quando mais mutações, mais vantagens de sobrevivência. “Entre elas, ele se torna mais contagioso […] e tem a capacidade de escapar da vacina criada para combater a linha original do vírus – porque ele deixa de ser reconhecido pelos anticorpos”, continua.

“Assim, as variantes são perigosas e devem ser monitoradas, mas vão surgir em diferentes partes do mundo. Inclusive, a mesma mutação acontece mesmo sem as pessoas viajarem, elas são comuns o suficiente para surgirem em vários lugares. Mas até agora todas as vacinas testadas estão sendo eficazes, mesmo que tenha algum nível de perda da eficácia, ainda assim não fica ainda zerada. Há um grau de proteção contra as variantes”, diz.

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De qualquer maneira, a recomendação da especialista é manter a prevenção: higiene das mãos, uso de máscara, e isolamento social – além das vacinas.

Reinfecções são raras

No início de dezembro, o Ministério da Saúde confirmou o primeiro caso de reinfecção de Covid-19 no país e de lá para cá mais casos surgiram. Porém, Natália pontua que embora a reinfecção seja possível, é rara.

“A variante vira notícia porque é exceção. Na prática, precisamos acelerar a vacinação. Porém, precisamos entender que a vacina não é mágica, não significa que você tomou e está completamente protegido. Não funciona assim. Nenhuma vacina protege 100%, ela diminui a probabilidade de a pessoa ficar doente. No caso da Coronavac, por exemplo, diminui a probabilidade pela metade”, explica.

Segundo ela, é preciso considerar mais a regra do que a exceção. “Olhamos a efetividade da vacina conforme seus dados vão aparecendo na população. Observamos seu comportamento histórico para depois avaliarmos. Até agora as vacinas têm se mostrado eficazes, estamos em um caminho promissor”, diz.

Cunha, chefe do laboratório de bioquímica/Incor, concorda com Natália e acrescenta que estudos mostram que a reinfecção acontece em uma pessoa a cada mil casos de Covid.

“A resposta imune da vacina não é só criada pelos anticorpos neutralizantes. Parte da proteção da vacina fica por conta da imunidade celular e sabemos hoje que essa imunidade não é afetada significativamente pelas variantes e isso deve segurar a eficácia da vacina mesmo com as variantes que estão aparecendo”, explica.

Ele afirma, ainda, que diante da atual situação no país, daqui a seis meses, podemos ter até o dobro de variantes que temos hoje, “uma substituindo a outra”.

Falta de insumos?

Outra preocupação em relação ao ritmo de vacinação do país, é a falta de insumos vindos da China, especialmente o chamado insumo farmacêutico ativo (IFA). Em nota, nesta quarta (7), o Butantan informou que espera a chegada da matéria-prima da vacina da China para a próxima semana e não tem como dar andamento na produção enquanto isso.

“Todas as doses provenientes do IFA recebido da China já foram envasadas. Neste momento, cerca de 2,5 milhões de vacinas encontram-se em processo de inspeção de controle de qualidade – parte integrante do processo produtivo – para serem entregues na semana que vem ao Programa Nacional de Imunizações”, disse a nota.

Na tarde desta quarta (7), Covas explicou em coletiva de imprensa que uma remessa de IFA que estava prevista para esta semana atrasou, e deve chegar na semana que vem. Porém, durante a live, Covas garantiu que não vai faltar IFA para finalizar as quantidades acordadas.

“Nosso acordo com a Sinovac foi firmado após o dia 7 de janeiro, com a autorização do governo federal, para a entrega de 46 milhões de doses, que vamos entregar agora em abril. Um segundo contrato de 54 milhões de doses foi fechado em meados de fevereiro, mas para esse contrato já havia alguma restrição em termos de disponibilidade de matéria-prima da Sinovac, fechamos de forma tardia o acordo e fizemos um cronograma desse segundo contrato para entrega até agosto. Os prazos combinados estão mantidos, por ora“, afirmou.

Assim, a expectativa é de que os insumos cheguem na semana que vem, apesar do atraso, e que o cronograma de entrega ao PNI não seja alterado.

Segundo ele, a Sinovac vai estrear uma terceira fábrica de vacinas na China ainda em abril, com capacidade de produzir 500 milhões de doses por ano. “A China é o pais que mais vacina em números absolutos e está demandando muito da indústria chinesa. Isso, porém, não está afetando nosso acordo com a Sinovac. Com o funcionamento da nova fábrica, a expectativa é de que haja uma melhoria com o volume enviado ao Brasil. Esperamos que realmente não haja problemas”, diz.

ButanVac: candidata à vacina tem baixo custo

Também durante a live, Covas ressaltou a importância da ButanVac, nova candidata à vacina anunciada recentemente pelo instituto. “A ButanVac faz parte de uma segunda geração de vacinas e pode se tornar uma alternativa em termos mundiais, principalmente porque está sendo desenvolvida com o objetivo de ser um imunizante de baixo custo e com ampla base produtiva”, afirmou o executivo.

Desde o ano passado, o Butantan avalia usar a base da vacina da gripe, com os ovos embrionários, técnica bastante utilizada ao redor do mundo na produção de outras vacinas, para tentar produzir uma nova vacina.

“A tecnologia da ButanVac é utilizada por muitos países, o que permitiria a produção em mais lugares e mais vacinas aos países pobres. Esse produto não tem patente, então, uma vez desenvolvido poderá ser usado em qualquer país”, explica.

A ButanVac já incorpora a variante chamada P1 e está sendo testada para ver se também combate a variante sul africana. “A partir de maio, a nossa fábrica de gripe fica disponível e teremos a capacidade de produção 50 milhões a 100 milhões de doses entre três e quatro meses”, afirma Covas.

No entanto, a nova candidata à vacina está iniciando os testes da Fase 1 e ainda há um longo caminho pela frente. O InfoMoney fez uma reportagem que conta mais sobre essa nova vacina – saiba mais aqui. 

“Esperamos que essa vacina possa ser rapidamente autorizada pelas agências sanitárias no segundo semestre. Se for autorizada, poder ser um divisor de águas na disponibilidade de vacinas”, afirma o presidente do Butantan.

Compra de vacinas por empresas

Outro tema abordado na live foi a compra de vacinas por empresas. A Câmara dos Deputados concluiu nesta quarta (7) a análise de Projeto de Lei que flexibiliza as regras para empresas comprarem vacinas contra a Covid-19, reduzindo as exigências para a aquisição de imunizantes pelo setor privado.

A proposta, que agora segue para análise do Senado, permite a compra de imunizantes por pessoas jurídicas para aplicação gratuita em seus funcionários, exigindo como contrapartida que quantidade igual à adquirida seja doada ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Cunha acredita que a iniciativa de compra por empresas é boa, desde que não haja competição com o próprio governo. “Se isso acontecer, está muito errado. Se for possível a empresa comprar vacina que o governo federal não tem acesso e sem competir com o próprio país, é vantagem. Acho que a lógica moral e ética é a indústria pensar no que é possível trazer de vacinas para além do esforço do governo federal”, avalia.

Uma pesquisa mostra que quase oito em cada dez executivos (78,5%) comprariam vacinas contra Covid-19 para imunizar seus funcionários caso fossem autorizados.

O InfoMoney também fez uma reportagem sobre esse assunto que mostra que especiaistas acreditam que mesmo se aprovado, o Projeto de Lei ainda deve passar por uma ampla discussão e pode ser submetido ao julgamento dos ministros do STF.

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Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.