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SÃO PAULO – Paciência é a palavra-chave que o investidor precisa ter neste início do governo de Michel Temer. O mercado foi muito eufórico com o afastamento da presidente Dilma Rousseff no 1º semestre, mas é preciso ter cautela até que uma mudança estrutural realmente ocorra para sustentar os preços atuais do mercado. Essa é a avaliação de André Pimentel, CIO (Chief Investment Officer) da Mirae Asset, gestora que possui R$ 200 milhões em ativos sob gestão.
Para Pimentel, a Bolsa deve seguir de lado nos próximos meses, mas ele já começa a se preparar para o momento da virada, que deverá ocorrer no próximo ano. “A gente tem olhado mais o lado micro do que macro neste momento, mas nós já estamos com diversos cenários engatilhados esperando a oportunidade mais correta para entrar”, explica o diretor de investimentos da Mirae em entrevista para o especial Onde Investir 2016 – 2º Semestre. O dólar, por sua vez, deve fechar o ano na faixa de R$ 3,20.
Confira a entrevista completa:
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InfoMoney – O mercado ficou bastante eufórico com o impeachment, mas após a entrada de Michel Temer a Bolsa entrou em um “compasso de espera” e perdeu força. Você acredita que este é um momento de cautela ou o mercado não está otimista com o novo governo?
André Pimentel – Realmente está não é um momento para euforia. A melhora vai vir, mas o investidor precisa saber que será gradualmente. Quando foi aprovado o processo de impeachment, a gente já dizia que a melhora viria, mas que seria gradual, nada vai acontecer da noite para o dia. Não se pode esperar que o governo terá aprovação de todas as medidas e o Brasil vai virar “AAA” pelas agências de rating, não é algo assim. É um processo bastante gradual e que demanda tempo, e que inevitavelmente vai ocorrer volatilidade no meio do caminho…
IM – …mas então para quando você acredita que veremos uma melhora do mercado?
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AP – Eu acredito que o Brasil pode entrar em uma tendência muito favorável a partir do ano que vem. O grande problema de inflação que a gente observou nos últimos anos foi uma combinação de grande excesso de crédito, enquanto tínhamos uma expectativa de inflação bastante desancorada, uma desvalorização cambial relevante e um mercado de trabalho muito apertado. Você tem diversas fontes de inflação e a tendência é que nenhuma destas fontes de inflação estejam apertadas, não só para o próximo ano, mas para os outros também.
O desemprego já está acima do nível neutro. Você tem um Banco Central novo, que na nossa visão não vai ser “dovish” (na tradução livre: não será tolerante) e vai tender a cortar os juros conforme as condições forem permitindo, com isso ele vai conseguir ancorar a expectativa de inflação. E o que a gente vê é muito menos estímulo para que os bancos públicos emprestem, ou seja, o crédito dos bancos públicos não deve crescer de forma muito relevante. O cenário de inflação tende a ser muito mais positivo para os próximos anos.
Se a gente tiver alguma colaboração, que a gente acredita que deva ter nos próximos anos da política fiscal, você abre espaço para a política monetária atuar. O corte de juros, por mais que a gente não acredite que será muito grande no curto prazo, é algo que pode ser contínuo.
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IM – E você acredita que o investidor irá retomar a confiança perdida no governo Dilma e que ainda não é total com Temer?
AP – Eu acredito nesta melhora. Medidas muito importantes estão sendo implementadas e este novo governo tem um capital político importantíssimo, mas isto é algo que não acontece do dia para a noite. Isto é uma luta, para aprovar estas medidas impopulares, e que tem que ter uma certa paciência. O mercado muitas vezes fica muito empolgado, coloca muita coisa no preço e depois acaba sendo necessário alguma realização. Demanda tempo pra que melhore, mas não estou pessimista.
IM – Em relação dólar, você vê mais espaço para quedas daqui para frente?
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AP – A gente acredita que o real pode continuar se apreciando, observando uma melhora contínua nas contas externas do Brasil, afastando todo este risco que se tinha de dívida cada vez mais explosiva, com o risco de default sendo levantado por muita gente. Nós vemos uma melhora mais efetiva do prêmio de risco, do CDS, e naturalmente isto tem algum reflexo no real, que a gente acredita que deve encerrar o ano mais próximo de 3,20 (contra o dólar) e isso vai ter reflexo em diversos outros ativos.
Outro ponto bastante importante é a política monetária implementada pelo Federal Reserve. O mercado de trabalho tem sido o grande pivô da recuperação norte-americana. A gente via dados de confiança perdendo força, dados da indústria bem mais fracos na margem, e o que vinha segurando a economia americana era o mercado de trabalho.
Mas estes últimos dados do Payroll (Relatório de Emprego) foram bastante assustadores. A gente viu dados mais próximos de 30 mil de criação de postos de trabalho e isto é muito abaixo do necessário para manter a taxa de desemprego neutra. Para que ela fique parada isto esta muito abaixo do que deve ser gerado. A gente calcula algo próximo de 120 mil ou 130 mil de criação de emprego mensal para que esta taxa fique estável. O Fed acredita que a taxa de desemprego neutra ainda é abaixo do que está agora, ou seja, você ainda tem subempregos na economia norte-americana, e esta geração de emprego tem que voltar a ficar acima deste patamar.
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Lógico que o Payroll é um dado muito volátil, inclusive nós só vimos esta piora expressiva neste indicador, o próprio ADP não mostrou esta queda efetiva. Então nós temos que ver quais serão os próximos dados, como eles virão, para termos uma melhor noção de como está a economia norte-americana. Mas este seria mais um ponto para beneficiar o real, a economia americana andando numa força menor do que imaginado anteriormente.
Há a possibilidade de um fortalecimento mais expressivo do real ainda mais com toda essa situação do Brexit, dado que se acredita que novas altas pelo Fed estão descartadas. Eu poderia até rever o dólar para patamares mais baixos, caso não acreditasse que este tipo de movimento tem como consequência final a aversão a risco. Fico sempre muito cauteloso quando vejo mercados emergentes performando melhor que os desenvolvidos em momentos de aversão. Já vimos alguns movimentos como esse na história, e isso sempre antecede um riskoff mais forte.
IM – E você tem alguma estimativa sobre quando veremos uma alta de juros nos Estados Unidos?
AP – A gente acredita em uma alta este ano. As duas próximas reuniões a taxa deve ficar estável e a seguinte deve marcar uma alta. A partir disso, acredito que o Fed vai esperar para ver exatamente como fica a economia antes de tomar alguma nova decisão sobre os juros.
IM – No exterior um dos grandes temores do mercado, além da alta de juros nos Estados Unidos, tem sido a China. Como você vê esta questão e seus impactos no mercado para os próximos meses?
AP – A desaceleração da China em boa parte já aconteceu, e é importante lembrar que os dados do país são um pouco complicados de se confiar. Mas o que a gente observa, que muita gente acredita, inclusive a Mirae, que a China já está crescendo num patamar diferente do que é anunciado. Ela já está crescendo mais próximo de 5% e isso é mais sustentável dado o nível de investimento deles.
É muito difícil de vermos novos problemas ou uma nova desaceleração da China, e todo esse movimento que temos observando nos últimos anos já foi antecipado pelo mercado. Então não vemos grandes problemas na China, se houver algo seria mais residual. Não é uma fonte de preocupação relevante nossa no momento.
IM – E a pressão da China sobre as commodities? Como você vê os preços do petróleo e do minério até o fim do ano?
AP – A questão da oferta já tem se ajustado. O petróleo está num patamar bem baixo, mas um patamar que inviabiliza certas formas de extração do petróleo. Então naturalmente quando chega você tem uma redução da oferta e algum equilíbrio começa a ser encontrado.
Já o minério teve uma queda muito relevante, que afetou diversas mineradoras do mundo. A questão é que ainda parece desbalanceado o nível de oferta e demanda. Para o minério ainda tem uma oferta excessiva, diversas mineradoras chinesas começaram a produzir nos últimos anos e a oferta ainda está em um patamar muito mais alto. A grande questão é que o custo de produção destas mineradoras chinesas é bem mais alto do que as mineradoras brasileiras ou australianas. Eles entraram no mercado num momento em que o minério estava muito mais alto e talvez não se preocuparam tanto com a questão do custo.
Esta questão do minério é um pouco mais específica, porque a gente tem uma oferta acima da demanda, logicamente, mas que tende a ser mais resiliente. Apesar das mineradoras terem um custo para produção muito alto, elas são chinesas, então não sei se elas terão tanta preocupação com prejuízo no curto e médio prazo. A longo prazo o negócio fica complicado, mas esta produção das mineradoras chinesas pode continuar durante um bom tempo, ainda que seja algo que dê prejuízo. Ainda é uma questão perigosa, porque se trata de uma economia fechada.
IM – Voltando ao Brasil. Em relação à Selic, iremos ver cortes de juros no curto prazo?
AP – Trabalhamos com o cenário de um Banco Central mais “hawkish” do que o mercado está esperando agora. O BC está enfrentando grandes problemas para ancorar a expectativa de inflação, e a gente acredita que este é o momento para você ajustar esta questão, não deixando a inflação tão desancorada como a gente viu nos últimos anos. A gente acredita que não tem espaço para quedas dos juros no curto prazo. Atualmente temos a inflação em 12 meses, por mais que cadente, rodando em um patamar muito alto, enquanto a expectativa de inflação está razoavelmente acima da meta.
IM – E você acredita que a chegada de Ilan Goldfajn realmente irá mudar a forma como o BC atua?
AP – O comportamento deve ser diferente principalmente em relação à expectativa de inflação. Este novo Banco Central vai ter um comportamento diferente quanto a isso, e muito mais em contato, em harmonia com o que o mercado vê. Se o mercado não acredita que tem espaço para cortar juros, eu não acho que ele vai lá e vai cortar os juros. Será um negócio muito mais harmônico neste sentido.
IM – E com todo este cenário em mente, como você vê a Bolsa nos próximos meses?
AP – A gente acredita que o mercado deve ficar próximo do patamar atual, andando de lado nos próximos meses. As empresas precisam melhorar seus níveis de endividamento e é preciso algum sinal de melhora efetivo na atividade antes de vermos uma alta mais relevante, mais estrutural, para a Bolsa. Do contrário teria que pagar muito na frente, acreditando muito em uma melhora e a gente acha que isto está muito mais na esperança do que num cenário mais provável.
IM – Em relação às empresas, tem alguma ação que vocês estão investindo neste momento e que veem com bons olhos?
AP – Eu não vou citar exatamente ações, mas setores. A gente tem apostado em algumas ações de bancos, apesar de ser um setor bastante complicado nessa situação do País, sendo que a inadimplência ainda pode subir, não temos uma ação específica. O setor de rodovias também vemos com otimismo. A gente acredita que foi muito descontado, e que tem espaço para alguma melhora. E tem outras ações, mas a gente tem operado mais no relativo do que no absoluto.
IM – E como a Mirae está posicionando seus fundos neste ambiente econômico e político?
AP – O que a gente tem visto no momento é que ainda tem espaço para a queda de juros longa, quando falo curva de juros longa eu digo janeiro de 2020 ou janeiro de 2021. Tem algum espaço para queda, por mais limitada que seja. É uma posição mais tática do que estratégica, mais de curto prazo do que médio ou longo prazo.
Mas a principal posição que a gente acredita que possa ter essa oportunidade vai ser em juro real. Em algum momento em julho ou agosto a gente deve ver essa posição criando uma oportunidade muito boa, com as NTN-B médias mais próximas de 6,5%, ou 6,7%, a gente acredita que possa ter uma esticada até estes patamares. Esta deve ser a posição mais estrutural. Neste momento temos montado posições mais táticas.