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A última sexta-feira (28) à noite marcou o tão esperado anúncio da nova política de dividendos da Petrobras (PETR3;PETR4), indicando mais clareza para os investidores de estatal sobre um ponto importante para a companhia, mas também gerando algumas dúvidas entre os analistas de mercado.
A maior parte da política foi mantida, incluindo pagamentos mínimos trimestrais. Entre as principais mudanças, estiveram, como ressalta a XP: (i) a recompra de ações como um mecanismo para devolver dinheiro aos acionistas (mas sem detalhes sobre isso); (ii) o percentual de FCO (fluxo de caixa das operações) menos capex (investimentos), ou fluxo de caixa livre (FCF), a ser devolvido aos acionistas foi reduzido de 60% para 45% (esperava-se, pelo consenso, ao menos 40%) e; (iii) a definição de capex agora considera não apenas aquisições de imobilizado e intangíveis, mas também participações societárias (portanto, os riscos de M&A agora pesam diretamente na incerteza de dividendos).
Para o JPMorgan, apesar da flexibilização dos dividendos na nova política, a redução – que já era esperada pelo mercado – foi modesta e corrobora uma visão positiva sobre a remuneração dos acionistas. “Os dividendos continuam baseados em FCF e trimestrais, que consideramos serem dois aspectos muito importantes da política que foram mantidos. Acreditamos que isso provavelmente será visto de forma positiva pelos investidores”, aponta o banco americano.
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A reação dos ADRs (recibo de ações, na prática, ativos negociados das empresas brasileiras na Nyse) da Petrobras no pré-mercado da NYSE e depois na B3 foi de bastante alívio à divulgação da nova política por ter sido melhor do que “alguns poderiam temer”, o que suscitou uma disparada das ações. Nesta segunda, os ativos PETR3 saltaram 5,26%, a R$ 34,81, enquanto PETR4 subiram 4,54%, a R$ 31,11, também em um dia de alta para o petróleo.
Na visão do Morgan Stanley, as ações da Petrobras deveriam apontar uma reação positiva à nova política de dividendos, uma vez que continua a implicar em distribuições robustas. Com 45% de FCF, é uma política competitiva que ainda pode resultar em rendimentos atraentes, que é o pilar da recomendação overweight (exposição acima da média do mercado, equivalente à compra) do banco para os ativos.
A distribuição de 45% do FCF veio ligeiramente à frente das expectativas do banco e de consenso, uma vez que a projeção era de pagamento de cerca de 40% do fluxo de caixa livre.
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“A fórmula básica do FCF ficou praticamente inalterada, com as aquisições de ativos sendo agora consideradas. Alguns investidores temiam que a nova fórmula deduziria o pagamento de aluguéis e despesas financeiras, o que reduziria a base de distribuição em cerca de US$ 6,5 bilhões, enquanto deduzirá as atividades de investimento ligadas à aquisição de ativos (por exemplo, no caso de a PBR adquirir um parque eólico existente)”, destaca o Morgan.
Sobre as recompras, o Morgan espera que sejam pequenas no contexto das distribuições totais, dadas as janelas limitadas para a empresa executá-las. “Também esperamos que as recompras ocorram apenas com ações preferenciais, dadas as possíveis sensibilidades legais em torno de uma mudança na estrutura do controle acionário. Além disso, com as ações preferenciais negociadas com 9,4% de desconto em relação às ações ordinárias, é a melhor opção para alocação de capital. A empresa pretende, em última análise, cancelar as ações que são recompradas”, diz o banco.
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Com a manutenção das distribuições trimestrais, a preocupação de alguns investidores se dissipa, uma vez que viam o risco de uma distribuição anual ou semestral.
O Morgan vê espaço para dividendos extraordinários no final do ano. “Como a Petrobras atingiu o limite das reservas estatutárias em seu balanço, deve distribuir a totalidade dos lucros como dividendos aos acionistas. Em nosso modelo, a distribuição de 45% do FCF equivale a 60% do lucro líquido esperado para o ano, o que deixaria um ganho de até US$ 8,7 bilhões em dividendos extraordinários, em comparação com a nossa expectativa de caso base de US$ 13,1 bilhões de lucro em 2023”, aponta.
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Isso seria um rendimento incremental potencial de 9,5%, além do rendimento base de 14,5% em 2023. Olhando para 2024e, os potenciais dividendos incrementais seriam de US$ 7,0 bilhões, para um rendimento extra de 7,7% sobre o rendimento base de 13,0%.
O Bradesco BBI também ressalta o potencial para grandes pagamentos extraordinários.
“O que não é tão óbvio está nos detalhes da Lei das Sociedades por Ações. A lei societária e os atuais estatutos da companhia não permitem que a empresa retenha grandes somas de dinheiro. O artigo 196 da Lei das Sociedades por Ações basicamente estabelece que uma empresa só pode reter lucros acima do piso legal de 5% em caso de uma reserva estatutária aprovada pelos acionistas (que não pode exceder 20% do capital social integralizado). Esta reserva deve ser bem justificada pelo orçamento da empresa”, avaliam os analistas.
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Se ao final de cada ano (i) nenhuma reserva estatutária adicional for criada e (ii) cerca de 92% do lucro líquido da Petrobras (que exclui reservas de lucros correntes) for superior a 45% de seu “FCO-capex-M&A”, a Petrobras terá que pagar o excedente em dividendos extraordinários.
Para que a criação de grande reserva estatutária de lucros ocorresse, a Casa Civil da Presidência teria que pedir ao Ministério de Minas e Energia que enviasse um pedido formal à Petrobras. E antes que a Petrobras vote o assunto em assembleia de acionistas, a empresa precisaria da aprovação do Tesouro Nacional. “Este ponto é interessante, porque as contas fiscais do Brasil estão muito apertadas e acreditamos que o ministro da Fazenda Haddad estaria mais inclinado a maximizar a captação de recursos”, aponta o BBI;
“Assim, com base em nossas estimativas atuais, o rendimento de dividendos da Petrobras em 2023 pode variar entre 12% e 24% versus uma média global de 10%. Embora a certeza em relação à faixa superior seja menor, ainda assim vemos como muito atraente”, avalia o banco.
Pelo lado não tão positivo, dado que a fórmula agora é formalmente calculada trimestralmente com 45% de FCO-capex-M&A, o BBI reduziu sua estimativa de dividendos para os resultados do 2T23 para US$ 2,8 bilhões, ante de US$ 4,4 bilhões. “A diferença de US$ 1,6 bilhão deve ser paga apenas no ano que vem, após a divulgação dos resultados do 4T23 (provavelmente em fevereiro ou março)”, avalia.
Para eles, conforme o tempo passa e o governo não mostre nenhuma intenção de criar uma reserva estatutária e não há grandes provisões no horizonte, o cenário para um rendimento de 24% começa a se tornar mais tangível e as ações poderiam se valorizar fortemente.
“Dito isso, vemos dois grandes riscos para um pagamento extraordinário: (1) a Petrobras tem cerca US$ 55 bilhões em disputas legais não provisionadas (US$ 36 bilhões relacionadas a impostos), que poderiam ser provisionadas em algum momento, e (2) uma forte desvalorização do real no caso a próxima administração do Banco Central do Brasil adota um tom mais dovish (brando, de queda dos juros). Ambos poderiam reduzir significativamente o lucro líquido reportado da empresa”, destaca o banco.
Para a XP, alguns detalhes mostram que no momento ainda é difícil dizer se a nova política foi melhor ou pior do que o esperado.
O fato de os pagamentos trimestrais terem sido mantidos de acordo com uma fórmula pré-definida (e não com diretrizes subjetivas) é positivo, assim como os 45% de FCO menos capex ficar um pouco acima dos 40% que o consenso esperava.
Por outro lado, a inclusão da aquisição de participações societárias para a definição do capex e a falta de detalhes sobre as recompras de ações ainda tornam o montante de pagamento de dividendos incerto.
O programa de recompra de ações é o próximo marco importante a ser observado, avaliam Andre Vidal e Helena Kelm, analistas da XP. Eles apontam que, ao contrário da maioria dos países, no Brasil os dividendos são isentos de impostos [no momento]. Portanto, há menos incentivo para buscar a recompra de ações às custas dos dividendos.
“No caso da Petrobras, se o governo optar por focar em ações ordinárias, acreditamos que a reação do mercado será negativa. No entanto, o governo enfrenta uma situação fiscal difícil e, sob essa lente, os dividendos são uma rota preferível. Em suma, nosso caso base é que o governo fará algumas recompras de ações para criar uma narrativa política, mas não o fará de maneira significativa (mas essa possibilidade continuará sendo um risco para o caso de investimento em Petrobras)”, destacam os analistas.
Há quem tenha visto o anúncio em si da Petrobras como negativo, ainda que não esperasse uma reação negativa do mercado.
Esse foi o caso da Genial Investimentos. “Na média, a métrica utilizada para o pagamento de dividendos foi reduzida (de 60% para 45% do fluxo de caixa livre da empresa), como foi inserido na linha de investimentos a aquisição de possíveis participações societárias – um dos maiores riscos para tese da empresa. Apesar de uma fotografia interessante em termos fundamentais, seguimos reticentes com a tese da empresa”, apontou a casa, que tem recomendação de venda para os ativos da estatal.
O BTG, que tem visão neutra para as ações, apontou que a política não foi tão ruim quanto se temia, mas foi pior do que esperava.
“Qualitativamente, nossos sentimentos são mistos. Embora a nova política transmita uma alocação racional de capital, ela também possibilita uma ampla gama de resultados, acrescentando uma camada de subjetividade a algumas métricas importantes da política”, avaliou a equipe de análise.
O banco aponta que a inclusão de fusões e aquisições no cálculo do capex diminuirá a capacidade do mercado de avaliar adequadamente os níveis de investimento da empresa em meio às discussões sobre o retorno aos setores petroquímico e de distribuição de combustíveis.
Além disso, substituir o covenant de dívida bruta de US$ 65 bilhões para remuneração dos acionistas por um valor ainda a ser definido (por meio do Plano Estratégico da empresa) permite que mais recursos sejam alocados para crescimento do que para dividendos. Finalmente, o momento e o tamanho do potencial do programa de recompra permanecem altamente incertos”, reforça.
O que esperar para o segundo trimestre e recomendações
Especificamente para os dividendos referentes aos resultados do 2T23, a XP agora estima um valor um pouco maior a ser declarado, de US$ 2,8 bilhões (cerca de R$ 1 por ação ou cerca de 3,5% de dividend yield, ou valor do dividendo sobre o preço da ação, para PETR4).
“Mantemos nossa visão de que, aos preços atuais, as juniores brasileiras de petróleo e gás sob nossa cobertura são um investimento de risco/retorno preferível. Vemos a Petrobras negociando a cerca de 13% de dividend yield e por volta de 22% FCF yield nos próximos trimestres, o que é um bom nível e suficiente para manter nossa recomendação de compra”, avaliam.
No entanto, os analistas da XP ponderam há muitos riscos no horizonte e a Petrobras deve continuar sendo um investimento de “baixo beta para o petróleo” (vide o recente baixo desempenho das ações, pelo menos parcialmente explicado pela alta nos preços do Brent).
Para o Itaú BBA, a nova política deverá implicar em um dividend yield para o 2T23 de 3,4%, que é, segundo suas estimativas, equivalente ao rendimento que deveria esperar se a Petrobras adotou a política declarada média das grandes companhias petrolíferas (que é algo em torno 30% do fluxo de caixa operacional).
Além disso, a manutenção dos pagamentos trimestrais e a ênfase aparentemente maior em dividendos em vez de recompras neste primeiro trimestre da nova política provavelmente será bem-vinda pelos investidores. “O rendimento de dividendos estimado implícito da nova política para o 2T23 (3,4%) ainda parece significativamente maior do que para as principais: na semana passada a Shell, Repsol e Total reportaram dividendos e recompras no 2T23 de 2,6%, 2,6% e 1,4%, respectivamente”, reforça o BBA.
Os analistas do banco ressaltam que a mudança nos critérios para os quais os investimentos são
incluídos na fórmula para considerar também as participações societárias nas outras empresas pode sinalizar que a empresa pretende expandir seu plano de investimentos de forma inorgânica, por meio aquisições e parcerias, além do crescimento orgânico por meio de projetos de capital. O BBA tem recomendação marketperform (desempenho em linha com a média do mercado), com preço-alvo de R$ 27 para PETR4.
O Credit Suisse destaca enxergar como positivo o fato da nova política manter o alinhamento de interesses entre investidores e governo e de eliminar os riscos de cauda do que poderiam ter sido com políticas alternativas.
O time revisou as estimativas para o 2T23 e o modelo e veem que, com produção sequencialmente menor, preços menores e o impacto por impostos de exportação, estima um lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) de US$ 11,7 bilhões (queda trimestral de 16% e anual de 41%), com lucro liquido de US$ 5,2 bilhões (-29% frente o 1T23, -53% ante o 2T22). Com a nova política, os dividendos devem totalizar US$ 2,5 bilhões (yield de 2,8%), na visão do banco.
Para o Citi, a principal discussão à frente deve ser até que ponto o rendimento de dividendos da Petrobras está em comparação com as principais petrolíferas da Europa e EUA. “Neste ponto, não vemos espaço suficiente para ver o desempenho forte da Petrobras, já que a diferença de preço foi fechada nas últimas semanas. Na política atual, vemos um dividend yield de cerca de 8% para 2023 (excluindo o 1T23) e de 9% para 2024.
A Petrobras divulgará seus resultados na próxima quinta-feira (3), após o fechamento do mercado, com expectativa de divulgação dos proventos junto com os números do segundo trimestre.