Tenda (TEND3): de “patinho feio” para alta de mais de 200% em 2023, o que esperar para as ações da construtora?

Analistas têm revisado para cima preços-alvo das ações após a disparada e veem menos riscos, mas ainda apontam cautela com a companhia

Lara Rizério

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De margem negativa levando à derrocada das ações até o início de 2022 à maior alta do índice de consumo (ICON) da B3, com avanço de 208,53% no acumulado de 2023 (até o fechamento da véspera).

Assim, as ações da Tenda (TEND3) passaram de patinho feio para um dos destaques do setor de construção.

Em março do ano passado, logo após a divulgação do resultado do quarto trimestre de 2021 (4T21), os papéis chegaram a cair 25% em apenas uma sessão, com os números do período  impactados pelo andamento de obras devido as revisões orçamentárias.

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Já no último resultado, o do 1T23, apresentado em maio, a Tenda continuou apresentando dados fracos, “como consequência dos erros do passado”, na avaliação da Genial. A composição do resultado ainda leva em consideração parcela significativa de projetos lançados em 2021, antes da grande revisão orçamentária da companhia.

“Na época, a Tenda não provisionava adequadamente a inflação, que foi especialmente alta para o setor entre 2020 e 2021, fazendo com que os projetos lançados pré-revisão fossem deficitários. Como projetos imobiliários têm duração de cerca de 2 anos, o impacto desses projetos serão vistos até o final de 2023, mas reduzindo cada vez mais o impacto negativo”, avaliou a casa de análise na ocasião.

Com a expectativa de melhora, além de ventos positivos no cenário macro e, especificamente, para as construtoras de baixa renda, os papéis tiveram forte recuperação – ainda que levando a muitos questionamentos sobre até onde a ação pode ir.

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De acordo com o consenso Refinitiv, de doze casas que cobrem o papel, 8 possuem recomendação de manutenção, 3 de compra e 1 de venda, com preço-alvo médio de R$ 10,43, vendo uma queda de cerca de 20% em relação ao fechamento da véspera, de R$ 13,02.

Nas últimas semanas, alguns bancos revisaram analistas têm revisado suas estimativas, notoriamente para o preço-alvo da empresa, avaliando tanto o processo de virada da construtora quanto os ventos mais positivos para o setor voltado às rendas mais baixas.

Em relatório da última sexta-feira, o Bradesco BBI destacou que as ações de empresas voltadas para o público de baixa renda têm apresentado desempenho significativamente superior no acumulado do ano, com alta de 89%, em comparação com o Ibovespa (+7%) e a média do setor de construção civil (+61%).

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Com a ação da Tenda em alta de mais de 200% no ano, o BBI elevou o preço-alvo para TEND3 de R$ 8 para R$ 15, refletindo principalmente uma queda significativa no risco percebido depois que as tendências de margem melhoraram recentemente, com a companhia vencendo licitações no programa habitacional Pode Entrar (do município de São Paulo) e uma perspectiva positiva após mudanças recentes feitas no programa MCMV (Minha Casa Minha Vida).

Para os analistas do banco, o pior parece ter passado para a empresa, e o valuation reflete isso.

“Nosso aumento de preço-alvo se deve principalmente a uma tese de redução de riscos (por exemplo, redução de custo de capital próprio – Ke) à medida que o processo de recuperação avança, embora sem grandes alterações em nossas estimativas”, afirma o BBI.

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Contudo, o banco mantém recomendação neutra para as ações, uma vez que: (i) a Tenda é negociada a 8,6 vezes o múltiplo de preço sobre ação (P/L) estimado para 2024, um prêmio de 15% em relação aos seus pares, o que não vê como merecido, uma vez que o processo de recuperação ainda está em andamento; e (iii) a redução do valor contábil das recentes perdas líquidas coloca a relação lançamentos/valor patrimonial da Tenda em 4-5 vezes (em linha com a Cury CURY3), o que adiciona um risco significativo à tese, amplia os riscos potenciais de execução e requer uma operação bem ajustada para fornecer resultados estáveis e recorrentes, avaliam os analistas.

Entre as ações de construtoras voltadas à baixa renda, a preferência do BBI é pela Direcional (DIRR3).

Na mesma linha, o Citi elevou nesta semana o preço-alvo para as ações da Tenda de forma expressiva, passando de R$ 6 para R$ 13 (alta de 117%), mantendo também recomendação de compra para os ativos e praticamente sem variação em relação ao fechamento da ação na véspera.

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“Estamos atualizando o modelo da Tenda incorporando os resultados do 1T23 e a última rodada de mudanças nos parâmetros do programa Minha Casa Minha Vida”, avaliam os analistas do Citi, que destacam a companhia como uma grande beneficiária do programa.

“A Tenda é uma das construtoras que mais se beneficiará com o aumento do subsídio de R$ 47,5 mil para R$ 55 mil por unidade, pois tem o preço mais baixo entre os pares listados (ou seja, tem maior exposição aos consumidores de rendas mais baixas, que recebem mais subsídios)”, citam. Porém, apontam que a Tenda não parece estar “fora de perigo”, pois deve continuar queimando caixa em 2023.

O Citi aponta que a Tenda gastou cerca de R$ 500 milhões em equipamentos de produção offsite (quando o processo construtivo acontece fora do canteiro de obras) adquiridos da empresa sueca Randek. A fábrica tem potencial para produzir 10 mil casas ao ano, mas lançou apenas 401 unidades em 2022, o que foi de fato uma queda em relação ao número de unidades de 2021.

A empresa começou a fazer parcerias com projetos de parcelamento de terras (chamado Projeto Casapátio). “Estimamos que a operação atinja o ponto de equilíbrio em um terço da capacidade, ou seja, no ritmo de produção de 3,3 mil – não atingir esse nível provavelmente resultará em queima de caixa em 2023”, afirma.

Assim, as mudanças positivas do MCMV e taxas de desconto mais baixas levaram ao aumento de preço-alvo, enquanto que a empresa ainda tem desafios de balanço consideráveis.

“No entanto, também deve se beneficiar muito com a mudança nos parâmetros do MCMV, além de: 1) taxas de juros mais baixas; 2) aumento de subsídios; e 3) aumento dos prazos dos financiamentos (35 anos). Também se beneficia do retorno do regime tributário “RET 1%” para os estratos mais baixos do programa habitacional, onde o total de impostos representa 1% da receita. Como resultado, aumentamos nossa previsão de lucro líquido para 2024 de R$ 76 milhões para R$ 144 milhões e, portanto, aumentamos nosso preço-alvo para R$ 13,00″, avalia.

O banco não incluiu nenhuma receita do programa habitacional “Pode Entrar”, do município de São Paulo, em 2023, mas apenas a partir de 2024. O Citi tem como seu nome preferido no setor de construção residencial é a Cury (CURY3).

Entre as casas que têm compra, o Credit Suisse passou a ter uma visão positiva para o papel em maio, quando elevou a recomendação de neutra para outperform (desempenho acima da média do mercado, equivalente à compra), após avaliar que o “pior já passou”. O preço-alvo passou de R$ 9 para R$ 11, abaixo do fechamento da véspera de R$ 13,02.

Segundo os analistas do banco, a maior parte dos gargalos de execução já foram resolvidos e a empresa está bem posicionada para retomar a lucratividade. As margens da construtora devem convergir para o nível de 30% registrado no passado ao longo deste e dos próximos anos, conforme estimativas do Credit Suisse.

Porém, na ocasião, o banco também destacou os riscos. Para os analistas, não se pode descartar que a Tenda esteja passando por um processo de turnaround muito desafiador, não sendo um processo fácil recuperar as perdas que a empresa enfrentou nos últimos anos.

Além disso, a empresa pode precisar continuar vendendo seus recebíveis sem garantia a taxas de desconto menos atrativas para não ultrapassar o covenant (cláusulas de garantia em contratos de financiamento ou empréstimos que servem para proteger os interesses dos credores) de dívida estabelecido.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.