Silvergate: o banco americano que apostou tudo nas criptomoedas e afundou

O "banco cripto" informou em comunicado que irá encerrar as operações; ações acumulam queda de 98% em pouco mais de um ano

Bloomberg

Sede do Silvergate Bank na Califórnia, EUA (Bloomberg)
Sede do Silvergate Bank na Califórnia, EUA (Bloomberg)

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O Silvergate Bank passou seus últimos dias sitiado. Bombardeados por short sellers, abandonados pelos clientes e evitados por parceiros de negócios, os executivos do banco focado em cripto ficaram cara a cara com os reguladores dos Estados Unidos em sua sede na Califórnia, nos Estados Unidos.

Funcionários da Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC, a agência que garante os depósitos das instituições financeiras) chegaram aos escritórios da empresa com a intenção de evitar a primeira baixa de uma instituição do sistema bancário dos EUA devido à implosão do mercado de criptomoedas.

Entre as opções que eles discutiram, estava encontrar investidores em cripto para ajudar a aumentar a liquidez em meio às crescentes perdas do banco. Mas, uma rodada desesperada de telefonemas para potenciais investidores falhou, e nenhuma empresa está disposta a arcar com o fardo de se associar a um negócio tão profundamente atolado na turbulência do setor.

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Com a sobrevivência parecendo cada vez mais improvável e sem comprador à vista, o Silvergate disse na quarta-feira (8) que estava fechando suas portas, encerrando uma década na qual se tornou um player central enquanto o setor cripto crescia.

Na tarde desta quinta-feira (9), as ações do Silvergate em Nova York operam em queda de 25%, a US$ 3,61, recuperando parte das perdas registradas nas negociações de pré-mercado, quando o papel chegou a valer menos de US$ 3. O estrago, porém, ainda é enorme: dos US$ 219 atingidos em novembro 2021, o recuo é de mais de 98%.

A decisão de fechar e liquidar voluntariamente o negócio, descrita por pessoas familiarizadas com o assunto que falaram sob condição de anonimato, estancou meses de turbulência no banco decorrente de seus laços com a exchange FTX, de Sam Bankman-Fried.

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O colapso da corretora de criptomoedas em novembro, seguido por alegações de fraude, colocou um holofote sobre o Silvergate e, simultaneamente, iniciou uma repressão regulatória aos laços do segmento cripto com o setor bancário.

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Enquanto o Silvergate cedeu sob a pressão, registrando US$ 1 bilhão em perdas no quarto trimestre e sangrando mais capital neste ano, foi forçado a adiar seu relatório anual e levantou questões sobre se poderia permanecer na ativa.

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Depois de se amarrar tão firmemente ao novo mundo dos criptoativos, o banco se expôs a um risco bancário do velho mundo: quando as perspectivas do setor pioraram, o Silvergate tinha poucos outros negócios sobre os quais se apoiar.

“Os problemas do Silvergate são tanto, senão mais, sobre os riscos bancários tradicionais – falta de diversificação, incompatibilidades de maturidade – quanto sobre sua exposição a criptos”, disse Sheila Bair, que chefiou a FDIC durante a última crise financeira global.

Um representante do Silvergate foi procurado, mas se recusou a comentar.

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Mergulho nas criptomoedas

O Silvergate foi aberto em 1988 para conceder empréstimos a clientes industriais, lidando com serviços convencionais, como empréstimos imobiliários comerciais e residenciais. Mas em 2013, começou a se transformar: de um típico banco comunitário, para um voltado para a indústria de ativos digitais.

Na época, passou a aceitar depósitos de criptomoedas de players institucionais com os quais poucas outras instituições financeiras tradicionais estavam dispostas a fazer negócios. Em 2018, lançou uma plataforma de pagamentos cripto que permitia aos clientes trocar moeda fiduciária na mesma velocidade em que negociavam ativos digitais em sistemas fora do banco, como a FTX.

Sam Bankman-Fried deixou o tribunal de Nova York em 16 de fevereiro.

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A mudança da empresa de banco tradicional para uma área de nicho refletiu uma dinâmica mais ampla no setor financeiro. Os bancos americanos menores, que lutam para competir com rivais maiores, dobraram a aposta em áreas que o setor financeiro tradicional evitava com a esperança de que isso lhes desse uma chance de lutar, mas com sucesso misto.

“Sempre que você deixa de ter uma grande parte do seu negócio como relacionamentos em ambos os lados do balanço, você acaba em apuros”, disse Abbott Cooper, um investidor ativista que se concentra no setor bancário. “E você definitivamente vai acabar em apuros se não estiver absoluta e intensamente focado nos riscos que foram criados por isso.”

Balanço

A composição única do balanço patrimonial do Silvergate também desempenhou um papel fundamental em seu fim. O Silvergate não pagava juros sobre os depósitos que aceitava de clientes cripto, o que significa que tinha um pool de financiamento gratuito que podia investir em investimentos como dívida do governo e ativos líquidos semelhantes. No meio de seu portfólio estavam títulos lastreados em hipotecas e títulos vendidos por governos estaduais e locais.

Essa configuração – embora não seja incomum para qualquer banco – provou ser problemática quando o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) aumentou as taxas de juros, corroendo o valor de uma parte dos títulos do Silvergate.

Quando a indústria cripto entrou em crise e os clientes correram para sacar dinheiro – reduzindo os depósitos não remunerados de US$ 12 bilhões no final de setembro para apenas US$ 3,9 bilhões no final do ano passado -, o Silvergate teve que vender títulos para pagar por essas retiradas. Mas os títulos valiam menos do que a empresa pagou por eles, forçando-a a vendê-los com prejuízo e causando um rombo de US$ 1 bilhão nos resultados do ano passado – os quais ainda não são totalmente conhecidos.

“Eles não conseguiram ver que o aumento das taxas de juros afetaria radicalmente a volatilidade desses depósitos”, disse Todd Baker, pesquisador sênior do Richman Center for Business, Law and Public Policy, da Universidade de Columbia, em entrevista à Bloomberg. “Eles também não conseguiram entender que o valor de sua carteira de títulos despencaria quando as taxas subissem”.

Investigações

Enquanto isso, os promotores dos EUA da unidade de fraude do Departamento de Justiça estão investigando as negociações do Silvergate com a FTX e sua empresa de trading Alameda Research.

A investigação criminal está examinando as contas que o Silvergate mantinha para os negócios de Bankman-Fried. A apuração aborda uma questão-chave: o que os bancos e intermediários que trabalharam com as empresas de Bankman-Fried sabem sobre o que as autoridades americanas consideram um esquema feito para fraudar investidores e clientes por anos?

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O banco não foi acusado de qualquer irregularidade e a investigação pode terminar sem que uma acusação formal seja feita.

Documentos judiciais apresentados em fevereiro alegam que Bankman-Fried se envolveu em um esquema de fraude bancária que visava uma empresa identificada em um documento judicial como “Banco 1”, que a acusação descreve como sediada na Califórnia. O banco 1 é o Silvergate, disse à Bloomberg uma pessoa familiarizada com o assunto.

Outra questão importante é como uma instituição financeira investindo tão profundamente em cripto não solicitou intervenção por parte de seus reguladores.

“Onde estavam os reguladores no caso Silvergate?” perguntou Jerry Comizio, professor adjunto de direito da American University e ex-funcionário do Departamento do Tesouro dos EUA. “Na realidade, eles perderam o Silvergate”.

© 2023 Bloomberg L.P.

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