Ata do Copom reconhece chance de corte maior na Selic – e anima Garde com prefixados, diz Weeks

Para economista-chefe da gestora, BC não deveria ter dito que é "pouco provável" que haja cortes mais duros, se não houvesse essa possibilidade

Bruna Furlani

Daniel Weeks, economista-chefe da Garde
Daniel Weeks, economista-chefe da Garde

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A intenção do Banco Central de adotar um discurso mais conservador na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) – para tentar conter cortes ainda mais duros nas próximas reuniões – pode não surtir tanto efeito como o esperado no mercado.

“Só reconhecer que existe essa possibilidade aumenta a chance de pedir uma queda maior”, avalia o economista-chefe da Garde, Daniel Weeks, ao se referir à postura adotada por agentes financeiros que passaram a pedir cortes de 0,75 ponto – após a decisão do BC de reduzir a Selic em 0,50 ponto na reunião da última quarta-feira (2).

Na ata, divulgada nesta terça-feira (8), o Copom afirmou que “julga como pouco provável uma intensificação adicional do ritmo de ajustes, já que isso exigiria surpresas positivas substanciais que elevassem ainda mais a confiança na dinâmica desinflacionária prospectiva”.

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Em entrevista ao InfoMoney, Weeks destacou que o BC parece identificar três razões que levariam a uma queda mais forte da Selic nos próximos encontros: queda adicional das expectativas de inflação, abertura maior do hiato do produto (diferença entre o Produto Interno Bruto potencial e seu crescimento efetivo), além de inflação de serviços mais benigna.

“Os dois primeiros têm uma probabilidade baixa de ocorrer. O foco então estaria na inflação de serviços”, observa o economista.

Nesse sentido, o profissional conta que a ata mostrou uma divisão dos membros com relação à inflação de serviços, mas que prevaleceu a avaliação majoritária de que houve uma melhora. A projeção da Garde é de que a inflação de serviços fique em 4% nos próximos meses.

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“O BC diz que é pouco provável que aconteça isso, mas cita algumas coisas que poderiam mudar esse cenário e acreditamos em uma inflação de serviços mais benigna”, observa. “Se fosse pouco provável, não teria falado nada. Teria parado um parágrafo antes”.

Apesar de acreditar que a estratégia adotada pelo BC pode não surtir tanto efeito no mercado, o economista manteve a visão de que a autoridade monetária deverá cortar os juros em 0,50 ponto na próxima reunião e realizar mais dois cortes de 0,75 ponto na sequência – o que levaria a Selic para o patamar de 11,25% no fim deste ano.

A estimativa é mais arrojada do que a dos economistas consultados pelo BC no Relatório Focus. Segundo o documento mais recente, de segunda-feira (7), o mercado espera que a taxa básica de juros encerre este ano em 11,75%.

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Onde investir?

Atualmente, a maior posição carregada pela Garde é uma alocação aplicada (que se beneficia da queda dos juros) em prefixados.

“Estamos animados de ter essa aceleração do ritmo à frente. Vai ter uma nova mudança na diretoria. Vai ser um passo significativo. Acho até que vai acelerar mais”, avalia o economista.

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Os mandatos de Fernanda Guardado (assuntos internacionais e gestão de riscos corporativos) e Maurício Costa de Moura (relacionamento, cidadania e supervisão de conduta) terminam em 31 de dezembro deste ano.

O economista chama atenção para o fato de que isso pode dar uma arejada no BC, já que ambos tiveram um voto mais conservador e optaram por um corte de 0,25 ponto na última reunião.

Ao ser questionado sobre o trecho em que o BC procurou afastar a visão de que poderia tornar-se mais leniente com a inflação, o economista afirma que o parágrafo buscou dizer que a mudança da diretoria não vai comprometer a credibilidade da autoridade.

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A preocupação do BC em esclarecer esse ponto não é à toa. Weeks afirma que a entrada de dois membros indicados pelo atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), além da saída de atuais diretores mais conservadores, trouxe indagações ao mercado.

“Fica a dúvida de como vai ser a função de reação do próximo BC. Não sei quão eficaz isso será”, pondera o especialista.

O maior esclarecimento deverá vir mesmo com as entrevistas dos diretores nos próximos meses, especialmente a de Gabriel Galípolo. “Ouvimos pouco da cabeça do Galípolo sobre política monetária. Precisamos ouvir um pouco mais o que ele acha e dos outros membros também”, destaca.

Hiato do produto e arcabouço

Além da tentativa de conter uma precificação de reduções maiores da Selic nas próximas reuniões, outros destaques na ata ficaram para observações em torno do hiato do produto e do arcabouço fiscal.

Sobre o primeiro, Weeks pondera que a parcela dos integrantes que foram vencidos, ou seja, dos que votaram pelo corte de 0,25 ponto, destacou que tem sido “difícil estimar o hiato”.

“Com relação ao hiato do produto, alguns membros notaram que sua estimativa tem sido revisada para cima e o Comitê discutiu as implicações de formas alternativas de mensuração de hiato com outros modelos e seus respectivos impactos nas projeções”, destacaram os dirigentes.

Já ao comentar sobre a parte fiscal, Weeks chamou a atenção para o fato de que o Comitê trouxe de volta o tema da questão, apesar de ter tirado esse ponto do balanço de riscos.

Na ata, os dirigentes afirmaram que o “Comitê retirou de seu balanço de riscos a incerteza residual sobre a aprovação do arcabouço fiscal, mas, em sua discussão, notou que a dinâmica fiscal seguia sendo relevante em seu cenário-base”.

A preocupação do BC é pertinente, já que as projeções de metas de resultado primário do mercado não estão convergindo, destaca o economista.

“O mercado não sabe tudo o que será aprovado. O governo tem anunciado números bilionários e quando vemos eles parecem menores. Não está claro como ele irá arranjar todo esse dinheiro”, defende Weeks.

Outro assunto que deverá ser monitorado de perto é a defasagem dos preços da Petrobras. “O BC trabalha com o PPI e há uma defasagem grande. Isso é um risco para a inflação corrente”, destaca.

Weeks afirma que tem posição comprada (que se beneficia da alta) em inflação mais curta. A alocação é pequena, mas tem como foco obter ganhos com a necessidade de reajuste da Petrobras.

Posições

De olho em um BC que pode adotar um ritmo mais forte de cortes e no enfraquecimento da China, a Garde diz que também tem adicionado posições compradas em dólar contra o real.

Já no quesito Bolsa local, a Garde diz que está com uma posição neutra. “Tem algumas coisas que jogam contra, como o fato de aumentar a tributação sobre empresas, China mais para trás, o que é ruim para exportadores de commodities e a defasagem nos reajustes da Petrobras”, afirma Weeks.

O economista também observa que a Bolsa andou muito nos últimos meses e o cenário externo está “confuso” com enfraquecimento da China e a esperada inclinação da curva de juros americana.