Setor de serviços começa a perder o impulso da retomada pós-pandemia, dizem analistas

Desempenhos foram mistos entre os segmentos e queda mais intensa em janeiro foi atribuída à base forte do recorde de dezembro

Roberto de Lira

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Embora a queda no volume de serviços na passagem de dezembro para janeiro, de -3,1%, tenha superado as estimativas, os analistas dizem que o desempenho atual do setor está mantendo a tendência esperada, de uma acomodação após a forte retomada que sucedeu o período mais crítico da pandemia de covid-19. Parte da queda mais forte foi atribuída ao dado recorde de dezembro (alta de 2,9%), mas a leitura é que os serviços vão sofrer cada vez mais o impacto do desaquecimento da economia, ainda que com resultados mistos entre os setores.

Isso já pode ser observado na pesquisa divulgada hoje pelo IBGE. O Banco Original destacou o fraco desempenho dos transportes no mês de janeiro, mas ponderou que, mesmo com essa performance ruim, o índice de atividades turísticas conseguiu um avanço de 0,5%.

Além disso, segundo análise dos economistas Marco Caruso e Igor Cadilhac, os serviços prestados às famílias apresentaram crescimento de 1% na comparação mensal. “Esse movimento foi impactado por um mercado de trabalho aquecido e com rendimentos crescentes”, avaliaram.

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A análise do banco pontuou que houve queda na demanda em três das cinco atividades apuradas na pesquisa, sendo que os serviços de transporte trouxeram a principal contribuição negativa, com queda de 3,7%.

“Com exceção do transporte aquaviário, as demais aberturas tiveram retração. Refletindo o recuo de 1,4% no transporte terrestre e de 5,9% no transporte aéreo, o volume de transporte de passageiros caiu 2,4% com ajuste sazonal frente ao mês anterior”, citaram os economistas.

Para a frente, a previsão é que o alto nível de comprometimento de renda das famílias deve seguir pesando negativamente no indicador. “Da mesma forma, os efeitos positivos da normalização da mobilidade pós-pandemia, observada em 2022, perde importância ao longo deste ano e moderar a atividade do setor”, comentaram.

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Com os números de janeiro, o Banco Original espera uma queda no setor de serviços e uma estabilidade relativa na produção industrial e no varejo. “Projetamos um IBC-Br de -0,6 no mês.”

Sinais mistos

O Santander Brasil tinha uma estimativa de queda de 1,4% no indicador do mês e também destacou os sinais mistos mostrados pelas diferentes atividades no período. O economista Gabriel Couto destacou que os serviços às famílias (+1%) tiveram o segundo aumento consecutivo mais forte.

Ao mesmo tempo, os serviços de informação também aumentaram 1,0% na comparação mensal e compensaram parcialmente a queda verificada em dezembro (-1,8%). Mas os serviços profissionais diminuíram 1,5%, já que outros serviços – um subsetor altamente volátil que inclui atividades como corretagem e serviços financeiros – tiveram uma queda de 9,9%. Isso após um salto de 9,4%um mês antes.

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No total, o índice de difusão atingiu caiu de 67% para 46% entre dezembro e janeiro, com seis das treze atividades apresentando crescimento na margem. O Santander destacou que o carrego (“carryover”) estatístico calculado para o primeiro trimestre é de -1,2%, ante alta de 1,3% no quarto trimestre de 2022.

Com os dados de hoje, a projeção do Santander para IBC-Br de janeiro foi revisado para -0,5% na leitura mensal, ante -0,4% na projeção anterior. “Se nosso resultado estiver na marca, seria a quinta queda nos últimos seis meses”, escreveu Couto.

Para o PIB, a estimativa no primeiro trimestre é de crescimento 0,5% ante o mesmo trimestre do ano passado. “Projetamos PIB +0,8% em 2023, com desaceleração significativa da demanda doméstica e da oferta cíclica, decorrente principalmente da esperada recessão global e da política rígida do Banco Central”, disse o economista do Santander, que prevê forte crescimento da produção agrícola não cíclica para o ano.

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O Goldman Sachs também destacou que a queda apontada na pesquisa de serviços do IBGE referente a janeiro foi concentrada em 3 das 5 grandes categorias: transporte e armazenamento, serviços profissionais e administrativos e outros serviços.

Segundo o economista Alberto Ramos, embora seja esperado algum benefício ao setor pela renovação dos estímulos fiscais, que devem trazer expansão da renda real do trabalho, a perda do impulso pós-pandemia e as condições monetárias e financeiras domésticas apertadas devem agir como atenuadores.

Perdendo tração

Para Rafael Perez, economista da Suno Research, o segmento encontrava-se em máximas históricas, o que acabou influenciando o dado do mês por conta da base de comparação elevada.

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“O setor teve um desempenho bastante robusto com a reabertura da economia e a forte melhora no mercado de trabalho ao longo de 2022. Porém, os serviços já começam a dar sinais iniciais de que estão perdendo tração”, comentou.

Para ele, isso está relacionado à forte desaceleração da atividade econômica diante da política monetária bastante restritiva, ao menor crescimento da renda das famílias e ao aumento do desemprego. “Porém, esse quadro pode auxiliar numa desinflação dos preços dos serviços, já que tem sido um dos mais resilientes e difíceis de combater”, disse.

Perez afirmou que a tendência ao longo do ano é que o setor deve continuar andando de lado, diante das condições adversas, o que deve se traduzir num menor crescimento da economia brasileira.

Já o Itaú afirmou, em análise assinada por Natalia Cotarelli e Matheus Fuck, que o dado principal (-3,1%) foi uma surpresa negativa, mas que parte dessa queda deve ser atribuída a efeitos pontuais.

“Por outro lado, o aumento dos serviços prestados aos agregados familiares parece temporário, impulsionado pelas férias de verão. Para os próximos meses, esperamos uma desaceleração mais gradual dos serviços em meio ao fim do efeito da reabertura e ao impacto defasado da política monetária contracionista”, afirmaram.