UE processa Portugal por visto dado a cidadãos da Comunidade de Língua Portuguesa — Brasil na lista

Medida pode afetar mais de 100 mil brasileiros que estão em terras portuguesas pelas regras do CPLP

Anna França

Bandeira de Portugal (Divulgação/MContábil)
Bandeira de Portugal (Divulgação/MContábil)

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A União Europeia (UE) abriu um processo contra Portugal por causa da lei que autorizou residências aos cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), podendo afetar mais de 100 mil brasileiros.

Em vigor desde março, a nova regra permitiu que imigrantes de países como Brasil, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste recebessem visto automático para morar por até um ano em Portugal. Isso inclui também autorização para trabalhar, se inscrever em cursos ou alugar imóveis no país.

No entanto, o bloco europeu alega que esse modelo de visto viola regras do acordo de Schengen, que definiu a livre circulação no bloco a turistas por até 90 dias. O espaço Schengen foi criado em 1985 e conta com 27 países, incluindo quatro que não são da União Europeia. Trata-se da maior zona de livre circulação do mundo, que vai de Portugal até a Finlândia.

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A UE já notificou Portugal e estabeleceu um prazo de dois meses para que o país se posicione. Se não houver resposta, o bloco poderá questionar formalmente o país dentro do grupo. Portugal, no entanto, informou que o acordo com os países da CPLP vai continuar.

Em entrevista à agência de notícias Lusa, o secretário de Estado dos Assuntos Europeus em Portugal, Tiago Antunes, afirmou que o governo português nunca teria adotado estas regras se achasse que estavam em contravenção com o regime Schengen. “Fomos surpreendidos com a abertura do procedimento de infração por parte da Comissão Europeia. Temos alguma dificuldade em compreender isso”, disse.

Como ficam os brasileiros?

A medida pode afetar mais de 100 mil brasileiros que estão em terras portuguesas dentro das regras do CPLP. Dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) português divulgados em 20 de setembro indicam que ao todo já são quase 400 mil brasileiros morando em Portugal, o que representa um crescimento de 36% em um ano. Isso sem contar os que estão sem documentos ou aqueles que têm dupla cidadania.

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Especialistas em fenômenos imigratórios avaliam que o total de brasileiros que vivem em Portugal pode chegar ao dobro dos números oficiais. Por isso, também aumentaram em 50% as denúncias de xenofobia contra brasileiros entre 2017 e 2021, segundo dados revelados pela Comissão para a Igualdade e contra a Discriminação Racial do país. Portugal tem 10,4 milhões de habitantes. A depender da estimativa, os brasileiros podem representar entre 4% e 8% da população.

De acordo com Luana Araújo dos Santos, advogada brasileira que atua em Portugal e auxilia pessoas que decidem se instalar e trabalhar no país, o tema vem sendo debatido há bastante tempo porque a lei regulariza o visto do estrangeiro que entra no país, mas não controla quem quer viajar pela Europa.

“Portugal sabia que daria problema, por isso achamos que terão de voltar atrás”, disse a especialista, que também emigrou para o país em 2019 e passou por todas as dificuldades que os brasileiros enfrentam. “Muitos agora acham que podem pedir esse visto e depois viajar pela Europa inteira, mas, se tiver passado os 90 dias, eles serão barrados nas fronteiras e é por isso que os casos aumentaram e a União Europeia vem questionando Portugal”, acrescenta.

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A questão, segundo a especialista é que o país precisa de mão de obra e como os processos de liberação de visto de permanência oficial tinham uma grande morosidade, podendo levar mais de um ano para ser obtido, a saída foi regularizar de outra maneira e permitir que os estrangeiros que falam língua portuguesa pudessem trabalhar de forma oficial.

Hoje, a lei prevê que é possível conceder nacionalidade a nascidos em solo português, quando os pais estão há mais de 1 ano no país, e quem tem pais, avós e até bisavós portugueses. “Mas quando Portugal entrou no bloco europeu se comprometeu a seguir as regras do jogo. Então achamos que isso será revertido ou pelo menos adaptado”, diz.

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Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro.