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SÃO PAULO – Na semana passada, o GPA anunciou sua estreia no ringue das maquininhas de pagamento com a Passaí, adquirente inicialmente voltada a clientes do “atacarejo” Assaí, mas que deve se tornar um player completo em breve. Para especialistas no setor, a atitude do GPA provavelmente não será isolada – e o formato apresentado ainda está longe do potencial de inovação de empresas deste porte.
No geral, espera-se uma tendência mais forte para varejistas que possuem marketplaces nesta linha de novos negócios em pagamentos, nos moldes do Mercado Pago, por exemplo. Ainda assim, não seria surpresa se mais supermercadistas decidissem chamar para si a responsabilidade de também puxar essa fila: 3 das 10 maiores varejistas do país são supermercados, de acordo com a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC). No ranking total, de 300 empresas do ramo, 140 são neste formato – e o GPA possui o maior faturamento (R$ 77,56 bilhões).
O analista Rafael Frade, do Bradesco BBI, escreveu recentemente que grandes varejistas estão “reavaliando suas soluções de pagamento e algumas pretendem lançar operações de adquirência”. A análise foi publicada em relatório recente, pouco antes do lançamento oficial da Passaí, e defende que há múltiplas razões justificando o interesse do setor em uma área já altamente competitiva como a das maquininhas – além do corte de custos. “Essas varejistas esperam conseguir mais dados sobre seus clientes/operações e oferecer soluções para clientes/fornecedores.”, escreve Frade.
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Tempestade perfeita
Alexandre Pinto, diretor de inovação e novos negócios da Matera, acredita que o Brasil está passando por uma espécie de “tempestade perfeita” no setor, mas que a escolha do GPA pela maquininha de pagamentos comum não é a “mais adequada” na busca pelo melhor aproveitamento de potencial deste mercado. Exemplos internacionais, como o do Alibaba e do Starbucks, mostram que existe muito a ser explorado em meios de pagamento para além das maquininhas – os pequenos aparelhos, aliás, devem ser esquecidos no futuro com a penetração dos pagamentos via celular e outros gadgets.
“Mais de 50 milhões de brasileiros que já têm celular ainda não têm conta em banco; entre oss que têm [conta], há muita insatisfação com o serviço prestado”, diz Alexandre. Para completar “a parte regulatória facilitou muito a criação de novos negócios e contas de pagamento”, lembra ele, referenciando a regra aplicada em 2013 que permite a qualquer empresa criar contas de pagamento sem necessidade de aprovação prévia pelo Banco Central. É essa tríade que ele chama de “quase uma tempestade perfeita” para a criação de plataformas mais completas em tecnologia financeira.
Embora estes serviços sejam associados de imediato às fintechs, caso do Nubank com a Nuconta, por exemplo, a robustez de empresas maiores e mais consolidadas trazem uma enorme oportunidade de alimentar um mercado ainda incipiente e rodeado de incertezas. “Considerando uma fintech nova, as varejistas não têm motivo para criar uma rede de aceitação de um meio de pagamento com poucos clientes, enquanto os clientes precisam de incentivo extra para, de repente, abrir uma conta em uma carteira digital sem conseguir usar nas lojas que frequentam”, analisa. “Se você cria esse modelo no varejo, no mínimo você já tem sua rede de lojas [como rede de aceitação]”, argumenta.
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Como exemplo, o especialista lembra que o serviço de pagamento da rede de cafeterias Starbucks, o Starbucks Pay, já é a maior carteira virtual dos Estados Unidos, à frente de Samsung Pay, Google Pay e Apple Pay – ainda que só funcione nas lojas da marca. Ela funciona como uma conta de pagamento: o usuário deposita valores e compra sem precisar usar cartão ou maquininhas e tem a opção de fazer o pedido antes de chegar à loja e busca-lo sem filas. Para a Starbucks, as principais vantagens são a descoberta dos hábitos de consumo de cada cliente, que dividem seus dados ao criarem e utilizarem a ferramenta, e o adiantamento: enquanto nas maquininhas o dinheiro cai entre um dia (no débito) até 30 (crédito), a cafeteria recebe o pagamento antes mesmo de vender seu produto. “A gente acredita muito que isso vai acontecer no Brasil”, diz o diretor da Matera.
“Guerra das maquininhas”
O sucesso da PagSeguro entre pequenos e médios comerciantes faz brilhar os olhos de cada vez mais empresas, gerando uma “superpopulação” de maquininhas de pagamento – entre elas, Stone, SuperGet (do Santander), e POP Credicard (do Itaú). As empresas estão em plena guerra de preços e condições na ânsia por abocanhar a maior parcela possível de um mercado até então praticamente inexplorado.
A pulverização destes serviços e a busca pelo menor preço são tão intensas que o fornecimento dos terminais está prejudicado no país, tanto pela altíssima demanda como pela necessidade de substituição de equipamento mais barato. De acordo com o BBI, o PagSeguro vê atrasos em seus produtos e pelo menos a Cielo já está em contato com empresas chinesas para fornecimento de POS (do inglês Point of Sale, ou ponto de venda) na tentativa de garantir que a alta demanda prevista seja suprida.
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Voltando à Passaí, por um lado foi resolvido um problema próprio, das taxas pagas pelo uso da maquininha em suas lojas. Qualquer transação com cartão de crédito cobra uma parcela para o banco emissor do cartão, outra para a bandeira (Visa ou Mastercard, por exemplo) e uma terceira para a adquirente. Desta última, a rede Assaí agora está livre – e ainda ganha uma fonte extra de receita quando seus clientes, como pequenos restaurantes, usam sua tecnologia.
Mas, se a distribuição de maquininhas próprias funcionou para uma empresa do porte do GPA, outras empresas não devem ter a mesma facilidade, justamente por esta saturação. “Na minha visão, a festa já está acabando”, diz Alexandre. “É muito difícil um novo player conseguir se posicionar”.