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SÃO PAULO – Em muitas ofertas de ações realizadas neste ano, o investidor de varejo precisou tomar uma decisão inédita na hora de reservar os papéis: escolher se aceita ou não um período de carência antes de poder negociar livremente suas ações no mercado.
O mecanismo, chamado de lock-up, sempre foi utilizado para pessoas ligadas às empresas que estavam fazendo as ofertas. “Já o lock-up para o investidor de varejo é algo inédito”, diz Fabíola Augusta Cavalcanti, sócia da área de mercado de capitais do escritório Tozzini Freire Advogados.
A jabuticaba brasileira apareceu pela primeira vez na oferta de ações da Petrobras, em junho deste ano. Também constou da operação do Banco do Brasil e das aberturas de capital da rede de joalherias Vivara e do banco BMG. O prazo de lock-up definido nessas ofertas variou de 45 a 120 dias.
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O bloqueio não é obrigatório. Durante a reserva das ações, o investidor precisa escolher se deseja entrar na oferta com ou sem o lock-up. Mas quem aceita a restrição tem prioridade na alocação dos papéis e, caso a demanda seja alta (o que tem acontecido), sofre um rateio menor (relação entre a reserva e as ações que realmente estão disponíveis).
Prós…
O objetivo do lock-up é reduzir a “flipagem”, estratégia que alguns investidores adotam de vender as ações de uma oferta logo no início das negociações.
Em tese, faz sentido e contribui para aprimorar o mercado brasileiro de capitais, uma vez que incentiva o investidor a ter uma visão de longo prazo na Bolsa.
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“Uma oferta de ações não deve ser utilizada para trading. O investidor precisa compreender que o cenário é de longo prazo, e o lock-up ajuda”, afirma Adeodato Volppi Neto, estrategista-chefe da Eleven Financial.
Para Marcelo Kayath, ex-executivo do Credit Suisse que participou da estruturação de dezenas de ofertas de ações, o lock-up “traz uma evolução para o mercado”.
“Sempre houve uma visão de que uma participação grande de pessoas físicas em ofertas de ações trazia uma volatilidade indevida, justamente porque muitas flipavam. Isso acabava poluindo as operações. O lock-up ajuda a resolver isso”, diz Kayath, que hoje é sócio da gestora Habitat, especializada em fundos imobiliários.
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Wagner Salaverry, gestor de renda variável da Quantitas, destaca o fato de o mecanismo ser benéfico para o investidor com visão de longo prazo, que pode conseguir mais ações.
“Hoje, esse investidor é obrigado a dividir a reserva das ações com aquele cara que entra para ‘flipar’ e prejudicar o mercado”, afirma Salaverry.
… e contras
Mas nem todo mundo concorda com essa visão. Para alguns especialistas, limitar o direito de comprar e vender ações pode ter o efeito exatamente oposto e acabar prejudicando o desenvolvimento do mercado.
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Um argumento é o fato de o mecanismo criar dúvidas e dificuldades. “O lock-up é uma discriminação contra as pessoas físicas, que já têm uma participação muito pequena na Bolsa. Enquanto nos Estados Unidos há um movimento de simplificação das aberturas de capital, no Brasil estamos fazendo de tudo para complicá-las ainda mais”, afirma Marcelo Mesquita, gestor da Leblon Equities.
Carlos Herrera, estrategista da casa de análise Condor Insider, lembra que as pessoas físicas já saem em desvantagem numa oferta de ações por não terem acesso aos executivos das empresas e aos roadshows (reuniões feitas por bancos e companhias para apresentar planos e resultados).
“O investidor individual já fica praticamente no escuro. O lock-up cria mais uma desvantagem”, diz.
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“O lock-up faz sentido quando se trata de um acionista com acesso a informação privilegiada, como é o caso da diretoria da empresa. A pessoa física tem o direito de escolher o que fazer com os papéis”, diz Rodrigo Wainberg, analista da Suno Research.
Os especialistas afirmam ainda que o lock-up pode apenas adiar a volatilidade dos papéis para o fim do período de carência.
O lock no varejo veio para ficar?
Em um ponto, tanto quem é contra quanto quem é a favor do lock-up concorda: ainda é difícil dizer se o mecanismo vai se manter. “É um teste e, como tal, é preciso esperar pelos resultados e tentar aprimorar o mecanismo com base neles”, afirma Kayath.
“Vai depender da adesão e ânimo dos investidores”, diz Herrera, da Condor.