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O governo da Rússia comunicou hoje que todos os navios que viajarem para portos ucranianos no Mar Negro serão considerados transportadores de equipamento militar a partir desta quinta-feira (20). A informação do ministério da defesa russo via Telegram provocou uma alta forte nas cotações do trigo em Chicago, que chegaram a bater em 9% na sessão desta quarta-feira.
A Rússia também declarou que as regiões sudeste e noroeste das águas internacionais do Mar Negro estão temporariamente inseguras para a navegação, sem dar detalhes sobre as partes do mar seriam afetadas.
Até então, a não renovação da Iniciativa do Mar Negro, um acordo entre a Rússia e a Organização da Nações Unidas (ONU) que permitiu desde o ano passado o escoamento seguro de parte da safra de grãos da Ucrânia, vinha mostrando um efeito apenas moderado nos preços de algumas commodities nesta semana.
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De acordo com a Bloomberg, os preços do trigo e do milho já haviam atingido máximas de três semanas nesta quarta-feira (19), mas parte disso estava sendo atribuída a algum prêmio climático sobre os preços, uma vez que existe um risco de o clima mais seco em partes do cinturão de cultivo dos EUA prejudicar o desenvolvimento dos campos de milho e soja.
A revista The Economist destacou em seu site nesta semana que comércio no Mar Negro já vinha diminuindo desde maio, quando a Rússia começou a impedir que os navios se dirigissem ao porto de Pivdennyi, que responde por um terço das exportações marítimas de alimentos da Ucrânia desde que o acordo foi assinado, em julho de 2022.
Acredita-se que o impacto global do fim do acordo provavelmente será atenuado. Um dos motivos é que a oferta mundial de trigo está forte após as exportações excepcionalmente altas da Austrália e da Rússia e de uma recuperação nos embarques canadenses após o período de seca ter atrapalhado sua safra no ano passado. Ou seja, depois de cair por anos, os estoques globais podem finalmente subir em 2023, segundo a revista.
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Sobre o milho, o déficit ucraniano pode ser absorvido por vendas recordes esperadas do Brasil, segundo avaliação da empresa de dados Kpler.
A revista alerta que, a longo prazo, o papel da Ucrânia como principal fornecedora de alimentos pode desaparecer, com consequências nefastas para a fome global. O país normalmente responde algo entre 10% e 15% das exportações mundiais de trigo e milho. E a produção de grãos caiu entre 35% e 40% em relação ao período anterior à guerra, de acordo com cálculos do think tank Ifpri.
Insegurança na África
Há uma preocupação extra com a provável insegurança alimentar que isso pode causar nos países africanos. Segundo o site African Business, embora algumas exportações de grãos da Ucrânia continuem por rotas terrestres através de países vizinhos, os volumes devem cair significativamente.
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Jacques Nel, chefe do escritório para a África na consultoria Oxford Economics, comentou que o colapso do acordo é uma notícia muito ruim para os países altamente dependentes da importação de alimentos.
Ele destacou que a África Oriental está apenas começando a se recuperar de um longo período de seca, enquanto a região mais ao norte, altamente dependente da importação de alimentos, também está vulnerável.
A Nigéria é outro dos maiores importadores de trigo do mundo e recebe um quarto de suas importações da Ucrânia e da Rússia, diz Debo Akande, especialista sênior do Instituto Internacional de Agricultura Tropical. Ele teme que os preços do trigo possam aumentar “astronomicamente”, o que terá efeitos indiretos nos preços de outras culturas básicas.
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Segundo o site, a situação é particularmente alarmante porque muitas economias africanas ainda não se recuperaram totalmente de uma sucessão de crises recentes, incluindo o aumento dos preços dos alimentos no ano passado e os impactos da pandemia de covid-19.
A isso se soma o fato de dívida pública e os custos dos empréstimos desses países terem aumentaram nos últimos dois anos, deixando os governos com menos margem fiscal para aumentar novamente o apoio social, segundo Nel.
O acordo do ano passado permitiu a exportação de quase 33 milhões de toneladas de grãos em um esforço coordenado entre Rússia, Ucrânia, Turquia e grupos internacionais. Os 5 maiores compradores foram a China, com 8 milhões de toneladas, a Espanha, com 6 milhões de toneladas, seguida pela Turquia, Itália e Holanda. Esses países representaram mais de 60% do total. O Egito foi o comprador africano mais proeminente com 1,55 milhão de toneladas.