Credit Suisse: o que aconteceu com o banco da crise até a compra pelo UBS e o que esperar

Crise evidenciada no ano passado foi contornada com compra pelo UBS, mas analistas ainda apontam incertezas para o setor (e também para operações)

Equipe InfoMoney

Credit Suisse - Londres (Foto: Divulgação)
Credit Suisse - Londres (Foto: Divulgação)

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O Credit Suisse voltou a ganhar destaque no noticiário nos últimos dias, mais especificamente desde a última quarta-feira (15), quando teve uma forte queda da ação que arrastou outras do setor.

Isso prolongou o temor dos investidores – que já estavam sendo impactados desde o fim da semana anterior com as quebras de bancos regionais americanos SVB e Signature Bank – e também exigiu uma atuação rápida das autoridades, culminando com a aquisição do banco pelo seu rival suíço UBS. Com a compra, os riscos para o mercado foram vistos como dirimidos, diminuindo a aversão ao risco, mas a crise ainda parece longe de acabar.

Os papéis do Credit já tinham caído na terça-feira da semana passada, com o anúncio do banco de que tinha encontrado “fragilidades materiais” em seus relatórios financeiros nos nos últimos dois anos por causa de controles internos ineficazes. Porém, o estopim ocorreu na última quarta, com as declarações de Ammar Al Khudairy, presidente do Saudi National Bank, afirmando que o banco, já um dos maiores investidores no Credit Suisse, não poderia colocar mais capital. “Não podemos porque [nossa participação] iria ficar acima de 10%. É uma questão regulatória”, disse ele.

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“A ausência de um socorro visível disparou o alarme. Apesar de o Credit Suisse informar que os demonstrativos financeiros referentes a 2021 e 2022 refletem os resultados ‘com bastante precisão’, essa entidade chamada mercado mostrou que sua tolerância está baixa”, apontou a Levante Ideias de Investimento.

Com as declarações sauditas e as notícias da fragilidade contábil, as cotações do banco caíram para menos de 2 francos suíços na Bolsa de Zurique, afetaram os preços de outras instituições financeiras na Europa e em vários países, e provocaram solavancos nos pregões em geral, indo para além da Europa e do sistema financeiro.

O susto inicial só passou quando o banco central da Suíça disponibilizou liquidez ao banco, na tarde de quarta-feira. Horas depois, o Credit Suisse afirmou que pretendia exercer a sua opção de tomar empréstimos de até 50 bilhões de francos suíços (US$ 53,68 bilhões, ou R$ 285 bilhões) do Banco Nacional Suíço por meio de uma linha de empréstimo coberta e uma linha de liquidez de curto prazo.

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Boa parte dessa reação mais forte do que esperado deveu-se ao momento, apontou a Levante na ocasião, em meio à quebra do Silicon Valley Bank e dois dias depois da falência do Signature Bank, mostrando o impacto da gestão inadequada de risco dos ativos, que se evidenciou com a alta de juros pelos principais bancos centrais. Esses eventos, segunda e terceira maiores falências bancárias dos Estados Unidos, não foram exatamente tranquilizadores, destacou.

Início da crise do Credit Suisse

Vale ressaltar que os problemas no Credit Suisse não foram recentes. A instituição lutava para se recuperar de uma série de escândalos nos últimos anos, que levou as ações a desabarem nos últimos 12 meses. Os papéis, que valiam cerca de 80 francos suíços em 2008, fecharam a sessão da última sexta-feira a 1,86 francos suíços.

O banco suíço sofreu com as consequências de duas grandes crises – o colapso da empresa financeira britânica Greensill e do fundo de multimercado norte-americano Archegos – que, combinados, custaram bilhões de dólares e levaram a uma mudança na sua administração.

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A primeira crise, a falência de Greensill, instituição financeira britânica que emprestava dinheiro para outras empresas pagarem seus fornecedores e que, na sequência, empacotava as dívidas em títulos financeiros (securitização) para revender a investidores.

Em certo momento, no entanto, o modelo negócio passou a gerar desconfiança e, em março de 2021, a companhia declarou falência – levando junto US$ 10 bilhões de clientes do Credit Suisse.

O segundo escândalo veio na sequência e envolveu o já mencionado family office Archegos Capital, de Bill Hwang, investidor sul-coreano baseado em Nova York.

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O escritório administrava US$ 10 bilhões, mas Hwang convenceu bancos, incluindo o Credit Suisse, a fornecerem US$ 30 bilhões para investir mais. Em 2020, ele investiu pesadamente na ViacomCBS, que viu o valor de suas ações disparar. Os papéis, porém, recuaram após um tempo. A Archegos não conseguiu cobrir as perdas ligadas aos financiamentos e, após um tempo, faliu.

O Credit Suisse passou a perder funcionários importantes do seu quadro, como o codiretor global do setor bancário Jens Welter e o chefe de produtos de crédito global Daniel McCarthy, e também clientes.

Em 2021, a instituição prometeu uma reestruturação sendo que o atual diretor executivo da instituição (CEO), Ulrich Koerner, que assumiu o cargo no final de julho de 2022, é especialista em projetos do tipo.

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A partir daí, começou a crescer a preocupação com a saúde do banco, principalmente no cenário de deterioração das condições macroeconômicas com juros mais altos e possibilidade de recessão das principais economias globais.

Assim, no contexto de fragilidade dos bancos regionais americanos, a fala na semana passada do até então maior investidor do Credit abalou e muito a instituição.

UBS concorda em comprar o concorrente

Com isso, no fim da última semana, começaram a surgir informações de que o UBS poderia comprar o seu rival, o que se efetivou após longas negociações, intermediadas por reguladores do país.

O UBS concordou em comprar o Credit Suisse por US$ 3,25 bilhões, criando assim um dos maiores bancos da Europa, com quase US$ 1,7 trilhão em ativos totais, e foi importante para evitar uma crise de confiança que poderia se espalhar pela Europa e Estados Unidos. Junto com o anúncio da transação, o Federal Reserve e outros cinco bancos centrais anunciaram uma ação coordenada para aumentar a liquidez aos mercados financeiros.

O anúncio, por mais que tenha gerado alívio, também trouxe alguns pontos polêmicos. Na venda do Credit Suisse, os títulos de maior risco, que somavam cerca de US$ 17 bilhões, tiveram de ser eliminados para que a conta pudesse fechar para o UBS, o que catapultou uma nova onda de temor, com reflexos no mercado global de títulos de dívida (os chamados bonds). A principal preocupação de investidores é de que eles podem estar expostos a um risco maior do que previam em relação aos bancos.

Entre os títulos que os bancos usam para captar recursos e atender exigências regulatórias de capital, um dos mais comuns é AT1 ou ‘Additional Tier 1 Bonds’, um instrumento de dívida subordinada semelhante a um bônus perpétuo, ou seja, sem data de vencimento, sem garantia e não conversível.

Nesse instrumento, o banco não paga o valor do principal captado, mas juros aos investidores que compram. Quando o capital de um banco cai abaixo de um determinado nível mínimo, o regulador pode forçar a conversão desses papéis ou simplesmente eliminá-los, o que ocorreu com o Credit Suisse.

Alívio e incertezas 

Na segunda-feira (20), sessão após o anúncio da compra pelo UBS, as ações do Credit desabaram 55%, de forma a se ajustar aos valores da compra feito pelo seu ex-rival. Pelo acordo, o UBS oferece uma de suas próprias ações para cada 22,48 ações que os investidores detêm no Credit Suisse. O UBS, por sua vez, após chegar a cair 16% na sessão da véspera, virou para alta e fechou com ganhos de 1,26%, em uma sessão que foi de melhora ao longo do dia para as ações do setor pelo mundo, com a menor percepção de risco para o setor após a “operação salvamento”.

Contudo, o cenário incerto permanece.

“Parece que o caso do Credit Suisse foi encaminhado, mas ninguém sabe se outras instituições terão problema. Tem uma preocupação com o contexto global”, diz Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências.

Também ainda há uma dúvida entre operadores e investidores sobre se os implacáveis aumentos de juros do banco central norte-americano, que alguns culpam por desencadear o maior colapso no setor bancário desde a crise financeira global, podem ter chegado ao fim. A atenção se volta para a reunião desta semana do Federal Reserve, com a decisão de juros na próxima quarta-feira.

“A situação atual nos bancos regionais dos EUA e no Credit Suisse levantou preocupações sobre o risco de contágio”, disse Grace Tam, consultora-chefe de investimentos para Hong Kong do BNP Paribas Wealth Management, acrescentando que o sentimento de curto prazo permanece volátil.

A necessidade de resgate do Credit Suisse, de 167 anos, foi desencadeada pelo colapso dos credores americanos de médio porte Silicon Valley Bank (SVB) e Signature Bank, e investidores estão preocupados com possíveis bombas-relógio no sistema financeiro.

A Associação de Banqueiros da Suíça disse nesta terça-feira que a oferta de crédito no país não será restringida pelo colapso do Credit Suisse, acrescentando que está convencida de que o setor bancário suíço ainda tem um “futuro próspero”.

“Desta vez, os principais bancos centrais têm reagido muito rapidamente para garantir a liquidez. As autoridades americanas também estão estudando maneiras de garantir temporariamente todos os depósitos bancários se a crise bancária se expandir”, disse Tam.

Mas o choque repentino significa que os investidores agora aumentaram suas apostas de que o Fed fará uma pausa em seu ciclo de aperto monetário na quarta-feira, de forma a tentar garantir a estabilidade financeira, embora operadores permaneçam divididos sobre se o Fed aumentará sua taxa básica de juros.

“A experiência de quase morte do setor bancário nas últimas duas semanas provavelmente tornará as autoridades do Fed mais comedidas em sua posição sobre o ritmo dos aumentos”, disse o chefe de pesquisa cambial para o G10 do Standard Chartered, Steve Englander.

Impacto nas operações

O impacto da aquisição do Credit pelo UBS para as operações de ambos no mundo e no Brasil são observadas de perto pelos investidores. Segundo profissionais ouvidos pelo InfoMoney, a compra do Credit Suisse pelo UBS não deverá alterar o andamento de operações já em curso no Brasil, como emissões de dívidas, fusões e aquisições (M&A, em inglês) e ofertas de ações. No entanto, a captação de novos negócios, tanto por parte da filial brasileira do CS quanto do UBS BB, tende a desacelerar até o fechamento da transação.

De acordo com o Estadão, no escritório do Credit em São Paulo, havia preocupações na equipe, como o risco de demissões com a sobreposição dos negócios com o UBS na área de banco de investimento e a potencial venda de novas partes do negócio.

Os bancos ainda não detalharam como as operações brasileiras serão afetadas. No País, as duas instituições têm atividades parecidas, com o foco na gestão de grandes fortunas, em fusões e aquisições e na emissão de dívidas de companhias e ações.

Os dados do BC mostram que em 2022 o Credit Suisse tinha cerca de R$ 42 bilhões em ativos e o UBS, R$ 1,2 bilhão.