Condomínio pode barrar locação por Airbnb. O que proprietários devem fazer após decisão do STJ?

Advogados explicam as situações que caracterizam atividade comercial de hospedagem, que batem de frente com destinação residencial dos condomínios

Mariana Segala

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SÃO PAULO – O julgamento no Superior Tribunal de Justiça (STJ) de um caso ocorrido em Porto Alegre colocou uma pulga atrás da orelha de quem tem imóveis para alugar no Airbnb. Uma decisão da Quarta Turma do Tribunal, na última semana, indicou que as convenções de condomínio podem proibir os moradores de locar seus imóveis por meio de plataformas digitais.

A resolução teve origem em uma ação no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que determinou aos proprietários de duas unidades residenciais em um condomínio que deixassem de alugá-las pelo Airbnb. A prática, segundo o TJ gaúcho, caracterizava as atividades comerciais e de hospedagem, vedadas pela convenção do condomínio. O recurso chegou ao STJ em 2019.

De acordo com o processo, os proprietários chegaram a fazer reformas nos apartamentos para criar novos quartos e acomodar mais pessoas. Além disso, o fornecimento de serviços (como lavagem de roupas), a alta rotatividade e o fato de os inquilinos não terem vínculo entre si foram os elementos levados em conta para caracterizar a atividade como hospedagem – e não locação por temporada.

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Enquanto a locação por temporada – com até 90 dias de duração – tem finalidade residencial, sendo regida pela Lei das Locações (ou Lei do Inquilinato), a hospedagem é uma atividade comercial.

Embora tenha reconhecido que as atividades realizadas por meio de plataformas digitais não possuem o modelo de negócio, a estrutura ou o profissionalismo da hospedagem profissional – como a oferecida pelos hotéis – o voto do ministro Raul Araújo (seguido pelos outros membros do STJ) indicou que o caso em questão envolvia um contrato “atípico” de hospedagem.

Impacto para os proprietários

Para quem tem uma casa ou apartamento para alugar no Airbnb, o que a decisão do STJ significa?

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De imediato, não há um impacto automático ou em cascata, explica o coordenador da Comissão de Locação do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim), Jaques Bushatsky. “Essa decisão do STJ não é vinculante. Significa que ela resolve a situação específica dos litigantes”, diz. Serve, porém, como um precedente que poderá ser considerado em outros julgamentos.

A advogada Kelly Durazzo, especializada em direito imobiliário, ressalta que o caso julgado tem particularidades. “Não foi uma transação usual de locação temporária, como costumamos ver nas plataformas e até nos tradicionais aluguéis de temporada nas praias. Os proprietários chegaram a criar divisórias adicionais para poder receber mais pessoas, o que descaracterizou o contrato residencial”, explica, lembrando que ainda cabe recurso. “Foi a primeira análise do tipo no STJ, e foi de um caso ruim.”

Na visão de Bushatsky, o problema não está no período curto de locação – já que, pela lei, o aluguel por temporada pode durar a partir de um dia, chegando até 90. “Mas se alugo vários cômodos ou camas de um mesmo imóvel para pessoas distintas e não relacionadas entre si, de fato posso estar oferecendo um serviço de hospedagem”, explica.

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A situação seria diferente, de acordo com o advogado, se o proprietário disponibilizasse o imóvel para uma pessoa ou uma família por um fim de semana, por exemplo – uma situação que ele entende como de aluguel por temporada. “Eventualmente, a convenção do condomínio poderia proibir expressamente a locação curta, mas é raríssimo encontrar isso atualmente”, diz.

Em nota, o Airbnb afirmou que a conduta do proprietário no caso julgado pelo STJ – que “transformou sua casa em um hostel”, algo que a plataforma não estimula – “descaracteriza a atividade da comunidade de anfitriões”.

“Os ministros ressaltaram que a locação via Airbnb é legal e não configura atividade hoteleira, e afirmaram que esta decisão não determina a proibição da atividade em condomínios de maneira geral. Proibir ou restringir a locação por temporada viola o direito de propriedade de quem aluga seu imóvel regularmente”, diz a nota do Airbnb.

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Dá para continuar alugando?

Para quem é proprietário de um imóvel em condomínio e quer locá-lo por meio de plataformas como o Airbnb, os advogados sugerem adotar alguns passos. O primeiro deles é certificar-se de que a convenção do condomínio não proíbe expressamente o aluguel residencial de curta duração. Segundo Kelly, embora seja muito difícil que isso ocorra, é importante estar seguro disso.

O segundo passo é, ao fazer o anúncio do imóvel nas plataformas digitais, tomar como referência as características mais comuns da locação residencial. “Oferecer café da manhã, por exemplo, pode caracterizar a atividade de hospedagem, assim como outros serviços adicionais”, explica Kelly.

Para Bushatsky, outra pergunta que os proprietários devem se fazer é a seguinte: “Você pretende alugar o imóvel para uma pessoa ou família, ou para várias pessoas independentes simultaneamente? Esse também poderia ser um desvirtuamento do uso residencial do imóvel”, diz.

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Kelly ressalta que o proprietário deve alertar seus inquilinos sobre as regras de uso do condomínio, como evitar barulho após os horários de proibição. “É importante não criar confusão para o condomínio e manter uma conduta ética como se fosse o inquilino fosse, de fato, um morador.”

Mariana Segala

Editora de Investimentos do InfoMoney