Serviços surpreendem em março, mas recuperação pós-pandemia mostra perda de ritmo, dizem analistas

Alta de 7,4% em 12 meses observada em março é a menor desde setembro de 2021; em janeiro, crescimento estava em 8,0%

Roberto de Lira

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O setor de serviços voltou a surpreender positivamente em março, com alta de 0,9% em volume ante o mês anterior, acima das estimativas, mas também continuou a mostrar a perda da potência da recuperação após o fim das restrições de circulação impostas pela pandemia, alertam analistas.

No acumulado de 12 meses, a alta de 7,4% observada em março é a menor desde setembro de 2021. Essa leitura estava em 8,0% em janeiro, recuando para 7,8% em fevereiro.

Para Rafael Perez, economista da Suno Research, o setor, que foi o principal condutor do crescimento da economia brasileira nos últimos dois anos, já começa a mostrar uma certa acomodação no seu ritmo de expansão, principalmente quando comparado a 2022.

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“Isso está relacionado à forte desaceleração da atividade econômica diante do ciclo de alta dos juros pelo Banco Central, menor crescimento da renda e do consumo das famílias, além do aumento do desemprego”, comentou.

Contudo, ele destacou que os dados mais recentes de atividade têm mostrado que esse arrefecimento da economia está sendo mais moderado que o esperado. “O setor de serviços surpreendeu positivamente nos últimos dois meses, mostrando uma dinâmica mais resiliente de alguns segmentos, como transportes, o que deve contribuir para um melhor desempenho do PIB no primeiro trimestre”, observou.

Caso a tendência permaneça, Perez disse que será possível ver um cenário um pouco menos adverso para a atividade econômica este ano.

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A análise do Banco Original é parecida. Para os economistas Marco Caruso e Igor Cadilhac, o alto nível de endividamento das famílias e a moderação da atividade econômica, tanto no Brasil, como no exterior, poderão tirar parte da força dos reajustes de serviços.

“No entanto, até o momento, a atuação dos serviços segue surpreendendo com um desempenho acima das expectativas, o que justifica a preocupação do Banco Central com a persistente inflação do setor”, comentaram.

Em março, ele destacaram que houve crescimento da demanda em três das cinco atividades apuradas na pesquisa do IBGE. “Como era esperado, assim como em fevereiro, a principal contribuição positiva veio dos serviços de transporte (3,6%). Com exceção do transporte aquaviário, que apresentou estabilidade, todos os demais cresceram consideravelmente”, afirmaram.

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Em específico, eles citaram o desempenho do transporte terrestre (3,3%), que tem se beneficiado da demanda crescente vinda do agronegócio.

Do lado negativo, os economistas do Original voltaram a destacar os serviços prestados às famílias, que recuaram 1,7%. “Esse setor tem uma demanda reprimida que sofre para recuperar os níveis pré-pandêmicos. A expectativa é que os estímulos fiscais, em conjunto com uma inflação mais moderada, possam auxiliar o desempenho do grupo daqui para frente”, previram.

Para 2023, o Banco Original projeta uma alta de 1,2% nos serviços, ainda impulsionada pela recuperação no período pós-pandêmico.

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Volatilidade

Na análise do Goldman Sachs, assinada por Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica para a América Latina, também é destacada a alta de 0,9% acima da estimada, mas com a ponderação que as leituras mensais têm se mostrado muito voláteis.

Ele destacou que, apesar da atividade positiva de serviços fevereiro a março ter surpreendido, a medida do trimestre móvel mostrou queda de 0,3%, a primeira retração em sete trimestres.

Daqui para frente, o banco de investimentos espera que a atividade de serviços se beneficie de estímulos fiscais significativos renovados, expansão da renda real do trabalho, redução da inflação e renda agrícola robusta.

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No entanto, também existe uma projeção que fatores como o enfraquecimento do impulso da reabertura econômica, condições monetárias e financeiras domésticas apertadas, altos níveis de endividamento das famílias e confiança fraca do consumidor e das empresas, além da reviravolta no ciclo de crédito, possam jogar contra a atividade de serviços nos próximos meses.

Claudia Moreno, economista do C6 Bank, destacou entre os dados de março divulgados pelo IBGE o papel do segmento de transportes e dos serviços auxiliares aos transportes e correio (+3,6%), que têm um peso de mais de 35% na composição do indicador e registrou a segunda alta consecutiva.

Mas ela também acredita que os serviços devem começar a sentir mais fortemente daqui para a frente o efeito dos juros altos praticados pelo BC, devendo andar de lado ao longo de 2023. “O dado de hoje não altera nossa previsão de crescimento do PIB de 1,5% em 2023. Para 2024, a projeção é que o PIB tenha um aumento de 1%”, estimou.

Para o Itaú, a projeção também é de uma desaceleração gradual do setor de serviços nos próximos meses, em meio ao impacto defasado da política monetária contracionista.

O Santander Brasil, por sua vez, projetamos crescimento do PIB de +1,0% em 2023, com desaceleração significativa da demanda doméstica e da oferta cíclica, decorrente principalmente da esperada recessão global e da política restritiva do BC.

“Mas esperamos forte crescimento para mercados não cíclicos produção agrícola, refletindo uma previsão de alta histórica para a safra de grãos”, comentou o analista Gabriel Couto.