Publicidade
A semana, que deveria ser marcada apenas por decisões no campo da economia, com a aprovação de algumas propostas do ajuste fiscal do ministro Joaquim Levy – pelo menos a revisão da meta fiscal de 2015, a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2016 e o projeto de regularização dos capitais de brasileiros no Exterior, será, novamente, dominada pelos assuntos da política a partir de novos desdobramentos da Operação Lava-Jato – as “bombas” armadas com as prisões do pecuarista José Carlos Bumlai, do banqueiro André Esteves e do senador Delcídio Amaral..
O fim de semana veio carregado de novas revelações com grau de aquecimento suficiente para aumentar a já insuportável temperatura política:
- A informação de que a Andrade Gutierrez, segunda maior empreiteira brasileira implicada no petrolão, acertou um acordo de leniência com o Ministério Público e seus executivos acertaram um acordo de delação premiada. A AG tem coisas demais a contar a já aceitou pagar multa de R$ 1 bilhão por seu envolvimento no caso. Ademais, além do escândalo da Petrobras, a Andrade confirmou propinas também na Ferrovia Norte Sul, em Angra 3, em Belo Monte e em obras da Copa do Mundo. Esse acordo isola a Odebrecht, a maior de todas e que até agora tem resistido às pressões para fazer o mesmo.
- A transformação da prisão do banqueiro André Esteves de prisão temporária em preventiva (deveria sair ontem, agora ficará por tempo indeterminado), o que levou à imediata renúncia dele à presidência do BTG, e deverá colocar pressão para um acordo de delação premiada.
- A pressão da família de Delcídio do Amaral para que o senador também recorra à delação, principalmente depois que ele – e a família, ficaram irritados com as atitudes de Lula, do PT e da própria Dilma. O senador se sentiu abandonado e traído. Como adicional, aumentou o temor no Congresso de um “efeito cascata”. O sono está escasso em Brasília.
- A descoberta de um documento nos papéis de André Esteves indicando que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (e outros parlamentares do PMDB), teria recebido um “agrado” de R$ 45 milhões pela aprovação de uma Medida Provisória (MP) que beneficiaria o BTG. Isso complica mais a posição de Cunha. Amanhã a Comissão de Ética da Câmara vai tentar mais uma vez julgar o processo de cassação contra ele, com a oposição fazendo pressões e uma parte do PT, mesmo contrariando a direção do partido, Lula e Dilma, disposta a votar contra Cunha.
E com Cunha, em retaliação, está prometendo anunciar agora a decisão sobre os processos de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Para não “provocar” demais o presidente da Câmara, informa “O Globo” que os aliados procuram uma pena alternativa para ele, pelo menos para manter o seu mandato de deputado.
Continua depois da publicidade
Quer receber as principais notícias de política diariamente no seu e-mail? Assine gratuitamente a newsletter do Na Real!
O contingenciamento de R$ 10,7 bi
Continua depois da publicidade
Como pano de fundo tudo isso, uma decisão do governo de cunho econômico, mas que ganha, nas circunstâncias atuais, foros políticos: diante da demora do Congresso de mudar a meta de superávit primário de 2015 (de mais 0,15% do PIB para menos 2%), contingenciar (corte temporário) mais R$ 10,7 bilhões das despesas este ano.
O novo texto com a decisão e o detalhamento dos cortes, a reprogramação orçamentária do último bimestre do ano, tem obrigatoriamente de ser publicado hoje e as novas normas passam a valer amanhã. Com isso, o governo deixa de pagar todas seus gastos não obrigatórios. Entre outros, cortes de diárias, de passagens, de bolsas e até de investimentos.
A alegação é de que isto foi necessário para cumprir determinação do Tribunal de Contas da União (TCU) e evitar que a presidente Dilma incorra em crime de responsabilidade fiscal, o que a sujeita a outro processo de impeachment. Pode ser, mas na realidade, o governo está fazendo uma espécie de “chantagem” com os parlamentares para que eles votem a mudança da meta fiscal.
Continua depois da publicidade
De fato, o buraco de Orçamento de 2015 não é apenas de R$ 10,7 bilhões – é de R$ 120 bi, incluídas as pedaladas fiscias. Porém, o corte anunciado na sexta-feira já é suficiente para paralisar parte das atividades da máquina federal. E, o mais insuportável para deputados e senadores, para impedir a liberação de verbas das emendas parlamentares.
O Banco Central está de olho
Além desta batalha, a turma da economia tem uma outra decisiva esta semana: a votação do projeto de repatriação/regularização de capitais irregulares de brasileiros no Exterior. A aprovação ficou mais complicada porque o relator do projeto era o senador Delcídio do Amaral. Delcídio era também o grande negociador do Palácio do Planalto com a oposição e Dilma e seus ministros políticos ainda não conseguiram definir seu substituto na liderança do governo no Senado.
Continua depois da publicidade
Na economia persistem ainda as preocupações com as conseqüências da prisão de Esteves e seus efeitos sobre o conglomerado comandado pelo BTG no sistema financeiro e no mundo das empresas. O BTG está começando a se desfazer de negócios. E o Banco Central redobrou sua atenção nesta área.
A presidente participa hoje da Convenção sobre o Clima em Paris (COP21) e retorna imediatamente ao Brasil para tentar contornar esses problemas – a questão do Eduardo Cunha e as votações da regularização de capitais e da nova meta fiscal. Nessas três semanas que faltam para o recesso, o governo ainda tentará avançar com a prorrogação da DRU e com a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2016. O Orçamento do ano que vem fica mesmo para o ano que vem e a CPMF não se sabe para quando.
A ver ainda se a oposição vai desistir de bloquear as sessões da Câmara e do Congresso enquanto Eduardo Cunha não for julgado na Comissão de Ética. Não é desprezível a possibilidade de o Congresso ter mais uma semana de total paralisia.
Continua depois da publicidade
Por fim, a avaliação da presidente e de seu governo não ajuda nas relações com os aliados. Apesar de algum avanço (caiu de 71% para 67% o índice de pessoas que consideram o governo ruim ou péssimo), a pesquisa do DataFolha divulgada no fim de semana indica que ainda não houve recuperação real desse quadro e que esta recuperação não deve vir tão cedo.
Outros destaques dos
jornais do dia
– “Levy: Brasil vive emergência fiscal” (Globo)
– “BNDES pode ter perdido R$ 848 milhões com JBS, aponta TCU” (Folha)
– “UE tem aval para negociar com o Mercosul, mas troca de ofertas fica para 2016” (Valor)
– “BNDES vai assumir fatia das ações da Andrade Gutierrez na Cemig” (Valor)
– “Montadoras já perdem 25% das vendas em 2015” (Valor)
– “BTG negocia a venda da Rede D’Or” (Estado/Valor)
– “CSN deve anunciar hoje acordo com sócio asiáticos na Namisa” (Estado)
– “Governos estaduais podem atrasar 13º salário” (Folha)
– “Com surto de microcefalia, Pernambuco decreta emergência” (Estado)
LEITURAS SUGERIDAS
- Paulo Guedes – “Nada é por acaso” (diz que o turbilhão de eventos, as gravações, as prisões e o caos aparente revelam na verdade uma nova ordem inteligível e benigna em formação) – Globo
- Editorial – “Barreiras e incompetência” (diz que o Brasil perde espaço no mercado mundial, mas é um dos campeões em criação de barreiras) – Estado
- Luís Eduardo Assis – “A Deus pertence” (diz que o Banco Central tem pouco a fazer numa situação em que o governo não sabe nem o que quer nem o que pode) – Estado
- Editorial – “O campo e a cidade” (diz que déficit da previdência voltada para trabalhadores rurais chega a R$ 90,6 bilhões, ou 1,49% do PIB, valor insustentável) – Folha
- Editorial – “Petrobrás permanece sobe ataque das indicações políticas (diz que é preciso ainda extirpar essa associação perniciosa entre o público e o privado na estatal) – Valor