Por que Elon Musk ‘rema contra a maré’ no momento em que modelo híbrido de trabalho desponta?

Postura do bilionário sobre trabalho 100% presencial pode influenciar grandes companhias ao redor do mundo, dizem especialistas

Giovanna Sutto

Elon Musk
Elon Musk

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O bilionário Elon Musk chamou atenção recentemente ao enviar um e-mail aos seus funcionários da Tesla, companhia de carros elétricos, impondo duas opções de escolha: voltar ao trabalho presencial ou deixar a empresa.

A exigência do homem mais rico do mundo era de que todos passassem pelo menos 40 horas por semana no escritório. 

A declaração dividiu opiniões, uma vez que grandes empresas do Vale do Silício, como Microsoft, Apple, Google e Amazon, estão em home office, uma modalidade de trabalho que ganhou lastro a partir da vigência da pandemia de Covid-19.

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No Brasil, o formato híbrido de trabalho (a jornada é dividida entre o home office e o escritório) vem ganhando força. Pesquisa recente da KPMG mostra que 85% das empresas do país pretendem incentivar este formato de trabalho aos seus funcionários.

Companhias como Vale, Coca-Cola South Operations, XP Inc., Unilever, Colgate têm, por exemplo, modelos remotos ou híbridos em funcionamento.

Mas em qual medida a atitude de Musk enfraquece o home office ou o modelo híbrido? O InfoMoney buscou respostas de especialistas sobre esta e outras questões. Confira:

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Musk pode influenciar tomadas de decisão?

“Ele é um influenciador e não tem como negar que a fala dele pode incentivar presidentes e executivos de vários segmentos, que já têm um pensamento mais conservador. Não acho, porém, que o 100% presencial se sustente no longo prazo”, avalia Bruno Martins, CEO da Trilha Carreira Interativa.

Musk está no centro das atenções há algum tempo, também, pelos seus projetos ambiciosos. Ele tenta fechar a compra do Twitter; desenvolve a SpaceX com voos ao espaço; colocou em operação satélites da Starlink para oferecer, entre outras funcionalidades, internet em áreas remotas; e tem a Tesla com seus carros elétricos.

Segundo o próprio Musk, a Tesla “vai realmente fabricar os produtos mais interessantes e significativos de qualquer empresa na terra. E isso não vai acontecer por telefone.”

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“Ele disse, na verdade, o que muitos empresários e executivos, que têm a tomada de decisão em mãos, estavam com receio de dizer”, afirma Renato Batista, CEO da Netglobe, empresa especializada em soluções de tecnologia para conexão de empresas e funcionários.

“Estamos atravessando um ano com desafios para muitos negócios. Essa retomada da pandemia ainda está acontecendo aos poucos e pode ser desafiadora até para a Tesla em alguns aspectos. […] Medidas de comando e controle podem ser reflexo de situações em que os negócios são exigidos”, completa Batista.

No Brasil, por exemplo, a crise econômica tem forçado as empresas a rever seus planos de crescimento, com muitas delas enxugando as equipes para lidar com o cenário desafiador. Este caminho foi trilhado recentemente por algumas startups, como QuintoAndar, Loft e Facily.

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Empresas maiores, como SulAmérica e Empiricus, também fizeram cortes em seus quadros para reduzir custos.

Home office não é para todo mundo

Segundo Batista, o recado que Musk deixa é que, “definitivamente, o home office não é para todo mundo”.

Levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que o Brasil tem cerca de 20,4 milhões de trabalhadores em ocupações que poderiam ser realizadas de forma remota. O número equivale a 24,1% do total de ocupados no mercado de trabalho, embora concentre em torno de 40% da massa de renda salarial.

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“Manter o home office foi uma forma encontrada pelas empresas para reter os talentos em áreas com escassez de profissionais. Mas, naturalmente, é preciso avaliar caso a caso. É necessário levar em consideração também o contexto, o tipo de trabalho, a saúde mental do trabalhador e a financeira da empresa. Há profissões em que o home office se encaixa bem, mas há outras em que é necessária a presença do funcionário”, analisa Martins.

Quando o home office vale a pena?

Rebeca Toyama, especialista em estratégia de carreira, afirma que a reflexão que Musk traz — apesar de sua postura polêmica de “comando e controle” — pode incentivar reflexões.

“Não podemos também ficar no ‘efeito manada’ do modelo híbrido. Cada empresa precisa avaliar o formato mais eficiente de trabalho de acordo com o contexto em que vive”, afirma.

Batista concorda e sugere três reflexões sobre a decisão de transição para um modelo híbrido.

Avalie a cultura da sua empresa, não importa o tamanho. Se for madura e bem disseminada, com um modelo orientado a resultado e autogestão, o modelo híbrido pode funcionar. Se a empresa for direcionada a uma gestão de comando e controle, atividades presenciais podem ser necessárias.

O próximo passo é alinhar a decisão com os líderes. A liderança precisa dar o exemplo e engajar os funcionários. Nenhuma empresa existe sem os empregados — nem mesmo a Tesla de Musk. Toyama lembra que geralmente não é possível “agregar gregos e troianos” e o papel dos líderes também é adaptar os funcionários que não estiverem em linha com a decisão da empresa e pensar em maneiras de engajamento.

Se a opção for pelo presencial, mostre aos funcionários que as atividades feitas no presencial não poderiam ser realizadas com a mesma eficiência em casa. Quais as diferenças das atividades entregues no presencial e no híbrido ou remoto? Vale a pena priorizar e fazer essa separação para entender qual modelo faz mais sentido.

“No entanto, acho muito difícil um modelo 100% presencial prosperar no longo prazo. Muitas áreas como tecnologia, varejo, mercado financeiro, estão funcionando bem no remoto ou híbrido”, aponta Martins.

Híbrido é o futuro?

Toyama afirma que pode ser cedo para afirmar que o híbrido já deu certo. “É uma tendência que vem se firmando”, diz.

Pesquisa da consultoria Mercer, com 800 empregadores, mostra que 94% afirmam que a produtividade em casa é a mesma ou igual ao momento pré-pandemia, mesmo com parte dos funcionários trabalhando em home office.

“No caso do Musk e da Tesla, algumas situações na empresa o levaram a tomar outra decisão, e muito baseada em sucesso futuro. O presencial trouxe muito resultado até aqui e ele pode estar se questionando se o remoto pode colocar isso a perder depois de um tempo forçado à distância”, diz.

Martins acredita que o híbrido será o futuro dos modelos de trabalho. “Ter flexibilidade, menos custos e mais tempo, além de menos gastos para as empresas são atrativos para a manutenção do modelo”.

Ele chama atenção para uma questão jurídica sobre o modelo híbrido, que ainda não possui uma legislação específica no Brasil.

“A insegurança jurídica pode estar freando muitas empresas de colocar o modelo na rua, de fato, e tentado o presencial. Mas será preciso tempo para que saia algo concreto por parte do Congresso e que tenhamos uma regulamentação oficial para adotá-lo detalhando quantidade de dias de trabalho na empresa, controle de jornada misto, equipamentos, divisão de espaços de trabalho, entre outros pontos”, diz Martins.

Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.