“Decidimos não participar da crise”, diz diretor de uma das campeãs da Bolsa em 2015

Em entrevista ao InfoMoney, o vice-presidente de Planejamento Corporativo & Relações com Investidores fala de como a empresa consegui driblar o cenário ruim e destaca as perspectivas para 2016

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A empresa cujas ações aparecem com uma das maiores altas da Bovespa em 2015 não é vista constantemente no noticiário e nem mesmo nos relatórios de análise de bancos e corretoras. Mas, provavelmente, você já teve que recorrer a ela algum dia. 

Trata-se da Raia Drogasil (RADL3), empresa do ramo farmacêutico que estreou este ano na carteira teórica do Ibovespa e é um dos destaques positivos do mercado apesar do cenário de deterioração econômica – até o dia 23 de dezembro, ela subia 44,86% em 2015, a 5ª melhor ação do Ibovespa. O índice da Bolsa, por sua vez, caía 11,98%. Em entrevista ao InfoMoney para “Especial Cenários para 2016”, o vice-presidente de Planejamento Corporativo & Relações com Investidores da Raia Drogasil, Eugênio De Zagottis, fala de como a empresa consegui driblar o cenário ruim, as perspectivas para 2016 e afirma: “nós decidimos não participar da crise”.

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Confira abaixo a entrevista com Eugênio de Zagottis:

InfoMoney – O que explica o sucesso da companhia em meio a esse cenário tão ruim principalmente no setor de consumo, que era um dos pilares de crescimento do PIB do Brasil?
Eugênio de Zagottis – Há três fatores que são importantes. O primeiro é o balanço forte. No Brasil, infelizmente, crise é uma coisa que acontece a cada quatro, cinco anos. Então a gente tem a vantagem uma estrutura de capital conservadora, sem dívida ou com pouca dívida. Acho que a primeira fortaleza nossa para estar bem nesse momento é o fato de não ter que se preocupar com rolagem de dívida, é o fato de não ter que se capitalizar fazendo juros, então isso é muito importante.

O segundo é que a gente está num mercado super resiliente que é o mercado de saúde, as pessoas continuam tomando medicamentos normalmente. A OMS (Organização Mundial da Saúde) mostra que o mercado de medicamentos se mantém crescendo a taxas de duplo dígito. Agora, se existe um concorrente que também se beneficia desse mercado mas está alavancado, tem que suar para não quebrar. Hoje os juros estão super altos e uma empresa endividada tem que fazer ginástica pra pagar esse juros. Ela acaba cortando na carne, tirando funcionários, reduzindo estoque e aumentando preço. Acho que, além de ter um mercado super resiliente, é preciso ter uma estrutura capital que nos permite não nos preocupar com dívida.

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O terceiro fator é a nossa fusão. A gente conseguiu trazer pra empresa o melhor da Droga Raia e da Drogasil e sem reinventar nada, porque são práticas que já existiam nas duas empresas. Ao combinar só o melhor das duas, mudamos de patamar de execução. Hoje, qualquer indicador operacional está muito melhor do que antes: estamos com menos falta de medicamentos, menos perdas de estoque, com menos retirada de funcionários e mais clientes satisfeitos. São esses os três fatores: estrutura de capital conservador, mercado resiliente e qualidade da operação. 

IM – Algum fator preocupa vocês pra 2016 em meio a essa crise? Já se fala que ano que vem vai ser perdido também… 
EZ – Nesse cenário econômico e na medida em que o mercado cresce para nós, não estamos preocupados com a retração do PIB, mas sim com a alta da inflação. Nós trabalhamos com uma inflação que beira os 9%, 10%. É um nível de inflação complicado, porque pega no aluguel, no pessoal, em todas as esferas da companhia. Hoje, o principal desafio que temos é lidar com a inflação.

Para combatê-la, precisamos de ganho de produtividade. Estamos investindo em melhoria de processo, tecnologia, pessoas, serviços pra ganhar produtividade e com isso conseguir contornar a inflação.

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IM – Qual é a estratégia para as novas lojas da rede?
EZ – Isso também está no contexto de produtividade. Nós temos hoje programas de fidelidade tanto na Raia quanto na Drogasil que estamos trabalhando para fortalecemos de forma que sejamos mais atraentes para o cliente. Quando a gente fala que melhorou na questão das lojas, essa melhoria é para o cliente. Quando eu falo de sistemas, é porque a gente quer atender melhor o cliente. Porque no fundo, produtividade é bom para nós e para o cliente. Por que? Se a gente conseguir atender o cliente 20% mais rápido, é mais satisfação pra ele e menos custo pra gente.

O cliente que espera em loja, que pega fila, que tem um atendimento mais burocrático, mais travado no balcão, sofre com isso. Tudo o que a gente está fazendo no fundo é para melhorar a vida do cliente. Produtividade e satisfação do cliente de fato andam juntas.

IM – Com isso, reforça também a estratégia da companhia em abrir mais lojas, pelo crescimento da produtividade também?
EZ – Quando a gente fala em produtividade, a gente fala muito mais em pegar loja atual e fazer melhor com menos custo. No fundo é isso. O plano de crescimento ajuda na escala. Em grande escala, o crescimento contribui. Nosso planejamento inicial para 2016 era abrir 130 lojas, mas mudamos para 165 lojas, pois percebemos que estamos correndo em velocidade maior.

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IM – E como crescer sem pressionar as margens da empresa, que são bastantes sólidas? Há alguma pressão no curto prazo para as margens da Raia Drogasil?
EZ – Crescer custa. A loja nova dá despesa pré-operacional e os 4 ou 5 primeiros meses são de prejuízo. Acelerar o crescimento e aumentar a projeção de novas lojas pega na rentabilidade. Então, esse trade-off, ou essa troca, é real.

Contudo, a gente pensa muito no longo prazo e estamos preocupados em criar valor que vai assentar a longo prazo. Abrir uma loja pode trazer pressão, e se trouxer, é a vida. Mas temos todo o know-how e experiência para abrir uma loja de qualidade. O importante é que esse investimento gere retorno e que a empresa esteja melhor dentro de 1 a 3 anos. Nosso objetivo não é otimizar o trimestre, é fazer o que é melhor a longo prazo.

IM – E qual é a estratégia de vocês para abertura de lojas? Quais são os pontos? Em que lugares vocês estão focando?
EZ – Nós estamos presentes em 17 estados que representam 90% do mercado farmacêutico brasileiro. Já temos uma cobertura de mercado maior do que os nossos principais concorrentes. Dentro disso, a gente consegue fazer um crescimento vistoso sem ter que concentrar em excesso numa região. A gente consegue espalhar. Claro que São Paulo, pelo tamanho do mercado, pela força das nossas marcas, é sempre o principal foco da nossa expansão e isso não vai mudar. Mas a gente abre em São Paulo o número de lojas que a gente acha ideal. Na hora que acelera o crescimento, se tiver chance, se tiver loja a mais pra abrir em São Paulo, ótimo. Se não tiver, a gente vai abrir mais em outros mercados onde a gente ainda tem um share (participação de mercado) muito baixo.

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IM – O desempenho das lojas da Raia Drogasil no Nordeste surpreendeu positivamente. Qual é a estratégia de operação por lá?
EZ – Temos excepcionais operações no Nordeste. Temos da Bahia desde o Rio Grande do Norte. A gente ainda não está no Ceará, Piauí e Maranhão mas, dentro desses mercados onde estamos, em todos deles estamos muito bem e nós estamos muito felizes com essa operação então trabalhamos pra fortalecer.

IM – Então vocês vão trabalhar para fortalecer as operações pelo Brasil, mas sempre olhando também, pro Sudeste que é o principal mercado?
EZ – Eu diria que São Paulo é nosso grande mercado. São Paulo é o maior mercado do Brasil, é quase 30% do mercado farmacêutico brasileiro. Normalmente eu esperaria que 30% do plano fosse São Paulo de cara. É um mercado que cresce muito. São Paulo pode crescer menos percentualmente que alguns mercados como o Nordeste, mas em valor de mercado nenhum do Brasil cresce mais que São Paulo, falando em números absolutos. Então a gente sempre tem um pedaço relevante do plano em São Paulo. Isso é uma boa notícia, porque a gente acredita que tem espaço, que nossa marca faz a diferença. A gente conhece o mercado como ninguém. Então, isso vem permitindo que alavanquemos essa fortaleza.

IM – Recentemente, vocês concluíram a compra de uma empresa de especialidades, a 4-Bio. Foi a primeira de mais aquisições no curto prazo ou o foco vai ser o crescimento orgânico?
EZ – O foco, sem dúvida nenhuma, é o crescimento orgânico. Claro que, quando oferecem pra gente algum ativo, a gente analisa e toma uma decisão. A 4-Bio é um exemplo de que não é impossível. A gente tinha especialidades como uma estratégia provável pra companhia, mas não era algo que estávamos atrás naquele momento. O que acontece é que a oportunidade estava lá na frente.

O que ofereceram para nós era uma empresa que era uma joia. Das três grandes, a 4-Bio é a única que não é distribuidor e a única com controle internacional e não tem venda governo. Isso é super único pro setor. Além disso, é uma empresa aberta por um ex-executivo da Procter & Gamble, tem uma filosofia de empreendedorismo, é estruturada. Desde o início a empresa era auditada. A gente entendeu que era uma oportunidade que não teria outra e nesse sentido a gente decidiu se mexer.

Nós não estamos ativamente olhando aquisições, mas se passa na frente algo que faz sentido, a gente vai analisar.

IM – Quais são as perspectivas para 2016?
EZ- Nós decidimos não participar da crise. Estamos tocando nossa vida normalmente. Como eu falei, a crise no nosso setor só está em quem tem dívidas. Para qualquer empresa saudável, um setor que cresce a dois dígitos é vida normal. Claro, tem a preocupação com a inflação, mas a gente consegue dar conta e lidar com ela. Nossa perspectiva pra 2016 é fazer um crescimento orgânico acelerado abrindo 165 lojas.

Se olhar nos últimos 12 meses, a Raia Drogasil ganhou R$ 1,5 bilhão de receitas sobre os 12 meses anteriores. É como se a gente comprasse todo ano a sexta maior rede do Brasil, só que sem pagar prêmio, só com crescimento orgânico. Temos uma máquina de crescimento que faz isso com muita velocidade muita qualidade e com excelente retorno. A gente quer continuar alavancando essa máquina e consolidar o que conseguimos nos últimos anos. 

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.