Primeiras leituras: Levy dá o recado econômico e agrada

Embora menos detalhada que o esperado e sem a presença da “avalista” da política econômica, a apresentação das linhas gerais da proposta para a economia foi bem recebida no mundo econômico. Já no político...

José Marcio Mendonça

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As linhas gerais da “nova” política econômica, explicitadas pelo futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, resumidas pelo jornal “O Estado de S. Paulo” como de ajuste fiscal gradual e rigor com a inflação, de um modo geral foram bem recebidas pelo mundo econômico privado.

Observou-se, no entanto, que a apresentação dos ministros foi bastante controlada, com poucas perguntas e previamente sorteadas, talvez porque faltassem definições mais concretas e muitos aspectos específicos da nova economia não tenham ainda direção, tais como câmbio, acerto das tarifas… Pareceu um evento para “acalmar o mercado”.

Para começo, parece funcionar. A estratégia de não prometer um superávit primário estrondoso, preferindo números mais factíveis nas circunstâncias em que se encontram as contas públicas – 1,2% do PIB para 2015 e 2% para os dois anos seguintes, com a promessa de transparência na contabilidade – foi considerado um dos aspectos mais positivos da amostra que a equipe econômica do Dilma II.

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Foi relevante o destaque dado por Levy à autonomia que ele recebeu da presidente para tocar o seu programa, embora com a ressalva de que ela será comprovada no dia-a-dia. “Estamos caminhando para a verdade fiscal” – foi a tônica de comentários registrados depois da fala de Levy.

A perda da credibilidade na política econômica nos últimos anos se deu em boa parte pelo vício do time econômico que está deixando Brasília de prometer e não cumprir fingindo que está cumprindo.

Parcerias Público Privadas

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Agradou também o papel que será cumprido pelo Ministério do Planejamento de cuidar da manutenção das políticas sociais e dos investimentos e concessões de serviços públicos, neste caso a partir de Parcerias Público Privadas, como explicou o futuro titular da área, Nélson Barbosa.

Por fim, veio o compromisso do renovado presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, reforçado pela política fiscal a ser colocada em prática, de ser implacável com a inflação. Este era o discurso de Tombini sempre, porém, na prática nesses quatro anos não pôde ser bem assim, menos por culpa do BC e mais por injunções políticas superiores.

Mantida a disposição exibida pela equipe entrante, já havia analistas prevendo que a inflação pode convergir para a meta, os 4,5% em 2016.

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Foi ponto aplaudido também a decisão de cessar os repasses de recursos do Tesouro Nacional para o BNDES. Os analistas estão inferindo que o avanço também do Banco do Brasil e da Caixa Econômica no crédito será freado.

Se essas diretrizes básicas foram bem recebidas no mundo empresarial e em meios acadêmicos e financeiros, não se pode dizer o mesmo da ala de economistas da linha “desenvolvimentista” e que órbita em torno do PT.

Nesse mundo, de um modo geral, as ações prometidas foram consideradas corretas, mas com a ressalva de que o governo não pode descuidar do lado do crescimento, do incentivo à demanda.

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Na interpretação de um economista de outra linha, Edmar Bacha, que colaborou no programa de governo do candidato Aécio Neves, isto poderá não ocorrer. Para Bacha, o ajuste não é “brutal” e a proposta de incentivar os investimentos privados via PPPs poderá garantir que a economia não continue tão deprimida como está ou caia ainda mais como temem os petistas.

Inclusão social, emprego…

Agora,será preciso saber, na prática, na administração da contas, nos ajustes do Orçamento, no corte efetivo de gastos, como o triunvirato econômico vai chegar às metas prometidas. Mesmo com metas fiscais menos ambiciosas, dizem alguns analistas, o ajuste não será indolor. Não há dúvida que 2015 será de todo modo um ano de arrocho.

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E aí entra o papel da presidente: manter-se firme nesta linha, sem vacilar quando surgirem as primeiras dificuldades e alguma coisa ainda piorar antes de melhorar, e ainda tourear o seu universo político.

Assim, a ausência de Dilma na apresentação dos ministros não foi bem vista. A expectativa era a de que ela fizesse as apresentações e dissesse alguma coisa sobre a “nova” política. Guido Mantega também não, por razões mais compreensíveis: ele está incomodado com a situação e não era mais o seu momento.

À noite, em um evento sobre economia solidária, Dilma indiretamente assinou em baixo do que disseram seus ministros: disse que recebeu seu segundo mandato para “continuar fazendo mudanças”, colocou entre suas prioridades “a estabilidade econômica” e prometeu priorizar “a inclusão social, emprego, acesso à educação, garantias de direitos” e mais “investimentos em infraestrutura, a modernização do país e a elevação da renda do povo brasileiro”.

O lado avesso

da política

Vencida a batalha da formação da equipe econômica e da definição das linhas da futura economia, a presidente Dilma vai poder voltar-se agora para uma tarefa mais árdua do que a enfrentou (e ainda em parte enfrenta) para botar seu triunvirato econômico de pé. Acertar-se com os partidos políticos, principalmente com o próprio PT e com o PMDB, tarefa que toma as mãos a partir de hoje.

É a partilha de cargos do presidencialismo brasileiro de coalizão. Pelos tropeços que a presidente teve nas duas últimas semanas na votação das mudanças na LDO ela teve uma amostra de que o trabalho exigirá muita dedicação e paciência.

O comando do PT vai fazer um esforço extra para tentar evitar críticas duras à equipe econômica do segundo mandato de Dilma e às propostas de ajuste fiscal esboçadas ontem pelo nomeado, mas ainda não empossado, novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Esta é a área de maior insatisfação no partido.

O discurso para o público interno – e também para o público externo que está estranhando as mudanças de rumo da economia – já está pronto: o ajuste é “gradualista”, não do tipo “terra arrasada” como seria com Aécio Neves ou Marina Silva. Para o ministro quase despedido Gilberto Carvalho, é uma retomada da linha natural do PT.

Hoje e amanhã o diretório nacional do partida deverá avalizar a nova política em reunião do diretório nacional em Fortaleza, com a presença da presidente Dilma Rousseff. A presidente fará um discurso para agradecer o apoio à reeleição e reafirmar seus compromissos com as políticas sociais dos 12 anos de petismo.

Regulação da mídia

Será uma forma de fazer um aceno positivo ao partido. As tendências à esquerda do PT continuam ressabiadas com a indicação de Levy – e também com a da senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) para o Ministério da Agricultura.

A perda da condução da política econômica será compensada com a manutenção do PT no comando dos ministérios sociais, talvez com alguns até mais turbinados. O PT já se conformou com a ideia de perder alguns espaços no ministério, para que Dilma possa atender outros aliados.

Só não parece feliz ainda com o abandono do Ministério da Educação, reservado pela presidente ao governador cearense Cid Gomes, do Pros. Os petistas gostariam de ter a compensação de um outro ministério forte e de apelo eleitoral. Estariam de olho no das Cidades, cobiçado também pelo PMDB e pelo seu atual ocupante, o PT.

O partido liderado por Lula gostaria ainda de emplacar na Esplanada dos Ministérios, na pasta das Comunicações, um ministro mais comprometido com seu projeto de regulação da mídia. Embora petista de carteirinha, o atual, Paulo Bernardo, nunca levou adiante a proposta herdada de Lula. Por orientação da própria presidente.

Porém, durante a campanha Dilma deu indicações de que não é mais tão recalcitrante à ideia. Pode ter sido apenas jogo de campanha. Pelo menos por agora Dilma não tem condições de abrir uma frente de combate contra a mídia, embora o governo de um modo geral considere a chamada grande imprensa “de oposição”. Os nomes citados para o posto são os de Ricardo Berzoini e Jaques Vagner.

Outros destaques

dos jornais do dia

– PETRÓLEO – Os membros da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) decidiram não reduzir sua produção, em sua reunião desta quinta-feira (27), a despeito de meses de queda nos preços da commodity. O preço do petróleo cru tipo Brent caiu dramaticamente com a notícia. O contrato para janeiro –referência internacional para o petróleo– chegou a cair US$ 6,50, para US$ 71,25 por barril, a cotação mais baixa em quatro anos. Durante o dia, houve recuperação e o barril terminou valendo US$ 72,58. O contrato de referência do mercado dos EUA caiu abaixo dos US$ 70 pela primeira vez desde junho de 2010, cotado a US$ 69,05.

– INFLAÇÃO – O IGP-M (Índice Geral de Preços-Mercado) subiu 0,98% em novembro, após alta de 0,28% em outubro, disse a FGV. Com o resultado, o índice acumula alta de 3,05% no ano e de 3,66% em 12 meses. O IGP-M é usado como referência para a correção de valores de contratos, como os de energia e aluguel de imóveis. O IPA (Índice de Preços ao Produtor Amplo) –que mede os preços no atacado e responde por 60% do índice geral– acelerou a alta para 1,26% neste mês, após 0,23% em outubro. O IPC (Índice de Preços ao Consumidor), com peso de 30%, avançou 0,53%, ante 0,46% em outubro. O INCC (Índice Nacional de Custo da Construção), com peso de 10%, subiu 0,30%.

– ENERGIA ELÉTRICA – O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, afirmou ontem que não há “indicativo” de racionamento de energia, por parte do governo, em 2015. Segundo ele, as condições do sistema elétrico brasileiro hoje são bem diferentes, e melhores, em relação às observadas em 2001, quando houve um programa de corte de consumo de energia. “Naquela época [2001] você teve que fazer racionamento, não havia dúvida. Mas, neste ano, não houve esses indicativos [de necessidade de racionamento]. Como não tem para 2015, como tem sido falado”, afirmou o secretário, durante o lançamento do “Caderno de Gás Natural FGV Energia”, na Fundação Getulio Vargas (FGV), no Rio. Reportagem publicada ontem pelo Valor informou que um grupo de bancos de investimentos divulgou relatórios nesta semana alertando para o risco de racionamento em 2015, caso o volume de chuvas neste verão ocorra muito abaixo da média histórica. (“Valor”)

– CONFIANÇA NA ECONOMIA – Pessimismo com o futuro da economia, crédito mais caro e alto patamar de endividamento das famílias reduziram os indicadores de confiança dos serviços e do comércio calculados pela Fundação Getulio Vargas (FGV) em novembro. Ambos os índices registraram queda nas expectativas o que, para economistas da FGV, indica cenário desfavorável para os dois setores até o fim do ano e, provavelmente, no começo de 2015. As razões desse cenário pessimista não são de fácil resolução no curto prazo, afirmam. O Índice de Confiança do Comércio (Icom) recuou 1% e o de Serviços (ICS) caiu 2,1% em novembro. No caso comércio, o superintendente adjunto de Ciclos Econômicos do Ibre/FGV, Aloisio Campelo, ressaltou que várias entidades ligadas ao setor varejista já anunciaram projeções indicando que o volume de vendas deste ano no conceito restrito será o pior desde 2003 (-3,7% segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O varejo restrito não inclui vendas de veículos e materiais de construção. –

– ECONOMIA MUNDIAL – A inflação na Alemanha desacelerou ao ritmo mais lento em quase quatro anos, enquanto os preços ao consumidor na Espanha recuaram em novembro. Os dados sinalizam que a zona do euro continua em dificuldades para reativar sua economia. A taxa anual na Alemanha, utilizando um critério harmonizado da União Europeia, foi de 0,7% em outubro para 0,5% em novembro, segundo dados oficiais. É o mais baixo índice desde fevereiro de 2010. Na Espanha, houve queda de 0,5% nos preços. A magra inflação alemã, mesmo em meio a um recorde de baixa no desemprego, e a deflação na Espanha refletem a fraqueza generalizada na zona do euro, onde a alta de preços se encontra em patamar bem inferior à meta do Banco Central Europeu (BCE), de quase 2%. O presidente da instituição, Mario Draghi, tem alertado sobre uma espiral de queda de preços e adiamento de gastos, e reiterou ontem que as autoridades econômicas estão dispostas a adotar mais medidas de estímulo se necessário.

LEITURAS SUGERIDAS

1. Editorial – “A missão da nova equipe” – Estadão

2. Vinicius Torres Freire – “O desmanche da economia de Dilma 1” – Folha 

3. Luiz Carlos Mendonça de Barros – “Lula, Dilma e a porta do inferno” – Folha 

4. Alex Ribeiro – “BC segue estratégia apesar do sinal fiscal” – Valor 

5. Maria Cristina Fernandes – “Seis superávits e nenhuma Dilma” – Valor