Eletrobras (ELET6) de volta ao jogo, enquanto “grande vencedora” não leva nenhum lote: o saldo do leilão para as elétricas da B3

Ação da Neoenergia foi destaque de alta do setor na sexta, subindo 6,9% e sem levar lotes, com percepção de disciplina de capital em meio à competição alta

Lara Rizério

Preços de energia elétrica puxaram altas do Grupo Habitação no mês
Preços de energia elétrica puxaram altas do Grupo Habitação no mês

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Realizado na última sexta-feira (30), o leilão de transmissão da Agência Nacional de Energia (Aneel) foi novamente marcado por competição e altos deságios oferecidos pelos players participantes – algo que os certames passados vinham apresentando e já era esperado que fosse ocorrer.

A melhora do cenário macroeconômico, como a expectativa de queda da Selic, pode estar entre os fatores que levaram os competidores a oferecerem maiores deságios. Para esse leilão, o deságio médio ficou em 50,1%, representando uma relação Receita Anual Permitida (RAP)/investimento de 8%, com R$ 15 bilhões de investimento total esperado.

O consórcio Gênesis, formado pelas empresas The Best Car Transporte de Cargas (92,52% da participação) e Entec Empreendimentos Eireli (7,48%), arrematou os lotes 1 e 8. A Rialma Administração e Participações arrematou o lote 2, o maior do leilão, ao oferecer uma RAP de R$ 347,8 milhões, com desconto de 51% em relação à RAP máxima, superando outros sete proponentes, incluindo grandes empresas como State Grid, Taesa (TAEE11), Cteep (TRPL4), Engie (EGIE3) e Eletrobras (ELET3;ELET6).

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Já a Cymi Construções e Participações arrematou o lote 3 ao ofertar RAP de R$ 70,89 milhões, com deságio de 52,13% ante o valor máximo estipulado pela Aneel. As geradoras Auren (AURE3) e Engie, e a Cemig também participaram. A Celeo Redes Brasil conquistou o lote 6, com um lance de R$ 99,87 milhões, deságio de 48,23% em relação à RAP máxima fixada pela Aneel, desbancando a EDP (ENBR3) em disputa viva-voz.

Entre as empresas tradicionais que conquistaram lotes, a Engie conquistou o maior, de número 5 – terceiro maior do leilão, com 1.006 quilômetros de linhas, entre a Bahia, Minas Gerais e Espírito Santo, com investimentos estimados em R$ 3,667 bilhões.

Já ISA Cteep levou os lotes 7 e 9. Pelo lote 7, correspondente a 1.044 quilômetros de linhas entre Minas Gerais e Rio de Janeiro, somando R$ 2,342 bilhões em investimentos, a empresa ofertou RAP de R$ 218,8 milhões, deságio de 41,81% frente a RAP máxima. Já no caso do lote 9, ofereceu RAP de R$ 7,461 milhões, um deságio de 50,36% em relação à máxima estipulada pela Aneel.

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A Eletrobras também chamou a atenção, voltando a vencer disputas. A empresa, por meio da subsidiária Furnas, fez o melhor lance pelo lote 4 do leilão, com oferta de R$ 68,7 milhões, correspondente a desconto de 45,75%, superando outros 11 interessados. O lote concentra obras em Minas Gerais, somando 303 quilômetros de linhas de transmissão que ajudarão a escoar a energia gerada no Estado, sobretudo de fonte fotovoltaica. O investimento é estimado em R$ 786,6 milhões e o para conclusão do ativo é de 60 meses.

Conforme destaca a Genial Investimentos, das empresas que a casa cobre, Eletrobras ELET6 (via Furnas), Engie EGIE3 e Transmissão Paulista TRPL4 foram vencedoras do processo.

“Sob o lote específico vencido por cada uma delas, percebemos que: i) o deságios foram abaixo da média e ii) Taxas internas de retorno razoáveis, sob premissas muito conservadoras (não consideramos antecipação de entrada operacionais, possíveis benefícios fiscais Sudam/Sudene, entre outros)”, avalia a Genial.

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O Credit Suisse comentou que a concorrência foi alta (em média 8 nomes diferentes competindo por cada bloco), o que resultou em descontos relevantes sobre o RAP, embora os maiores descontos tenham ocorrido nos blocos vencidos por empresas não listadas, o que também surpreendeu.

O Itaú BBA avalia ainda que, com vários lotes vencidos pelos players não listados, essas empresas terão um desafio grande de obtenção de financiamento e capex (investimento) competitivo dado o porte das companhias e as condições de mercado. O banco aponta que o leilão foi muito competitivo e, se utilizadas as premissas de capex e entrada em operação da Aneel, os retornos seriam muito baixos com destruição de valor.

“Com as premissas de antecipação em 2 anos, realavancagem, margem Ebitda mais elevada, custo de dívida mais baixo, desconto de capex, chegamos em retornos razoáveis para esses lotes vencidos pelos players listados”.

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O Bradesco BBI apontou que os retornos foram apertados, como esperado, o que fez com que algumas empresas que sequer arremataram lotes fossem consideradas as vencedoras do leilão. Neoenergia (NEOE3) foi bastante conservadora, com lances apresentando deságio em relação ao RAP máximo entre 19% e 32%. Assim, apesar de não ganhar nenhum projeto, a visão do mercado foi positiva, pois em leilões anteriores a empresa foi vista como uma licitante agressivo e agora manteve disciplina de capital. Na sexta, NEOE3 saltou 6,90% por conta da visão de disciplina de capital.

Outros participantes bem-comportados que não ganharam projetos incluem: (i) Auren (uma licitação para o Lote 3 com 29% de desconto); (ii) Taesa, que licitou os Lotes 1, 5, 6 e 7; e (iii) o consórcio formado por Equatorial (EQTL3) e Alupar (ALUP11), com lances de aproximadamente 40%. Não houve licitação da CPFL (CPFE3) e da Energisa (ENGI11).

O Morgan Stanley destaca que o leilão de sexta foi apenas o primeiro de muitos que o governo realizará até 2032, dos quais os investimentos totais devem totalizar cerca de R$ 200 bilhões. Nos próximos 12 meses, mais dois leilões devem demandar investimentos adicionais de aproximadamente R$ 35 bilhões. O próximo leilão, que deverá ocorrer em dezembro de 2023 (previsão anterior era de ocorrer em outubro), tem previsão de investimentos de R$ 19,7 bilhões, e a outra em março de 2024, podendo alcançar cerca de R$ 15 bilhões em investimentos.

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Confira abaixo sobre a avaliação das empresas após o leilão:

Engie

A Engie venceu o Bloco 5 (terceiro maior) com um desconto de 42,8% (RAP final de R$ 249 milhões), superando outros 5 concorrentes. O Bloco 5 (capex estimado de R$ 2,67 bilhões) é uma linha de transmissão de 1.006 km conectando Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia.

A Genial aponta a Engie como ponto inesperado; a empresa arrematou um dos maiores lotes do leilão, após presenças mais tímidas nos eventos anteriores. Novamente, utilizando as mesmas premissas, a casa espera uma Taxa Interna de Retorno (TIR) nominal de 7,0%.

Para os analistas do BTG Pactual, embora nenhum guidance tenha sido fornecido, as avaliações alcançaram uma TIR real de 9,3% para o Bloco 5, assumindo: (i) economia de capex de 15% versus estimativa da Aneel; (ii) margem Ebitda de 95%; (iii) 18 meses de construção antecipada; (iv) alavancagem do capex de 80% a IPCA+6%; e (v) benefício fiscal da Sudene.

Isa Cteep

A Isa Cteep venceu os Blocos 7 e 9 com descontos de 42% e 50% (RAP de R$ 219 milhões e R$ 7 milhões). O Bloco 7 (quarto maior; capex estimado de R$ 2,3 bilhões) é uma linha de transmissão de 1.044 km conectando o Rio a Minas Gerais, enquanto o Bloco 9 (subestação elétrica de 400 MVA em São Paulo com capex estimado de R$ 94 milhões) é o menor. O Bloco 7 contou com mais 5 proponentes, enquanto o Bloco 9 recebeu mais 8 lances e foi acertado em viva-voz com Eletrobras e CelgPar.

A Genial aponta que, em suas premissas iniciais, está considerando uma eficiência de investimentos necessários de 20% a menos, com relação ao divulgado pela Aneel. A casa não olha para possíveis benefícios fiscais (Sudam/Sudene), além de  não considerar eventuais sinergias operacionais com outras linhas que a empresa já possui, assim como não observa possíveis adiantamentos de entrada operacional das linhas – algo que a empresa recorrentemente consegue entregar.

“Partindo desse cenário, encontramos uma TIR nominal de 7,7% e 6,2%, respectivamente ao lote 7 e 9, número que consideramos razoáveis levando em consideração o histórico operacional da empresa e eventuais alavancas de valor a serem exploradas em tais projetos”, aponta a casa de análise.

O BTG destacou que os projetos alcançam uma TIR real de 7,7% para o Bloco 7 e 6,4% para o Bloco 9, assumindo: (i) economia de capex de 15% versus estimativa da Aneel; (ii) margem Ebitda de 92,5%; (iii) construção antecipada (em 18 meses); e (iv) alavancagem do capex de 82,5% a IPCA+6% e os benefícios fiscais informados pela empresa. Os retornos podem ser maximizados por meio da re-alavancagem, atingindo 8,8% para o Bloco 7 e 6,6% para o Bloco 9.

Para o Morgan, os retornos do lance melhoraram versus os leilões anteriores, mas ainda não vê a criação de valor. “Acreditamos que o fechamento das ações de sexta-feira (+0,6%), com desempenho inferior ao IEE em 1,6%, foi consistente com nossa avaliação inicial do leilão. Por fim, apesar da desafiadora geração de valor, notamos que o retorno esperado dos lances da Cteep neste leilão foi melhor do que nos leilões anteriores”, apontam os analistas.

Eletrobras

Este foi o primeiro grande leilão após o retorno do CEO Wilson Ferreira Júnior, então a participação da empresa já era esperada. Por meio de sua subsidiária Furnas, concorreu a todos os nove blocos e venceu o Bloco 4 (linha de transmissão de 303 km em Minas Gerais com capex estimado de R$ 787 milhões) com desconto de 46% (RAP de R$ 69 milhões) após licitação com outras 9 empresas.

Em teleconferência pós-leilão, a empresa disse que vê retornos reais de dois dígitos para o Bloco 4 e está orientando para ´otimização´: 15% de economia de capex versus estimativa da Aneel, construção antecipada (2 anos de antecedência), margem Ebitda de 94-95% e alavancagem de 80%. O BTG fez cálculo para uma TIR real de 7,8% para o Bloco 4 (baseado no guidance), custo da dívida IPCA+6% e benefício fiscal da Sudene para 45% do bloco. “Se assumirmos a realavancagem, chegamos a uma TIR real de 8,8%. Os retornos podem ser maximizados, provavelmente atingindo o guidance da Eletrobras, com benefício fiscal no nível da holding e menor custo da dívida”, destacamos analistas do BTG.

A Genial aponta que, utilizando as mesmas premissas, encontra uma TIR nominal de 7,5%. “Pelo tamanho do lote, relativo ao tamanho da empresa, consideramos um número razoável, mas que no final não impactará o valuation da empresa”, ressalta.

O Morgan Stanley aponta que a Eletrobras claramente marcou o retorno de um player altamente competitivo nos leilões de transmissão, mas espera um Valor Presente Líquido (VPL) ligeiramente negativo para o lote 4. A Eletrobras foi a única concorrente que entregou propostas para todos os lotes do leilão isoladamente.

“Em nossa opinião, apesar do VPL ligeiramente negativo para o Lote 4, tal desempenho pode ser explicado pela combinação de taxas de juros mais baixas e maior diligência da Eletrobras e TIRs percebidas para os maiores lotes no leilão, pois, embora a empresa não tenha vencido [nesses maiores lotes], poderia indicam que a ELET poderia ser um veículo de crescimento competitivo e diligente após sua privatização”, avaliam os analistas do Morgan.

Neoenergia

A Neoenergia participou em parceria com a GIC. Não ganhou nenhum bloco, mas foi mais conservadora que seus pares e também quando comparado ao leilão do ano passado, provando disciplina de capital. Como tal, as ações subiram 6,9% na sexta-feira, aponta o BTG, em avaliação reiterada pelo Credit.

Energisa 

O Morgan destaca que, embora a Energisa tenha sido previamente cadastrada para participar de 7 lotes do leilão (ou seja, Lotes 1 a 7), a empresa não demonstrou interesse em licitar.

“A falta de interesse da Energisa em entregar lances pode estar relacionada à combinação de fatores, incluindo expectativas da administração sobre a agressividade dos concorrentes no leilão, possíveis desafios relacionados a fornecedores e disponibilidade de empresas de EPC (contratos de engenharia, gestão de compra e construção), alta alavancagem da empresa (alavancagem de cerca de 2,9 vezes a relação dívida líquida e Ebitda no 1T23) face a outras oportunidades de crescimento, entre outras”, avalia o Morgan.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.