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Considerada a “commodity mais sensível à geopolítica”, o petróleo voltou a subir de forma intensa nesta segunda (9), reagindo ao conflito entre Israel e Hamas. Com a declaração de guerra no domingo, o barril do petróleo iniciou o dia em alta e assim permaneceu.
O barril WTI encerrou a última segunda-feira com alta de 4,34%, aos US$ 86,38 enquanto o Brent avançou 4,28%, aos US$ 88,20.
“Pela primeira vez, há duas guerras concomitantemente em lugares onde o petróleo tem muita importância, o que é curioso”, destaca Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), ouvido com pelo InfoMoney.
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“A expectativa é que, nesta semana, possa bater até US$ 100”, mas que depende de alguns fatores para se concretizar.
Onça na floresta
A commodity conforme o esperado, é fortemente impactada com as tensões atuais. “Eu até brinco que petróleo é como uma onça, igual um leão, ele está na floresta, cai uma folhinha, ele sai correndo. Isso é petróleo”, comenta o especialista.
Pires relembra que, na pandemia, o barril do petróleo chegou a US$ 20,00 pela baixa demanda. Após a reabertura e a consolidação da vacinação, a Rússia e Arábia Saudita passaram a criar cotas de produção e o preço do petróleo rapidamente se recuperou.
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“Vem a Guerra da Ucrânia com a Rússia, aí dispara, chega a bater mais de US$ 100,00 o barril. Depois disso, há uma acomodação porque as pessoas e o mercado se acomodaram à guerra. Muita gente achava que seria rápida, não foi, então há uma certa acomodação”, comenta.
Sem perspectivas de crescimento alto, em um mundo de juros elevados, a trajetória do barril foi de queda de janeiro deste ano até julho. Conforme a recuperação econômica acontece, com quedas de juros, inclusive no Brasil, o preço passa a subir, explica Pires.
Até chegar aos recentes US$ 97,00 de semana retrasada. “E só não chegou a mais de US$ 97, em particular, porque a China não cresceu tudo que se estava esperando”, afirma.
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Na semana passada, nova volatilidade afetou o mercado do petróleo e a perspectiva de aumento de juros fez com que os preços voltassem a cair, de acordo com o especialista. Com resultados do mercado de trabalho diversos das projeções de analistas para garantir o encerramento no ciclo de alta de juros pelo Federal Reserve, os preços recuaram.
“Preço de barril e juro tem uma correlação que, quando um sobe, outro cai”, explica.
E, com o conflito que tomou corpo no final de semana, a “onça” descrita por Pires saltou e os preços se elevaram nesta segunda-feira.
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Papel de Irã e Arábia Saudita no conflito
Sobre o comportamento da commodity nas próximas semanas, o especialista explica que depende de uma série de elementos. “Por exemplo, a gente sabe que a guerra não é entre Israel e o Hamas, é entre Israel e o Irã, que foi quem armou o grupo para o atentado”, alega. “Como fica o Irã nessa história? Haverá um embargo ao petróleo iraniano pelos EUA? Israel, de alguma forma atacará os iranianos?”, indaga.
De acordo com Pires, se houvesse algum tipo de conflito diretamente com o Irã, as consequências poderiam ser ainda maiores para o preço da commodity. O país pérsico detém o controle sobre o Estreito de Ormuz (situado entre a Península Arábica e o Irã). “Aí o petróleo vai a mais de US$ 150,00, porque é pelo estreito que passa mais de 1/3 do petróleo do mundo”, explica o diretor. “Isso é um cenário muito ruim”.
Outro ponto levantado pelo especialista é que as conversas diplomáticas em curso entre Arábia Saudita e Israel. Já era contemplada a hipótese de, quando se encerrasse o prazo dos cortes voluntários já estabelecidos, o país saudita aceitasse colocar mais barris no mercado. Com o acirramento dos conflitos, essas conversas não devem ser retomadas tão cedo.
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Ainda que não haja um pleno entendimento entre Arábia Saudita e Irã, de acordo com Pires, o estabelecimento de alianças entre os dois países é mais provável que uma aproximação do país árabe com Israel e os próprios EUA. “Isso, agora, morreu”, ressaltando que as declarações dos países árabes nesse final de semana não foram favoráveis ao Estado de Israel.
“Eles, no final do dia, podem ter diferenças mas são muitos parecidos, no sentido religioso, político e por dependerem 100% do petróleo”, comenta.
Mercado na mão de Arábia Saudita e Rússia
“De 7 anos para cá, se pega a curva de consumo do petróleo comparado com o nível de investimento, abre uma boca de jacaré. O consumo cresce muito, o investimento cai. Hoje, então, está em um mercado em que a oferta está curta e está muito na mão da Arábia Saudita e da Rússia”, explica Pires.
Ele, inclusive, destaca a iniciativa de criação da OPEP+ como um dos movimentos para fortalecimento do controle dos países saudita e russo em relação ao mercado do petróleo, tanto a produção quando os preços praticados.
“Incertezas fazem o barril subir muito”, comenta o especialista. Ele explica que, se que houvesse algum apaziguamento na semana que vem, o que não considera como possível, seria possível reverter um pouco o quadro.
Pires esclarece que, por mais que os preços de outros combustíveis também avancem, o diesel tem maior potencial de alta em razão da proximidade com inverno nos países do hemisfério norte. Historicamente, o momento tanto favorece o aumento de demanda quanto o armazenamento do diesel para questões de segurança de geração de calor e energia. E o aumento no valor dos derivados pode ser um problema para o Brasil.
“Por outro lado, quando o petróleo fechou a US$ 83 na semana passada, a Rússia anunciou que ia liberar outra vez as exportações de diesel e isso estava ajudando muito. O prêmio estava 18% em relação ao mercado internacional”, comenta. Contudo, o especialista faz a ressalva de que não é possível prever o valor do diesel russo nesse cenário de guerra em Israel.
“Quando começou a guerra da Ucrânia e Rússia, o petróleo já estava a mais de US$ 80”. E, de acordo com Pires, a recente rejeição ao petróleo por questões ambientalistas faz com que a demanda torne-se ainda mais curta. “A volatilidade continuará muito forte, com tendência de alta”, avalia. O diretor considera possível até mesmo que o barril bata US$ 150,00, a depender da situação presente no Oriente Médio.
“Sendo pragmático, a Arábia Saudita tem interesse que o petróleo vá a US$ 100. Ela tem interesse que não vá a US$ 70 mas, se for a US$ 100, ela não se mexe não”, considera.
Mercado doméstico
O posicionamento do Brasil hoje é diverso que nas duas primeiras crises mundiais (conhecidos como choque de petróleo), de acordo com Pires.
“Diferentemente dos choques anteriores, o Brasil hoje é um exportador de petróleo. Naquela altura, a gente importava 80% do petróleo e consumia. Porém, nos temos calcanhar de Aquiles: nós somos importadores de todos os derivados de petróleo e, em particular, diesel e gasolina. E, me parece, que pode ter um rally no diesel”, destaca.
Sobre os próximos passos da Petrobras (PETR4) em relação aos preços praticados no mercado interno, o especialista considera que a fala de Jean Paul Prates, CEO da estatal, que afirmou que a política de preços atual poderia mitigar possíveis consequências do aumento do barril, tem seu lugar ainda durante essa semana, mesmo que o avanço dos barris siga.
“Todo mundo achava, até o início da semana passada, quando o petróleo estava a US$ 97, que haveria um aumento na gasolina e no diesel. Com a queda do petróleo na semana passada, a US$ 83, a defasagem caiu muito. Se o preço ficar em torno de US$ 90, a US$ 100 dólares, com o dólar a R$ 5,15, R$ 5,20, a defasagem vai subir muito e não terá como não aumentar”, considera.
Em sua visão, contudo, não há necessidade de aumento nessa semana. “É precipitado, na minha opinião”, pontua. Diante do que acontecer na próxima semana, o especialista considera que pode ser, sim, necessário que um aumento seja realizado.
“Petróleo caro é bom para país produtor e para petroleira, para economia, é uma porcaria”, conclui Adriano Pires.